O Sr. Braamcamp Mancellos, num texto meu anterior – “Como é diferente o amor em Portugal” postou o seguinte comentário sobre o seu “amor diferente”:
«Por falar em Amor, aquilo de que eu mais gosto neste País, são os “nossos” funcionários públicos. A chamada esperteza saloia associada à indiferença pelo resto, o resto, que não faz outra coisa que andar a sustentar mentes e costumes compostos por pessoas que escolheram a asa protectora do Estado como Padroeiro. O que vale é que todos eles são facilmente identificáveis, num centro comercial ou na rua, trabalhem eles numa repartição, nos Municípios, na Justiça ou num Ministério qualquer. Dir-se-ia que vieram todos da mesma santa terrinha. As semelhanças físicas são assustadoramente iguais. E as mentes também.
Glorioso País que tais filhos tem.»
Achei graça à referência, e decidi transcrever um texto sobre idêntico tema dos funcionários públicos, de estatuto um pouco diferente há trinta e cinco e quarenta e sessenta anos, embora, por razões diferentes das de hoje, o desprezo dos ricos pela classe fosse semelhante. Antigamente, o funcionário público era considerado um pobre diabo de servidor, sempre mal pago, mas cumprindo com maior ou menor competência – creio que a maioria com maior – os trâmites das suas funções. Para se ter acesso a qualquer cargo do funcionalismo público, faziam-se concursos, e nunca esquecerei a imagem do meu Pai, estudando e decorando as matérias do seu concurso para Fiel de Armazém, passeando-se pela varanda da nossa casa, em Lourenço Marques, enquanto as repetia em voz alta para melhor as memorizar. Valeu-lhe o esforço, pois a minha Mãe ainda hoje lembra o primeiro lugar que ele obteve, até mesmo em confronto com um outro concorrente com uns anos de um curso superior, o qual obteria o segundo lugar. As firmas – muitas delas estrangeiras, como a Shell, o John Orr’s – é que, por tradição, pagavam melhor, segundo os méritos dos trabalhadores, embora eu julgue que os patrões portugueses exploravam os seus trabalhadores na estulta avidez de sempre, que hoje se banalizou no nosso país, de tal maneira que os donos delas despedem empregados, sobrecarregando os que ficam, sem limitações de horários, sob a ameaça de despedimento se não se conformarem com as imposições de força. Um mundo brutal, onde não há leis que valham, apenas sanguessugas aproveitando-se da conjuntura crítica para melhor sugarem o sangue alheio. E o Governo, conivente para não perder mais empresas, fecha os olhos às manobras, a própria Justiça, manietada por aquele, participando no estado geral de corrupção em que vivemos.
Mas dantes o funcionário, competente ou menos, era um ser um pouco mísero, porque se acomodara, sem asas para construir um mundo de estabilidade e riqueza, como o faziam os grandes empresários, que por isso o desprezavam, na sociedade de castas em que sempre vivemos.
Eis o texto “Conformismo”, extraído de “Pedras de Sal”, contido igualmente em “Cravos Roxos”:
«Todos sabemos quanto a ambição e o ofício de funcionário público se não ajeitam em harmonia. Quem deseje fazer fortuna terá pois de escolher outra via para progredir.
Creio mesmo que nós, os funcionários, não passamos de uns recalcados, muito tímidos, e para sempre deslumbrados perante as histórias de riquezas angariadas nos negócios, nas profissões livres ou mesmo nas empresas particulares que se fartam de conceder regalias aos seus empregados – com excepções.
O facto verifica-se até nas esferas superiores de instrução, pois risível é o ordenado do professor comparado com os proventos do médico, do advogado ou do engenheiro, possuindo, embora, todos eles, idêntico curso superior. Mas nesta questão do professorado é coisa de pouca monta o tal curso superior – talvez justamente isso explique a modéstia do seu ordenado.
Sendo, pois, o nível de vida do funcionalismo inferior ao dos não funcionários, e a profissão daqueles encarada com certo desdém por estes, em todo o caso dá-se na sociedade um fenómeno bem curioso: apenas se pressente que o governo magnânimo resolveu aumentar os vencimentos dos seus servidores e até mesmo conceder-lhes um a dobrar na quadra festiva de Dezembro, logo, radiosamente, todas as forças terráqueas – sólidas, líquidas e gasosas – se erguem em peso para lhes extorquir o pobre aumento.
Desde os pepinos ao papel de sebenta, do gás aos ossos da sopa, ainda por cima em greve, tudo aumenta fraternalmente, num laço de solidariedade, digno do espanto universal.
