domingo, 31 de dezembro de 2017

Pontos de vista em final de ano


Acabo um serão de prazer em torno de um vasto programa de dança clássica, na TV5, com a jovem bailarina envolvida nos seus trabalhos de prática do ballet, os mestres ensinando, sem mimo mas com competência e simpatia, uma jovem mortal que engravida e tem um filho, retomando meses depois a sua prática de bailarina, com “sangue, suor e lágrimas” e beleza, rematando com trechos musicais bastamente aplaudidos por plateias atentas, tais as de outros programas ricos, em espectáculo e diversão, que por lá se fazem. Logo pensei nos nossos programas televisivos diários, de diversão popular, fomentadores da gula, da laracha, do interesse – o que não é despiciendo, mas cansativo da parte dos animadores desses programas, repetindo à exaustão a sua “banha de cobra” a distribuir pelo afortunado do telemóvel que respondeu ao anúncio. Programas do bailarico, mostrando, de passagem, coisas da materialidade habitual - doenças, crimes do dia-a-dia, que informam sobre assuntos de importância, mas frustrantes nas suas limitações fofoqueiras ou paternalistas.
Mas não quis acabar o ano sem deixar de parte um rol de opiniões não só sobre o nosso país e os nossos patrícios, denunciando falhas ou percursos da política.
Um texto de António Barreto, (DN), sempre rico e claro de informação, sobre o problema de despovoamento e envelhecimento das populações, problema referido anteriormente, por Diogo Queiroz de Andrade, em diferente perspectiva, mas valorizando as tomadas de posição de algumas zonas do país, cujas universidades atraíram gente estrangeira, susceptível de se fixar por cá.
Da Página 42 do PÚBLICO, para guardar do ano denúncias graves, cito, pois, a EDITORIAL por D. Queiroz de Andrade, seguida de Cartas ao Director, que exploram sucintamente e com graça crítica, quer acontecimentos recentes sobre Tartufos criminosos de seitas impunes, quer opiniões públicas desconcertantes, sobre acontecimentos alheios, encarados segundo o interesse próprio que a hipocrisia dita.
E, como remate, emAs minhas Fotografiasde António Barreto, o texto explicativo sobre “O Claustro de D. João III” no Convento de Cristo, a necessitar de obras de restauro, mas, de preferência, a canalizar dinheiros em papelada apelativa de distinção, em ano de Património Cultural. O bla bla bla do costume, formal e mísero em solução, apesar de vários monumentos já terem sido reparados.

