De João Miguel
Tavares, sobre a Igreja e os badalados
casos de pedofilia, o Papa Francisco
na ribalta da sua humilhação papal, santificada pela bondade, de Maria João Marques
sobre a recusa de uma
exposição cá, por Marine Le Pen e o
seu nacionalismo rebarbativo, de
sobre as políticas anti-ecologistas de Donal Trump. Para esses textos, um ou dois comentários elucidativos
de apoio ou oposição, entre as dezenas por eles recebidos. Três tristes textos,
sobre um mundo prazenteiro e inconsciente .
I - OPINIÃO
A Igreja, a pedofilia e o celibato
Uma Igreja séria avaliaria o
impacto do celibato no comportamento dos padres abusadores e tiraria daí
consequências.
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 25 de Agosto de 2018
No início, a Igreja
escondeu. Silenciou. Negou. Depois desvalorizou. Evitou pronunciar-se. Negociou
acordos com vítimas. Finalmente falou. Pediu perdão. Criticou o clericalismo e
as estruturas de pecado. Impôs certas normas de conduta e separou o que é
pecado do que é crime. Pediu perdão outra vez. E tem pedido perdão com
regularidade, à medida que saem mais notícias e mais documentários e mais
filmes e mais relatórios sobre a dimensão catastrófica da pedofilia no seio da
Igreja Católica. Pedir
perdão é bom? Sim, no sentido em que é uma obrigação moral. Não, se se
transformar numa expiação inútil, num arrependimento improdutivo e numa
desculpa para a inacção – tipo: o Papa já assumiu a culpa da Igreja, o que é
que querem mais?
Queremos muito, muito mais. Pedir perdão pode ser duro e humilhante,
mas não faz com que a Igreja realmente saia da sua zona de conforto. Todas as
missas começam pelo reconhecimento de que somos pecadores – já sabemos, muito
obrigado, que os homens e a Igreja fizeram, fazem e farão coisas horríveis. É
próprio da sua natureza. Aquilo que me parece imprescindível é que a Igreja
discuta o que manifestamente não quer discutir, e que arranje forma de
responder a estas perguntas essenciais: existe, ou não, uma relação entre
celibato e pedofilia? O voto de castidade, conjuntamente com o voto de
obediência, potenciou ou não a tremenda tragédia do abuso de crianças, ainda
por cima maioritariamente rapazes, o que é uma anomalia estatística (fora da
Igreja, os menores abusados são maioritariamente de sexo feminino)? A
obrigatoriedade de abstinência sexual numa Igreja liderada em exclusivo por
homens que exercem o seu magistério de forma largamente solitária contribuiu,
ou não, para a massificação da criminalidade sexual no seio do clero?
Pedidos de perdão oriundos
do Vaticano já ouvi muitos. Respostas a estas questões não ouvi uma única. A
última carta do Papa Francisco pode ser muito humilde e sentida, mas sobre isto
diz zero – reconhece apenas que o número de “clérigos ou pessoas consagradas”
envolvidas em abusos é “notável”. Mas porque é que é “notável”? Essa é a
pergunta a que a Igreja não se atreve a responder. A que se deve este número absurdo de padres abusadores, que têm feito
mais pelo ateísmo no mundo do que as obras completas de Karl Marx? Há paralelos
com outras Igrejas? Os protestantes, os ortodoxos, os muçulmanos, os budistas
têm a mesma incidência de comportamentos pedófilos no seio do seu clero?
Já existem estudos que
mostram que não, que a incidência da pedofilia no seio da Igreja Católica é, de
facto, superior, mas o que me interessa aqui não é iniciar uma guerra
de links – até porque na internet há de tudo, para todos os gostos. O que
me interessa é sublinhar que ninguém é capaz de responder melhor a estas
questões do que a própria Igreja – tivesse ela a coragem de enfrentar a dura
realidade e, em última análise, revolucionar a sua organização interna. Uma Igreja séria e sólida faria necessariamente
duas coisas: 1) produziria um grande relatório, independente e público, à
escala mundial, sobre a pedofilia na Igreja Católica nos últimos 50 anos. 2)
Avaliaria o impacto do celibato no comportamento dos padres abusadores e
tiraria daí consequências sérias. Quando isto for feito, a Igreja estará
verdadeiramente a enfrentar a tragédia da pedofilia. Enquanto não o fizer, os
pedidos de perdão são apenas formas santas de olhar para o Céu enquanto se
continua a sujar a Terra.
