Um texto de António da Cunha Duarte Justo, saído no “A
Bem da Nação”:
A LÓGICA DA GADANHA E A DA BATATA...
...
LEVAM À INCAPACIDADE DO COMPROMISSO PARA O BEM-COMUM
A
INCLUSÃO CONTINUA A SER UM ESTRANGEIRISMO NO DISCURSO POLÍTICO PORTUGUÊS
“Seria
uma obscenidade política o próximo governo ser liderado por quem perdeu as
eleições” disse um Pire
s de
Lima que, em vez de limar as arestas dos partidos no sentido de um compromisso
de coligação útil para Portugal, aposta na conversa barata apoiante do tipo de
discurso com que se tem estabilizado a corrupção, o compadrio e o sistema
partidarista português.
Segundo
as eleições não houve propriamente nenhum partido vencedor por muito que o
gostássemos da cor do sangue ou da cor do bronzeado das praias. O compromisso
de PS e PSD com a Zona Euro impede-os de serem de esquerda ou de direita em
matéria de confissão nacional. Muito do povo contundente ainda não percebeu
isso limitando-se a desviar a água de Portugal para o seu moinho e a urinar só
para o rio. Nesta situação quereríamos continuar a ser um “jardim à
beira-mar plantado” a trabalhar só para o bronze (de alguns)!
Pelos
resultados das eleições o povo queria a formação de um governo de grande
coligação com os partidos mais votados porque sabia que o PS defende a política
de Bruxelas (da Zona Euro). O que interessa ao povo são soluções para Portugal.
O sistema partidário português prefere conversa fiada a tomadas de medidas
realistas de compromisso que beneficiariam o povo de Portugal.
De um
lado, uns com o rei na barriga e do outro, outros com a rainha na barriga.
Assim se mantem um Portugal sempre pobre, por tanto amor dos partidários da cor
da camisola! Como cada partido e cada adepto só conta com a sua barriga e tê-la
cheia de razão (dogmática) com curvaturas de tipo leguminista ou carnista, não
se vê hipótese para soluções equilibradas e úteis; cada qual só avista o
Portugal das suas cearas ou das suas manadas pretendendo encurralar um Portugal
plural e rico não numa só gamela. A história é às vezes mestra da vida mas o
país recusa-se a evoluir porque rejeita reconhecer a variedade e a beleza dos
seus diferentes biótopos.
Da
Verdade das Cores do Arco-íris
A
realidade, tal como a lógica, tem muitas perspectivas. De um lado, os do carpe
diem com a ideia do não é para se fazer mas para se ir fazendo e do outro, os
que gozam o dia porque sabem que o povo não exige o tal
querer para poder e assim vão podendo e querendo à medida que o pasto rico vai
chegando para a sua manjedoura. Portugal precisaria certamente de mudar mas,
como vai tendo para ir sobrevivendo, evita a dor do pensar e o consequente
incómodo de mudar. Por isso basta-lhe o equilíbrio das suas energias entre
o seu génio temperado e a sua expressão de revoltado.
Ainda
não descobrimos que o problema não está nos outros mas em nós (indivíduo,
partido ou país), nem que a razão de ser portuguesa está na diferença geografia
diferenciada, na diferença de ideias e temperamentos que precisariam, para se
tornarem efectivos, do espírito de iniciativa inovadora, da tolerância e do
compromisso. A verdade é como o arco-íris, tem muitas cores não o podendo
ninguém agarrar só para si. Este é o dilema de Portugal com elites que
cochicham e berram ao povo afirmando que o arco-íris é seu quando, na
realidade, nem o ser da própria cor conhecem. O grande problema não vem
tanto de todos termos razão ou do espírito de cumplicidade mas da incapacidade
de sermos pessoas de compromisso e nos deixarmos embalar pela sereia do amanhã
com os seus acordes de fatalidade do destino.
Do Povo
de Mouras encantadas a adiar a Vida e a Verdade
Na
realidade se prestarmos atenção ao testemunho dos nossos grandes escritores de
todos os tempos constatamos que o retrato do povo e suas elites, feito por
eles, se repete. É um problema crónico de cumplicidade entre governantes e
governados. E o fado entoa em nós sempre a mesma entoação: o acorde da queixa.
Num meio assim não há culpados nem desculpados, somos como somos e por isso o
génio da cultura teima em desculpar a falta do agir com a ideia de "a
culpa morreu solteira" ou ainda "casa em que não há pão todos ralham
e ninguém tem razão" e para completar a ladainha dos nossos actos de fé
desculpamo-nos com o argumento que impede a mudança da situação, pois, de facto
se constata que "ladrão que rouba a ladrão tem cem anos de perdão”. O
cinismo do problema vem do facto de todos nós sermos povo e ninguém conseguir
ultrapassar o tempo da responsabilidade que começaria a partir dos cem anos.
