Um artigo de Vasco Pulido
Valente mostra preocupação pelo bem-estar do PCP, caso Jerónimo de Sousa
continue amarrado aos chavões do seu mestre Cunhal, que exigem a alteração das
leis laborais, como já nos tempos do PREC se conseguiu, todos temos isso
presente. Julgo que Vasco Pulido Valente não quer a extinção do PCP, que para
todos os efeitos tem um herói no seu currículo, cujos amigos de Peniche desses
tempos o salvaram da prisão no Forte, dando-lhe possibilidade de voltar anos
depois já herói consagrado e criador de novas leis laborais, sobretudo para os
trabalhadores do seu conceito, todos os outros não passando de uma cambada de
exploradores ou de serventuários do capital.
Um
erro sem desculpa
Público, 30/10/2015
Já
muito mais tarde, por volta de 1990, conheci pessoas que tinham trabalhado com Álvaro
Cunhal durante o PREC e durante os primeiros governos constitucionais. De tudo
o que me contaram, o que mais me espantou foi o facto de Cunhal persistir em
acreditar que o regime estabelecido era (para usar o calão da seita) uma
“democracia avançada” e não uma “democracia burguesa” como em toda a Europa. Ao
que parece, Álvaro Cunhal fundava esta inesperada ideia na Constituição, que no
preâmbulo falava em “socialismo” e dava por adquiridas as leis laborais de
1975, a reforma agrária, as nacionalizações “irreversíveis” e outras maravilhas.
Como considerava a Constituição eterna e a sociedade imutável, não pensou na
fragilidade do equilíbrio em que assentava a sua consoladora visão das coisas. Os
desgostos não tardariam a chegar. Mas, pensando bem, para quem conhecia a
história da ortodoxia comunista desde 1917 as fantasias de um pequeno chefe num
país distante tinham, e continuavam a ter, dezenas de precedentes. Para
compreender Jerónimo de Sousa, é preciso compreender isto. O PCP não está
condenado pela “austeridade” do Governo de Passos Coelho. O PCP está
condenado pela sociedade em que hoje vai vivendo, reduzido a uma velha área de
influência geográfica, constantemente ameaçada, e aos sindicatos dos
transportes, de que o Estado, contra a razão e o bom senso, ainda é
proprietário. A aliança de Jerónimo de Sousa com o PS é uma aliança defensiva,
um episódio já obscuro da “luta pelas conquistas de Abril”, condenado tarde ou
cedo a falhar como sempre sucedeu.
O
PC resolveu pagar ao PS com o seu apoio (muito condicionado, de resto) a
revogação das leis laborais da coligação, a permanência dos transportes na
esfera pública e algum alívio transitório para aqueles a quem Jerónimo quase
deixou de chamar “trabalhadores” e trata agora por um eufemismo burguês, particularmente
equívoco: “Os mais frágeis”. Volta assim à política de cegueira e de
imobilismo que o distinguiu desde Novembro de 1975. Só que desta vez corre
um risco muito mais grave. Se por causa do Governo de António Costa as
condições gerais da economia piorarem, agravando a pobreza da sociedade e do
Estado, o PC perderá o que tem; os benefícios que o PS lhe der; e também na
enxurrada o persistente respeito dos portugueses pela sua fidelidade a si
próprio: um erro sem desculpa.
Eu até, para animar Jerónimo
de Sousa, que poderá responder sempre a Pulido Valente como fez Cunhal a Soares
– “Olhe que não!”, mesmo sem ser em duplicado, por reverência ao amo e
modéstia própria, respiguei da Internet algumas sentenças de Álvaro Cunhal, que
serão música celestial para os adeptos desse ideário que vamos ser obrigados a
seguir na nova era que se avizinha, embora faça ainda parte da Cenozóica em que
nos situamos, bem aconchegados no período Quaternário, das grandes realizações
humanas:
Do seu livro: «Acção Revolucionária, Capitulação e
Aventura» (1967)
«A construção de um Portugal democrático será
gravemente limitada ou mesmo impedida se os monopólios estrangeiros continuarem
sendo reis e senhores de Portugal. A construção de um regime democrático deve
significar a libertação do imperialismo estrangeiro e a conquista da real
independência nacional. »
«Os imperialistas
estrangeiros têm nas suas mãos os principais recursos nacionais, predominam no
mercado interno e dominam o comércio externo, vendem-nos caro e compram-nos
barato, pilham as nossas riquezas, exploram o nosso trabalho e reduzem Portugal
à condição de um país dependente e semicolonial. »
A política de
exploração, opressão e terror da ditadura é a política de protecção dos
interesses monopolistas. Só eliminando o poder dos monopólios poderão as
riquezas nacionais ser aproveitadas em benefício do povo e da nação, poderá ser
dado um impulso ao desenvolvimento económico no quadro da liberdade e da
democracia, poderá elevar-se o nível de vida das classes trabalhadoras e do
povo em geral.
Liberdade
Nem todos quantos estão dispostos a lutar pela
liberdade estão dispostos a lutar pelo socialismo, mas todos quantos estão
dispostos a lutar pelo socialismo estão prontos a lutar pela liberdade.
Só dogmáticos podem
pretender explicar a vida social, na sua extrema riqueza, diversidade e
complexa e irregular evolução, com a aplicação de fórmulas imutáveis ou com a
citação de textos.
De: «Discurso, Checoslováquia» (1967)
A luta pela paz e a
segurança na Europa está também intimamente ligada à luta pela verdadeira
independência nacional de todas as nações europeias. Posições económicas
dominantes representam meios de influência e de intervenção na política interna
de outros Estados e meios de pressão diplomática.
É também uma lição da
história e uma evidência da actual situação internacional que as forças
agressivas do imperialismo se apoiam sempre, além fronteiras, nos regimes e nas
forças mais reaccionárias, apoiando estes por sua vez.
A existência de nações
europeias privadas de uma verdadeira independência nacional é um factor
prejudicial ao estabelecimento duma paz duradoura, além do mais porque essa
situação de subjugação nacional não se revela apenas nos aspectos económicos,
mas no domínio político, diplomático e militar.
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