Nos EUA, pais acorrentam filhos. Nós por cá, imitando, ao que parece,
desenvolturas europeias, mostramos a nossa elevada consciência de modernidade
para lorpas engolirem, em programações abusivas de insensatez, provocação e
miséria moral, na pretensão, ao que parece, de explorar perversões infantis - provavelmente
justificadas por perversões parentais e sociais - que alguns canais televisivos,
amorais e ávidos, impingem, no desrespeito absoluto pelo público, tal como
dantes se passava por canais de exploração sexual à disposição de todos os
utentes. Os textos abaixo – a EDITORIAL de DIOGO QUEIROZ DE ANDRADE e
seus comentadores, precedidos da Notícia sobre a SIC, com referência a críticas
da Unicef, ilustram o acontecimento. Repugnante.
Unicef subscreve críticas, SIC defende-se. Já
há queixas na ERC e Ordem dos Psicólogos
Comissão de protecção de menores considera que
o conteúdo do programa Supernanny, que este domingo se estreou na SIC, é
“manifestamente contrário ao superior interesse da criança". SIC rejeita
as críticas. No primeiro episódio, menor de sete anos é apresentada como o
“Furacão Margarida”.
15 de Janeiro de 2018,
EDITORIAL
Superabusivo
DIOGO QUEIROZ DE ANDRADE
Público, 17 de Janeiro de 2018
Não é preciso ter uma dose
demasiado elevada de bom senso para perceber os riscos de um programa que expõe
de forma tão abstrusa a privacidade de uma criança.
Um programa da SIC
decidiu trocar audiências pela exposição pública de crianças malcomportadas.
A Comissão de Protecção de Menores, o Instituto de Apoio à Criança e a Unicef
já criticaram o programa. Mas o show promete continuar porque é
um negócio em que, aparentemente, todos ganham: ganham os paizinhos que expõem
as crianças, ganha a estação com os anúncios que vende, ganha a psicóloga que
tem um cachet e
ainda impinge mais uns livrinhos aos incautos. Mas perde a criança e perdemos todos, porque a
degradação do espaço público é uma derrota da sociedade.
Teresa Paula Marques,
a psicóloga encartada que ganha dinheiro a explorar o direito à privacidade das
crianças neste programa, tem um percurso que garante solidez: já deu conselhos
nas revistas Teenager, Bravo e TVMais, para além de ter
participado em programas como o Muita Lôco e o Queridas Manhãs.
Não é que estas
polémicas sejam novidade para a SIC. A mesma estação já tinha humilhado uma
criança no programa Ídolos, para além de dar regularmente voz a tarólogas que
se aproveitam da ignorância alheia para sacar uns trocos e oferecer conselhos
tão esclarecidos como o de propor que uma vítima de violência doméstica mimasse
o seu agressor. Nada disto perturba a salomónica Entidade Reguladora para a
Comunicação Social, que assiste a tudo sem hesitações que não vão para além de
deliberações suaves pouco incomodativas. É a ERC, note-se, que tem responsabilidades de gestão
deste espaço público que é tão importante para a saúde colectiva — e é
importante recordar que as antenas televisivas são um bem público, devidamente
regulado e concessionado por um período limitado de tempo.
É certo que a gestão
de um meio de comunicação social com uma elevada componente de entretenimento
não é uma ciência exacta. Mas também não é preciso ter uma dose demasiado
elevada de bom senso para perceber os riscos de um programa que expõe de forma
tão abstrusa a privacidade de uma criança — que, ao contrário do que alguns
desejariam e muitos julgam, não é propriedade dos paizinhos, nem deve ser a
motivação maior para ganhar uns trocos.
O chavão dos “15 minutos de fama” a que todos têm direito já está mais
do que estafado, mas parece valorizar-se nestes tempos — em que até vão tendo
prioridade os que se aproveitam de quem não se pode defender.
Comentários vários:
LUSO
Diz o cronista de forma
afirmativa que este espaço público é importante para a saúde colectiva. Pois eu
direi, que se o é, as autoridades que superintendem nestas pindéricas
televisões são tal qual como os fazedores dos programas, pois todos os dias há
motivos para acabar com as vergonhosas televisões que temos. Se alguma coisa
baixou ao mais baixo nível da cultura, da instrução e da educação e da falta de
respeito em Portugal, foram estes transmissores de inutilidades, pondo de parte toda a deontologia que um
serviço de televisão exige. O que se vê, é dos mais rascas pacotes que se vêEm
Europa fora. Chamar-lhes comunicação já é favor.
Bruxelas
Acho interessante esta
polémica em Portugal sobre a emissão "Supernanny". Essa emissão
passou em França (e nos países francófonos com acesso à televisão francesa) e,
que se saiba, ninguém tugiu nem mugiu. Força!, é continuar!
Terra
Ainda bem que a ERC não
intervém. Não devia nunca intervir para proibir seja o que for. Isso é censura.
O que as pessoas deviam fazer era não ver o programa, por pudor. A SIC acabava
logo com ele. A responsabilidade não é da ERC, é dos espectadores que comem
qualquer coisa. Eu não vejo o programa.
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