Uma crónica de Maria João
Avillez que resultou em inúmeros comentários, de que extraio alguns. Se não
servem para corrigir pecadilhos na floresta de enganos da nossa orientação
governativa, para efeitos de um historiar futuro, atento e objectivo, poderão também
contribuir para acentuar o mito da eterna nau catrineta que o anjo ou o Sebastião
da crença virão salvar um dia. Pessoas crédulas e pacientes, continuaremos
sempre a acreditar na nossa nau, é com ela que vivemos, é a ela que prezamos,
com as solas de molho da nossa fome continuada, saecula saeculorum, que outros povos vão saciando, quais sebastões
de agora.
Habilidade? /premium
OBSERVADOR, 17/10/2018
Releia-se a espantosa carta de Costa a Negrão, repare-se no seu tom
ditatorial, pasme-se sobre o seu acinte, e perceber-se-á porque evoco o passado
recente socialista. Perceber-se-á ao que chegámos.
1. O
primeiro round foi ganho: que melhor do que apanhar um país desprevenido num
fim de semana com Fátima, futebol e Leslie para despedir quatro ministros de
uma assentada? A surpresa política, forte, convenhamos, só iludiu porém os
distraídos,
Ao ter metido tudo no mesmo saco, relativizando e desqualificando os
pesados casos que tinha pela frente, António Costa exibiu aquela leveza de
pensamento e comportamento de quem tudo se permite por se achar incólume,
talvez mesmo acima do bem e do mal. Chamam-lhe “habilidade”. Grande parte da
plateia aplaude mas repare-se na leveza: ao fim de um longo folhetim indecoroso,
a questão de Tancos — que arrasaria qualquer governo pela gravidade da sua
dupla natureza militar e política foi publicamente transformada pelo
primeiro-ministro na ressurreição do seu próprio Executivo. Despejou-se o
titular da Defesa à mistura com outros que (afinal?) urgiam ser despejados e
eis, do pé para a mão, um governo, “novo”, “fresco”, “combativo”. Pronto para
tudo, que o governante está atento à felicidade dos governados e quis
demonstrá-lo. Pronto para tudo e apto para tudo: não é verdade que veremos
alguns dos seus membros defender politicamente um Orçamento de Estado que eles
não fizeram, nem leram, mas do qual passam a ser os responsáveis, amanhã ou
depois?
2. À
primeira vista foi isto mesmo, um bom número político: houve bravos da plateia
socialista, genuíno espanto dos compagnons
de route e no tal país mais distraído – ou que
intencionalmente se refugia na distracção – ouviram-se hinos (que carecem de
reciclagem) à habilidade de Costa. Apanhada pela minha própria surpresa
na Madeira (onde Leslie, amavelmente, não impediu o quente mar, o sol e o grato
usufruto de jardins encantados) concluí porém que quem arreda assim Defesa,
Economia, Saúde, Cultura, emite alguns sinais de apreensão. O político António Costa leu os sinais
vermelhos, mas uma boa percepção política das coisas não é o mesmo que saber
domesticar uma governação que reclama poder de decisão e escolhas seguras, o
que a bicuda circunstância geringoncional e as cedências a que obriga, têm
quase sistematicamente impedido. Não é raro que o político e o
governante descoincidam. Basta aliás reparar que enquanto o político gozava a
vitória da sua jogada de antecipação, o governante era obrigado a pescar os
seus novos reforços onde podia: nas suas próprias águas. Viva a gestão do dia a
dia com amigos fieis.
3. Tudo isto acabará mal, vem nos
livros, virá nas urnas. Poderá porém acabar pior – e este é hoje o meu ponto –
quando a crescente arrogância do político, o abuso do tudo se permitir, ou a
suas habilidades, comecem a parecer-se demasiado com o passado recente do PS.
Exagero? Releia-se a espantosa carta
de António Costa a Fernando Negrão, repare-se no seu tom quase ditatorial,
pasme-se sobre o seu acinte, e depois perceber-se-á o que quero dizer quando
evoco hoje o passado recente socialista. E sobretudo perceber-se-á ao que
chegámos.
4. A necessidade de mimar a “cultura”
que acode ao espírito de todo e qualquer político na véspera das “suas”
eleições, precisava agora de melhor expressão e maior sedução. Vai ser preciso
fazer barulho e fazer de conta: que há o dinheiro que não há, que há a
consideração rendida do poder para com o universo cultural, que raramente há.
No abrir de porta de um ano triplamente eleitoral a démarche do poder para com
a cultura será mais viva, simulará ser mais generosa e parecerá estar mais
atenta: a grande família cultural da
esquerda tem de ser levada ao colo. Menos pelo que simboliza, mais pelo seu
ilimitado poder mediático. Não sei o que desgosta mais: se testemunhar
um poder político que se irá prestar a esta encenação em nome da caça ao voto;
se ver alguma gente respeitável — e culta — participar no espectáculo com o
elan e o empenho que se usa quando as coisas são sérias.
5. Os últimos serão os primeiros:
dificilmente se discorda da escolha de João Gomes Cravinho para a massacrada
Defesa. Tudo abona em seu favor, tudo parece recomendá-lo para o cargo -como
num certo sentido tudo desaconselhava o seu antecessor. João Gomes Cravinho
possui desde logo o entendimento da delicadeza da sua missão, oxalá possua
igualmente a autoridade e a vontade política de remover o joio e salvar o
trigo. O passado indigno que herda pô-lo-á à prova mais que os outros,
dele espera-se esse “muito” que é a certeza de acabar com Tancos de uma vez por
todas. Com isso redimindo quem deve ser redimido, punindo quem deve ser punido
e desagravando o país, durante longos meses tomado por parvo.
