Mais uma mini análise polivalente,
de Clara Ferreira Alves, ao sabor da sua pluma, que divaga pelos vários cantos
do mundo, trepidante no seu colorido informativo, conceituoso e cáustico. É
sobre pederastia, como acto condenável - segundo os que se definem por
princípios religiosos, ou de um puritanismo enraizado por um conservadorismo assente
em raízes morais, (tantas vezes postos em causa pelos defensores democráticos da
“verdade sem sofisma”, os quais preferem assacar àqueles razões de hipocrisia,
para justificar os seus argumentos de libertinagem anti convencional – mas este
é apenas um considerando meu, que não receio as críticas das mentes
progressistas, para quem termos como “libertinagem” são pedantice parola, se é
que os dois termos são conciliáveis). E todavia, considero bem condenáveis esses
que se aferram aos seus princípios antiquados para justificarem acções
terroristas de puro ódio criminoso, facilitado por leis democráticas americanas,
que lhes facultam as armas e que lhes justificam os actos de malvadez como
perturbações do foro psiquiátrico.
Mas é sobretudo contra os
defensores da religião islâmica que se aferra a pluma de Clara Ferreira Alves –
de passagem mais comedida pelas normas que Cristo implantou, denunciando a hipocrisia
de um fundamentalismo islâmico condenatório de práticas homossexuais, quando tão
bem explora essas práticas em cenas orgíacas de pederastia e pedofilia, esta
ainda mais repugnante e criminosa, assente em usos que permitem a venda de
crianças para esses efeitos de indignidade exploradora da miséria.
Ao menos, Petrónio escreveu
sobre estas aventuras de pederastia, alegremente, sem propósito de condenação. Será que o mundo se
tornou mais intolerante? Que estamos gastos de fartura explosiva? Que quanto
mais moralistas mais perversos nos tornamos? Quanto mais falamos de direitos,
mais tortuosos e injustos somos?
Digamos, pois, insubmissos e
rebeldes a todas as convenções e princípios, e saciados de mentira, tal como
Álvaro de Campos o disse, premonitoriamente, na sua “Ode Triunfal”:
A gentalha que anda
pelos andaimes e que vai para casa
Por vielas quase irreais de estreiteza e podridão.
Maravilhosa gente humana que vive como cães,
Que está abaixo de todos os sistemas morais,
Para quem nenhuma religião foi feita
Nenhuma política destinada para eles!
Como eu vos amo a todos, porque sois assim.
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus.
Inatingíveis por todos os progressos,
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida!
Por vielas quase irreais de estreiteza e podridão.
Maravilhosa gente humana que vive como cães,
Que está abaixo de todos os sistemas morais,
Para quem nenhuma religião foi feita
Nenhuma política destinada para eles!
Como eu vos amo a todos, porque sois assim.
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus.
Inatingíveis por todos os progressos,
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida!
….
Eh-lá grandes desastres
de comboios!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágios deliciosos dos grandes transatlânticos!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali, acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões,
Ruído, injustiças, violências, e talvez para breve o fim,
A grande invasão dos bárbaros amarelos pela Europa,
E outro Sol no novo Horizonte!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágios deliciosos dos grandes transatlânticos!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali, acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões,
Ruído, injustiças, violências, e talvez para breve o fim,
A grande invasão dos bárbaros amarelos pela Europa,
E outro Sol no novo Horizonte!
Assumamos a nossa condição de incapacitação mais ou
menos visível. Porque, afinal, tanto faz duma forma ou doutra. Como no rio da imagem… ou na imagem do rio… Passamos.
