O Público de 9/9 contém um Editorial de Manuel Carvalho – “O caso “estranhíssimo”
visto pelo professor Cavaco” – condenando
a intervenção de Cavaco Silva, na sua
censura à exclusão de Joana Marques Vidal de um segundo
mandato de PGR feita por este governo de Marcelo
e Costa. Tal intervenção mereceu
a MC duras críticas, não só pelo clima
de suspeição criado em torno da nomeação de Lucília
Gago, como pelo que significa de falta de ponderação e recato exigíveis a
um ex-Presidente, o que atrairia, naturalmente, os doestos de parceiros
ideológicos contra o ex PR, embora também ali surgissem pareceres positivos,
como o que transcrevo, por comungar com idêntica opinião:
OldVic: Dei-me ao trabalho de ler todos
os comentários e confirmei a minha previsão inicial, feita logo que li a
coluna: Cavaco ia ser atacado por quem é e não pelo que fez. Um governante
vindo de origens humildes que teve uma carreira política de sucesso única na
nossa democracia e que nunca passou a mão pelo pêlo das elites instaladas foi,
é e será sempre um intruso a abater, seja lá de que maneira for. A oligarquia
só admite membros e convertidos à causa oligárquica. A oligarquia gosta muito
mais de Sócrates do que de Cavaco, até porque paga muito menos as consequências
dos desmandos de Sócrates do que o resto da população. São as “elites” que
temos, pobres de nós.
Mas no Observador a condenação
de Marcelo Rebelo de Sousa feita por
Cavaco Silva, a respeito do mesmo caso, é tratada mais airosamente por Miguel
Pinho, com a necessária dose de humor e não resisto a transcrever o
texto e bem assim alguns dos comentários pró e contra.
Marcelo, Cavaco e o silêncio de Bento XVI /premium
OBSERVADOR, 3/10/2018
Marcelo gostava que Cavaco se
retirasse para um mosteiro, como fez Bento XVI depois de deixar o seu cargo.
Porque o ex-Presidente representa a direita que votou nele apenas por não ter
alternativa.
Se dependesse de Marcelo Rebelo
de Sousa, o seu antecessor seguiria o santo exemplo de Bento XVI: depois de
deixar o cargo, teria recolhido para um mosteiro e para uma vida de oração e
silêncio. Aliás, pensando bem, não seria preciso tanto: a parte da oração
era dispensável — bastava o silêncio.
Decididamente, o Presidente da
República actual não gosta que o Presidente da República anterior fale, mesmo
que da sua boca saiam frases que não incluem as palavras “Marcelo”, “Rebelo” ou
“Sousa”. Depois de Cavaco Silva ter descrito a não recondução de Joana Marques
Vidal no cargo de procuradora-geral da República como “talvez a mais estranha decisão da geringonça”,
Marcelo Rebelo de Sousa decidiu colocar o seu corpo presidencial entre Cavaco
Silva e António Costa e assumir que, de alguma forma, era ele quem estava em
causa naquela crítica e não o primeiro-ministro: “A nomeação da
procuradora-geral da República foi uma decisão minha e de mais ninguém.
Portanto, o que me está a dizer é que o Presidente Cavaco Silva, no fundo,
disse que era a mais estranha decisão do meu mandato”.
Qualquer pessoa fica tonta com
esta pirueta retórica, que pretende colocar um nevoeiro onde havia clareza e
transformar uma acusação numa insinuação. Depois de virar a frase de Cavaco
Silva contra si mesmo, Marcelo optou por falar sem falar e por dizer sem dizer.
A frase “Entendo que não devo
comentar nem ex-Presidentes, nem amanhã, quando deixar de o ser, futuros
Presidentes, por uma questão de cortesia e de sentido de Estado” é
um código pouco elaborado para Marcelo comentar o comportamento de Cavaco ao
mesmo tempo que assegura não o estar a comentar. É um piscar de olho imaginário
a quem o ouve: como diria alguém, “vocês sabem que eu sei que vocês sabem que
eu sei”.
Deste episódio — e de outros semelhantes —
sobra uma constatação: Marcelo Rebelo de Sousa não gosta que Cavaco Silva fale
porque qualquer coisa que o ex-Presidente diga, mesmo um simples “bom dia”,
parece uma crítica (e muitas vezes é) ao actual Presidente. E esta constatação
força-nos a procurar uma pista: porquê?
