quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Coisas amenas ou menos



Rui Tavares, em noite de Halloween, José Pacheco Pereira em dia de anedota, foi o que colhi do Público de 2/11, para diversão, pois se tratava de Noite das Bruxas para RT e de Dia do “Inimigo Público” para PP. O pequeno texto, sobre PP e, de passagem, sobre Jorge Coelho, devo copiá-lo do jornal, pois que me foi interdita a transcrição via Internet. Como é breve, faço-o para me divertir um pouco à custa de PP, não porque me ria dele, mas porque o artigo é hilariante, e aqui vai. JPP decerto também se riu, pois é suficientemente camarada e sabe disfarçar. Eis o texto, de VE:

«Pacheco Pereira pensou ter recebido pó suspeito mas afinal era só caspa»
Pacheco Pereira coloca-se entre os grandes símbolos de Esquerda da actualidade e por isso desconfiou que estava a ser alvo de um atentado do supremacista branco Cesar Sayoc Jr., ou do ex-director de Serralves e pornógrafo amador João Ribas, mas percebeu que afinal o pó misterioso era apenas caspa da sua vasta cabeleira marxista. Pacheco Pereira apanhou a caspa com um papel molhado e juntou-a à imensa colecção de caspa de Álvaro Cunhal que guarda no museu Ephemera, juntamente com cinzas de cigarro que o seu antigo colega de partido Macário Correia coleccionava para entregar às autoridades competentes. Jorge Coelho também recebeu um pó misterioso mas era apenas cimento da Mota Engil. VE

Quanto à crónica de Rui Tavares, a propósito dos folguedos de Halloween, com máscaras assustadoras, indícios de medos e preocupações da sociedade actual e norte-americana em especial, devidos aos problemas migratórios e ao racismo político insuficiente de Trump, segundo os pareceres nacionalistas de muitos americanos, alguns comentários ajudarão à percepção dessa realidade apontada, sobre os debates acerca da polarização nos EUA, e o mal-estar geral:

