De João Miguel Tavares,
contestando uma opinião de José Pacheco Pereira, enfadado com uma
comunicação social limitada a casos pontuais ou acidentais provocadores de
controvérsia, limitativa da acção do governo; de José Milhazes esclarecendo
sobre umas eleições russas com a especificidade dos truques para Putin continuar
no governo, este último texto vindo a dar razão a Miguel de Sousa Tavares,
ao alargar os domínios temáticos jornalísticos orientadores de opinião a outros
domínios sociais ou políticos. O próprio J.M.T. é exemplo de pessoa que pesquisa
e nos informa com o seu arrojo e trabalho jornalístico. Julgo que os considerandos
de P. Pereira resultam da posição superior em que ele se coloca, de
letrado apenas, que brilha e contesta, mas não se arrisca a assumir uma posição
de construtor num governo, podendo revelar fragilidades que lhe desmanchariam o
carisma. A opinião pública, limitada que seja, está sempre à coca - quer para destruir, quer para abençoar.
I- OPINIÃO O jornalismo está melhor – e isso é
óptimo
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 2 de Janeiro de 2018
Eu tenho a minha quota
parte de textos profundamente desiludidos com o estado da comunicação social
portuguesa. A desgraça de 2005-2011 é culpa dos políticos, em primeiro
lugar, mas também da comunicação social e do sistema de justiça, que se
portaram miseravelmente ao longo de toda a primeira década do século XXI. Com
ilustres excepções, foram demasiadas vezes moles, mornos e cobardes. Não
desempenharam o seu papel. Prejudicaram o país. Estranhamente, em 2017, apesar
de todas as dificuldades económicas e do estado preocupante dos grandes grupos
de media, senti, pela primeira vez em muito tempo, que alguma coisa de
significativo aconteceu. A maior parte dos jornais e das televisões começaram a
fazer jornalismo com mais acutilância e sentido de dever. E obrigaram o poder
político a dar resposta às suas notícias e às suas investigações.
Foi, por isso, com grande
espanto que li, no último texto de Pacheco Pereira, homem sempre
atento à comunicação social, uma crítica ao governo de António Costa e ao PS
por se ter deixado desgastar em 2017 “ao aceitar haver algum mérito em questões
casuísticas e anedóticas, mas mediáticas, que a oposição usa bem”. Pacheco
Pereira não esclarece exactamente que “questões casuísticas e anedóticas” são
essas, mas aproveita o embalo para dar o costumeiro pontapé nas canelas dos
media: “A questão é que à falta de questões de fundo e com uma comunicação
social muito limitada ao ‘caso’ da semana, explorado ad nauseam, seja ou não
importante, o Governo desgasta-se ao actuar ao ritmo dos jornais e televisões,
ou, ainda pior, das chamadas ‘redes sociais’.”
Esta frase incomoda-me
porque ela facilmente se confunde com a conversa do terrível jornalismo
populista (que nunca foi o principal problema do jornalismo português) e das
maldosas redes sociais, que também têm, como qualquer ferramenta, para além dos
abusos que todos conhecemos, inúmeras vantagens que os apocalípticos preferem
não ver. Dos incêndios de Verão ao roubo de Tancos, passando por casos
mais pequenos, mas muito significativos, como o da Raríssimas, aquilo que
assistimos em 2017 foi aos jornalistas a fazerem o seu trabalho, impedindo em
cada um desses casos, e em muitos outros, o Governo de assobiar para o ar. A
proliferação do fact-checking;
as explicações de temas complexos, seja a confusão na Catalunha ou o
funcionamento do Montepio Geral; a não-limitação de espaço do jornalismo online, que permite aprofundar os
assuntos; a amplificação dos casos nas redes sociais de uma forma positiva, ou
seja, gerando uma justa indignação pública em casos que são efectivamente
indignos (como ainda agora se viu com o financiamento partidário); tudo isto
tem feito bem ao país e à qualidade da nossa democracia.
Tenho dificuldade em
perceber o que quer Pacheco Pereira dizer com o seu lamento de um governo a
“actuar ao ritmo dos jornais e televisões”, porque a maior parte das vezes esse
ritmo de actuação significa apenas ter de responder publicamente às questões
que são levantadas pelos media no exercício do seu escrutínio – e esse, de
facto, é o dever tanto dos media como do poder político. O jornalismo português
não se tornou de repente o melhor do mundo. Mas parece-me, com todas as suas
limitações, que respira mais liberdade, tem maior consciência do seu dever e o
público responde em conformidade: sempre que há bom jornalismo, há leitores e
espectadores para ele. Que assim continue são os meus sinceros votos para 2018.
