Ouvi esta frase na “Opinião Pública” de hoje, no Canal 5, a propósito da pobreza envergonhada. Opiniões contraditórias, dos que condenaram os anónimos envergonhados da sua pobreza actual, achando sadicamente que deviam dar a cara, para a gente os conhecer - mesmo que não estejamos interessados - dos que atacaram e dos que defenderam as medidas de auxílio implementadas pelo Governo, dos que acreditam - ou não - em Paulo Portas e nas suas promessas eleitorais, de medidas ostracizantes para os que se aboletam com os subsídios, preferindo não trabalhar nem pagar impostos, e defensoras de vencimentos maiores para os que trabalham e pagam impostos e ganham menos do que os anteriores ...
O interlocutor da jornalista deu conselhos simpáticos, no sentido de uma maior responsabilização de todos, mas disse compreender os que gastam um pouco – ou muito, depende – superfluamente, terminando com a imagem do telemóvel topo de gama que todos preferem – não sei porquê! – ao simples instrumento de comunicação normal, sem apetrechos esquisitos. “Porque entre um normal e um topo de gama, escolho este. Porque eu quero ser feliz”. Foi o que ele disse, não sei se influenciado pela mesma conclusão do “Fado” cantado em tempos, no “Festival da Eurovisão” pela Dulce Pontes, que também queria.
Achei a sorridente conclusão, anedótica - não é assim que se responsabiliza um povo. E entendi melhor por que motivo nunca seremos ninguém. Com tais preceitos, não de luta, de empenhamento e consciencientificação no trabalho, mas de defesa do direito ao prazer, que um responsável pelo auxílio económico aos carenciados expende em mensagem televisiva, nunca se atingirá o sentido da dignidade, que deve ser apanágio de todo o homem, a quem o Senhor disse que era preciso suar – no rosto – para se comer pão e ter direito ao telemóvel, acrescento eu.
E como um texto que escrevi sobre o 5 de Outubro provocou reacções negativas – do Sr. Carlos Branco que me fala na monarquia nórdica e do Sr José Pires que me manda repoltrear-me e aprender história antiga e moderna, eu vou transcrever um texto antigo meu, tirado de um livro também já antigo – “Cravos Roxos”, embora duvide que o segundo senhor o leia, ou por falta de poltrona ou por desinteresse de sábio que atingiu o topo de gama do saber e não precisa de mais cultura, nem sequer do foro das boas maneiras, embora defenda as fidalguias dos tempos de antanho.
Ora, neste texto antigo, eu demonstrei não ser propriamente adepta do 25 de Abril, como aliás, tenho demonstrado ultimamente também – não sou das que mudam, embora tenha idade para ter juízo - e até fiz os possíveis, nesse livro e outros, por desmascarar uma situação que tanto feriu a honra dos portugueses honrados, como provavelmente o sr. José Pires será, mesmo sem boas maneiras. Eis o texto:
«Mesa Redonda na Têvê
Realizou-se depois das eleições de 25 de Abril, que o Dr. Mário Soares ganhou por uma maioria relativa, segundo informou. Modéstia. O Dr. Freitas do Amaral e o Dr. Sá Carneiro, pelo menos, congratularam-se pelo seu êxito, como é da praxe nestes casos. O da UDP não deu parabéns, que não ia lá para isso. Bastou-lhe atacar os adversários – todos – com muita displicência. O Dr. Mário Soares não se ralou. Via-se bem que ele pouco se rala com ataques. Quer o mando e bem o merece, depois dos seus violentos esforços para o ter. Fartou-se de ingerir água para molhar a palavra. E a água que ele metia... no copo, fazia um gluglu ruidoso e familiar enternecedor, pois sentíamos assim quanto o Dr. Mário Soares é uma pessoa como nós, que às vezes também fazemos gluglu. Aliás, ele até dança como nós, pelo menos nos comícios do PS e nós, populares, vamos muito em danças, já desde os tempos de D. Pedro I, rei perfeitamente democrata a dançar.
Às vezes o Dr. Mário Soares atrapalhava-se com as observações inteligentes do Dr. Freitas do Amaral ou até mesmo com as observações trocistas do Dr. Sá Carneiro, mas nessa altura socorria-se do copo ou então da sua posição de soberania absoluta e eficaz, e prosseguia impondo a sua linha de pensamento.
