terça-feira, 19 de junho de 2018

Poverini



Às vezes - para responder a um comentador de Pacheco Pereira muito “bravo” com este, e que transcrevo após o texto de JPP - também eu me sinto “brava” e discordante, pelo seu contributo maquiavélico no desenrolar das políticas, que, com a sua agudeza mental, proporcionou o desvio do recto caminho, qual Nero em arroubo lírico, declamando poemas perante as chamas de Roma, por ele mandada incendiar. Nunca esquecerei a proposta fraudulenta, naquela Quadratura do Círculo de 2015, proposta explicitada mansamente, um papel e uma caneta surgindo subrepticiamente, qual carta na manga, após a vitória do PSD, demonstrando, sem qualquer problema de consciência, que a vitória cabia à esquerda, em sugestão da aliança, que A. Costa e seus comparsas não deixaram de captar, indiferentes quer a critérios de esperada honestidade, quer a uma reconstrução pátria, iniciada por Passos Coelho, no sacrifício de todos, e que mesmo assim lhe deram a vitória quatro anos após as primeiras eleições ganhas. São águas passadas, comprovativas da nossa passividade de povo abúlico, - só o não sendo no esmolar - que aceitámos a perfídia sem grande protesto, já habituados a uma anterior receita de perda territorial, e na retoma de um abril de permanência hoje, JPP, repimpado no seu trono espaçoso de sibarita, que, ao que parece, já poucos engana, como o prova o comentário de nelsonfari, que o conheceu e lhe traça o retrato.
Mas neste caso do PR, julgo que José Pacheco Pereira, ao ser tão agressivo, deseja apenas obstar ao ridículo de um encontro efémero, entre um homem que procura obter uma mezinha para o seu país e outro que cumpre forçadamente o protocolo, sem qualquer firmeza ou interesse em aceder a pedidos de um país que nem reconhece, nem lhe importa conhecer, e mesmo que conhecesse não se lhe dava de o ignorar a seguir, como tem feito por aí. No caso do PR, trata-se de uma questão económica que o leva a engolir o sapo, embora, tontamente, julgue que poderá ter algum peso o aperto de mão da pose fotográfica, que também a mim me envergonha. Por isso, acho o texto de José Pacheco Pereira bastante engenhoso na sua mordacidade, de intelectual que põe o dedo na ferida do seu – e nosso – repúdio envergonhado.
Quanto à Carta ao Director, de Rui Silvares, (Cova da Piedade), concordo em absoluto com o retrato que ele faz de uma mocidade de repente liberta de alicerces presentes e  futuros, educada no mimo e na liberdade, sem controlo, da sua própria projecção social, como público a quem a sociedade dos adultos interesseiros explora a cupidez, a gulodice e a vaidade, - pelos inúmeros truques da sua própria ganância comerciante - a que os pais impotentes não deixam de aceder, para satisfazer a sua própria paz familiar, ou as suas toleimas, numa sociedade cada vez mais sem alicerces, como bem comprova o excelente texto de Rui Silvares.

OPINIÃO
Não se ponham a dançar em conjunto
Lembre-se, que, quando Trump for para dentro da Casa Branca, entre o último aperto de mão e a porta, ele já se terá esquecido de tudo, do seu nome, de Portugal, de tudo. Mas nós não.