COMENTÁRIOS:
: A acusação de Costa a Negrão é rasteira e
baixa. Após uma decisão em instrução que considerou não existir matéria para
julgamento e levar ao arquivamento do caso, Costa mantém a suspeita e usa isso
para atacar Negrão. A decisão do tribunal nada serve a Costa que não
aceita nem acredita na justiça. Mas este não é um procedimento de Costa. Isto é
o procedimento habitual da esquerda, nomeadamente do PS, onde se continua a
invocar o "crime" dos submarinos, o "crime" da Tecnoforma e
mais uns tantos "crimes" que o Tribunal absolveu ou nem julgou. É
como se "os esquerdas" tivessem uma força superior de justiça, que se
sobrepõe aos próprios tribunais.
: Lendo
este artigo de MJA, fica-se sem perceber se é uma crítica, se é um aplauso. Que
Costa é habilidoso, malabarista e domesticador de caniches de extrema esquerda,
todos já sabemos. Mas o texto não dá uma única pista sobre o que terá feito de
errado. Não seria melhor falar dos secretários de estado que meteu no governo
sem terem habilitações e perfil para o cargo, como o saltitante Galamba?
:
Costa, o Habilidoso. Costa vive
fascinado com este cognome, que lhe foi dado pelos comentadores do regime, que
exultam com a sua "habilidade" e lhe permitem tudo, mesmo as práticas
mais censuráveis e eticamente reprováveis no mundo das pessoas civilizadas.
Para estas, a "habilidade" de Costa não é mais do que aquilo que
antes tinha outros nomes, menos prosaicos: má-educação, cinismo, arrogância,
ganância, intolerância. No fundo, a "habilidade" de Costa é tudo
aquilo contra o qual a esquerda luta com a sua eloquência, mas pratica no seu
dia-a-dia.
Ser Costa é ser habilidoso. Ser habilidoso, no mundo de Costa, é ser
falso e manipulador. É afastar os adversários (inimigos...) e humilhá-los
(basta ver o desdém de Costa para com Passos ou Seguro). É criar uma corte de
bajuladores que, no comentário, na política, na cultura e no desporto, idolatra
e faz idolatrar o guru Costa. É manipular os seus "parceiros
geringonços", anulando-os e tornando-os irrelevantes sem que eles,
iludidos e fascinados, se apercebam que são meros piões num caminho de poder
pessoal que é evidente para quem está de fora.
Se a troca de cartas com Negrão tivesse sido com alguém do Governo
anterior, o que seria? Essa carta, com ameaças veladas e cínicas do chefe
Costa, é uma demonstração de um carácter miserável, de uma sede de sangue
invulgar e de um cinismo exponencial. Mal se falou disso. E os comentadores do
costume nem sequer tocaram nesse tema. Se fosse com outro, seria
dizimado.
A "habilidade" de Costa será a nossa desgraça. Mas, mais uma
vez, quando dermos por isso, já ele estará em Paris ou noutro paraíso qualquer.
Agora, neste momento, somos obrigados a viver fascinados com o chefe do gangue
e o seu séquito de seguidores e estamos destinados a aplaudir um orçamento que
nos cega pelas migalhas que agora nos dá, que pagaremos no futuro, com juros e
com o inevitável recurso à ajuda externa. O (des)governo de Costa não é mais do
que uma remodelação do (ainda maior des)governo de Sócrates. As caras são as
mesmas. As práticas são as mesmas. Os vícios são os mesmos. A ganância é a
mesma. A desfaçatez é a mesma. O Galamba é o mesmo.
Por cá perde-se a energia em problemas de segunda -embora seja clara a
negligência de Costa no assunto Tancos - mas a nossa sorte joga-se lá fora. É
preciso preparar o barco para a tormenta que se avizinha. E não se tem feito o
trabalho de casa. Mas existem razões: a Alemanha amarrou Portugal à
circunstância aberrante de termos gerado um segundo Ronaldo, o Centeno, et pour
cause devemos ser bons alunos, seguidistas, sem resolver o problema da pobreza
que atinge perto de 25% da população, da ferrovia quase inoperacional. dos maus
tratos dados ao SNS.
Os partidos políticos vivem bem com os rendimentos auferidos
através da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos, gerando uma massa
populacional que vive de favores do Estado e pratica actos de corrupção. Sem
excepções. Uns mais do que outros. E luta-se no dia-a-dia pela conquista de
posições no Aparelho de Estado.
Olhe-se o mapa da Europa e veja-se que os países do Leste têm de ano
para ano subido as suas posições relativas em termos de convergência e
Portugal, em 28 ou 27 países (Brexit diminui o número) ocupa, em termos da
posição do pib per capita em termos de paridade do poder do compra a 23ª.
posição. Não nos encham a cabeça com esta mentira do crescimento: crescemos mas
os outros crescem mais que nós.
: Só
mesmo a Maria João Avillez para descrever o maior mestre da gestão “do dia-a-dia”.
Que, mais do que um grande habilidoso, é mesmo um político muito perigoso.
Desde logo, porque consegue disfarçar a “crescente arrogância do político”,
e o “seu tom quase ditatorial”, que muitos insistem em ignorar. Mas pior,
comparam o novo líder da oposição com este perigoso habilidoso. Se há um
ministro que deve ser remodelado é o “primeiro”. Quem não percebe ou não quer
perceber, e continua a combater o actual líder da oposição, está a fazer o jogo
da reacção, e de todos nós parvos.
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