segunda-feira, 21 de março de 2016

Uma estratégia pueril



Desta vez fui eu que me pronunciei com uma frase de peso, conquanto sem a graça ronceira com que a nossa amiga pronuncia as suas. Estávamos a falar do truque da Dilma e do Lula, a minha irmã em críticas aceradas, até lembrou um dos coronéis prepotentes da antiga telenovela brasileira, a nossa amiga mais circunspecta, sem muito bem saber como considerar a questão, pois o Lula sempre fora do seu agrado, desde as melhorias que introduziu, durante o seu governo, nas condições de vida dos mais desfavorecidos. Eu sou mais comedida a pronunciar-me, gosto mais de ouvir as opiniões alheias, mas a minha frase foi apoiada, creio que patrioticamente, as três ficando satisfeitas com o reconhecimento da nossa superioridade moral sobre os brasileiros.
O que eu disse foi, pois, que, apesar de tudo, apesar das muitas trapaças que correm no nosso território escasso, não nos lembraríamos jamais de eleger às pressas, para um ministério, um ex-governante em riscos de ser preso por trafulhice, para, a coberto da imunidade parlamentar, o libertar da choça. Pareceu-nos, de facto, que nem para isso nós, portugueses, teríamos coragem, mas pensando bem, eu até admiro a Dilma, que por amizade e reconhecimento para quem a ajudou a ela, arriscou o seu cargo em prol do amigo, num conluio de muita solidariedade. O Brasil é de facto um país de muita pujança. Aqui, um caso destes seria reprovado pelos nobres sentimentos que todos debitamos à luz do politicamente correcto, os nossos podres permanecendo soterrados sob a capa do sorriso da decência. Pueril parece a concertação Dilma-Lula, tão trapaceira é, mas merecendo, apesar de tudo, um abraço de simpatia, pela fraternidade revelada, quais os gémeos Castor e Pólux, filhos de Leda, mas de diferentes pais, Pólux, o filho de Zeus, conseguindo igual imortalidade para o seu mano, filho de homem, lá permanecendo ambos na constelação Gémeos, para sempre brilhando em amor, tal como a bela Helena, sua irmã, cá na Terra, em beleza.
Foi, pois, o caso Dilma-Lula, chamado à constelação por via do sentimento fraterno e de gratidão, pese embora o facto de pertencerem a sexos opostos, ao contrário dos manos Dioscuros.
Contrariamente ao meu parecer de defesa do “casal” brasileiro, - ou do “caso”, menos ambíguo - Alberto Gonçalves apresenta bons argumentos de ataque, mas cuido que é apenas porque Dilma e Lula são da esquerda pecadora, os quais, para se ilibarem do próprio pecado, acusam os captadores das suas combinações fraternais como responsáveis por uma crise de governação em potência, e não a si próprios, que ainda por cima utilizaram, telefonicamente, na sua combinação, uma linguagem imprópria de estrelas de uma constelação governativa. Ironiza também, A. G., contra o PS timorato e a nossa esquerda apoiante do cúmplice casal por não querer ver o lado ético na reprovação geral desse conluio.
Que Deus nos acuda neste vale tudo! Mas que foi um grandioso gesto de amiga esse da Dilma, isso é que foi. Não, nessa nunca nós cairíamos, a dar tanto nas vistas e com tanto risco. Além de que temos o provérbio da nossa reticência, que nos define: Amigos, amigos, negócios à parte.