DOIS COMENTÁRIOS:
Diogo Cabral,
27.08.2018: Bem ... se a Igreja Católica tivesse seguido
a sugestão do próprio Apóstolo Paulo nada disto tinha acontecido ... ou, pelo
menos o problema tinha sido bastante minimizado!!! O Apóstolo Paulo na carta
que escreveu à congregação dos Coríntios abordou este problema e disse que,
embora o Celibato fosse a melhor forma para o Cristão se dedicar totalmente à
evangelização "em vista da imoralidade sexual, cada homem deve ter a sua
própria esposa, e cada mulher o seu próprio marido." Cor 7: 1-9. Ou
seja, o Celibato NÃO é uma imposição para quem quer exercer cargos de
sacerdote/ancião, pois os próprios apóstolos eram casados! Sugestão para a
Igreja Católica: remover a obrigatoriedade do "Voto de Celibato" para
quem quer ser sacerdote! Vai resolver uma boa parte do problema em questão!
Manuel Serra72: Concordo com o artigo do João Miguel Tavares. Seria interessante saber
a que ponto o celibato está relacionado com os casos de pedofilia. Como
agnóstico que sou e sem defender de maneira nenhuma este tipo de práticas, acho
que muito devemos à religião cristã que é muito mais do que os reducionismos
que lêem nos comentários. A nossa civilização assenta nesse pilar que é o
Cristianismo. E mais para o bem do que para o mal. E chocam-me os comentários
ignorantes e muito habituais à Igreja que vão muito para lá do âmbito do
artigo. Ainda assim inventou-se a palavra Islamofobia para pôr as pessoas com
medo de comentarem o Islão. Felizmente não existe a equivalente
"Cristianofobia" ...
II - MARINE LE PEN
A inutilidade do diálogo com
extremistas /Premium
O que fazer com os extremistas? Debate-se?
Ignoram-se? Ostracizam-se? Durante tempo de mais agiu-se como se a incitação à
violência não estivesse relacionada com a violência. Que anjinhos
tantos foram
OBSERVADOR, 22/8/2018
Li por aí muitas tiradas lindas
e pomposas que nos garantem que perante Marine Le Pen e derivados há que
debater, rebater, vencer pelos argumentos, conversar piedosa e pacientemente
até trazer as ovelhas tresmalhadas que seguem estes produtos políticos tóxicos
de volta ao bom caminho. É argumentação muito bonita, quase digna de uma
parábola no Novo Testamento do bom pastor que nunca abandona quem se perde
pelos extremismos – mas de uma ingenuidade assombrosa.
Sobre proibições e censura já
perorei a semana passada. Sucede que, lá porque uma pessoa ou um ideário
político não é ilegal e, donde, proibido, tal não significa que tenhamos de
divulgar e, pior, conversar com tais ideólogos ou seguidores. Como
aparentemente muitos parecem defender. O argumento vai na linha ‘se não se
divulga e não se conversa, esta exclusão só dá força ao excluído’.
Suspiro. É um caso típico de
nunca se aprender nem com as lições mais ostensivas. Os argumentos que leio para defender o convite para a Webb Summit a
Marine Le Pen são tal qual os que lia para defender a liberdade de expressão
dos extremistas islâmicos dentro da Europa. A quantidade de vezes que me
disseram – quando eu clamava que deixar estas pessoas a falarem à solta era
perigoso, que estavam a usar as liberdades que lhes disponibilizávamos contra
nós – que não, o Ocidente venceria estes obscurantistas dando-lhes liberdade e
provando com a tolerância que somos superiores. Deixá-los dizer que os crentes
deviam guerrear e matar os infiéis. Tinham todo o direito de dizer isto. Só se
torcia o nariz quando (e a quem) de facto guerreasse e matasse infiéis.
Durante tempo de mais agiu-se como se a incitação à violência não
estivesse relacionada com a violência. Que anjinhos tantos foram. Só ao fim de
demasiados atentados terroristas – de demasiadas mortes – se endureceu a
legislação que limita a liberdade de expressão nos casos de incitação à
violência ou nos discursos de ódio vindos dos radicais islâmicos.
Finalmente lá se percebeu
que não, que a maneira mais eficaz de combater esta erva ruim era não lhe dar
espaço para crescer. Ao fim de vários anos a apelar ao ódio e à violência e a
radicalizar jovens, protegido pelas leis e pela claque da liberdade de
expressão absoluta, Anjem Choudary (por exemplo) foi preso por incitação
ao terrorismo. Não sem que outros continuassem a defender o seu direito à
liberdade de expressão sem limites e a prisão como um abuso estatal.
Casos como os de Marine Le Pen são mais ambíguos. Estamos no fio da
navalha e reconheço que não tenho respostas absolutas para estes casos. Sei,
porém, que o mantra da liberdade de expressão sem limites e a necessidade de
debate não colam.
