quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

O mundo por cá e por lá


Dois textos de duas jornalistas que apontam factos e alertam para o que se passa entre nós, com um ministro de “costa-espertice”, que entrou, aparentemente, a matar, pela Europa, e afinal “se agacha” à Europa, sugerindo mais impostos para resolver crises – as nossas, sobretudo – impostos que já estavam em cima da mesa europeia, segundo conta Helena Cristina Coelho, a qual explica as dificuldades europeias devidas ao Brexit, e as nossas, que Costa pretende resolver ao seu modo açambarcador e doloso, desde o seu início governativo.  O segundo texto, de Helena Matos, sobre a extensa crise e o êxodo venezuelanos, e as responsabilidades disso, que uma vez mais recaem sobre governantes – Chavez e Maduro – ao pretextarem defender o povo para bem se governarem a si próprios, sempre apoiados pelos nossos panegiristas da defesa de iguais valores samaritanos, indiferentes à destruição perpetrada naquele país.
Mundo de comédia o nosso, na questão dos governantes, de tragédia o deles, na questão dos governados.

I TEXTO:
Costa e a rábula do bom aluno
HELENA CRISTINA COELHO
OBSERVADOR, 13/2/2018
Se o plano do Governo ao acenar com estas (não tão novas) propostas de impostos europeus é cair nas boas graças da liderança europeia, está na direção certa. Só lhe falta o título de "bom aluno".
As notícias sobre a proposta do Governo português de criar três novos impostos europeus são, afinal, manifestamente exageradas. O exagero, entenda-se, não está nas benditas ideias, que essas mantêm-se em cima da mesa. O exagero parece estar antes em considerar que há aqui ideias novas. Só que não. As propostas que António Costa estará tão empenhado em levar a Bruxelas no final deste mês não só já fazem parte de um projeto de resolução do Parlamento Europeu de janeiro deste ano, como parte tinha sido debatida pela Comissão Europeia no passado mês de setembro. Outros tempos e já as redes sociais estariam a multiplicar hashtags: ‘por acaso (não) foi ideia minha’…
Deixemos a ‘costa-espertice’ e a originalidade (ou a falta dela) de lado e falemos das tais ideias que Costa defende, mais para provar que está alinhado com a Europa do que inspirado por ela. O objetivo é ter medidas que ajudem a União Europeia, por um lado, a compensar o vazio orçamental que a saída do Reino Unido vai causar; por outro, a reforçar os apoios nas áreas de Defesa, Segurança e Migrações. E o plano passa por, entre várias opções, aplicar taxas a três grandes áreas: transações financeiras, economia digital e economia verde. Dito de outra forma: mais impostos para garantir novas fontes de financiamento, é isto que o governo português está disposto a subscrever (também aqui há nada de novo, certo?)
Tenho dúvidas, porém, de que este seja o melhor caminho para lá chegar. É certo que, com o Brexit, há menos um país a contribuir (a receber também) e isso obriga a descobrir fontes alternativas e a redistribuir o esforço entre os vários Estados-membro. É preciso reforçar contribuições país a país e descobrir o melhor modelo para as suportar sem exigir mais aos contribuintes. O próprio Marcelo já veio comentar as necessidades financeiras da Europa.
Mas a fórmula preguiçosa de agravar a carga fiscal, para sacar mais receita em pouco tempo, pode durar pouco e ser contraproducente. Pior: só vai complicar a já estafada e labiríntica burocracia da União Europeia, a mesma que se anda a tentar simplificar há anos e anos. Se é assim que a pretendem reformar, então boa sorte — é capaz de ser mais fácil chegar a Marte ao volante de um Tesla.
E como explicar a escolha dos alvos fiscais? Anda um governo e os seus ministros a subir a palcos para dizerem ao mundo que a economia digital é uma aposta do país, que as tecnológicas não encontrarão melhor ambiente para crescer do que em Portugal, que os negócios verdes precisam de se expandir. Depois chegam e, surpresa, dão de caras com mais impostos. É isso que se quer?
Ora, quando a estratégia passa por tentar atrair novos investidores e empresas inovadoras, grandes tecnológicas e multinacionais, novas áreas e negócios sustentáveis, não me parece que o discurso das taxas e taxinhas seja o mais convidativo. E não vale a pena vir com a história do bicho papão de que, usando o fisco, se evita que certas plataformas digitais operem de forma ilegal ou se corrige a aparente injustiça das grandes margens de lucro, entre outros argumentos — porque não é com taxas que isto se resolve, é com lei e regulação.
Se o plano do Governo ao acenar com estas (não tão novas) propostas é cair nas boas graças da liderança europeia, está a ir na direção certa — só lhe falta mesmo receber o título de “bom aluno” da Europa (onde é que já ouvimos isto?). Mas, neste momento-chave da União Europeia, António Costa tem uma oportunidade de fazer chegar ideias novas, verdadeiras propostas de reforma, criar ruturas, de discuti-las com os decisores, fazer valer a influência portuguesa de que ele próprio tanto se gaba. Será capaz disso? Ou vai, simplesmente, representar a rábula do bom aluno, prestável e obediente? Ou, pior, armar-se no aluno cábula que prefere socorrer-se das ideias dos outros como se fossem suas para passar no exame?

