«O Sócrates ainda vai meter o juiz na cadeia»
Acho que a nossa amiga tinha visto a entrevista, que
eu não vi. A do juiz Carlos Alexandre, que é o superjuiz de muitos processos
desses sem destrinça possível, em que há muitas insinuações, ao que parece
baseadas em factos, ou apenas em suspeitas, e nunca mais chegam a uma sentença definitiva,
devido ao fugidio das suas contra-argumentações ou do seu advogado, seguros da
sua impenetrabilidade desafiante
Mas a nossa amiga continuou na sua récita implicativa
contra a minha ignorância:
- Sabe quem é o juiz? Não sabe? E o superjuiz, é
corajoso, hein? A vida é difícil para ele, tem pouco dinheiro, não é como
certas pessoas que têm amigos com contas bancárias que emprestam dinheiro sem
juros nem nada…
- Está-se mesmo a ver que esse dinheiro não é dos
amigos, mas dele, esclareceu a minha
irmã que diz cada vez sentir mais asco pela figura do Sócrates.
E a nossa amiga acrescenta, com a malignidade do
costume:
- Eu até penso se eles não são casados os dois, ou se
não estarão para casar. Quero saber quando é que eles se casam os dois, pois
comunhão de bens já têm.
Eu ia tomando nota, um tanto às aranhas, mas ela
continuou:
- Achei muita graça quando o juiz disse que não queria
ter vida política. E também que não queria ser presidente da câmara, não gosta,
é contra, “Deus me livre , nem pensar”, respondeu ele à entrevistadora da Sic.
Que já tinha inimigos que chegassem, parece que é dos incorruptíveis. E até concluiu:
“Quando eu morrer, no meu funeral só devem ir alguns amigos. Se não chover”.
Lembrei-me do poema «Fim» de Sá
Carneiro:
Quando eu
morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
E eu quero por força ir de burro!
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
E eu quero por força ir de burro!
Regressada a Penates, às sopas, e resignada ante a humilhação
que a nossa amiga fez questão de me infligir,
sabendo ela embora que o tempo é escasso para seguir e assimilar todas as
notícias e programas – ela não vê os filmes de ficção, por isso tem mais tempo
para os reais, da praça de cá ou da de lá de fora - informei-me melhor com o meu marido sobre a
questão, reduzida, na esplanada, às saídas bombásticas ou epigramáticas da
nossa amiga.
Tratara-se, pois, de uma entrevista na Sic, com o tal
superjuiz, que os participantes do Eixo do Mal, aliás, tinham arrasado, na
véspera, e que pude ver às 3 horas, a conselho seu: um juiz por todos troçado
ou descrito severamente, no seu provincianismo arrogante de pessoa que pretende
apresentar-se como não corrupta, mas perfidamente insinuando a corrupção
alheia. Fiquei esclarecida.
Para
mim, contudo, seria importante averiguar da união dos dois amigos - Sócrates, o
que pede emprestado, e Santos Silva, o que empresta. Mas eu, que sou menos
maliciosa do que a nossa amiga, prefiro lembrar, para tanta aberração, não uma
aliança matrimonial mas uma aliança fraterna, tal a dos manos Castor e Pólux, filhos
da aberrante união de Leda com Júpiter, transformado em cisne. É, pelo menos,
mais poético. Ou desmistificador da rezinga, que tantas vezes a vaidade dita – dos
comentadores e das suas vítimas.
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