16 de Junho de 2018
Marcelo vai-se encontrar com Trump no final deste mês. É um encontro protocolar e normal entre dois Estados que têm relações diplomáticas. Não tem sentido pôr em causa que o encontro aconteça. Mas... o terrível “mas”...
Sabe-se que Trump não lê quase nada do que lhe é enviado pelos diferentes serviços e o resultado é que a informação que provavelmente lhe é dada antes do encontro com Marcelo deve caber em meia folha em letras grandes. A julgar pelos precedentes conhecidos deve incluir a transcrição fonética ou coisa parecida do nome de Marcelo, os pontos de litígio entre os dois países, com relevo para a Base das Lajes, e — e é aqui que as coisas se complicam — um perfil psicológico do Presidente português. A folhinha dirá coisas sobre os “afectos”, talvez sobre as selfies e a popularidade de Marcelo, aconselhará o Presidente americano a ser igualmente próximo e íntimo, como foi com Macron e Kim. Imensas palmadas nas costas, muita linguagem corporal. E essa sugestão será certamente seguida por um presidente que gosta da encenação e da coreografia. O problema é o... outro Presidente que gosta das mesmas coisas, Marcelo Rebelo de Sousa. Por isso, a tentação vai ser grande de andarem a mostrar como gostam um do outro e a usar o narcisismo e a vaidade para marcar pontos. Ambos. Durará uns minutos, mas será penoso de ver.
Trump não sabe nada sobre Marcelo e Portugal, mas Marcelo sabe mais do que o suficiente sobre Trump para nos poupar o espectáculo e reduzir a coreografia ao mínimo. Trump é um adversário da União Europeia, da OTAN, do sistema de globalização de que Portugal faz parte, dos acordos que Portugal assinou com os EUA e que este rompeu sem consideração por nada e sem qualquer política consistente que não seja a de agradar à sua “base” e ao seu ego. Trump é um perigo para a paz e a estabilidade mundial, um amigo demasiado próximo de Putin, Kim, Duterte, Erdogan, acabou por elogiar em termos entusiásticos o novo Governo italiano, apoiou Le Pen, os racistas ingleses e alemães, e de transformar o bom do Canadá em inimigo da América. A lista seria longa, mas aponta sempre para a mesma coisa: machismo, poder, autoritarismo, força e violência.
Quando Marcelo for ter com Trump, terá de ter em conta que a maior repercussão da sua viagem vai ser o tweet de circunstância que ele faz quando encontra os seus congéneres estrangeiros, no intervalo dos frisos de militares, bombeiros e polícias que ele gosta de colocar como paisagem de fundo, para além de Kim Kardashian. Não é até impossível que ele lhe faça um daqueles elogios guturais que costuma fazer, “nice guy”, “very clever guy”, vindo do “beautifull sunshine country, Spain. I’m sorry, Portugal”, “I love bullfights”, e inanidades do género. Pode até perguntar-lhe sobre as oportunidades de negócios imobiliários nas praias do “Mediterrânio”, e se Portugal também quer uma Torre Trump — “I’m joking, President Marcell”.
Senhor Presidente, o nosso, faça tudo para o evitar ter por perto. Mande aumentar a distância dos púlpitos. Deixe a promiscuidade para a alt-rightportuguesa, que tem bons contactos no “trumpismo”. Fale-lhe nos imigrantes que isso basta para o pôr maldisposto, e, quanto às Lajes, não vale a pena ter muita esperança, porque ele deve achar que “custa muito dinheiro” e ainda lhe pede que aumente a contribuição para a OTAN. Nada de bom para Portugal virá do lado de Trump, muito menos dos republicanos, e pouco dos democratas, e lembre-se que a mossa que Trump está a fazer às democracias também cá chegará, ou melhor, já cá está. Talvez repetir na América o discurso do 25 de Abril sobre o populismo tenha mais sentido.
Com Trump é preciso distância, cara cerrada, no máximo esboços de sorrisos, mais esgares do que esboços, com o ar mais enjoado do mundo. A chanceler Merkel faz isso bem. Trudeau e Macron andaram a bajulá-lo e saiu-lhes mal. Bem feito! Marcelo não deve, nem precisa de ser mal-educado, mesmo com o protótipo da má-educação que tem à sua frente, mas deve ter em conta que nos está a representar, e intimidades com Trump são um insulto ao povo português.
Lembre-se, que, quando Trump for para dentro da Casa Branca, entre o último aperto de mão e a porta, ele já se terá esquecido de tudo, do seu nome, de Portugal, de tudo. Mas nós não.
Um comentário biográfico
nelsonfari Portela-Loures 17.06.2018
JPP não engana ninguém. É e sempre foi um oportunista. Jovem revolucionário  -conheci muito bem esses tempos, senhor JPP, não me dribla. Deputado europeu, o tal que disse a Passos Coelho que tinha profissão... Snr. JPP quantas profissões tem hoje? Professor no ISCTE, comentador na SIC, cronista neste Jornal, uma gigantesca colecção de livros, jornais... Diz-se curioso...Uma curiosidade muito bem paga. À beira dos 70 anos continua a escrever crónicas que seriam um "must" há vinte anos...Tal como aquela crónica em que sobrevoa Portugal...É preciso saber envelhecer...Quem não sabe matemática dificilmente percebe o mundo...E Trump é o saco-de-boxe de muita gente...É como olhar para o dedo e não para o firmamento...Trump é a consequência não é o problema...É a economia, estúpido...
OPINIÃO
CARTAS AO DIRECTOR
NOTAS PARA UMA REFLEXÃO
PÚBLICO, 16 de junho de 2018
Os professores perderam autoridade na sala de aula e os encarregados de educação perderam-na na sala de jantar. Há um desprezo generalizado pela experiência de vida, cada vez mais substituída pelo Google, esse oráculo infalível capaz de todas as respostas em fracções de segundo. Os velhos são descartáveis, são chatos e não encontram um lugar confortável na hierarquia social do mundo contemporâneo.
Por outro lado, a voracidade consumista alcandorou os putos à categoria de consumidores. Desde que são capazes de influenciar os hábitos de consumo passaram a ser levados a sério. Na maior parte das situações passaram a ser levados demasiado a sério. As sociedades actuais tendem a valorizar os designados direitos do consumidor em detrimento dos direitos de cidadania. São coisas diferentes e nem sempre compatíveis. Não é nada extraordinário ver putos a berrar porque sim, a falarem por cima dos pais, a reclamarem tudo e nada só porque lhes apetece. E porque podem. Educamos as criancinhas num vazio de valores que tudo relativiza. E os encarregados de educação, muitas vezes porque perderam o pé, encontram nos professores os bodes expiatórios perfeitos para diluírem as suas próprias insuficiências.
Vivemos na sociedade da casa dos segredos e dos brunos de carvalho; uma sociedade boçal, carente de valores que possam irmanar-nos. Perdemos a religião enquanto factor unificador e não fomos capazes de a substituir por nada. A Ética não faz sentido sem uma divindade capaz de castigar os maus e premiar os bons. Ficou o consumismo. O resultado é o que está à vista. Mais adiante nem daremos conta que já não somos livres. Nem nada que se pareça.
RUI SILVARES, Cova da Piedade




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