terça-feira, 28 de agosto de 2018

Eram só 36, àquela hora



Vem à baila um velho enigma, de fácil resolução, de gavião e as pombas: A pombinha responde ao gavião, que estranha a quantidade de pombinhas no chão: “Nós, outras tantas como nós, mais metade de nós, mais um quarto de nós e contigo, gavião, cem pombas farão”. Mas o gavião é passageiro, outros gaviões virão, e as pombinhas também, a desfazer a ponderação. Helena Matos é pessimista na sua Opinião a respeito do gavião, alguns seus comentadores atacam mais as pombinhas, que não se ilustram e se deixam comer pelos gaviões sabidões, embora outros comentadores vão mais num sentido de igual revolta de HM. Manuel Carvalho faz, pelo contrário, um Editorial optimista, de quem não pertence ao bando das pombas e se sente em estado de graça e profunda admiração pelo gavião camarada. Há sempre divergências de pontos de vista, o que é positivo. E maior ou menor lucidez analítica. Mas é uma boa distracção, a sua leitura. Melhor que novela, em que participamos, sem nos apercebermos. Ou fazendo de conta, até porque, como disse Ricardo Reis,  «não vale a pena cansarmo-nos... Mais vale saber passar silenciosamente  E sem desassossegos grandes…»

I - ESTADO
Até quando? /premium
HELENA MATOS             
OBSERVADOR, 26/8/2018,
Ninguém fala pelos contribuintes. Esses invisíveis que na sua mansidão tornam possível o populismo de quem promete o insustentável às suas clientelas eleitorais.
2018. 23 de Agosto. Os imóveis do Estado que se encontrem em mau estado de conservação, devolutos ou em ruínas, não terão de pagar o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) agravado, ao contrário do que acontece aos proprietários privados que têm de pagar este imposto a triplicar como forma de sanção
Três dias. Três notícias. Um padrão. Uma mesma orientação: o Estado impõe aos outros aquilo de que se exime a si mesmo.
Não foi por acaso que acabámos com a urgentíssima e relevantíssima protecção de dados transformada num mecanismo que nos impede de saber que políticos recebem pensões vitalícias ou o que aconteceu nos fogos de Pedrogão mas que simultaneamente não impede a divulgação dos nomes dos devedores ao fisco ou à Segurança Social. Note-se que o papel da protecção de dados enquanto agente especial do estatismo não acaba aqui: as multas anunciadas para quem não cumpra a legislação em matéria de protecção de dados não se aplica ao Estado.
Também não é por acaso que todas as semanas somos confrontados com a proliferação de medidas que reforçam a estatização dos nossos bens, para todos os efeitos transformados nos bens que o Estado concede que estejam à nossa guarda. Os levantamentos superiores a 50 mil euros que vão dar alerta no Fisco são apenas mais um capítulo na transformação dos antigos proprietários em cuidadores supervisionados pelo Estado. O que é afinal senão um cuidador supervisionado pelo Estado o senhorio a quem se determina a quem pode alugar; que tem de patrocinar determinadas actividades como as lojas ditas históricas ou, mais prosaicamente ainda, substituir a Segurança Social e as misericórdias no apoio social aos seus inquilinos?
Os absurdos a que se chegou no campo da produção legislativa através da qual o Estado intervém na vida dos contribuintes só se torna evidente quando aqueles que pensam ter cumprido tudo, mas mesmo tudo, em matéria fiscal se descobrem afinal infractores: foi isso que aconteceu este ano com as multas da ViaCTT e que acontecerá mais cedo ou mais tarde quando o fisco começar a multar os noivos que não declaram as prendas de casamento superiores a 500 euros ou os filhos e netos que não declaram as mesadas. (O facto de a doação estar isenta – entre pais e filhos e avós e netos – não isenta ninguém de ter de fazer a respectiva declaração.)
Não sei se será graças a um partido novo ou velho ou a um movimento anti-partidário. Também não sei dizer quem será o primeiro político a enfrentar directamente o assunto mas, a bem da nossa liberdade e dignidade, alguém vai ter de dizer que não podemos continuar a viver nesta ratoeira em que os políticos compram o voto dos cidadãos à custa da criação de uma ditadura sobre o contribuinte. (Há aliás qualquer coisa de feudal na relação dos nossos dirigentes quando falam de impostos, sobretudo da sua redução, que anunciam como quem faz uma mercê ditada pela sua generosidade ou especial sagacidade.)
Exemplar deste círculo vicioso é o outro anúncio desta semana. Melhor dizendo, o número “Bloco quer” dos últimos dias. Como não podia deixar de ser, esta semana o Bloco tinha de querer alguma coisa. Isso não é propriamente notícia. Aliás, notícia seria o Bloco não querer coisa alguma. Mas vale a pena atentar naquilo que o Bloco disse agora querer: esta semana o Bloco quer reduzir as contribuições para a ADSE.