Da
Lógica da Gadanha e da Batata
A lógica
da gadanha é presunçosa, confunde a norma com a própria opinião; fala de cima
para baixo; prejudica pessoas inocentes ou indefesas usando para a sua
argumentação generalizações, ataques baixos, mal-interpretação dos factos ou
usa ainda citações fora do contexto. Usa uma lógica perversa justificando as
barbaridades do presente com as barbaridades já passadas. Engana-se a si mesmo
julgando-se num reino isento, no reino de uma verdade mesquinha que só encontra
relva para a sua gadanha.
Em
Tempos de Mentiras e Meias-verdades
Num
passeio que hoje fiz com Nietsche discutimos muito sobre o “Homem-Superior” e a
"vontade de poder", sobre a verdade e a mentira; a conversa não foi
fácil mas, finalmente, chegou-se a acordo quando Nietsche disse: "A
principal mentira é a que contamos a nós mesmos."
Um estranho texto de alguém que, dialogando com Nietzsche,
ora se pronuncia por lógicas de bom senso ora, como no caso, parece
pronunciar-se por lógicas de altivez e de inesperado desprezo por tudo e todos,
mais parecendo, todavia, uma lógica específica de mudança de cor, em saldo, ao
que parece, no preciso momento – já vivido há 40 e poucos anos, em que tal
mudança irrompeu poderosa, na voz dos autodeclarados sacrificados no regime
anterior, pretendendo abarcar um novo mundo de facilidade e razia sobre os anteriores
afortunados – no momento de nova instabilidade governativa.
De facto, um texto que não corresponde minimamente à
doutrinação equilibrada anterior do seu autor, que sabe perfeitamente que no
trabalho e não no parasitismo reside a felicidade da realização humana.
Quando um governo se propôs pagar uma dívida – à custa de
muitos sacrifícios, é certo, parece que estava a cumprir um dever. E de deveres
é o que Duarte Justo deve estar habituado a discursar e a cumprir, lá no país
onde se encontra fixado, deveres que anteriormente mostrara prezar.
Agora, numa conjuntura de mudança, o discurso surge bem
outro, não de arco-íris mas de furta-cores, sobre uma direita que não é só
formada por exploradores, sabe –o bem e em favor de uma esquerda que expele igualmente
ódios, tal como este texto parece
expeli-los. Com imagens sofisticadas, do foro agrícola, a gadanha em
grande plano, um pouco ambígua a questão da batata. Uma lógica sem bom senso,
em nome de vagos sentimentos misericordiosos em favor dos humildes. Se é que os
encontra ainda.
Volto-me para Vasco Pulido Valente, com a sua clara lógica de percepção
da realidade previsível:
O assalto da realidade
Público, 10/10/15
Dois
casos bastam para ilustrar a questão. Um caso: no dia em que perdeu, António
Costa prometeu que o PS não iria ser uma “maioria do contra”; e ficou toda a
gente sem saber se tencionava voltar-se para Passos Coelho ou para a
extrema-esquerda. Outro caso: no dia seguinte, o mesmo Costa deu liberdade aos
militantes do PS para votarem em Nóvoa ou Maria de Belém na primeira volta da
eleição do Presidente (sem saber se haveria segunda).
Ou
seja, o secretário-geral do PS, que prometeu levar à glória aquela
caranguejola, não quer escolher. Não foi capaz de escolher durante a campanha,
em que oscilou até ao fim, e não é capaz de escolher agora quando se trata de
tomar decisões substantivas sobre o futuro do país. Nesta confusão, ninguém se
entende e dia a dia a ansiedade cresce.
Vamos
supor que António Costa, empurrado por alguns fanáticos sem educação, se
entende com a extrema-esquerda, mesmo não mais do que parcialmente. Dada a
natureza desses doces companheiros de caminho, qualquer entendimento implicaria
não menos do que a inversão total ou parcial da política de Passos Coelho desde
2011. Isto provocaria uma ruptura quase imediata com a Europa (que já avisou
que não está disposta a tolerar uma aventura sem pés nem cabeça) e também com
os credores que não estão ali para aturar fantasias, sobretudo à sua custa. Em
pouco tempo (seis meses?), Portugal ficaria na miséria e os políticos que fazem
sentimento, e ganham votos, com a miséria do próximo teriam de se apresentar em
Bruxelas de cabeça baixa e chapéu na mão a pedir esmola. Isto arruinaria o PS e
a extrema-esquerda, ou acabava rapidamente com a República democrática, ou as
duas coisas.
Mas
nada impede que António Costa, em vez de se virar para a esquerda, se vire para
a direita, tanto mais que anda por aí a piscar o olho aos dois lados. Se o PS
se comprometesse a sustentar, ainda que indirectamente, a coligação, perdia
toda a sua ala radical, no meio de uma gritaria alucinada e torpe, e não é
absurdo pensar que perdesse também uma boa parte da ala moderada para o PSD e
afins. Neste beco sem saída, António Costa não pode abrir a boca, nem dar um
passo em sentido algum. E pouco a pouco a confiança internacional de que o país
precisa para viver irá desaparecendo. À mansa maneira portuguesa, os nossos
políticos, de Cavaco a Jerónimo, começaram a sofrer o assalto da realidade. E a
festa vai durar.
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