I- Criar raízes, fixar populações
António Barreto
DN, 31/12/17
Os desastres deste ano vieram actualizar um velho problema: o despovoamento, para uns, ou a desertificação, para outros, de grande parte do país. Não apenas do interior clássico, mas do interior social e económico que por vezes se aproxima a escassos quilómetros do litoral ou até que inclui muita praia do centro do país ou do Alentejo. Aliás, visto de São Petersburgo ou de Istambul, Portugal é todo litoral.
Por causa da violência dos fogos e do número de vítimas mortais, os incêndios do Verão e do Outono deixaram marca indelével no território, nos espíritos e na política. O governo reagiu mal, mas, justamente corrigido pelo Presidente da República, mexeu-se e tentou recuperar o tempo perdido.
Rapidamente se começou a discutir as grandes questões, o ordenamento florestal e do território, as funções do mercado, a criação de parques nacionais e o destino a dar às matas abandonadas. Prontamente se ouviram promessas, umas velhas, outras muito velhas. A grande demagogia regressou. Quase não há político que não fale das "raízes", não as das árvores, mas as das populações. Com o que se pretende "fixar populações", evitar as migrações, controlar a urbanização, trazer novas pessoas para "criar raízes" Chega facilmente a dizer-se que é necessário fazer que as pessoas "devam" (na versão despótica) ou "possam" (na versão liberal) ficar a viver onde nasceram e cresceram. São temas inúteis que rendem sempre qualquer coisa em comício ou à saída de jantar: "revitalizar o interior", "impedir o despovoamento" e "incentivar a natalidade". Ao que não falta "trazer empresas para o interior", "criar incentivos fiscais", "proteger a produção local", "criar emprego" e "encorajar o artesanato". Há 50 anos e agora. As intenções são tão boas que falta coragem para criticar o erro, a demagogia e a ilusão.
A verdade é que, para fixar populações, só se conhecem meios ditatoriais, já bem rodados na China, no Camboja e na União Soviética. Com centenas de milhares de vítimas. Ou milhões. Fixar populações ou é demagógico e não serve senão para tentar ganhar votos, ou implica retirar aos cidadãos algumas grandes liberdades que são as de movimento e de mudança de local de vida. Para fixar populações, é necessário talvez o planeamento integral da vida das pessoas.
Confundir despovoamento com abandono é uma das raízes do problema. Terras despovoadas podem ser economicamente úteis, desde que bem tratadas. Em muitos casos, é mesmo o contrário que se produz: gente a mais significa incêndio, desleixo e acidente. A decisão de viver na vila, na pequena cidade, na grande metrópole ou no estrangeiro não é sempre uma decisão de miseráveis e desprotegidos. A decisão de mudar é muitas vezes um passo para a promoção e a mobilidade, para melhorar e subir na vida. Viver nas cidades traz quase sempre vantagens para a educação, a saúde, o emprego, a cultura, o casamento, a justiça e o conforto. Em poucas palavras, a liberdade é urbana. Em grande medida, o progresso também. Já se conhecem em Portugal centenas de agricultores que vivem na cidade e trabalham no campo. Felizmente que ninguém se lembrou de os fixar.
Evitar o abandono? Sim. Impedir a degradação do meio? Sim. Aproveitar os recursos sem os destruir? Sim. Fixar as populações? Não. Mas sim ao estímulo e à remoção de obstáculos. Assim como evitar que sejam as autoridades as primeiras a acelerar o abandono. Destruir instituições pode ser fatal. É o que tem feito o Estado, de esquerda ou de direita, para poupar pouco a fim de gastar muito. Não faltam exemplos por todo o país: escolas, centros de saúde, repartições, bancos, centros de emprego e da segurança social, centros de formação, esquadras de polícia, quartéis da GNR, regimentos militares, lares de terceira idade, serviços florestais, parques nacionais, áreas protegidas, serviços de conservação da fauna Houve decisões racionais? Talvez. Mas também as houve insensatas e de curtos horizontes.
Manter instituições pode ser muito mais barato, democrático e livre do que acudir depois a subsidiar causas perdidas. Áreas despovoadas podem não ser abandonadas. Áreas despovoadas podem ser ricas e aproveitadas.

As minhas fotografias - Claustro de D. João III, Convento de Cristo, Tomar
O convento é uma obra maior de vários estilos: gótico, manuelino, renascentista, maneirista.  Com obras-primas como o Claustro Grande e a Charola. Deixaram lá o nome o Infante D. Henrique, D. Manuel I, D. João III, D. Filipe I e os arquitectos Diogo de Arruda, João Castilho e Diogo de Torralva. Ali perto, o Aqueduto dos Pegões, a Ermida da Nossa Senhora da Conceição e a Sinagoga são obras de excepção a merecer toda a atenção neste Ano Europeu do Património Cultural que amanhã se inicia. Os textos portugueses e europeus relativos a este programa são recheados de lugares-comuns. Coesão. Diversidade. Riqueza. Diálogo intercultural. Patamar de visibilidade. Desafios. Oportunidades. Interesse transversal. Sustentabilidade. Está lá tudo. Uma parte dos recursos será gasta em gabinetes e publicidade. Numa palavra: eventos! Mas uma parte bem mais importante poderia ser gasta com operações simples (o que não quer dizer fáceis): tratar das coberturas dos monumentos, tirar a erva dos telhados, limpar as pedras, preservar a estatuária, restaurar esculturas, vitrais e pinturas. Conservar, cuidar. Era bom que fossem estas as iniciativas do Ano do Património! 


II- EDITORIAL
Trazer imigrantes para ganhar cidadãos
Com a crise financeira os imigrantes deixaram de aparecer. Agora, graças aos estabelecimentos de ensino e a empregos sazonais, estão a regressar.

