terça-feira, 12 de setembro de 2017

Malhar em ferro frio


A inutilidade das sentenças! Mas, como sempre, é um prazer ler estes artigos de António Barreto, embora acabemos sempre em outras sentenças finórias, como a do “fazer ouvidos de mercador” que nos define, atidos àquela outra do “bem prega frei Tomás”, mas, definitivamente, no “depois de casa roubada trancas na porta”, ou mesmo, na desportiva, nessa do ”atirar para trás das costas”, porque “o que for soará”. Mas deleitemo-nos com este “mais do mesmo”, “o X da questão” do nosso “ver-se à brocha”, ou, mais elegantemente, o “ver-se grego” na “Via Sacra” da nossa amargura.

A morte fortuita
ANTÓNIO BARRETO
DN, 10/9/17

Os incêndios florestais de 2017, especialmente os de Pedrógão Grande, entraram para a história. Os mais de 65 mortos deste desgraçado Verão ficam nos anais do último século. Há por esse mundo fora, em área ardida por exemplo, outros fogos mais graves. Mas pelo número de vítimas já figuram entre os mais mortais de todos.
Não só por esse motivo mas também pela descoordenação e pela imprevisão, caso contrário não haveria este número absurdo de mortos. Pela incompetência. Pela falha dos sistemas de comunicação. Pela incerteza criada com as mudanças de dirigentes de última hora. Pela incerteza da autoridade e da distribuição de responsabilidades. Pela confusão na aquisição de telecomunicações, de carros, de helicópteros e de aviões. Pela insuficiência de serviços profissionais. Pela tentativa de dissolução de responsabilidades. Pela desordem na organização dos apoios à reconstrução. Pela trapalhada na gestão dos donativos. Tudo falhou: o antes, o durante e o depois. E só a recordação das centenas de bombeiros a trabalhar em sofrimento impede de ser ainda mais severo.
Estes temas são sempre políticos. Porque é a política que permite organizar a segurança, socorrer, criticar e corrigir. Infelizmente, os responsáveis, em defesa própria, tentaram afastar a política. E acusaram a oposição de "fazer política". Esta quis defender-se, mas não escondeu o ar rancoroso. O PSD e o CDS não perderam o tom ressabiado, à espera de ver sangue para gritar ao lobo. Não houve debate sério. O Bloco e o PCP, que quase sempre abordam assuntos difíceis, desta vez, com receio de ferir o seu governo, calaram-se.
O clima de desconfiança cresceu, alimentado pela gestão infeliz dos dinheiros da solidariedade. Não se sabe onde estão. Recomeçar a vida? Reiniciar actividades comerciais e industriais? Reconstruir as casas? Todos os dias chegam aos jornais e às televisões queixas de cidadãos a perguntar pelos apoios e a garantir que nada chega. Serão só boatos? Sucedem-se os comunicados de várias entidades, o que só aumenta o descrédito. Nem sequer é provável que haja roubo, mas tão-só incompetência, tentativa de protagonismo e luta entre medíocres autoridades.
Como é evidente, todo este assunto é profundamente político. Da prevenção aos sistemas de protecção, da organização da sociedade e das autarquias aos investimentos, das compensações aos subsídios e à reconstrução: há políticas por todo o lado. Política no sentido de escolhas e de opções fundamentais. Infelizmente, não tivemos essa política. O governo calou-se e criou um ónus moral sobre todos, acusando de oportunista quem pretendeu debater. Culpado da desorganização, o governo não quis analisar e tomar responsabilidades. Ainda tentou garantir que responsáveis eram os governos anteriores, mas também aí recuou, quando percebeu que o governo de Sócrates e Costa estava incluído. Na verdade, o maior esforço do governo consistiu na procura do esquecimento. E na tentativa de mostrar que as mortes eram inevitáveis. Ou antes, fortuitas.
A estratégia foi a de afirmar que qualquer discussão do assunto era "fazer política" e "aproveitar". Com os sentimentos de culpa do PSD e do CDS, com os silêncios dos autarcas que não se querem comprometer e com a abstenção do PCP e do Bloco, não haverá responsabilidades nem correcção dos sistemas de ordenamento e de prevenção. A não ser que qualquer coisa mude. A não ser que os 65 mortos tenham sido a conta necessária para comover o país.
Porque estes problemas são sempre políticos e é necessário, acima de tudo, ajudar e corrigir, esperava-se que o Parlamento e outras instituições reforçassem o seu empenho na tentativa de resolver. Mas não. Praticamente toda a gente se limitou a defender os seus e acusar os outros. Como adeptos ou fiéis, sem liberdade nem pensamento. Nem sentido do dever.

As minhas fotografias
Torres Gémeas de Nova Iorque em 1978. Eram assim as torres. Faz amanhã 16 anos que um bando de terroristas, fanáticos políticos e religiosos, financiados por senhores do petróleo e por Estados islâmicos milionários, atirou dois aviões contra estas maravilhosas torres, matando cerca de três mil pessoas e marcando o novo século XXI que começava então. Já tinha havido terrorismo em muitas épocas e em vários continentes. Mas este atentado abriu uma nova fase da história. Como se tem visto até hoje. Houve imbecis na Europa que declararam, com um sorriso superior, que os Estados Unidos "estavam mesmo a pedi-las". Houve loucos que no Próximo Oriente saíram à rua para dançar e festejar essa "grande vitória". Houve idiotas que para desculpar os terroristas dissertaram sobre "as causas sociais" dos atentados. Houve dirigentes políticos, a começar por George W. Bush, que em resposta não foram capazes de evitar erros atrás de erros e contribuíram para o aumento da violência e do terrorismo. 
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