Por vezes, delicadamente, conta-se a história justificativa do aumento: a dos prejuízos sofridos já anteriormente pelas companhias de gás que os sofreram com estoicismo até se fartarem disso, a dos galinácios e seus produtos para o aumento dos jornais, a do preço espectacular da farinha seguido, necessariamente, do aumento espectacular do preço do pão e de uma cada vez maior deficiência de fabrico.
A acrescentar a tudo isto, a prodigalidade dos impostos, só equiparável à produção, nos mercados do Estado, dos fósforos “Pala-Pala”, profusão, de resto, indispensável para remediar a sua natureza pouco inflamável, que obriga a gastar dez para se aproveitar um.
Não, não é esta ainda a altura de o funcionário equilibrar as suas finanças, muito pelo contrário. Mas não nos importemos, nem pensemos, desconfiadamente que isto do aumento não passa de pura mistificação.
Tenhamos em conta, como princípio a seguir com fervor cristão, a máxima da inutilidade dos bens terrenos.
Ouçamos Gil Vicente, sempre bem apetrechado de louváveis sentenças:
“Que quanto menos tiverdes
Menos tereis que guardar!”
E tanto cuidado que dão as arrumações!»
É certo que não é a estes funcionários de antigamente que se refere o Sr. Braamcamp Mancellos. Trata-se dos vários que, aquando de eleições, o governo eleito introduz nas várias funções, os do seu partido, substituindo outros de partido diferente, ganhando com isso a adesão submissa e simultaneamente arrogante da sua cada vez mais vasta rede – a rede socialista, que alastra e vigora não permitindo outras hipóteses de governação. Esses os funcionários descritos no comentário, os de topo de gama como parasitas sociais que tudo secam em redor, usando de privilégios e de vencimentos que o PM tenta ocultar, empolando as questões mínimas do ordenado mínimo imposto, como medida de extraordinário alcance social, e decididamente avesso a racionar as benesses de todos os que o rodeiam e as suas, e a fazer repor os dinheiros aos que roubaram, como medidas urgentes para salvar as novas castas aterradoras dos desempregados, dos subsidiados, dos que ganham ordenados miseráveis com que não podem sobreviver com decência.
Mas o TGV vai-se fazer. A regionalização é dado assente. As novas uniões e adopções são prioridades. Puros disfarces na via suicidária do nosso País.
«Por falar em Amor, aquilo de que eu mais gosto neste País, são os “nossos” funcionários públicos. A chamada esperteza saloia associada à indiferença pelo resto, o resto, que não faz outra coisa que andar a sustentar mentes e costumes compostos por pessoas que escolheram a asa protectora do Estado como Padroeiro. O que vale é que todos eles são facilmente identificáveis, num centro comercial ou na rua, trabalhem eles numa repartição, nos Municípios, na Justiça ou num Ministério qualquer. Dir-se-ia que vieram todos da mesma santa terrinha. As semelhanças físicas são assustadoramente iguais. E as mentes também.
Glorioso País que tais filhos tem.»
Achei graça à referência, e decidi transcrever um texto sobre idêntico tema dos funcionários públicos, de estatuto um pouco diferente há trinta e cinco e quarenta e sessenta anos, embora, por razões diferentes das de hoje, o desprezo dos ricos pela classe fosse semelhante. Antigamente, o funcionário público era considerado um pobre diabo de servidor, sempre mal pago, mas cumprindo com maior ou menor competência – creio que a maioria com maior – os trâmites das suas funções. Para se ter acesso a qualquer cargo do funcionalismo público, faziam-se concursos, e nunca esquecerei a imagem do meu Pai, estudando e decorando as matérias do seu concurso para Fiel de Armazém, passeando-se pela varanda da nossa casa, em Lourenço Marques, enquanto as repetia em voz alta para melhor as memorizar. Valeu-lhe o esforço, pois a minha Mãe ainda hoje lembra o primeiro lugar que ele obteve, até mesmo em confronto com um outro concorrente com uns anos de um curso superior, o qual obteria o segundo lugar. As firmas – muitas delas estrangeiras, como a Shell, o John Orr’s – é que, por tradição, pagavam melhor, segundo os méritos dos trabalhadores, embora eu julgue que os patrões portugueses exploravam os seus trabalhadores na estulta avidez de sempre, que hoje se banalizou no nosso país, de tal maneira que os donos delas despedem empregados, sobrecarregando os que ficam, sem limitações de horários, sob a ameaça de despedimento se não se conformarem com as imposições de força. Um mundo brutal, onde não há leis que valham, apenas sanguessugas aproveitando-se da conjuntura crítica para melhor sugarem o sangue alheio. E o Governo, conivente para não perder mais empresas, fecha os olhos às manobras, a própria Justiça, manietada por aquele, participando no estado geral de corrupção em que vivemos.