Pra ver o bando passar
Alberto Gonçalves
20/3/16
A extraordinária quantidade de especialistas em política brasileira que ocupou as nossas televisões e imprensa dispensa os palpites de um leigo. Ainda assim, não me dispenso de os fornecer, principalmente porque esta coluna se alimenta de temas da actualidade e, na última semana, a actualidade pareceu resumir-se às proezas do senhor Lula & Associados. Logo, ou escrevo sobre o Brasil ou vejo-me forçado a escrever sobre futebol, ou sobre a gripe que me atacou há dias. Desgraça por desgraça, antes o Brasil. Eis, pois, as minhas impressões a propósito.
Primeira impressão. O efeito produzido por milhões de pessoas em protesto nas ruas dissolve-se no instante em que, no meio da multidão, é descoberta uma família branca com uma ama-seca preta. Pelos vistos, este bombástico pormenor desvaloriza imediatamente as manifestações e prova o "racismo" e o "classismo" dos manifestantes. A circunstância de a ama-seca ter confessado empregar, ela própria, outra ama-seca, ignoro de que cor, não invalida o essencial: se o povo está contra a esquerda, não se trata de povo, mas de serviçais da "direita", do capital e dos EUA.
Segunda impressão. Quando duas criaturas de esquerda são escutadas a arquitectar trafulhices ao telefone, o problema está na divulgação ilícita das escutas - e não nas trafulhices em si. Presumo que se Fulano for filmado a amolgar o crânio de Sicrana com um martelo, o culpado é Beltrano, que filmou à socapa e despejou o vídeo na internet. Isto se Fulano for de esquerda, claro (se não for, configura-se o crime de violência doméstica).
Terceira impressão. A julgar pelos telefonemas entre ambos, a habilidade oratória da "presidenta" e do seu antecessor é um portento. Não me refiro aos palavrões, mas às restantes palavrinhas, das quais quase nenhuma existe nos dicionários. E as poucas que existem não são ordenadas convenientemente. Embora seja absurda a exigência de instrução básica para se subir na política, acho discutível que, conforme é norma na esquerda internacional, a instrução, básica ou elevada, constitua critério de exclusão.
Quarta impressão. Um deputado da oposição que proferiu um impropério qualquer na falhada posse do sr. Lula enquanto ministro foi imediatamente agredido por dirigentes do PT e, de seguida, por jagunços do PT. Isto da liberdade e da tolerância é muito lindo sempre que não afecta os esforços da esquerda em prol da liberdade e da tolerância.
Quinta impressão. Os "telejornais" insistem em falar em manifestações contra o governo e a favor do governo. Até sexta-feira, testemunhas avulsas (a soldo da CIA) não tinham conhecimento das segundas. Mesmo as de sexta-feira foram, a julgar pelas imagens (manipuladas pelo FMI), comparativamente residuais. As sondagens (distorcidas pela Mossad) mostram 70% a 80% de opiniões favoráveis à destituição da "presidenta". Como dizia uma comentadora isenta na TVI24, o país está dividido: a divisão é que está mal feita.
Sexta impressão. Garantem-me que diversas "figuras da cultura" local (de facto artistas de variedades e escritores ilegíveis) defendem o sr. Lula e a "presidenta". Nada de surpreendente: é público que a esquerda acarinha o saber. Certa ocasião, inquirida acerca do livro da sua vida, a dona Dilma admitiu ter lido um, e por pouco se recordava do respectivo título sem o auxílio das assessoras. E o sr. Lula prefaciou a tortura do eng. Sócrates.
Sétima impressão. O sr. Maduro da Venezuela, estadista credenciado, apela à "solidariedade mundial" para com o sr. Lula e a "presidenta". Aguardam-se as posições do sr. Kim da Coreia do Norte, do Estado Islâmico e de três régulos africanos para completar o pleno democrático.
Oitava impressão. Os camaradas de cá não tardaram a aderir à onda solidária exigida pelo sr. Maduro e a denunciar o "golpe" em curso no Brasil. Onde o cidadão alienado vê um gangue de salteadores a roubar o que se move (e o que não se move também, dado o Cristo do Aleijadinho encontrado num cofre do sr. Lula), PCP e BE detectam conspirações "neoliberais". E detectam bem. Se não a refutassem, a propaganda capitalista faria esquecer o inegável trabalho social do PT, a começar pela melhoria das condições materiais de inúmeros membros do PT. E a terminar na preservação do património (ver estátua do Aleijadinho e obras sortidas).
Nona impressão. O nosso querido PS oscila entre a "neutralidade" (neutralidade, aqui, é fingir considerar tão graves as acções dos juízes "justiceiros" quanto as dos políticos corruptos - de modo a desvalorizar a corrupção) e o silêncio. É uma atitude adequada: na verdade, o PS andou anos a venerar o sr. Lula e a "presidenta", pelo que arriscaria o pleonasmo. Ou o descaramento.
Décima impressão. Quem acredita na desonestidade, na inépcia e na prepotência de um governo de bolcheviques analfabetos, acredita em tudo. Acredita, inclusive, que a aliança da esquerda caseira é, para Portugal, uma tragédia sem precedentes. Fora o precedente brasileiro e o imenso rol de sucessos comunistas.

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