quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

“Quem a tem chame-lhe sua”

Quem livre quiser viver
Arrisca-se a ser descontente
Por falta das jantaradas
E até outras alcavalas
Que a sujeição às normas perpetradas
Nas fortes falas
Dos governantes,
Patrões ou amos impantes,
Costuma favorecer.
Assim o diz La Fontaine
Sempre bom observador
Dos homens do tempo de outrora
Que são os mesmos de agora,
Simulados em animais
Especiais,
Para entendermos melhor
A psicologia,
Pela universalidade
Da alegoria.
Eis a fábula sobre “a liberdade
Contraposta à sujeição

De O Lobo e o Cão

«Um Lobo não era mais que pele e osso
Enquanto os cães faziam boa guarda às casas.
Um dia encontra um Dogue belo, possante
Luzidio, anafado
Que por engano se havia extraviado.
Atacá-lo, desfazê-lo
Senhor Lobo fá-lo-ia de bom grado;
Mas era preciso guerreá-lo
E o mastim era de porte superior,
Capaz, pois, de se defender corajosamente.
O Lobo então aborda-o humildemente,

Entra em acordo, cumprimenta-o servilmente
Sobre o seu ar anafado, que admira com calor.
“- Não cabe senão a vós, belo Senhor,
O poder ser tão gordo como eu”,
O Cão lhe respondeu.
“Deixai o mato, fareis melhor:
Os vossos pares ali são bem miseráveis,
Autênticos cancros, pobres-diabos lastimáveis
Para quem morrer de fome é condição.
Senão, vede: nada têm de seu, nenhuma almoçarada,
É tudo à ponta da espada...
Segui-me. Tereis destino de barão.”
“- Que devo fazer então?”
O Lobo pergunta ansioso.
“- Quase nada, disse o Cão
Pressuroso:
“Dar caça às gentes que trazem paus,
Aos mendigos com caras de maus
Os da casa lisonjear,
Ao dono agradar...
O vosso salário assim será favorecido,
Com vitualhas enriquecido:
Ossos de frangos, de pombos,
Sem falar de muitos mimos mais.”
O Lobo imagina a tal doçura,
Que o faz chorar de ternura,
Dos petiscos e lambiscos

E outras coisas que tais.
Mas no caminho, repara no colarinho
Do Cão pelado no pescoço.
“- Que é isso?” - perguntou. “- Nada!”
O Cão respondeu.
“- O quê? Nada?!” “- Pouca coisa!”
“- Oiça! Isto agora é outra loiça!”

O Lobo exclamou em expressão mais grotesca.
“- O colar a que estou ligado
É certamente a causa do pêlo rapado
Do meu pescoço anafado,”
Respondeu o Cão formalizado.

“ - Ligado? - diz o Lobo admirado.

E retomando a expressão cavalheiresca:
“Vós não podeis então correr
Para onde quiserdes ir?
“ - Nem sempre, mas isso é pouco relevante.”
- Para mim é importante,
Tão importante
Que todas as vossas comezainas
Ou mesmo um tesouro
Eu não quereria a este preço,
De ter pelado o meu pescoço."
Isto dizendo, o Sr. Lobo
Dá às de Vila Diogo
E corre ainda
Pela planura infinda
Para ele linda...»

E a moral da história está subjacente:
Foi a que foi dita anteriormente
Sobre a liberdade como coisa bonita,
Com riscos é certo. Mas também digo
Que para se ser livre é preciso merecê-lo:
Respeitar e respeitar-se é bem mais belo.

Nenhum comentário: