Parece um estudo retirado de
um manual teórico, com as teorias todas certas, a orientar os cérebros dos
alunos – talvez por ser de um curso estrangeiro, de seriedade e competência.
Por outro lado, apesar de algum cepticismo, o tom geral é optimista, e isso o
afirmam também alguns dos seus comentadores aqui representados, sem parti pris. «O próximo passo», de Nuno
Bettencourt, um Estudante na Nova School Of Business and
Economics, surge-nos, assim, como um texto sem malícia, ainda puro de
conhecimento humano, e sobretudo da realidade portuguesa, expurgado, pois, dos entraves
habituais dos meandros que impregnam, geralmente, os nossos artifícios produtivos,
emperrantes de quaisquer bons propósitos, a começar na burocracia e a terminar
nos paraísos fiscais do nosso enriquecimento quantas vezes fraudulento.
Mas o texto de Nuno
Bettencourt é um copo de água fresca na aridez do nosso areal.
CRESCIMENTO
ECONÓMICO O
próximo passo
OBSERVADOR, 28/9/2018
O FMI prevê um crescimento potencial da economia Portuguesa, no médio
prazo, de 1,4%. Na
prática isto diz-nos que os Portugueses vão continuar a viver pior que a média
dos cidadãos da União Europeia.
A economia Portuguesa crescerá cerca de 2,3% em 2018, a taxa de
desemprego fixar-se-á perto dos 7% e o défice orçamental próximo dos 0,7%.
Estes indicadores representariam, em condições normais, uma economia saudável,
estável e promissora.
É neste contexto que o debate público se centra na especulação
imobiliária, no fim da gerigonça, no significado da Social Democracia do PSD e
pouco mais. É neste contexto de aparente serenidade e de relativo afastamento
dos holofotes internacionais, que a nossa classe política volta ao seu registo
comum.
Os mais responsáveis
discutem o ciclo económico, o ainda elevado peso do crédito malparado no
sistema financeiro, a crise dos mercados emergentes, o fim do quantative easing
e consequente aumento das taxas de juro, a guerra comercial e a tendência proteccionista
do comércio global. É
importante a preocupação quanto à resiliência da economia Portuguesa à
exposição a estas fontes de risco. Os sinais apontam para uma forte
probabilidade de ocorrência destes eventos e para uma vulnerabilidade
significativa da nossa economia. Neste sentido, seria de esperar que o debate
público se centrasse, pelo menos, na resposta a estas questões e na melhor
forma de mitigar os riscos referidos.
No entanto, mais assustador é o parco debate centrado em políticas de
crescimento. Por um lado, Portugal tem um PIB per
capita abaixo da média da União Europeia, semelhante ao da Eslováquia, e
inferior a países como a Eslovénia, a Lituânia, o Chipre e a República Checa.
Por outro, Portugal aparece, consecutivamente, nos rankings das melhores
universidades, do turismo, de diferentes desportos e da gastronomia. Portugal
tem dos melhores artistas, banqueiros, empresários, desportistas,
investigadores, médicos e até modelos do mundo. Faz algum sentido a discussão
sobre crescimento e qualidade de vida ser sempre tão superficial e inflamada por
interesses políticos?
O FMI publicou no passado dia 12 uma análise sobre a situação económica
do nosso país. Nesse relatório estima um crescimento
potencial da economia Portuguesa, no médio prazo, de 1,4%, em termos reais. Na
prática isto diz-nos também que os Portugueses vão continuar a viver em piores
condições financeiras do que a média dos cidadãos da União Europeia. Esta limitação é causada, em grande medida,
pelo facto de o crescimento por via do emprego estar a chegar ao limite
espectável. Perspectiva-se que em 2019 a taxa de desemprego venha a registar
mínimos do período pré-crise, o que conciliado com a tendência decrescente da
população activa (5,5M em 2008 vs 5,2M em 2017), sugere que o crescimento
económico causado pelo facto de mais pessoas estarem a trabalhar, vai alcançar
o seu limite a curto prazo.
Desta forma, o debate público deve-se centrar na melhoria da
produtividade do trabalho, quer por via do aumento do investimento, quer por
via da qualificação da força de trabalho. Este é o próximo passo.
Neste sentido, importa
referir que:
Portugal, com uma dívida
pública de 126% do PIB, é o terceiro país mais endividado da União Europeia,
atrás da Grécia e Itália;
O sector privado Português
também se encontra extremamente alavancado, com uma dívida de cerca 160% do PIB
em 2017, valor superior ao da Grécia e Itália.
Em particular, as famílias
Portuguesas têm um nível de poupança líquida (% rendimento disponível)
significativamente abaixo da média da União Europeia (-2,6% vs 3,6%, em 2017).
Estas factores, e tantos mais, demonstram que o investimento público e
privado nacional se irá manter limitado no médio-prazo. Assim, e embora se deva
debater políticas de aumento da poupança privada e da eficiência dos
investimentos públicos, é fundamental centrar o debate na atracção de
investimento externo.
A estabilidade social, o crescimento de sectores com grande potencial
inovador, o sector do turismo, a qualidade de vida, as infraestruturas, os
serviços tecnológicos e o talento são grandes atracções do investimento em
Portugal. No entanto, barreiras para o investimento externo como a incerteza
regulatória e fiscal e os elevados custos de contexto são entraves para os
investidores.