Digamos que a verbalização deste querer é a performance reservada ao Bloco na grande festa do Orçamento de 2019 (a redução das contribuições para a ADSE está em cima da mesa há algum tempo) mas PS, PCP e BE (não tenho de fazer de conta que os Verdes existem, pois não?) vão todos eles querer alguma coisa para no fim o PS fazer de grande moderador e os companheiros de um bocadinho conseguidores. Obviamente, nas próximas eleições o Bloco lembrará aos funcionários públicos que têm votar no Bloco porque foi o Bloco que conseguiu a redução das contribuições para a ADSE; o PS explicará que foi graças a António Costa que a ADSE baixou as contribuições e subiu o seu saldo positivo e o PCP gritará que é aos comunistas que os funcionários públicos devem o facto de a redução das contribuições para a ADSE não ter sido considerada como um aumento de ordenado.
Mas, deixando de lado a teatralização do “vamos fazer de conta que negociamos”, passemos ao que interessa: quanto vai custar esta redução das contribuições para a ADSE?
Segundo contas feitas pelo Governo em 2017 (eu avisei que a reivindicação do Bloco não era propriamente uma novidade!) reduzir as contribuições para a ADSE de 3,5% para 3,25% implicaria que entrariam menos 40 milhões de euros nos cofres da ADSE.
Mas mesmo que não exista qualquer redução nas contribuições para a ADSE esta vai precisar de mais dinheiro, pois os actuais 3,5% de descontos já não acompanham o ritmo de crescimento dos custos com a saúde dos beneficiários, e esse crescimento é inevitável numa população cada vez mais envelhecida.
Portanto, será o dinheiro dos contribuintes (essa espécie de lado B dos cidadãos e da cidadania) a suportar esta redução das contribuições para a ADSE. Entre estes contribuintes contam-se beneficiários e não beneficiários da ADSE. Mas, e aqui voltamos ao princípio desta crónica, é aceitável que os funcionários do Estado beneficiem de um seguro de saúde a um custo que só é tão baixo porque na hora do acerto de contas se for necessário será efectuada (mais) uma transferência via Orçamento de Estado? Em que grau de irresponsabilidade estamos para que se proponha baixar as contribuições para um sistema de saúde ? E como é possível que os sindicatos tenham o desplante de dizer que as reduções das contribuições não podem ser consideradas um aumento de ordenado?
Tudo isto só é possível porque ninguém fala pelos contribuintes. Esses invisíveis que na sua mansidão tornam possível o populismo de quem promete o insustentável às suas clientelas eleitorais. Esses desmobilizados sem cartazes nem megafones e portante irrelevantes na hora em que o Estado negoceia com os seus: Caixa dá prémio aos trabalhadores em plena guerra laboral. Esses silenciosos que pagam aos credores que nos resgatam e aos governos que nos levam à falência… Até quando?
P.S.: Que o governo socialista de um país da Europa – a Espanha – tenha como sua medida emblemática desenterrar um homem que morreu e foi enterrado há 43 anos é sintomático da falência política do chamado socialismo democrático.

COMENTÁRIOS
Pedro Reis
Já em Outubro de 2014, a propósito da notícia em que "Costa alega inconstitucionalidade de imposição das 40 horas" comentei aqui no Observador o seguinte:
"Este país precisa do Partido dos Contribuintes, um verdadeiro PC. O partido que defenda os que sustentam esta bagunça, que pagam os salários destes políticos de meia tigela, demagogos e insanos. O partido que defenda aqueles que trabalham para pagar as obras em dobro ou em triplo do seu valor, que pagam o dobro por trabalho mal feito e apesar de pagarem tudo bem pago, são maltratados nos serviços prestados pelas instituições públicas. Ou é o processo na câmara que demora tempos infinitos, ou são os buracos nos passeios e nas ruas, ou são as sargetas que não estão limpas, ou é o lixo que se acumula, a desorganização do estacionamento que prejudica os peões, enfim tudo aquilo que não se faz para melhorar a vida de quem paga isto tudo, os contribuintes. Quem paga manda, numa situação normal, por cá é, quem paga é burro...(ou é cristo)...Neste caso, já vislumbramos um candidato a 1º ministro, que só pensa em mais despesa pública, ou seja mais encargos para os contribuintes…"
O que se vislumbrava em 2014 tornou-se uma realidade...