II TEXTO: VENEZUELA
Por qué se han callado?
OBSERVADOR, 11/2/2018
O apoio implícito a tudo o que transpire estatismo levou a que num tempo de indignações se silenciasse a tragédia da Venezuela. Em 2015 ainda Maduro levou um prémio da ONU pelo combate à fome.
Finalmente fala-se deles, dos refugiados venezuelanos. Não tanto por eles mesmos mas sim porque no Brasil e na Colômbia o fluxo crescente de pessoas que deixam a Venezuela fez soar as campainhas de alarme. Nos jornais do Brasil e da Colômbia os refugiados venezuelanos são agora referidos todos os dias: “Venezolanos, la migración más grande en la historia de Colombia”; “Brasil discute possibilidade de barrar entrada de refugiados venezuelanos”; “Pedidos de refúgio de venezuelanos no Brasil quadruplicam em dois anos”; “Nuevas medidas para venezolanos buscan llegada más organizada”… Enfim o habitual em qualquer zona do mundo confrontada com uma chegada massiva de refugiados com a diferença que por aquelas bandas e neste particular assunto não vigora a censura do costume e portanto temos títulos como “Onda de imigrantes da Venezuela pode gerar crise em Roraima”; “En Atlántico crece número de enfermedades por inmigrantes venezolanos”; “Atracos, el lado oscuro del éxodo de los venezolanos”…
A crise na Venezuela não surpreende. Ela era mais que anunciada. Afinal serem pobres e perseguidos não para sempre,  mas enquanto não se conseguirem desembaraçar dos seus auto-proclamados libertadores tem sido o destino de todos os povos que caem nas mãos dos construtores da igualdade. Aliás também já sabemos o que vem a seguir: a culpa é do Maduro porque, vão dizer, se o Chavez não tivesse morrido tudo teria sido diferente. A culpa é dos países vizinhos que não estão a ser solidários com o governo da Venezuela ou que não apoiam os seus refugiados (Os dois argumentos só aparentemente são contraditórios pois em ambos os casos desculpam o governo da Venezuela). A culpa é do petróleo quando é mais barato porque gera menos receita. A culpa é do petróleo quando é mais caro  porque gera mais receita e torna o governo mais dependente do petróleo. A culpa é dos EUA e obviamente de Trump.(Antes de se usar este argumento convém recordar que o esforço colocado pela administração Obama na melhoria das relações com Cuba visava entre outras coisas fragilizar o governo venezuelano que mimoseava o então presidente norte-americano com epítetos como “o negro” e “palhaço”). A culpa é da oposição venezuelana que não é alternativa… Enfim, a culpa será de todos mas nunca dessa fraude ideológica representada pelo socialismo.
Valha, contudo, a verdade que na tragédia que se está a viver na Venezuela existem outros culpados além da camarilha grotesca que se governa enquanto faz de conta que governa aquele país. E esses culpados são os cúmplices do costume em Portugal representado pelo PCP ou pelos radicais e terroristas espanhóis transformados em assessores do governo venezuelano. (Nesta galeria de horrores temos em Portugal além dos comunicados do PCP apoiando “o processo libertador bolivariano” a inauguração em 2016, repito 2016, na Amadora, da Praça Hugo Chavez). Mas os principais culpados estão na esfera democrática porque são