A coisa mais assustadora que ouvi na Noite das Bruxas
Os estrangeiros, como ameaça, lá vão ter de cumprir com o seu papel histórico de serem ameaçadores para que os americanos se possam unir.
2 de Novembro de 2018
Province, Rhode Island, EUA. — Esta semana tivemos a Noite das Bruxas, Halloween, e aqui nos EUA onde levam a celebração a sério vi mulheres sem cabeça, muitos frankesteins e até um par de mãos de um morto-vivo a tentar sair da cova. Mas a coisa mais assustadora não vi, ouvi. E não foi na rua, mas na televisão. E não foi uma coisa para assustar, mas antes dita com boa intenção. E foi por isso mesmo que foi assustadora.
Num dos canais de notícias que por aqui pululam com debates e comentadores a toda a hora, discutia-se a polarização da sociedade norte-americana. Ou seja, debatia-se o debate. Em particular, tentava debater-se com um nível um bocadinho mais alto porque é que o nível do debate é em geral tão baixo. E, em consequência, discutia-se Trump. Trump insinua que George Soros é o culpado de haver uma caravana de migrantes e refugiados a tentar chegar aos EUA. Um homem mata onze pessoas numa sinagoga porque acha que os culpados por haver demasiados imigrantes nos EUA é daqueles que são, como Soros, judeus (nota: o assassino era crítico de Trump por não ser suficientemente anti-imigração e porventura por não ser anti-semita). Trump acha que os jornalistas que o criticam são “inimigos” do povo. Um homem com a carrinha cheia de autocolantes de Trump e outros com os seus adversários na mira de uma espingarda manda mais de dez envelopes-bomba aos adversários de Trump, incluindo ex-presidentes, primeiras-damas e candidatos à presidência, e jornalistas. O debate consistia em saber se Trump poderia fazer ou dizer algo para evitar que a polarização levasse a mais violência.
Havia no debate comentadores anti-Trump e pró-Trump. Os anti-Trump achavam que o presidente polarizava o país de propósito sem se incomodar com as consequências. Os pró-Trump argumentavam que a polarização já existia antes de Trump e que não cabia a ele só resolvê-la. O debate era cordato. E foi aí que um deles disse:infelizmente vai ser muito difícil resolver o problema da polarização e acho mesmo que o problema só vai acabar quando houver uma ameaça externa contra o nosso país”.
E pronto. Aí está a coisa mais assustadora que ouvi este Halloween. Não porque tenha sido dita em tom de ameaça, mas porque foi dito em tom de lamento, quase como quem encolhe os ombros e diz que “lá vai ter de ser” haver uma ameaça externa para resolver o problema americano de os americanos terem decidido polarizar-se e o presidente americano estar pouco disposto a deixar de polarizar o país ainda mais. Os estrangeiros, esses sim como ameaça, lá vão ter de cumprir com o seu papel histórico de serem ameaçadores para que os americanos se possam unir.
Como já disse, o senhor que disse a frase parecia perfeitamente bem intencionado. E além disso, não estava a dizer nada de original. É quase uma banalidade notar que o destino do nacionalismo — doutrina que o presidente Trump reivindica aos berros do palanque — é acabar no conflito entre nações. Quando há uma fornada de líderes a convencer os seus povos que a o princípio organizador da política é “o (inserir aqui nome de país) acima de todos” vai haver um problema quando o país X “acima de todos” tiver um conflito com o país Y que também é “acima de todos”. 
Mas a razão pela qual o que disse o tal senhor foi iluminadora é que me revelou naquele momento um caminho explicativo através do qual o conflito entre nacionalismos não é só uma possibilidade, mas uma necessidade. E, enquanto tal, virtualmente inevitável.
Reparem: o nacionalista alega amar a nação, mas não sei se notaram que ele gosta de muito pouca gente dentro da nação. O nacionalista não gosta da oposição. Dos que parecem estrangeiros. Dos que gostam do estrangeiro. Dos esquerdistas ou dos socialistas ou dos liberais ou dos cosmopolitas ou dos ecologistas ou de todos os que se costumem lembrar que há um mundo lá fora. Também costuma não gostar dos LGBT, dos intelectuais, dos sindicalistas, das religiões minoritárias, das ONGs, dos artistas, dos judeus e dos muçulmanos, dos moderados e dos radicais, dos miseráveis e dos milionários (bem, só de alguns milionários), e na verdade nem a classe média nem a alta nem a baixa são muito de confiar. Excluindo os crentes que lhe aparecem nos comícios e os que o defendem nas redes sociais (e mesmo entre esses boa parte são autómatos ou assalariados de governos estrangeiros), é muita gente para não gostar.
Por outro lado, o nacionalista tem necessidade de ser amado, de ser adorado até. E a certa altura, principalmente se houver eleições (há na próxima terça-feira) e se ele as perder, o nacionalista vai precisar de fazer o que promete e unir a nação.
Mas como? Como unir a nação, se ele a dividiu tanto até agora? Bem, é aí que entra a ameaça externa. A ameaça externa, se houver, há de salvar-nos! E se não houver, inventa-se.
E é por isso que devemos ter medo, muito medo.
Historiador; fundador do Livre

