O título do artigo de António Barreto, que refere,
concisamente, um tempo repetitivo, um tempo sem esperança, tempo de alguém já cansado,
que participou entusiasticamente, desde os primórdios, no apoio à mudança, e
afinal conclui que tal mudança, que muita houve, é em forma espiralada, de
precipitação cada vez mais abissal - os incêndios, as praxes, a destruição da
economia, por conta das muitas barbaridades que se cometeram e se permitiram
quer na gestão dos dinheiros, quer no desaparecimento deles, sem que nem
tribunais nem juízes nem Justiça nem Governo interviessem, deixando que as
falcatruas se cometessem, que as matas se não limpassem, que os incendiários se
não castigassem e sempre por aí fora, em eventos de horror e miséria e
repúdio…. pois esse título – Todos os anos, pelo Outono – lembrou-me o de um filme que
vi nos anos sessenta, – “Suddenly, Last Summer” – “Bruscamente no verão
passado” – de Joseph Mankiewicz - também
sintético e de suspense, e que me ficou numa memória atordoada de espanto, do
tema, do drama em si de novidade, e sobretudo do seu desempenho. “Subitamente
no Verão passado” – um título que, como o do texto de António Barreto,
contém dois sintagmas temporais que se opõem, respectivamente, entre eles, apontando,
todavia, na sua síntese, para uma concretização de ambiguidade – “bruscamente”
em oposição a “todos os anos” – o repentino contra o lento e repetitivo; “no
verão passado”, como algo uno e localizado temporalmente, oposto a “pelo
outono” de multiplicidade de acção, agora presente. «Todos os anos, pelo
Outono» em oposição e também em paralelismo rítmico - ambos com 9 sílabas
métricas - com «Bruscamente, no Verão passado» - uma analogia como puro
entretenimento de quem não crê em mudança… a não ser para pior. Tal como
António Barreto. Mas ainda bem que ele escreve, por muito falso que seja hoje o
provérbio “Água mole em pedra dura…” ( E digo água mole, porque já não
há magos poderosos, capazes de inverter a marcha). Fazem muita falta o estudo e
a seriedade, não mais possíveis por cá, desde que se confundiu democracia com
indisciplina, permissividade bacoca ou generalização do despudor.
EL MUSEO
DEL PRADO DENTRO DE UNOS AÑOS...
O mejor
dicho, dentro de unos días...
(Seguem-se os
quadros assinalados com as referências da actualidade).
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Todos os anos, pelo Outono...
António Barreto
D.N., 4/8/16
Os primeiros dias de Setembro recordam rotinas e
despertam saudades... Há melancolia no ar, mas também energia renovada. Os
corpos ainda trazem sinais do mar ou da montanha. As olheiras do cansaço
desapareceram por um tempo. O urbano retoma o seu império. Aliviados durante
umas semanas, os acessos às cidades ficam congestionados e recomeçam as filas
de carros e as horas perdidas. Nas ruas das cidades, fazem-se as obras mais
vistosas, pois o ano que aí vem é de eleições. Os filhos vão para as escolas.
Recomeçou a cena dos manuais a preços incompreensíveis. Veremos se, neste ano,
volta a haver o drama da colocação de professores, mas tudo leva a crer que
não: os sindicatos querem poupar o governo. Nas universidades, acolhem-se mais
umas dezenas de milhares de novos alunos. Uma grande parte dos mais velhos
entrega-se ao prazer sádico anual, a praxe, que convive com o alcoolismo, a
pornografia e a violência. E a impunidade.
A Justiça inicia o seu ciclo. Ou antes, recomeça o ano
judicial, não necessariamente a Justiça. Aproximamo-nos do fim de prazos agora famosos. Os
grandes processos, "les causes célebres", continuam a sua
penosa caminhada sem que se adivinhe o fim. Talvez nunca! Os banqueiros,
bancários, gestores, empresários, governantes, deputados, autarcas e altos
funcionários indiciados, arguidos, julgados, condenados ou em recurso esperam.
Os cidadãos também.
Pelo país fora, no mundo mais sensível à natureza, é
tempo de mudança. E de continuidade. Por matas e florestas, entre os queimados,
fazem-se balanços, à espera de indemnizações e ajudas que só tarde chegam. Os
últimos cereais foram guardados. Acaba a fruta de Verão. Ainda se corta a
cortiça. Em breve se começará a preparar a terra para o ano seguinte. Mas o
tempo é de vinho: em grande parte do país, fazem-se vindimas. Cheira a mosto
nos campos, nas aldeias e nas vilas.
Na Assembleia da República, limpa-se o pó das bancadas e
das poltronas. Prepara-se a liturgia do Orçamento. Serão longas semanas de
trabalho, debate e berraria. A despesa e a receita de 2017 estão em discussão.
Governo e oposição vão defrontar-se com rara aspereza. A novidade é que os
apoiantes do governo, mas que dele não fazem parte, querem pretextos para
apoiar, sem perderem a face nem os eleitores! As fricções, dentro do bloco do
governo, serão tão ríspidas como as que se verificarão entre governo e
oposição. Só que mais discretas.
É tempo dos balanços a que o Orçamento obriga. Confirma-se
que o produto cresce pouco ou nada. Que o consumo interno não cresce. Que a
poupança está no mais baixo de sempre. Que o investimento continua a diminuir.
Pior: vamos verificar, com factos e números, que o produto nacional e por
habitante não aumenta desde o princípio do século! Há quinze anos que o
crescimento é zero! De 2000 a 2015, a preços constantes, com pequenos altos e
baixos, estamos agora ao nível de então. A média anual do período é
praticamente zero! É o mais longo período de estagnação económica da história
moderna!
Após estes quinze miseráveis anos, era necessário estudar
e rever. Era necessário verificar o que bateu certo e o que correu mal.
Globalização? Euro? Crise financeira? União Europeia? Troika? Demagogia
política? Corrupção? Falta de reformas? Falta de investimento? Estado a mais?
Investimento público a menos? Um bom debate, no Parlamento e na sociedade, nas
televisões e nos jornais, talvez ajudasse a rectificar. Ou, pelo menos, a
esclarecer com mais inteligência e menos algazarra. Mas não. Vamos assistir
ao habitual passa-culpas. O que corre mal deve-se ao governo anterior.
Sempre. Ou antes desse. Ou ao actual. Os maus resultados deste ano são já
visíveis. Neles, o PSD e o CDS procuram o seu contentamento. Deles, o PS acusa
o governo anterior. Por causa deles, o Bloco atira sobre a União Europeia. E o
PCP faz pontaria ao capitalismo.
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