II- VLADIMIR PUTIN: Guerra
fria nas eleições presidenciais na Rússia
Mas o pior está para vir. Há
algum tempo atrás, a Rússia foi colocada, ao lado do Irão e da Coreia do Norte,
como ameaça aos Estados Unidos. Em Fevereiro, espera-se uma nova onda de
sanções.
A campanha eleitoral para
as presidenciais na Rússia não promete levantar dúvidas quanto ao candidato
vencedor, mas pode transformar-se em mais um campo de batalha entre
Washington e Moscovo. Os norte-americanos preparam-se para estragar a vitória
de Vladimir Putin.
Por enquanto, tudo corre
segundo o previsto pelo Kremlin. Nenhum dos candidatos ao cargo de Presidente
da Rússia tem capacidade de travar Vladimir Putin.
Alexei Navalni, o único
concorrente que talvez conseguisse trazer alguma combatividade à campanha
eleitoral, foi afastado da corrida pelos tribunais russos. Ele prometeu
recorrer da sentença no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem mas, mesmo se a
decisão chegar a tempo, nada fará mudar os planos de Putin, ou seja, manter-se
no poder pelo menos até 2024.
Pavel Grudinin, o
capitalista e milionário em que os comunistas russos apostaram para participar
na corrida eleitoral, irá tentar cumprir o papel que estava até agora reservado
a Guennadi Ziuganov, dirigente do Partido Comunista da Federação da Rússia, que
é ficar em segundo lugar no escrutínio e legitimar a eleição de Putin.
As organizações de
defesa dos direitos humanos e alguns órgãos de informação chamam a atenção para
o facto de, nalgumas regiões da Rússia, os cidadãos serem coagidos a dar a sua
assinatura de apoio a Putin (como o actual Presidente russo achou melhor não
ser candidato de alguma força política, para sublinhar a sua independência, ele
necessita de angariar 300 mil assinaturas, mas ninguém duvida que esse número
será em muito ultrapassado), as estações públicas de rádio e televisão não
param de sublinhar os feitos do líder, quase se esquecendo dos restantes
candidatos, mas a Comissão Eleitoral Central da Rússia considera que tudo está
a correr dentro da normalidade.
É importante recordar que
as eleições presidenciais foram antecipadas do Outono para 18 de Março para que
o escrutínio coincida com o 4º aniversário da ocupação da Crimeia pelas tropas
russas, mais um motivo para atiçar os “ânimos patrióticos” dos eleitores.
Mas Washington parece
mesmo interessado em estragar a festa a Vladimir Putin. A 11 de Janeiro de
2018, a Secretaria de Estado norte-americana aconselhou os cidadãos dos Estados
Unidos a não visitarem a Rússia, explicando essa decisão com “os riscos de
atentados terroristas e de agressões por parte dos habitantes locais, dos
funcionários públicos e órgãos de segurança”.
O Ministério dos Negócios
Estrangeiros da Rússia reagiu imediatamente, sublinhando que isso é feito
porque “se os cidadãos dos EUA vierem em massa à Rússia, poderão ver com
seus próprios olhos que não encontram nem encontrarão aquilo com que as
autoridades americanas ameaçam”.
Mas o pior está para vir.
Há algum tempo, a Rússia foi colocada, ao lado do Irão e da Coreia do Norte,
como ameaça aos Estados Unidos. Em Fevereiro, espera-se uma nova onda de
sanções, desta vez contra os círculos mais próximos de Putin. As autoridades
americanas ameaçam publicar uma longa lista de cidadãos e empresas russos
envolvidos em “enriquecimento ilícito”, “branqueamento de capitais” e noutros
crimes.
Esta ameaça está a criar um
clima nervoso entre políticos e homens de negócios russos. Por exemplo, a fim
de evitar sanções, o banco russo Alfa-bank já veio anunciar que não tem o
complexo militar-industrial do país como um dos seus clientes.
Dificilmente esta “guerra
fria” irá impedir a reeleição de Vladimir Putin, mas poderá criar-lhe problemas
internos e externos no seu novo mandato.´
Nenhum comentário:
Postar um comentário