Um meu amigo doutor juiz explicou-me com uma animosidade muito fascista que nisso de linha, a dele era a do pacóvio espertalhão, que julga enrolar os outros pacóvios, mas eu considerei, pesarosa, que o mais grave ainda é que, se o Dr. Mário Soares continuar a ingerir tanta água, acabará por perder a linha toda, pois dizem que a água engorda e um futuro governante deve ter cuidado com as gorduras, para não dizerem que ele não pratica a austeridade que nos aconselha a nós, reduzidos com certeza no próximo futuro a poupar a própria água e talvez mesmo o ar ambiente.
Foi uma mesa redonda escutada pelo país com imenso agrado.
À figura discreta e sóbria do Dr. Freitas do Amaral, salientando-se apenas – mas brilhantemente – quando requisitado, opunha-se a figura um tanto sardónica do Dr. Sá Carneiro, divertido com a exuberância do deputado da UDP, já conhecida nas suas sessões de propaganda televisiva, e por isso sem efeito profundo sobre os adversários, olimpicamente indiferentes.
O Dr. Mário Soares saboreava a pequenos goles o seu êxito, e parecia mais inchado, ao lançar a alfinetadazinha regozijada, embora “sem polémica” contra a expectativa gorada da direita de ganhar as eleições.
Justificou também o seu não casamento com nenhum partido por uma súbita e severa alergia a esse tipo de acto, perturbadoramente aliciante, a qual atitude o Dr. Sá Carneiro acolheu, via-se bem, com maligno espanto.
Preocupado com uma definição exacta, o meu amigo doutor juiz repetiu conscienciosamente a de “saloio espertalhão” atribuível à sua personalidade de “leader” com muitas viagens embora de visão moderada, no seio de uma população com escassez das duas, o que justificava o provérbio sobre a realeza do zarolho na terra dos cegos.
Lembrei-me então, num fulgor de entendimento, da história do saloio que jurara ensinar o seu burro a ler e, posto perante o rei entre a alternativa de realizar a proeza ou de ser enforcado, afirmou a um amigo a viabilidade de outra solução – a morte do rei, a do burro ou a dele próprio, dentro do prazo estipulado de um ano.
Eu agora fico à espera de ver qual das mortes escolherá o Dr. Mário Soares, mas estou ciente de que o burro é que vai pagá-las todas – para não ser burro.
Aquando da descolonização e das nacionalizações e saneamentos, sempre desagradáveis – sobretudo quando se trata de coisas ou pessoas de quem precisámos anteriormente, o que não é, aliás, o caso do Dr. Mário Soares, liberal e despido de preconceitos em relação ao alheio por imposição da sua doutrina fraternal, ele apoiava-se pluralisticamente, embora não simultaneamente, em todos os partidos, mas agora, como esses serviços já estão feitos, não precisa de encosto para governar democraticamente só.
Insiste em desejar manter as conquistas do 25 de Abril de 74, mais do que em suster a barca naufragante da sua pátria, e como as tais conquistas são da linha revolucionária-progressista-comunista, é de supor que o sentido da palavra “democracia” se processe cada vez com maior estreiteza na sua linha de pensamento – que eu nunca pus em dúvida, ao contrário do meu amigo doutor juiz que põe.
Mas palavras jamais nos faltaram para as justificações, bastará arranjarmos mais amplitude de significação para as que empregávamos todos antes com autoconvicção e precisamos de empregar depois para consolidar a convicção alheia.
Deus Nosso Senhor dê muita vida para as justificações ao Dr. Mário Soares.»
E aqui está porque, quer em Monarquia - absoluta ou constitucional liberal - quer em República - ditatorial ou democrática, ou faz-de-conta - nunca sairemos desta cepa torcida pelos homens e mulheres que as constituem. Nada temos a ver com as monarquias nórdicas, nem mesmo com esta para lá da nossa fronteira. O que eu tenho dito sempre é que a nossa massa de cepa lusitana ou outra, com muita miscelânea de povos que poderiam ter tido efeito positivo sobre ela, mas não tiveram, deu nisto que somos – uns tristes, sem a fibra de tantos outros, que lutam por ideais, o primeiro dos quais é o do respeito humano e nacional. Será do clima.