A
religião e os gays
E, 18.6.2016
Foi um ataque terrorista. Foi um ataque contra os
homossexuais. Foi um ataque facilitado pelas leis laxistas que regulam a compra
de armas de guerra. Foi todas estas coisas e nenhuma em particular. E foi um
crime perpetrado, segundo os psiquiatras e psicólogos e peritos, por uma pessoa
perturbada. E o terrorista e assassino era um descendente de afegãos e um
muçulmano praticante que frequentava a mesquita. Camuflar ou censurar cada uma
destas características, que deram uma mistura explosiva, é sobrepor à tentativa
da explicação da irracionalidade deste crime para o cidadão comum uma agenda política,
multicultural ou sectorial. Tivemos a mania de dividir a Humanidade em grupos e
de a defender ou acusar defendendo ou acusando todas as pessoas desse grupo,
incluindo as que não partilham as características, em função da inclusão
forçada. Devia ser evidente no princípio do século XXI, quando os direitos
civis e os direitos humanos fizeram a caminhada que fizeram, que uma religião
ou uma comunidade religiosa na sua totalidade não pode ser condenada por um crime que um dos seus
membros cometeu. Do mesmo modo que os extremistas e supremacistas brancos que
obedecem a preceitos cristãos divisivos não responsabilizam a história do
cristianismo, os muçulmanos do mundo não são os responsáveis pelo extermínio
compulsivo praticado pelos extremistas islâmicos. O que não podemos é esquecer
que o Islão, na sua formulação actual dominante, xiita ou sunita, tem
tolerância zero com a homossexualidade e não reconhece os direitos dos
homossexuais. Tal como não é feminista. Não podemos esquecer que, dos 73 países
do mundo onde a homossexualidade é penalizada e punida como crime, larga
percentagem são países islâmicos ou na esfera de influência do Islão. Nas Nações
Unidas, nas reuniões internacionais sobre a sida e os portadores HIV, ou nas
regiões da agenda internacional dos direitos LGBT, os países da Organização da
Cooperação Islâmica, dezenas deles bloqueiam sistematicamente a participação de organizações e pessoas representantes das
comunidades LGBT. Na Arábia Saudita, ou no Egipto, as práticas homossexuais são
punidas com legislação que consagra penas pesadas. A tortura prisão e
assassínio de homossexuais são correntes nos países islâmicos. E o Islão
considera a homossexualidade um crime. Podemos dizer que o cristianismo também
não tolera a homossexualidade ou não tem (e devia ter) complacência cristã, é
verdade, pelo menos até o Papa Francisco aparecer, mas o distingo é importante.
O cristianismo não condiciona a política
na polis ocidental, não é elevado a lei fundamental da regulação da
vida num país. E o judaísmo também não. Apesar da proliferação de extremistas
ortodoxos em Israel, o país tem uma prática de tolerância que autoriza uma cidade
religiosa como Jerusalém a ter a sua gay
parade, protegida pela polícia, apesar dos protestos dos fundamentalistas.
Como escrevia Yourcenar, houve um singular momento na
História em que os homens foram livres, entre a morte dos velhos deuses e os
novos deuses por nascer. Em todas as práticas de comportamento e orientação
sexual onde a religião se mete, a história acaba mal e gera uma hipocrisia
repugnante. Umas religiões metem-se mais
do que as outras. Na “puríssima” Arábia Saudita, ou no Kuwait, as histórias de
festas e orgias masculinas com ladyboys
(reduzidos a escravos sexuais) importados da Ásia são conhecidas. E reconhecidas.
Estão documentadas. No Afeganistão,
donde vieram os progenitores de Omar Mateen, os homossexuais são perseguidos e
não reconhecidos, tanto por costume tribal como por costume religioso, mas é
comum os senhores da guerra, incluindo os chefes talibãs, apropriarem-se de
crianças do sexo masculino e usarem-nas como brinquedo sexual. Muitos pais
vendem os rapazinhos, que são vítimas de pederastia e pedofilia. Bacha Bazi
chama-se a prática. O senhor Mateen sénior não hesitou em dizer que a sorte dos
homossexuais de Orlando estava nas mãos de Deus. Leia-se, a punição pelo seu
comportamento desviante. É esta a atitude do Islão, quer se goste ou não, quer
se queira proteger ou não uma religião dos ódios de outra religião.
Os republicanos americanos, tão preocupados com o
Islão radical, menosprezaram este atentado como um crime contra os
homossexuais. Nos anos 80, quando a epidemia da sida começou, muitos dos
evangélicos e conservadores americanos decidiram que a doença era uma punição
de Deus contra a homossexualidade. A tolice, tal como a intolerância, incluindo
a intolerância ateísta e multiculturalista disfarçada de agenda humanista, está
em todo no lado.
O que não devia ser possível é, como acontece todas as
vezes, usar um atentado terrorista para ter razão sobre a supremacia da sua agenda
política ou ideológica. Tal como, todas as vezes, vemos a repetição de gestos
sentimentais que não impedem novos atentados e comprometem a decisão política
que pode evitar novos atentados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário