Um artigo sobre Pedro Passos
Coelho - e Maria Luís Albuquerque – expressão
de uma malignidade que me parece um tanto paranóica, de um azedume próprio de
quem pertence a terrenos ideológicos díspares, como parece ser o caso, consultada
a Internet, sobre este que se diz Fundador do Partido Socialista e que agora, por
quaisquer desencontros colegiais, singrou pelo Bloco de Esquerda, o que, no
actual contexto, não é coisa relevante, amigos para sempre, mas com mais peso
dramático na expressão, como se verifica no tal artigo. Pode aliás, tal
autoridade esgrimista de conceito paranóico, resultar também do emproamento que
as muitas condecorações nele produziram –
produzem sempre, como a crista no galo – contra pessoas reduzidas à
insignificância de não ter nenhumas, nem, provavelmente, sequer a medalhinha oferecida
pela madrinha de baptismo, ou de guerra, de que Passos Coelho, evidentemente,
já não usufruiu, jovem que foi, extinta a guerra.
O título do texto, A
fixação obsessiva de Passos Coelho, aponta, pois, para uma equiparação
com o caso chileno, de uma teoria económica de empobrecimento como alavanca
para o enriquecimento futuro, pretexto para Alfredo Barroso se lançar em medonha
diatribe contra tal política de Pinochet no Chile, autêntica “orgia
automutiladora de reformas empobrecedoras”, como ele bem explica apoiado na bibliografia própria, que não me compete contestar, leiga
que sou, atida a princípios caseiros equivalentes aos de PPC, que me fizeram
comprometer sempre as minhas ambições de riqueza, pagando escrupulosamente as
prestações mensais das minhas ambições burguesas de conforto. O que Alfredo
Barroso omite sonsamente na sua diatribe, é o considerar a dívida monstruosa
herdada pelo governo de PPC e o recomeço, após quatro anos de austeridade
necessária e mais séria, num novo período de maior progresso e credibilidade,
caso não lhe tivessem extorquido o comando, os Barrosos da malignidade e do caloteirismo.
Por isso, continuo a achar de puro psitacismo vaidoso de ostentação de
sabedoria própria e maldoso no achincalhamento à ignorância alheia estes tais
artigos dos troca-tintas que assim escondem a falta de princípios éticos de
aboletamento de dinheiros alheios, que a verdadeira honradez manda saldar.
A fixação obsessiva de Passos
Coelho
ALFREDO BARROSO , Fundador do Partido
Socialista, ex-secretário de Estado
Público, 26/08/2016
TÓPICOS:
Chile Pedro
Passos Coelho América Latina Maria
Luís Albuquerque Augusto Pinochet Fundo Monetário Internacional
O
que mais avulta num político de recursos tão limitados como Pedro Passos Coelho
(PPC) é a sua fixação febril, obsessiva e obtusa na «teoria» do empobrecimento
deliberado do país e do povo, para servir de alavanca a um enriquecimento
futuro de tal modo incerto que nem ele próprio se atreve a prognosticar. Quanto
à sua ex-professora e ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, cujas
limitações também são óbvias, tornou-se a sua mais repetitiva discípula
política e não passa de um epifenómeno, ou seja, de um sintoma que sobreveio
numa «doença» já declarada (por PPC). Constituem ambos uma parceria política de
meter medo ao susto.
Mas o que mais impressiona
na teimosia obtusa de PPC é a semelhança inquietante das ideias que
insiste em defender com os ditames de Milton Friedman e dos seus Chicago
Boys, quando estes fizeram do Chile de Pinochet o primeiro grande «laboratório»
de aplicação prática das suas teorias neoliberais, de acordo com a «santíssima
trindade» — privatização, desregulamentação e redução das despesas sociais — formulada
na obra matricial Capitalismo e Liberdade (!?). Como escreveu Naomi
Klein, no seu livro The Schock Doctrine, The Rise of Disaster Capitalism,
foi o Chile que marcou a génese da contra-revolução ultraliberal, nascida no
terror, que pretendia ser «uma verdadeira revolução, um movimento radical rumo
à liberalização total dos mercados», como escreveu o Chicago Boy José Piñera,
ministro do Trabalho e das Minas de Pinochet.
O resultado do «tratamento
de choque» que o próprio Milton Friedman foi ao Chile aconselhar a Pinochet — uma
«orgia automutiladora» de reformas, como salientou a insuspeita revista The
Economist — traduziu-se num brutal empobrecimento (noção que viria
a ser tão cara ao «nosso» PPC) com o objectivo de empurrar o Chile até à
«liberalização completa dos mercados», provocando um enorme aumento do
desemprego (que os Chicago Boysconsideravam ser «provisório») e
desmantelando o Estado-Providência, no intuito de estimular o nascimento
de uma «utopia capitalista pura». O ano crucial foi 1975, quando a
inflação já atingira os 375% (mais do dobro do que durante o governo de
Allende) e o balanço é simplesmente aterrador.