Marco Silva -> Pedro Reis
Só é inconstitucional se afectar negativamente a função pública. Se fôr positivo para a função pública, quem alega inconstitucionalidade, será abafado, demonizado e/ou ridicularizado na praça pública e nas redes sociais. É assim que funciona a máquina de propaganda da esquerda.
Tal como acontece nos Estados Unidos e em outros paises, como a Hungria, Polónia, etc, onde há uma preocupação com a influência do movimento migratório na Europa e Estados Unidos, em àreas como o mercado de trabalho e de contribuições sociais e quem vai pagar isso. Qualquer tentativa de discussão destes temas, redunda imediatamente no insulto por parte das esquerdas à pessoa que colocou tais questões. Insultos como "racista", "xenófobo", "nazi", etc etc.  É assim a esquerda. Sempre disposta a discutir qualquer tema, desde que seja nos seus termos. Opiniões divergentes, recebem censura e/ou insultos pessoais.
Marco Silva:
Até...sempre ? Os portugueses foram envenenados pela utopia socialista. Foram décadas de indoctrinação...não têm salvação possível. Acreditam que para ter o que querem, têm de ser os "outros" a assegurar tal pretensão. Têm de ser os "outros" a pagar as despesas. Mas isto é realmente novidade? Somos um país envelhecido, onde a maior parte dos mais velhos não sabe como funciona a segurança social. Lembro-me da minha avó que dizia que era o "governo que lhe pagava a pensão". Não fazia a mínima ideia de onde vinha o dinheiro da pensão...E a maior parte nem quer saber. Quer é que no final do mês lá esteja. Como lá chega, quem sofre com isso, é irrelevante. O que interessa é que chegue. E quem lhes garante que vai chegar, até com um valor mais elevado, é em quem eles/as vão votar. E isto é válido para os mais novos também, que falam muito nas redes sociais, mas desconhecem como funciona este Estado gigante e muito menos conhecem como chegámos aqui, e portanto ávidos em repetir os erros do passado. Já dizia o outro, quem desconhece a sua história, está condenado a repeti-la. E de facto o povo português é moralmente corrupto e hipócrita. Aceita a corrupção sem problemas, desde que o/a beneficie directamente, mas critica outros por fazer o mesmo. Qualquer cultura que esteja podre a este nível, não tem salvação. O ciclo vicioso em que nos encontramos não parece ter fim: gastar mais do que podemos num Estado que não pára de aumentar -> pré-bancarrota -> pedir ajuda financeira -> melhorar um pouco a situação -> voltar ao inicio. Sem uma revolta a sério, bem mais que o 25 de Abril, nada disto vai mudar, dado que o veneno da esquerda está enraizado na sociedade portuguesa e afecta todas as àreas. Sem isto, Portugal continuará a ser um país pobre (e cada vez mais pobre), infestado de incompetentes e parasitas do Estado, que apenas estão interessados no seu umbigo.
J. Costa
Alguém sabe dizer quanto é que rasputine recebe do "largo do rato" para dizer tanto disparate?
Marco Silva -> J. Costa
Provavelmente não recebe nada. Há pessoas assim. Que defendem uma ideologia mesmo sem qualquer tipo de retorno. São fanáticos/as que não pensam em nada, não questionam nada, apenas debitam a propaganda exigida pela ideologia. Tipicamente associado à religião, mas existe em todo o lado: clubes de futebol, partidos políticos, fabricantes de smartphones, fabricantes de placas gráficas, etc etc. Em suma, as ovelhas. Por outro lado, pode fazer parte da clientela do governo - funcionários públicos, pensionistas - que têm sempre regalias, ainda que sejam outros a pagá-las e não o "governo".
José Filipe Fernandes
Até quando? Resta-me a esperança de pensar que tudo tem um fim.
Só que para nós, o Zé contribuinte, ainda falta muito. Principalmente agora que começou o futebol e até a Cristina Ferreira (símbolo máximo do nada) é mais uma vez notícia, como é que nos podemos preocupar que nos estão outra vez a ir ao bolso se andamos tão ocupados a comentar os exemplos (há tantos outros) referidos? Com um Presidente da República preocupado em ser diariamente aclamado como fosse um Rei em vez, isso sim, de defender os Zés contribuintes, talvez esta vergonha de (des)governo não nos fizesse de gato sapato, sempre apoiado por uma esquerda que só existe pelo palco dado pela comunicação social e uma doente democracia europeia que tudo acolhe e cobardemente respeita, apenas com medo de perder votos. Resta-nos alguns que com coragem e lucidez, ainda escrevem e falam a ver se esta inércia portuguesa dá, como já alguém e muito bem escreveu, dá um valente coice nestes "cogumelos e fungos" que vivem da apatia de todos nós. Está mais do que nunca na vez de gritar: BASTA !!