É possível que haja uma fina barreira vermelha entre a incitação ao
terrorismo e à violência e ao discurso de ódio. Em boa verdade temos todos o
direito de odiarmos quem quisermos, desde que não lesemos direitos do nosso
objecto de ódio. Não faz sentido ilegalizar sentimentos. Mas se o ódio é
expresso em palavras públicas, levanta-me reservas. Não podemos enterrar a
cabeça na areia e fingir que o discurso da extrema direita é só palavras
inócuas. Os membros destes grupos começam a ser estudados e, sem surpresa,
verifica-se que desumanizam e diabolizam os indivíduos que odeiam – dos mexicanos às feministas. E sabemos bem
que diabolizar e não ver o outro como partilhando da nossa humanidade é o
primeiro passo para aceitar ou perpetrar violência sobre esse outro.
Já pelo menos dois massacres foram feitos nos Estados Unidos por dois
sinistros incels – os celibatários involuntários que não conseguem ter
namoradas nem casos sexuais e se vingam das mulheres que os repudiam matando a
eito. Ora esta cultura incel divulga pela net um brutal ódio às mulheres e
revela desejos de vingança. Quem pode garantir que os massacres não são
incentivados por este discurso de ódio? (De resto, discurso de ódio contra as
mulheres é o que não falta pelas redes sociais.)
Não sei a resposta a dar a
estes ódios, e outros, que brotam publicamente. Mas sei que, não sendo solução
criminalizá-los, é irresponsável e cúmplice dar-lhes palco, estender-lhes
convites, normalizá-los, legitimá-los. Inclusive palco online. A maioria das
pessoas que usa a internet tem a mesma capacidade crítica sobre o que lê que
Homer Simpson tinha para a televisão.
Também é inútil tentar
conversar com radicais para os converter à sensatez. Lamento dar a notícia a
quem ainda não tinha percebido esta realidade. Devemos conhecê-los, vigiá-los,
mas é perda de tempo tentar recuperá-los. Os que aderem a estes movimentos têm
tendências tribais fortes e não são necessariamente permeáveis a factos e informação que contrariem crenças; pelo contrário,
fornecer informação, mesmo se contraditória, serve para reforçar as posições
iniciais.
Há sinais aqui e ali que vão no bom sentido. O Reino Unido proibiu há
pouco tempo a entrada a
agitadores de extrema-direita. Fez muito bem: não se devem importar temporariamente produtos
radioativos; são perigos de segurança pública. Tal como seria inaceitável
permitir a entrada a um conferencista islâmico que pregue o rancor ao mundo não
muçulmano sunita, ou que se estendesse a passadeira a um oficial norte-coreano
que explicasse como organizar campos de concentração para opositores políticos
ou ao guerrilheiro de extrema-esquerda que acumula com professor de explosivos,
também não há necessidade de receber estes provocadores carregados de mensagens
de ódio.
UM
COMENTÁRIO:
Carlos Martins M.: Lamento
informar mas é inútil conversar com pessoas como a Maria João Marques para que
sejam convertidas à sensatez. Temos simplesmente que a vigiar e desistir de a
recuperar, pois pessoas como ela têm tendências tribais fortes e não deixam que
as suas crenças sejam abaladas por factos e informação. Antes pelo contrário,
deturpam a realidade e manipulam a informação para que sejam consistentes com
as suas crenças. E assim vivem: patetas e felizes com a sua visão dualista e
simplista do mundo. A fim
de moldar a realidade para que esta seja consistente com as suas crenças, a MJM
tenta, num claro e patético esforço, colar o partido de Marine Le Pen aos
movimentos islâmicos extremistas que apelam à morte dos infiéis, aos atentados
covardes contra civis, à dominação das mulheres e à perseguição dos
homossexuais. Pessoas
sensatas sabem que o crescimento exponencial de partidos nacionalistas surgem
como reacção às posições ideológicas defendidas por gente da estirpe de MJM. O partido de Le Pen defende o proteccionismo
económico e a intolerância zero à criminalidade e à imigração não europeia. E,
por este motivo, entende MJM, na sua visão deturpada do mundo, que o discurso
de Le Pen é um discurso de ódio. Por oposição, o discurso do islamismo, do
socialismo e do comunismo é um discurso de paz. Pessoas
que defendem o silenciamento e a censura de opiniões divergentes deveriam ter
vergonha na cara de se chamarem democratas. Todos os ditadores e apoiantes de
sistemas totalitários acham que têm a razão do seu lado e que defendem ideias
nobres mas, como a história se encarrega de confirmar, estão profundamente
errados .E não há nada que me incomode mais do que ouvir pessoas profundamente
erradas que atacam a democracia e a cultura ocidental com o sorriso pateta de
quem se acha moralmente superior e não tem vergonha de demonstrar essa
arrogância publicamente.