Sim: porquê? Porque é que mesmo
um perfume de crítica, vindo de Cavaco Silva, incomoda tanto Marcelo Rebelo de
Sousa, levando-o a explicar-se e a responder? Talvez por causa disto: Cavaco representa a direita que elegeu
Marcelo apenas porque, na ausência de alternativa, preferiria qualquer pessoa a
Sampaio da Nóvoa. Essa direita suporta Marcelo mas não o respeita, não o
compreende e, acima de tudo, não confia nele. Acha que o Presidente tem convicções
a menos e jogo de cintura a mais; acha que fala quando não deve e cala
quando não pode; acha que se expõe muito e se resguarda pouco. Marcelo
sabe que, se tiver a mais pequena oportunidade de o abandonar sem entregar
Belém à esquerda, essa direita fá-lo-á sem hesitações nem remorsos.
Eu referi o silêncio de
Bento XVI, mas, na realidade, o Papa emérito já falou depois
de se retirar. E até comentou o seu sucessor: disse que “não tinha pensado
nele” para o lugar e que a sua escolha foi “uma grande surpresa”. Nisto,
Ratzinger e Cavaco concordarão: o ex-Presidente também “não tinha pensado” em
Marcelo para o suceder e, como se constata repetidamente, a escolha terá sido
“uma grande surpresa”.
COMENTÁRIOS:
Manuel Pinto: Na "democracia" que assaltou cá o sítio, no
tal Abril, vota-se, infelizmente, no mal menor. Assim tem sido e, vai continuar
a ser. Para quê estar a gastar "latim" antes do tempo. Esperemos
pelos próximos "redentores", decidindo-se seguir, quem parece menos
mal!!!
Alfaiate Tuga: Estão todos bem uns para os outros, o Cavalo foi PR
enquanto o 44 e os amigos andaram a rebentar com o país com negócios ruinosos
para o estado, mas este não viu nada nem sabia de nada, foi surpreendido pela
banca rota da mesma forma que o padeiro do meu bairro. Alguém que é presidente
da república tem obrigação de estar mais bem informado e alertar o povo para os
desvarios do governo. Também não se safa das negociatas com as acções do BPN e
do grupo de ministros e secretários de estado dos seus governos hoje a braços
com a justiça. O cata-vento é um Chico esperto, daí a alcunha encaixar como uma
luva, toda a vida foi funcionário público , não conheço nada que tenha gerido
ou liderado com sucesso, que currículo tem para ser PR? No meu ponto de vista
nenhum, por isso não teve o meu voto. Até ao dia que aceitou correr com a PGR,
via-o como uma figura bizarra que não tinha noção do ridículo, hoje vejo como
mais um que deve ter o rabo preso. A única justificação que vejo para não bater
o pé aos xuxas no caso da PGR, é saber que se o amigo Salgado fosse engavetado
este começava a cantar e entalava metade da classe política e jornaleira deste
pobre bocado de terra. Pensar que mais vale o povo viver na ignorância que
saber toda a verdade, talvez seja o pensamento deste PR e talvez o meu, pois
acho que, se se soubesse tudo, não
haveria gaiola para tanta gente e teria de ser a UE a enviar uma comissão de
gestão para a Tugolândia, talvez esteja a ser demasiado tremendista, mas com o
que se vai sabendo temo que seja a realidade.
Jose Almeida: Isto é
simplesmente ridículo. O PR insurge-se e com toda a razão. Quanto à frase do
Sr. Banalidades, o q esta diz é q a não recondução da PGR é a coisa "mais
estranha q a Geringonça fez"...?! Ora, portanto, tudo o resto q a
Geringonça fez na governação do país é pouco ou nada estranho? Normal?
Digno de apreço? Estranho é o q o Sr. "Q nunca se engana" diz. Viva a
Geringonça então.
Jorge Madeira Mendes -> Jose Almeida: Seja honesto. Cavaco
afirma não se lembrar de alguma vez ter proferido a frase "Nunca me
engano [e raramente tenho dúvidas]", e a verdade é que nunca ninguém
provou que ele a tivesse proferido. Em toda a aparência, tratar-se-á de
uma atoarda com que tentaram denegri-lo. Curiosamente, uma outra frase
(essa sim, verdadeiramente afrontosa) como "2017 foi um ano particularmente
saboroso", proferida por António Costa em relação ao ano em que se deram
os dois incêndios mais mortíferos da História de Portugal e em que ocorreu o
grotesco e inacreditável roubo de armas em Tancos, não fica para a História
(porque a esquerda, que você, aparentemente, apoia, é extremamente habilidosa a
denegrir os seus adversários, ao mesmo tempo que salvaguarda as suas própria
hostes). Por outro lado, acho que você não percebe nada do que lê. Quando
Cavaco diz que a não recondução da PGR foi a medida mais estranha da
Geringonça, isso significa que há outras medidas estranhas, de entre as quais
esta é a mais. Só se ele tivesse dito que era a ÚNICA medida estranha da
Geringonça é que se poderia concluir que tudo o mais era pouco ou nada
estranho. Percebeu agora?