Só espero que OS COMANDOS mantenham um mínimo de prontidão e operacionalidade. Haverá sempre portugueses heróis no momento da verdade e é isto que mantém toda a nossa esquerda  em alerta e desassossego.
Ana Silva
Certíssimo tudo o que  Helena Matos diz mas a verdade é que temos o que merecemos porque deixamos acontecer. Para a grande maioria dos portugueses mais Estado seria ainda melhor (o que temos funciona tão bem).
Marco Silva ->Ze Europa
Peço desculpa, mas o Costa é dr de quê? Do faz de conta ? De vender banha da cobra? Da constantemente atribuída "habilidade politica" ? A habilidade politica foi algo que sempre me causou espanto, já que nada do que Costa fez nas décadas em que está na politica mostram essa habilidade, no entanto muitos atribuem-lhe tal característica.
Vejamos:
1) Interferiu com a justiça, na investigação do caso Casa Pia, para ajudar os amigos do PS, Ferro Rodrigues e Paulo Pedroso
2) Foi ministro da justiça, sem que nada tenha feito de memorável, ainda mais dado o estado lastimável em que a justiça portuguesa sempre se encontrou e só tem piorado
3) Foi ministro da administração interna onde assinou o contracto do SIRESP (o sistema de emergência que podia falhar em caso de emergência, sem consequências para o gestor do sistema), acabou com os guardas florestais e fez a compra/contractos dos helicópteros Kamov, que nem voam por só terem problemas mecânicos.
4) Foi presidente da CML e basicamente aceitou tudo o que os sindicatos pediam, aumentou a divida da câmara, recebeu cerca de mil milhões de ajuda do governo para pagar a divida e auto-proclamou-se responsável por baixar a divida da CML
5) "Apunhalou" José Seguro para assumir a liderança do PS
6) Fez um acordo com a extrema-esquerda, partidos em muitos aspectos opostos ao PS já que por exemplo são contra o projecto europeu, para salvar a pele dentro do PS e ser primeiro ministro à força, depois de ter perdido as eleições em 2015
Isto é habilidade? Eu só vejo incompetência, manha e banha da cobra, todos termos bem depreciativos. Nenhum deles merece "dr".

II - EDITORIAL
A economia entre o suficiente e o suficiente mais
Depois de 17 trimestres de crescimento consecutivo, a economia regista uma vitória e um empate: enterrou a memória da troika, mas continua longe dos Estados mais dinâmicos.
MANUEL CARVALHO
PÚBLICO, 15 de Agosto de 2018
economia voltou a recuperar no segundo trimestre um bom ritmo de crescimento. Era expectável, mas uma boa notícia não deixa de ser uma boa notícia até quando é esperada. E é-o ainda mais quando a tendência de crescimento do produto se mantém após 17 trimestres consecutivos, ainda que desta vez se deva registar que o investimento abrandou e o consumo privado cresceu. Portugal enterrou os traumas do ajustamento e entrou num novo ciclo da sua história económica – o que impõe uma leitura actualizada do contexto. Já não basta o regozijo com o fim do ciclo das recessões: é preciso reflectir sobre se o ritmo de crescimento é satisfatório e, principalmente, se não corremos o risco de cair num estado de auto-satisfação que nos condena a ficar cada vez mais na cauda da União Europeia.
Esse debate já teve início e, como seria de esperar, é muito marcado pelas naturais divergências da política partidária. Para o Governo, o desempenho da economia é uma boa notícia que dispensa leituras comparativas; para a oposição, Portugal está bem mas não está suficientemente bem para se colar ao pelotão da frente das economias mais avançadas. Na análise, ambos têm razão: poucos ousariam dizer há quatro ou cinco anos que o país fosse capaz de se desfazer do pesadelo da troika tão depressa; mas, nota o PSD, o CDS e alguns dos principais economistas, está na hora de enterrar o passado, olhar os dados do presente e reparar que, se Portugal cresce acima da média europeia, a verdade é que os países com os quais compete mais ombro a ombro estão a portar-se melhor. Houve 13 países a crescer mais do que Portugal.
Numa conjuntura externa positiva como a destes anos, seria obrigatório que Portugal crescesse mais e mantivesse a distância em relação aos seus competidores directos. Não o conseguindo, está condenado a perder posições e ver outros países do bloco do Leste a ultrapassá-lo. Mas se essa preocupação faz sentido, há outra abordagem imperiosa: Portugal tem hoje uma estabilidade política, uma infra-estrutura, um nível científico e uma disponibilidade de recursos humanos que reclamam outra ambição. Não basta dizer que o ciclo é bom; é preciso dizer que pode e deve ser melhor.


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