quarta-feira, 27 de maio de 2009

A salvação da Pátria

No “Prós e Contras” da semana, tratou-se da crise, subordinada ao tema “Como salvar Portugal”.
O Dr. Lobo Antunes, embora parecesse triste, disse-se optimista. Sendo o seu laboratório um espaço de observação, achou o problema do desemprego uma tragédia, conquanto todos os que lá estavam no público e mesmo o auditório do sofá, à distância, - o meu caso - achassem, com certeza, que tal não era preciso - haver laboratório - para se detectar a tragédia que é a falta de emprego.
Informou ainda que os cargos são mais importantes do que as pessoas, o que diminui a dignidade dos cargos quanto a ele, mas foi porque me pareceu muito humano, muito fragilizado pela dor. Na realidade, segundo a minha experiência, as pessoas sempre se definiram pelos cargos e não há dúvida de que também pelos vestuários, basta lembrarmos o Adão e a Eva no Paraíso, porque quando o perderam, ninguém mais pôs a vista em cima das suas roupas, e assim perderam a dignidade toda, porque a parra foi fundamental para o seu estatuto, além de que tiveram, após a expulsão, um emprego de baixo calibre, com a inauguração da Idade do Ferro, o Jeová escamado com a desobediência deles ao não pouparem a maçã proibida. Mas, realmente, nem percebi a perplexidade do Doutor, que até ocupa um cargo que o define em dignidade.
Ainda expôs sobre o problema dos professores que considerou um fait-divers inquietante, mas afirmou exaltadamente amar o seu país, achando admirável a solidariedade portuguesa, manifesta no banco da fome e no auxílio prestado nas paróquias e nas comunidades aos novos necessitados.
Todos, de resto, partilharam o ponto de vista do amor pátrio e da necessidade de fazer face à crise, mesmo com os citados paliativos da urgência. Henrique Granadeiro achou mesmo que a média de 700 desempregados diários era obra, e que, embora fôssemos um povo mais dado à lamúria do que à acção, se impunha que não baixássemos os braços, sem com isso pretender significar, creio, qualquer castigo de crueldade inusitada, ou qualquer prece angustiada, a exigir-nos os braços erguidamente hirtos.
Era necessário favorecer as políticas de emprego, embora a nossa cultura de empreendorismo não estivesse muito generalizada. Informou ainda que o sistema financeiro já retomara o caminho dos lucros, com emissões de dívidas, e isso foi positivo ouvir, mesmo estranhando nós como fora possível em tão pouco tempo. Contudo, na minha opinião ignara, andou aí metida a mão do nosso Primeiro Ministro, por conta dos dinheiros da banca externa que nos fortalecem a auto-estima momentânea - enfraquecendo, porém, para os vindouros, o espólio financeiro que nem se sabe se ainda existe - e por conta também, sem dúvida, da sua autopromoção eleitoral, sempre enérgica. Contudo há quem afirme não ser verdade tal retoma, pura balela promocional, ficámos indecisos.
Mas crises já tivéramos e vencêramos, uma das quais a integração, a seu tempo, de um milhão de retornados. Frisou ainda o actual ambiente de crispação, a violência verbal de cortar à faca.
Foi a vez de Laborinho Lúcio usar da palavra, não de forma crispada, mas de forma entusiástica, começando por referir, em imagem literária brilhante, que, à morte de um grande cinéfilo português, um jovem também cinéfilo e também português ganhara a palma de ouro de Cannes, representando o facto alicerce simbólico para o fortalecimento do nosso optimismo.
O que era preciso era restabelecer a confiança, e outras crises já o país suportara, sem falar nas do passado remoto. No passado próximo, além de devermos recordar os três quartos do século XX, indefectivelmente deitados fora, pois só ganháramos o último quartel, tivemos, incluído neste, contudo - nada é perfeito - a crise da integração dos retornados, não menos arrasadora do que esta do desemprego do século XXI.
Como patriota que sou, senti-me profundamente vexada e até receosa, pois, a terem sido eliminados tão drasticamente os tais três quartos iniciais do século XX, já eu batera as botas – as asas brancas, na descrição da pureza de Garrett, a preceder o seu inferno de amar a Luz – viscondessa. Mas pensando que, a dar-se o caso, teria sido acompanhada no chuto por Laborinho Lúcio, sosseguei, em razão do dito amor pátrio e próprio, que permitiu que vingássemos ambos, mesmo com os três quartos eliminados.
Como retornada que fui, todavia, posso responder, para restabelecer a minha auto-estima, que dei no país o meu melhor, para compensar o peso em que me tornei com o meu retorno. Tive mesmo que vender o meu carro, de volante à direita, que me fez passar alguns vexames, com as interferências dos inconformados com a minha presença, entre os quais se contou L. Lúcio, vejo agora, os quais me mandavam insultuosamente para a minha terra. Mas isso era mais quando eu cometia algum deslize na minha condução, confesso, a maior parte das vezes primorosa e sem receio de confrontos. Nesta minha confissão de desagravo, de resto, não existe qualquer espécie de retaliação abusiva, democrata como sou e superior a condenações precipitadas, tanto dos condutores irascíveis, como dos magistrados com mais obrigações cívicas, tal L. Lúcio.
Até concordo que o país pequeno em que se tornou, por abandono do país grande que era, não deixou de cumprir o melhor possível – pesem, embora, algumas queixas dos mais dados à lamúria - o seu dever de estender os braços a quem anteriormente o favorecera, economicamente falando, e que não tinha culpa do despejo que lhe fora imposto, para o agrado dos Laborinhos Lúcios, precipitadamente bem-falantes, a fim de melhor atropelar as suas ideias inquinadas.
Bordou-se muito, depois. A respeito de saúde e de justiça e de política e da verdade. A verdade, como conceito em crise, a verdade absoluta perturbante.
E L. Lúcio vá de exemplificar com uma anedota sobre o juiz a quem uma testemunha pergunta se não tem receio de ir para o inferno por ser tão aldrabão, ripostando este airosamente que irá a cavalo nas testemunhas, e toda a assistência de apoiar com risos de simpatia o humor de L. Lúcio.
Mais uma graça ainda, para amenizar a cavaqueira, desta vez passada com ele próprio e com uma deputada alemã, ou juíza talvez – é-me difícil reconstituir os percursos europeus de L.L., sintetizados que estejam, na Internet – a quem ele perguntou como agiriam os juízes alemães no caso de um réu faltar a uma audiência. Mas não houve meio de a juíza entender a pergunta, dada a impossibilidade de isso suceder por lá, pela Alemanha. Passa-se no seu país? – perguntou a juíza. Mas L.L. respondeu prontamente que nunca. E assim mostrou o seu patriotismo no estrangeiro, que o deixou bem cotado perante a estrangeira, e já cá, mais em família, a sua arrogância moralisticamente incriminatória dos seus concidadãos, ao constatar que temos esse defeito de permissividade entranhada – que atrasa a justiça mas serve os réus, os advogados, os juízes, o próprio L. L., que não se rala minimamente com isso, no atropelamento desonesto do seu discurso nulo, acompanhando, todavia, defeitos que não são nulos, porque revelam antes muito das nossas próprias características de velhacaria, pouco dignas de qualquer ser humano, e menos de um magistrado.
Houve tentativas de concluir o programa sobre as fórmulas de vencer a crise, segundo o ponto de vista abalizado de pessoas fora dela. Uns – o Padre Feytor Pinto - apontando a tolerância, o diálogo, a convivência. O costume. Outros o aumento dos recursos, a formação ética, a celeridade na justiça, todos, o blá blá blá habitual, sem consequência. Como salvar Portugal assim?

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