É essencial que o espectro
político nacional encontre consensos de longo-prazo em matérias como:
A taxa do IRC, e restante fiscalidade corporativa são factores que afectam
a competitividade das empresas Portuguesas. Na Irlanda, o imposto sobre
o lucro pode chegar aos 12,5% (25 % para o lucro gerado por actividades não
comerciais). Na Polónia, 19%. E na Hungria, 9%. Em Portugal, 31,5%. Assim,
políticas de longo-prazo que permitam a redução do IRC são essenciais para
atrair investimento externo;
Os agentes internacionais
consideram que a regulamentação e fiscalidade do mercado empresarial são
complexas e instáveis. É necessário simplificar, definir estratégias e
objectivos de longo prazo e comunicar com clareza;
O talento é, neste momento, o activo mais valorizado por investidores e
Portugal é visto como um dos países da UE com maior potencial. É necessário
promover a retenção de talento e o dinamismo do mercado de trabalho para atrair
investimento externo;
O sistema judicial é visto como um dos principais entraves para a
entrada de investidores internacionais. A complexidade, falta de transparência
e eficiência do sistema judicial são apontados como factores de pouca
atratividade da nossa economia. A sua reforma e modernização deve ser uma
prioridade para os agentes políticos Portugueses.
Desta forma, Portugal conseguirá tirar partido das qualidades já
referidas, bem como das oportunidades geradas pela incerteza política em
mercados como o Reino Unido e a Itália, a tensão social originada por
tendências populistas e o clima de insegurança em alguns países Europeus.
Outro ponto relevante é a qualificação da força de trabalho. Este
factor é, não só, um catalisador de investimento externo como, per si, também
contribui para a produtividade do trabalho. Como anteriormente referido, o
talento é hoje um dos activos mais valorizados a nível mundial e embora
Portugal seja presença constante nos rankings universitários das mais diversas
áreas, uma parte relevante dos jovens acaba por procurar outros mercados. A
retenção do talento parte, essencialmente, da dinâmica do mercado, do
desenvolvimento dos trabalhadores e das condições de trabalho.
A dinâmica do mercado é
catalisada, em grande medida, pela atracção do investimento externo
anteriormente discutida.
Por outro lado, as empresas
portuguesas também têm de assumir a sua responsabilidade nesta discussão. O treino
e desenvolvimento dos seus trabalhadores tem de ser uma prioridade para as
empresas que devem tirar partido da, cada vez mais ampla, oferta de programas
de executivos e outras iniciativas de qualidade. As condições de trabalho têm
de se aproximar da realidade europeia na mesma proporção que o talento
Português se tem aproximado dos melhores exemplos mundiais. Não faz sentido que
a geração dos 1000 seja eterna e que as empresas valorizem licenciaturas,
mestrados, doutoramentos e outras formações da mesma forma. As multinacionais
não podem ter uma disparidade salarial entre países muito superior ao natural
ajuste relacionado com os diferentes custos de vida. São as empresas de grande
dimensão que, muitas vezes, servem de benchmark para o mercado laboral e estas
têm um grande interesse na discussão.
Um dos aspectos de maior atractividade para investidores internacionais
é, justamente, o potencial de melhoria da produtividade, o que torna evidente a
clara simbiose entre os factores referidos. Assim, é necessário que o estudo
dos mesmos seja feito de forma integrada e transversal ao sector público e
privado.
Desta forma, daremos o próximo passo para que Portugal atinja o seu
potencial e se torne num dos melhores países do mundo.
Estudante na Nova School Of Business and Economics
COMENTÁRIOS:
Pedro Pinheiro Augusto: Genericamente, de acordo. Não concordo com a
insinuação que Portugal deva entrar na corrida dos paraísos fiscais para atrair
investimentos. A questão da produtividade está, como de costume, mal explorada.
Todos a querem aumentar, ninguém sabe bem o que é, nem como se aumenta. Acho
também alguma piada tanta gente que quer afastar o Estado da economia mas
defende que esta cresça por decreto, como é o claro caso do jornal Observador.
Continuação de bons estudos.
Eduardo Batista: O
sistema judicial é um dos principais entraves ao nosso desenvolvimento
nacional. Muitíssimo bem visto. Está na hora de começarem a ser julgados e
feita uma reestruturação do sistema de justiça. Sem uma boa justiça não existem
relações comerciais com futuro. Parabéns por este artigo!
Luís M.
Gagliardini Graça: Excelente
análise crítica e criteriosa, parabéns a um ainda jovem estudante que espero o
País saiba cativar.
Mosava Ickx Excelente,
arrasador! Esclarece
a situação de maneira brilhante e apesar de tanta clarividência ainda consegue
ser optimista. Eu, já
não consigo... Boa sorte!
victor guerra: O próximo passo, será os meninos da
escola luxuosa de Carcavelos, descerem à praia, a ver se a água está
fria. Estou a brincar, a sua análise da situação está certa. Obtenha
o diploma e emigre. Nem agora, nem nos próximos anos,
há
lugar para gente que pense objectivamente
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