ALBERICO LOPES: O actual presidente, a
quem já por mais de uma vez pedi para me devolver o meu voto, foi para mim a
maior desilusão e até a maior traição ao eleitorado que o levou àquele lugar!
Foi ele, juntamente com o Marques Mendes, o Pacheco Pereira e a Manuela F.Leite
e o Rui Rio quem, com as suas críticas constantes e ferozes e a maior parte das
vezes injustas contra Passos Coelho, permitiram que se formasse a geringonça e
o sr. Costa não tivesse sido corrido do PS e agora ande levar-nos de novo para
a bancarrota! Mas quando tal suceder, o dr. Marcelo não terá desculpas: ele
será o maior culpado!
José Filipe Fernandes: Preciso e conciso. Parabéns pelo artigo pois relata na
perfeição quem é este Marcelo. Não abdica
do protagonismo e mostrou, para quem ainda tivesse dúvidas, que faz parte plena
da geringonça. Por isso é que esta solução governativa se mantém em funções
depois de tantos e tantos erros que cometeu ( fogos florestais, Tancos,
Infarmed, saúde, CGD, BES,....). Já o ano
passado quando Cavaco falou na universidade de Verão do PSD, com duríssimas
críticas também a Marcelo, este empertigou-se todo, tal betinho de Cascais que
o é.
Joaquim Zacarias: MARCELO e COSTA estão mancomunados no objectivo único
de serem reeleitos. Só não vê quem não quer. Os aliados de um, são os aliados
do outro. Os adversários políticos do primeiro são os adversários do segundo. É
evidente que ao nível da linguagem tudo é dito de forma dissimulada, mas na prática
tudo é feito às claras.
Francisco Pinto: São estes
pequenos episódios que desmascaram a teia pensada, arquitectada e urdida pela
oligarquia para manter os privilégios e afastar personagens como Cavaco Silva
ou Passos Coelho.
E é óbvio
que Marcelo representa e defende essa oligarquia, como o tem feito com Costa,
mesmo que os episódios gravíssimos se repitam. E isso também explica a
exposição exagerada às selfies e aos afectos. Com abraços e beijinhos se
enganam os tolinhos
André Ondine: Eu iria mais longe
nesta análise. Marcelo não quer que Cavaco se cale. Quer que Cavaco fale. Para
depois o poder humilhar e aumentar a sua "popularidade populista"
junto a quem lhe interessa engraxar. Para Marcelo, a preocupação nem é tanto a
direita que Cavaco representa. Para Marcelo, o importante é cavalgar a onda
anti-Cavaco que está tão em voga, e que é tão bem alimentada e cultivada pela
elite política / comentadora / cultural que dita as novas tendências e que não
suporta (já o referi aqui antes) aqueles que não só não pertencem a essa dita
elite, mas também não se deixam condicionar por aquilo que a tal elite pensa ou
comenta. Esta gente despreza, humilha e faz bullying a políticos como Cavaco,
Passos Coelho ou mesmo António José Seguro. E cria vagas de fundo que acabam
por se tornar tendências. Hoje em dia, são poucos aqueles que, sem medo de
serem também humilhados, defendem publicamente qualquer um estes três políticos
(talvez Passos escape a esta tendência, mas também é visto pelos elitistas
urbano-pseudo-intelectuais como um provinciano). E isso é visível nos jornais,
no meio artístico, no meio académico e em muitos outros círculos que criam
tendências e movem influências, por vezes de forma perniciosa. É importante
dizer que Cavaco é uma esfinge, que Passos é parolo e provinciano e que Seguro
é também um provinciano sem carisma. Isso dá votos. Dá likes. É popular. É
populista. É Marcelo.
E Marcelo
sabe disto perfeitamente. Criticar Cavaco dá-lhe votos. Aumenta a sua
popularidade. Torna-o mais trendy junto à elite que lhe interessa bajular. Por
isso alinhou na trapaça de Costa com a Procuradora-Geral da República. Por isso
tentou rebaixar Cavaco. Por isso é o mesmo Marcelo de sempre. Afectuoso, mas
maquiavélico. Desleal.
Sinceramente,
nem concordo com Miguel Pinheiro quando este diz que Marcelo quer o silêncio de
Cavaco. Não quer não. Quer que ele fale. Para depois ser Marcelo. Para depois,
repito, pois não é demais referir, poder humilhar e rebaixar e cair nas boas
graças dos muitos Pedros Marques Lopes que por aí andam.... num caminho de
revanchismo pessoal, que arrasta consigo uma comunidade de ética questionável e
de interesses algo obscuros. É essa comunidade que, infelizmente, hoje produz
opinião. E Marcelo quer uma boa opinião para si. Nem consegue viver doutra
forma.
Nenhum comentário:
Postar um comentário