P. S. - Já vi alguns textos do blog do sr Carlos Branco e gostei. Vou postá-lo nos meus favoritos, pois encontrei nele identidade de parecer e de educação. “Porque eu também quero ser feliz”.
O interlocutor da jornalista deu conselhos simpáticos, no sentido de uma maior responsabilização de todos, mas disse compreender os que gastam um pouco – ou muito, depende – superfluamente, terminando com a imagem do telemóvel topo de gama que todos preferem – não sei porquê! – ao simples instrumento de comunicação normal, sem apetrechos esquisitos. “Porque entre um normal e um topo de gama, escolho este. Porque eu quero ser feliz”. Foi o que ele disse, não sei se influenciado pela mesma conclusão do “Fado” cantado em tempos, no “Festival da Eurovisão” pela Dulce Pontes, que também queria.
Achei a sorridente conclusão, anedótica - não é assim que se responsabiliza um povo. E entendi melhor por que motivo nunca seremos ninguém. Com tais preceitos, não de luta, de empenhamento e consciencientificação no trabalho, mas de defesa do direito ao prazer, que um responsável pelo auxílio económico aos carenciados expende em mensagem televisiva, nunca se atingirá o sentido da dignidade, que deve ser apanágio de todo o homem, a quem o Senhor disse que era preciso suar – no rosto – para se comer pão e ter direito ao telemóvel, acrescento eu.
E como um texto que escrevi sobre o 5 de Outubro provocou reacções negativas – do Sr. Carlos Branco que me fala na monarquia nórdica e do Sr José Pires que me manda repoltrear-me e aprender história antiga e moderna, eu vou transcrever um texto antigo meu, tirado de um livro também já antigo – “Cravos Roxos”, embora duvide que o segundo senhor o leia, ou por falta de poltrona ou por desinteresse de sábio que atingiu o topo de gama do saber e não precisa de mais cultura, nem sequer do foro das boas maneiras, embora defenda as fidalguias dos tempos de antanho.
Ora, neste texto antigo, eu demonstrei não ser propriamente adepta do 25 de Abril, como aliás, tenho demonstrado ultimamente também – não sou das que mudam, embora tenha idade para ter juízo - e até fiz os possíveis, nesse livro e outros, por desmascarar uma situação que tanto feriu a honra dos portugueses honrados, como provavelmente o sr. José Pires será, mesmo sem boas maneiras. Eis o texto:
«Mesa Redonda na Têvê
Realizou-se depois das eleições de 25 de Abril, que o Dr. Mário Soares ganhou por uma maioria relativa, segundo informou. Modéstia. O Dr. Freitas do Amaral e o Dr. Sá Carneiro, pelo menos, congratularam-se pelo seu êxito, como é da praxe nestes casos. O da UDP não deu parabéns, que não ia lá para isso. Bastou-lhe atacar os adversários – todos – com muita displicência. O Dr. Mário Soares não se ralou. Via-se bem que ele pouco se rala com ataques. Quer o mando e bem o merece, depois dos seus violentos esforços para o ter. Fartou-se de ingerir água para molhar a palavra. E a água que ele metia... no copo, fazia um gluglu ruidoso e familiar enternecedor, pois sentíamos assim quanto o Dr. Mário Soares é uma pessoa como nós, que às vezes também fazemos gluglu. Aliás, ele até dança como nós, pelo menos nos comícios do PS e nós, populares, vamos muito em danças, já desde os tempos de D. Pedro I, rei perfeitamente democrata a dançar.
Às vezes o Dr. Mário Soares atrapalhava-se com as observações inteligentes do Dr. Freitas do Amaral ou até mesmo com as observações trocistas do Dr. Sá Carneiro, mas nessa altura socorria-se do copo ou então da sua posição de soberania absoluta e eficaz, e prosseguia impondo a sua linha de pensamento.
Um meu amigo doutor juiz explicou-me com uma animosidade muito fascista que nisso de linha, a dele era a do pacóvio espertalhão, que julga enrolar os outros pacóvios, mas eu considerei, pesarosa, que o mais grave ainda é que, se o Dr. Mário Soares continuar a ingerir tanta água, acabará por perder a linha toda, pois dizem que a água engorda e um futuro governante deve ter cuidado com as gorduras, para não dizerem que ele não pratica a austeridade que nos aconselha a nós, reduzidos com certeza no próximo futuro a poupar a própria água e talvez mesmo o ar ambiente.