COMENTÁRIOS:
Registado Leitor, 02.11.2018 : "Num dos canais de notícias " ??? oh RT em Portugal vê debates bem piores em vários canais de TV. Quanto ao conteúdo, enfim, fraquinho, mais um artigo tirado da gaveta, repetindo até à exaustão o ódio a Trump. A novidade é a "existência" de um debate num tal canal de TV para suportar pela enésima vez este tema que, dia a dia, vai ficando cada vez mais fraquinho e menos fundamentado.
DCM, charneca de Caparica 02.11.2018: Há quem defenda que para melhor governar este mundo tem que se voltar aos tempos da guerra fria por outros meios. Eles já estão no terreno usando a velha máxima:"quem não for por mim será contra mim" Enquanto for a frio podemos aguentar, o pior será se as coisas aquecerem.
Há pouco tempo li que um general americano declarou que é provável que dentro de quinze anos, China e EUA entrem em guerra. E o fim do acordo nuclear com a Rússia, as guerras comerciais, a propaganda que Steve Bannon anda a fazer pela Europa que está numa
AndradeQB, Porto 02.11.2018: Oh diabos!! Rui encruzilhada sem saber que caminho escolher quando as coisas descambarem.Tavares agora já quer os liberais do lado dele. Está aqui, está a considerar Passos Coelho dentro do perímetro democrático. De que será?
manuelserra72, 02.11.2018: Portanto podemos esperar o pior de Trump e dos seus apoiantes... algo de novo? Mas então o que dizer da "identity politics" da Sra. Hillary Clinton? é isso que une as pessoas? Falando de coisas assustadoras: O que dizer das palavras de Don Lemon quando diz "a maior ameaça de terror a este pais são os homens brancos"? O que dizer da Nancy Pelosi quando fala em danos colaterais contra as pessoas que não partilhem as suas ideias? Portanto às vezes parece-me que nos devemos interrogar de que lado vem o pensamento totalitário, de que lado vêm as divisões. Ou parece-lhe que há os maus de um lado e os bons do outro? Porque estes exemplos que dei dos "virtuosos" e "democratas" deixam muito a desejar...
Raquel Azulay, 02.11.2018: "Os estrangeiros, esses sim como ameaça, lá vão ter de cumprir com o seu papel histórico de serem ameaçadores para que os americanos se possam unir."sim, o uso da ameaça dos "estrangeiros" (por Trump) vai, entre outras coisas, fazer com que uma maioria tsunâmica expulse aquela persona inarrável da Casa Branca. Esta parte da sua frase "para que os Americanos se possam unir" presume, erradamente, que os Americanos se uniriam em torno da diabolização dos migrantes. Alguma má fé, Rui Tavares. A sua miopia não deixa de me surpreender: será precisamente o oposto. Quanto mais Trump insistir na ameaça dos emigrantes, mais Americanos se insurgirão contra ele. Veremos nas próximas Presidenciais.
Gustavo Garcia, 02.11.2018: Foi sempre assim. Os EUA, após a guerra civil, sempre necessitaram de um bicho papão que os unisse (mais concretamente que unisse as nações que, no fundo, são os estados). Nos últimos tempos isso foi patente e já foram vários os "monstros" que vieram substituir a URSS da guerra fria. Desde a "droga" ao ISIS, passando pela AlQaeda e Bin Laden, foram sendo muito convenientes estas ameaças para permitir à classe dominante continuar a manter os americanos devidamente assustados e obedientes.
Raquel Azulay, 02.11.2018: Codiacho. Até os Sovietes, que viveram sob o jugo de burocratas iluminados que agiram e viveram como uma verdadeira classe dominante (totalitária), tiveram que inventar inimigos. A fé inabalável dos comunistas nunca deixa de me surpreender. No fundo, são religiosos...do piorio.
Pois. E os EUA são claramente uma nação totalitária que inventa ameaças como um chef inventa pratos do dia. Brilhante. Não há NYT, nem Washington Post, não há contestação nas ruas, não há metoo nem Judith Butler nem Elizabeth Warren nem Sanders, não há juízes q impedem a implementação de políticas Trumpianas, não há centenas de comediantes a troçar do mr presidente e não há milhões que vão retirar o Trump da Casa Branca à velocidade da luz. Não há nada disso. Nas nações totalitárias não há watergates, não há presidentes a ser investigados etc. Os EUA não são e nunca foram uma nação totalitária. Nem com o McCarthism os EUA foram totalitários. O totalitarismo político é um bicho muito sui generis. Aprumem as definições se faz favor.
Uma classe dominante que inventa ameaças para manter a sua dominação das massas. Eu quero um paradigma destes também. Com chocolatito. As cenas deliciosas são sempre muitos simples.


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