Mas dantes o funcionário, competente ou menos, era um ser um pouco mísero, porque se acomodara, sem asas para construir um mundo de estabilidade e riqueza, como o faziam os grandes empresários, que por isso o desprezavam, na sociedade de castas em que sempre vivemos.
Eis o texto “Conformismo”, extraído de “Pedras de Sal”, contido igualmente em “Cravos Roxos”:
«Todos sabemos quanto a ambição e o ofício de funcionário público se não ajeitam em harmonia. Quem deseje fazer fortuna terá pois de escolher outra via para progredir.
Creio mesmo que nós, os funcionários, não passamos de uns recalcados, muito tímidos, e para sempre deslumbrados perante as histórias de riquezas angariadas nos negócios, nas profissões livres ou mesmo nas empresas particulares que se fartam de conceder regalias aos seus empregados – com excepções.
O facto verifica-se até nas esferas superiores de instrução, pois risível é o ordenado do professor comparado com os proventos do médico, do advogado ou do engenheiro, possuindo, embora, todos eles, idêntico curso superior. Mas nesta questão do professorado é coisa de pouca monta o tal curso superior – talvez justamente isso explique a modéstia do seu ordenado.
Sendo, pois, o nível de vida do funcionalismo inferior ao dos não funcionários, e a profissão daqueles encarada com certo desdém por estes, em todo o caso dá-se na sociedade um fenómeno bem curioso: apenas se pressente que o governo magnânimo resolveu aumentar os vencimentos dos seus servidores e até mesmo conceder-lhes um a dobrar na quadra festiva de Dezembro, logo, radiosamente, todas as forças terráqueas – sólidas, líquidas e gasosas – se erguem em peso para lhes extorquir o pobre aumento.
Desde os pepinos ao papel de sebenta, do gás aos ossos da sopa, ainda por cima em greve, tudo aumenta fraternalmente, num laço de solidariedade, digno do espanto universal.
Por vezes, delicadamente, conta-se a história justificativa do aumento: a dos prejuízos sofridos já anteriormente pelas companhias de gás que os sofreram com estoicismo até se fartarem disso, a dos galinácios e seus produtos para o aumento dos jornais, a do preço espectacular da farinha seguido, necessariamente, do aumento espectacular do preço do pão e de uma cada vez maior deficiência de fabrico.
A acrescentar a tudo isto, a prodigalidade dos impostos, só equiparável à produção, nos mercados do Estado, dos fósforos “Pala-Pala”, profusão, de resto, indispensável para remediar a sua natureza pouco inflamável, que obriga a gastar dez para se aproveitar um.
Não, não é esta ainda a altura de o funcionário equilibrar as suas finanças, muito pelo contrário. Mas não nos importemos, nem pensemos, desconfiadamente que isto do aumento não passa de pura mistificação.
Tenhamos em conta, como princípio a seguir com fervor cristão, a máxima da inutilidade dos bens terrenos.
Ouçamos Gil Vicente, sempre bem apetrechado de louváveis sentenças:
“Que quanto menos tiverdes
Menos tereis que guardar!”
E tanto cuidado que dão as arrumações!»
É certo que não é a estes funcionários de antigamente que se refere o Sr. Braamcamp Mancellos. Trata-se dos vários que, aquando de eleições, o governo eleito introduz nas várias funções, os do seu partido, substituindo outros de partido diferente, ganhando com isso a adesão submissa e simultaneamente arrogante da sua cada vez mais vasta rede – a rede socialista, que alastra e vigora não permitindo outras hipóteses de governação. Esses os funcionários descritos no comentário, os de topo de gama como parasitas sociais que tudo secam em redor, usando de privilégios e de vencimentos que o PM tenta ocultar, empolando as questões mínimas do ordenado mínimo imposto, como medida de extraordinário alcance social, e decididamente avesso a racionar as benesses de todos os que o rodeiam e as suas, e a fazer repor os dinheiros aos que roubaram, como medidas urgentes para salvar as novas castas aterradoras dos desempregados, dos subsidiados, dos que ganham ordenados miseráveis com que não podem sobreviver com decência.
Mas o TGV vai-se fazer. A regionalização é dado assente. As novas uniões e adopções são prioridades. Puros disfarces na via suicidária do nosso País.
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