Foi uma mesa redonda escutada pelo país com imenso agrado.
À figura discreta e sóbria do Dr. Freitas do Amaral, salientando-se apenas – mas brilhantemente – quando requisitado, opunha-se a figura um tanto sardónica do Dr. Sá Carneiro, divertido com a exuberância do deputado da UDP, já conhecida nas suas sessões de propaganda televisiva, e por isso sem efeito profundo sobre os adversários, olimpicamente indiferentes.
O Dr. Mário Soares saboreava a pequenos goles o seu êxito, e parecia mais inchado, ao lançar a alfinetadazinha regozijada, embora “sem polémica” contra a expectativa gorada da direita de ganhar as eleições.
Justificou também o seu não casamento com nenhum partido por uma súbita e severa alergia a esse tipo de acto, perturbadoramente aliciante, a qual atitude o Dr. Sá Carneiro acolheu, via-se bem, com maligno espanto.
Preocupado com uma definição exacta, o meu amigo doutor juiz repetiu conscienciosamente a de “saloio espertalhão” atribuível à sua personalidade de “leader” com muitas viagens embora de visão moderada, no seio de uma população com escassez das duas, o que justificava o provérbio sobre a realeza do zarolho na terra dos cegos.
Lembrei-me então, num fulgor de entendimento, da história do saloio que jurara ensinar o seu burro a ler e, posto perante o rei entre a alternativa de realizar a proeza ou de ser enforcado, afirmou a um amigo a viabilidade de outra solução – a morte do rei, a do burro ou a dele próprio, dentro do prazo estipulado de um ano.
Eu agora fico à espera de ver qual das mortes escolherá o Dr. Mário Soares, mas estou ciente de que o burro é que vai pagá-las todas – para não ser burro.
Aquando da descolonização e das nacionalizações e saneamentos, sempre desagradáveis – sobretudo quando se trata de coisas ou pessoas de quem precisámos anteriormente, o que não é, aliás, o caso do Dr. Mário Soares, liberal e despido de preconceitos em relação ao alheio por imposição da sua doutrina fraternal, ele apoiava-se pluralisticamente, embora não simultaneamente, em todos os partidos, mas agora, como esses serviços já estão feitos, não precisa de encosto para governar democraticamente só.
Insiste em desejar manter as conquistas do 25 de Abril de 74, mais do que em suster a barca naufragante da sua pátria, e como as tais conquistas são da linha revolucionária-progressista-comunista, é de supor que o sentido da palavra “democracia” se processe cada vez com maior estreiteza na sua linha de pensamento – que eu nunca pus em dúvida, ao contrário do meu amigo doutor juiz que põe.
Mas palavras jamais nos faltaram para as justificações, bastará arranjarmos mais amplitude de significação para as que empregávamos todos antes com autoconvicção e precisamos de empregar depois para consolidar a convicção alheia.
Deus Nosso Senhor dê muita vida para as justificações ao Dr. Mário Soares.»
E aqui está porque, quer em Monarquia - absoluta ou constitucional liberal - quer em República - ditatorial ou democrática, ou faz-de-conta - nunca sairemos desta cepa torcida pelos homens e mulheres que as constituem. Nada temos a ver com as monarquias nórdicas, nem mesmo com esta para lá da nossa fronteira. O que eu tenho dito sempre é que a nossa massa de cepa lusitana ou outra, com muita miscelânea de povos que poderiam ter tido efeito positivo sobre ela, mas não tiveram, deu nisto que somos – uns tristes, sem a fibra de tantos outros, que lutam por ideais, o primeiro dos quais é o do respeito humano e nacional. Será do clima.
P. S. - Já vi alguns textos do blog do sr Carlos Branco e gostei. Vou postá-lo nos meus favoritos, pois encontrei nele identidade de parecer e de educação. “Porque eu também quero ser feliz”.
Embora uma borrasca, maior ainda, esteja eminente, por excesso do défice. Não para o Soares e tutti quanti, todavia...
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