As despesas do Estado
foram reduzidas, de uma só vez, em 27%. A Saúde e a Educação foram os sectores
mais duramente atingidos (uma das medidas mais emblemáticas foi o corte do
abastecimento de leite às escolas). A rede de escolas públicas foi substituída
por escolas privadas à la carte, às quais se tinha acesso com «cheques de
ensino». Os serviços de saúde foram submetidos ao princípio do «utilizador
pagador», os jardins de infância e os cemitérios foram vendidos ao sector
privado. Mas a medida mais radical foi a privatização da Segurança Social.
Mais de 500 bancos e empresas públicas foram igualmente privatizados, ao «preço
da chuva». As empresas locais foram destroçadas e, entre 1973 e 1983, o
sector industrial perdeu 177.000 postos de trabalho. Cerca de metade da
população chilena foi, pura e simplesmente, excluída da economia. A corrupção,
o compadrio e a fraude escaparam a qualquer controlo. As pequenas e médias
empresas públicas foram dizimadas. A riqueza passou do sector público para o
sector privado enquanto os passivos passaram do sector privado para o sector
público. Aconselhado por Milton Friedman e pela sua ignominiosa e
corrupta quadrilha de Chicago Boys, o general Augusto Pinochet mergulhou
deliberadamente o Chile numa profunda recessão.
Claro que os únicos
beneficiários das reformas ultraliberais executadas no Chile pelos Chicago
Boys locais — designadamente pelo seu chefe de fila, o ministro
das Finanças Sérgio de Castro (antigo aluno de Milton Friedman em Chicago) — foram
as grandes empresas estrangeiras e um pequeno grupo de financeiros
oportunistas, a que os chilenos chamavam «piranhas», que nunca se cansaram de
ganhar, à custa da especulação desenfreada, milhões e milhões, partilhando-os
com os Chicago Boys estrangeiros e locais. O resultado das reformas
ultraliberais só podia ser, como de facto foi, o de aspirar a riqueza de baixo
para cima e, à custa dos sucessivos choques, empurrar a classe média de cima
para baixo, para o desemprego e a despromoção social.
A lógica neoliberal do
«tratamento de choque» (o mesmo que a troika e o governo de PPC
quiseram impor a Portugal entre 2011 e 2015) fez Naomi Klein evocar,
no seu livro já citado, o «parentesco» impressionante com a lógica dos
psiquiatras que, nas décadas de 1940 e 1950, estavam convencidos de que bastava
provocar deliberadamente as crises de epilepsia para que o cérebro dos
pacientes voltasse a funcionar «normalmente». Para tanto, esses
psiquiatras prescreviam o recurso massivo aos electrochoques, tal como Milton
Friedman, e depois a UE, o BCE e o FMI (isto é, a troika) — com
apoio de governos como o de PPC — receitaram e continuam a receitar
os «tratamentos de choque» aos países periféricos em sérias dificuldades.
Como então descreveu a também insuspeita revista Business Week, o que se
viu no Chile foi «um mundo digno do doutor Strangelove, onde a depressão é provocada
voluntariamente».
As propostas de Friedman
foram de tal forma brutais e desumanas, que um seu antigo discípulo, André
Gunder Franck, escandalizado com o horror que testemunhou no Chile, escreveu
que tais propostas «não teriam podido ser aplicadas sem os dois elementos-base
em que se apoiavam: a força militar e o terror político». Eu
diria, sem constrangimentos ou papas na língua, que foram estes dois
elementos-base que, felizmente, faltaram em Portugal, entre 2011
e 2015, para criar um cenário tão dantesco, não só como o do Chile, mas
também como o da Argentina, do Brasil e de outras ditaduras militares
sul-americanas igualmente «aconselhadas» pelos Chicago Boys.
Não duvido de que seja
grande a capacidade dos grandes potentados económicos e financeiros — assim
como da União Europeia, do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário
Internacional — para desestabilizarem governos cujas políticas tenham
em vista a melhoria das condições de vida e do bem-estar das populações. Se pudessem contar com
a força militar e o terror político — como a multinacional
norte-americana ITT contou no Chile— é quase certo que não hesitariam.
Mas, onde a democracia ainda funciona, esses potentados não têm outro remédio
se não contar com a truculência de políticos tão soturnos, rebarbativos e
obtusos como Passos Coelho.
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