Diogo Queiroz de Andrade
Público, 26 de Dezembro de 2017
O envelhecimento do país é particularmente sentido no interior, onde o cenário é dantesco: com as políticas de centralização a agravarem a falta de crianças, temos na prática metade do país a morrer aos poucos. Podemos fazer muita campanha em defesa do “vá para fora cá dentro”, mas não há políticas activas de fixação de populações no interior que possam fugir a uma palavra: emprego.
Para fixar populações, sejam elas imigrantes ou nacionais, é preciso que exista trabalho que as sustente. Com Lisboa e Porto a entrarem numa espiral de custos que prejudicam especialmente os jovens profissionais, outras capitais de distrito ganham apelo e interesse – até porque em várias cidades a qualidade de vida já pede meças à da capital. Mas sem emprego nada irá acontecer a não ser a criação de periferias mal reguladas, que colocam mais pressão sobre as maiores cidades e pioram o nosso índice médio de felicidade.
O trabalho de jornalismo de dados que hoje publicamos demonstra bem o impacto que políticas sensatas podem ter na aquisição de cidadãos. Exemplos como o de Bragança, que está a aumentar a população imigrante graças ao bom trabalho do Politécnico, são retemperadores. Que Bragança tenha uma das ruas mais cosmopolitas de Portugal é uma bela bofetada no suposto internacionalismo de Lisboa e Porto, onde muitos imigrantes representam mais problemas que soluções – exactamente ao contrário do que se passa no interior. Também há bons exemplos em Aveiro ou na Covilhã, casos em que as respectivas universidades se têm assumido internacionalmente e trabalham activamente na aquisição de alunos estrangeiros.
É certo que os estudantes equivalem a populações móveis e cíclicas, mas a boa gestão pode ajudar a que o ciclo se renove. Populações estudantis crescentes equivalem a clientes para bens e serviços, que acabam por ajudar a criar empregos e a fixar famílias nestas regiões. Se a isto se juntarem políticas que ajudem licenciados a ficar na região, com empregos, será meio caminho andado para diminuir o maior problema estrutural do país.
E, já que o estado central há décadas que nada faz nada para contrariar a desertificação do interior do país – estimulando até a concentração no litoral – resta pouco às regiões para agir no sentido de renovar populações. O nosso problema é tão grave que não serão os imigrantes a resolvê-lo, mas podem ser eles a evitar que algumas cidades morram. Ao menos isso

OPINIÃO
III - Cartas ao director
26 de Dezembro de 2017

Os vendilhões do tempo
Emanuel Caetano, de Ermesinde
Graças às privatizações e à abertura do capital de empresas públicas portuguesas ao exterior, vimos estrangeiros a apropriarem-se de firmas nacionais, mas o que nunca tínhamos visto era forasteiros a apoderarem-se de crianças através de adopções ilegais! Dizem que é uma igreja, eu digo que é uma seita que exige um dízimo mensal aos seus crentes. Dizem-se bispos e pastores com curas milagrosas mas eu só vejo um conjunto de empresários religiosos com influência política e que tem um império de comunicação.
À boleia destes alegados raptos, já era hora do Governo português impedir que estes vendilhões do templo comercializem a fé e desmascarasse o poder sobrenatural que engana os ignorantes e fragilizados.  

Curiosidades luso-catalãs
José A. Rodrigues, Vila Nova de Gaia
Ao que parece, a Catalunha está dividida em duas partes. Cada uma delas é atravessada transversalmente pelos espectros políticos habituais, a esquerda e a direita. Contudo, em Portugal, constato que todos os meus amigos de direita são adeptos do soberanismo espanhol, e que todos os meus amigos de esquerda se inclinam para, ao menos, reconhecerem o direito de expressão aos independentistas. O conjunto de todas essas pessoas é demasiadamente exíguo para poder servir de amostra em qualquer sondagem, e é possível que a conclusão a tirar possa estar enviesada. Mas que é um facto curioso, é! Ou talvez não…

Desigualdade de critérios
 Jorge Morais, Porto
Em Novembro de 2016 após a aprovação dos resultados das eleições nos Estados Unidos da América, onde Donald Trump apesar de ter tido menos votos que Hillary Clinton, saiu vencedor já que as regras assim o impõem, seja quem for o vencedor. De imediato, por lá e pasme-se, também por cá, logo se passou à discussão se aquela regra devia ser ou não respeitada.
Por vontade dos nossos politólogos, analistas, comentadores, políticos, mesas redondas, redes sociais, etc., Donald Trump jamais tinha legalidade para tomar posse. A 21 de Dezembro de 2017, nas eleições realizadas em Espanha na Comunidade autónoma espanhola da Catalunha saiu vencedor o bloco independentista, apesar do bloco unionista/neutral ter tido mais votos.
Claro que sabendo do que a casa gasta, jamais me passou pela cabeça que os mesmos viriam defender aquilo que defenderam nas eleições presidenciais dos Estados Unidos da América. Mas afinal que espécie de gente é esta? Eu disse gente? Gente não é, certamente a gente de bem não se comporta assim.



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