eles e a sua condescendência face a qualquer um que integre no seu discurso expressões como combate à pobreza, solidariedade, apoio aos mais pobres, combate às injustiças e às desigualdades, reforço do papel do Estado nas políticas sociais… que tornaram possível que a Venezuela tenha passado de país que recebia imigrantes a país de emigrantes e refugiados. De país que exportava a país onde falta tudo. Na verdade, basta usar a língua de pau do socialismo para se gozar do benefício da dúvida dos jornalistas e das organizações internacionais, todos sempre tão angustiados com a falta de condições de vida no mundo capitalista. Só este apoio implícito a tudo o que transpire socialismo-estatismo tornou possível que entidades como a FAO premiassem em 2013 e 2015 o governo de Maduro pelas suas políticas de combate à fome e à pobreza. Aliás durante anos a FAO só viu e estou a citar “progressos notáveis e excepcionais” na luta contra a fome na Venezuela 
Na página da FAO dá-se como bom exemplo da política de combate à fome levada a cabo pelo governo venezuelano a rede estatal de supermercados onde o subsídio aos preços chegava a atingir os 78,7%. Não é preciso ser especialista em alimentação para perceber que aquilo que tanto inebriava a FAO — 22 mil pontos estatais de abastecimento de que dependiam ou foram tornadas dependentes 17,5 milhões de pessoas com preços ditados pelo governo — pode servir como serviu para ganhar eleições mas alimentarmente falando só podia acabar na tragédia da fome.
A lista de prémios e elogios aos governos de Chavez e Maduro pelas suas políticas sociais é aliás extensa e resistiu ao grotesco discursivo de Chavez, às imagens das prateleiras vazias nos supermercados (resultado da especulação dos merceeiros); às denúncias da oposição (gente ligada à CIA); à destruição das empresas (incapazes de se adaptar às mudanças)… Até que como invariavelmente acontece nas diversas marchas para o socialismo em qualquer lugar do mundo, o povo — sim, o povo esse em nome de quem se faz o socialismo— se pôs a caminho e fugiu da revolução.
Parafraseando Juan Carlos e o seu célebre Por qué no te callas?  dirigido a Hugo Chavez, temos de perguntar Por qué se han calladopor esse mundo fora durante tanto tempo técnicos, políticos, dirigentes de organizações internacionais perante o caminho que a Venezuela estava a tomar? Pelas mesmas razões por que se calaram quando no lugar da Venezuela estiveram Angola, o Vietnam, a  Coreia do Norte (sim, sim a Coreia do Norte já foi um país exemplar face ao covil  representado pela Coreia do Sul), o Cambodja…: porque para muitos  o socialismo é o regime que defendem ou que não defendendo apenas porque o acham inalcançável  reconhecem como moralmente superior (Ah, já me esquecia, a Praça Hugo Chavez na Amadora foi aprovada por maioria numa comissão de toponímia integrada pelo PS, CDU e coligação Amadora Mais PSD/CDS-PP).
Ps. Prémios Machismo do Ano, Exploração do Trabalho Infantil e Vamos Lá Ver Se Não Há Pedófilos Por Ali: a substituição nas provas de Fórmula 1 de modelos femininos devidamente pagas para o efeito por crianças presume-se que a título gratuito.


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