III - Da patranha do aquecimento global
OBSERVADOR, 22/8/2018
Trump afirmou que o aquecimento global
era uma conspiração dos chineses para prejudicar a economia dos EUA. Quem se
atreve a duvidar do chefe do país mais desenvolvido e poderoso do mundo?
Nestes últimos tempos temos sido alarmados com os efeitos do
aquecimento global e da mudança climática, que ameaçariam o nosso futuro
confortável e a que temos direito. Tudo isto é obra de cientistas de todas as
nações, os quais, num conluio irresponsável, nos alarmam, sabe-se lá porquê,
sobre o que está e virá a acontecer ao nosso planeta.
Francamente! Lá porque a
concentração de CO2 e do metano na atmosfera aumentou para o dobro, querem
convencer-nos que o nosso querido clima está a aquecer e a modificar o regime
dos ventos, originando tufões e chuvas diluvianas. Que disparate! Tufões sempre
existiram (talvez não tão fortes…) e as chuvas torrenciais são normais
(ultimamente não tanto…) por esse mundo fora. Qual é então o problema? Por amor
à economia mundial aguentem! Não sejam piegas…
Os gelos dos pólos estão a
derreter, causando a subida do nível do mar? Que disparate! Quem é que não
reparou quando o copo do nosso gin tónico vem cheio com gelo até acima, o
liquido não transborda quando ele se derrete. Então?
E quando esses ecologistas tontos
que há anos nos alarmam, por exemplo, com a destruição das florestas tropicais?
Ora é muito mais útil e dá mais dinheiro que os terrenos desflorestados sejam
plantados com soja, que vai alimentar o gado, ( que produz metano que, por
coincidência, tem forte efeito de estufa), que dará a carne para os hamburgers
do país de Trump, o grande líder dos EUA. Quem pode duvidar?
As águas oceânicas estão a aquecer por causa do efeito de estufa?
Ora, ora, só vejo benefícios em ter água mais quente, para que os banhos de mar
sejam mais agradáveis, para nós e para os nossos queridos turistas.
Esses cientistas dizem que o
desaparecimento de inúmeras espécies está a causar uma extinção global
semelhante às do passado geológico. Tretas, caros cientistas, então para que
servem os jardins zoológicos? E porquê essa preocupação em salvar uns
tantos bichos e plantas que não servem à nossa economia e que qualquer cidadão
normal nunca viu, a não ser, talvez, na televisão?
Isto são apenas alguns exemplos
que provam que o aquecimento global é uma grande patranha e que a nossa vidinha
vai continuar como sempre. Era o que faltava que assim não fosse!
Não esqueçamos que o presidente
Trump afirmou que o aquecimento global era uma conspiração dos chineses para
prejudicar a economia dos EUA. Quem se atreve a duvidar do chefe do país mais
desenvolvido e poderoso do mundo?
Deixei para o fim o meu principal argumento. Alguém acredita que os
governos da grande maioria dos países do mundo, ao continuarem a comportar-se
como têm feito até hoje, produzindo e usando mais viaturas, gastando mais e
mais hidrocarbonetos, explorando mais campos petrolíferos, poluindo rios e
oceanos, consumindo cada vez mais recursos desejando nos seus programas
políticos sempre maior crescimento económico, sem olhar a meios, estarão
errados? Esqueceremos nós que esses governos são compostos pelos melhores e
mais sabedores cidadãos, livremente escolhidos pelo povo? Sendo assim, não temos
o direito de duvidar das suas decisões que serão, certamente, as melhores para
o futuro da Humanidade.
Continuemos, pois, a viver a nossa vidinha sem preocupações, como
temos feito desde há séculos, até porque nem conhecemos os nossos bisnetos.
DOIS
COMENTÁRIOS:
Feliz José
Santos: Tudo perfeito excepto uma coisa: não são os governos
que usam carros e poluem, são os cidadãos. Somos nós. E é esse o problema. O
Trump é apenas mais um triste epifenómeno.
victor guerra: Trump ainda não está
na Casa Branca, há dois anos e já é o responsável por todos os problemas da
alteração do clima, se é que existe, numa série estatística longa. Mais, Trump
saiu do Acordo de Paris e bem, porque a América iria pagar centenas de milhões
por ano, para que os grandes poluidores - China, Índia, Rússia - fazerem o
"ajustamento" até 2025.
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