…que mereceu o Editorial de Ana Sá Lopes, com o título O animalocentrismo, publicado no Público. A mesma página em que saiu,
continha, nas “Cartas ao Director”,
de Helder
Pancadas, o protesto epistolar com o título O partido fofinho, com
cuja transcrição inicio este texto, para comprovar os argumentos seguintes, do Editorial de
Ana Sá Lopes - a “Srª Lopes”, na designação indignada da comentadora Paula Custodio, certamente que fiel seguidora dos preceitos de
descortesia, inegavelmente humana, que levaram em tempos João Jardim – sem senhor – a tratar Cavaco Silva por “O senhor
Silva”. Coloco apenas alguns desses protestos, de idêntica aversão contra a
editorialista, pois que a maioria dos outros foi ainda mais ofensiva. Para pôr
os pontos nos ii, transcrevo ainda, do Observador,
o artigo do , sensato e justo, e percorrendo a
História, em termos comprovativos da existência do Mal no Mundo.
Sou dos que sofre com o
sofrimento dos animais, nos espaços fechados onde são enfiados para o alimento ou
diversão do homem, ou nas caçadas de adestramento e visível prazer dos
caçadores e tantos mais casos de indiferença humana pelo sofrimento animal que
a cada passo nos ferem a sensibilidade. O certo é que os animais também se
comem uns aos outros e programas há, televisivos, que mostram a cadeia
alimentar poderosa, nos mares, como na Terra, como nos ares, sendo o Homem,
todavia, o mais requintado a matar, para seu alimento próprio, ou diversão.
Creio que sim, que devemos amar os animais, mas os mosquitos, as baratas, ou os
ratos, ou mesmo as moscas, ou os piolhos, as carraças, as pulgas, e até
micróbios daninhos, não sei como os defendem os “animalocêntricos”.
A mim, parece-me uma
provocação reprovável, essa dos encapuzados do IRA.
I -CARTAS AO DIRECTOR - O partido fofinho
HELDER PANCADAS, SOBREDA PÚBLICO,
17/11/18
Quem havia de dizer, hem?Quem poderia imaginar que aquele partido tão
fofinho, criado para proteger os animais e resgatá-los das garras dos seus
algozes, é a face legal de um grupo de marginais com a sigla IRA. A mesma sigla
do extinto Irish Republican Army que tanto fez sofrer irlandeses e ingleses. Pelo
que vi ontem no trabalho de investigação de um operador de TV, os tipos levam a
sua “missão” muito a sério. As imagens
mostravam um grupo de encapuzados armados, em tudo semelhante a imagens dos
grupos clandestinos terroristas. Com o pretexto de salvação dos animais, os
“ungidos” do IRA praticam actos de violência gratuita que as autoridades têm
obrigação de parar quanto antes. Se a jornalista os conseguiu entrevistar e filmar, a PJ também o
poderá fazer. E o IRA que se ponha a pau! Se grupos ligados aos touros ou
amantes da caça lhes saírem ao caminho, não se admirem das consequências. O
deputado do PAN, André Silva, e a
sua chefe de gabinete, Cristina
Rodrigues, têm muito que explicar às autoridades sobre tudo aquilo que
sabem sobre este grupo, o que parece ser muito.
II - EDITORIAL
- O animalocentrismo
Felizmente, a relação dos humanos com os animais de companhia mudou
muito desde o tempo em que se cantava “Atirei o pau ao gato/mas o
gato/não morreu/D. Chica/assustou-se/com o berro/ com o berro/ que o gato
deu”, ou se enxotava o cão com um pontapé. Mas
a sociedade cada vez mais “animalocêntrica” que estamos a criar, em que o amor
por um animal, ou por vários animais, começa a ser considerado superior ao amor
por um humano ou vários humanos, é a base de sustentação para grupos
extremistas como o IRA – Grupo de Intervenção e Resgate Animal – que,
utilizando como acrónimo o nome do grupo separatista irlandês, está agora a ser
investigado pela Polícia Judiciária por crimes violentos, nomeadamente
agressões e roubo.
A relação profunda que é
possível estabelecer entre humanos e animais de companhia não nasceu nos
últimos anos. Manuel Alegre, agora
muito fustigado por causa da defesa das touradas, tem um livro – Cão como Nós – que fala exactamente sobre
isso. A expressão “o cão é o melhor amigo do homem” também não é do século XXI.
Como é que se passou da existência de
relações de pertença a uma alteração social que põe o valor da vida animal a
emocionar multidões – em contraste paradoxal com a frieza com que hoje os
animalocêntricos europeus olham para os barcos dos refugiados do
Mediterrâneo ou para os sem-abrigo das suas cidades?
Não é fácil encontrar
explicações para esta mudança de paradigma. Mas é essa mudança que vai, com bastante probabilidade, aumentar a
votação PAN, que responde a uma alteração histórica que, no lado positivo,
o pode fazer crescer eleitoralmente e, no lado negativo, ter a sua chefe de
gabinete suspeita de ter ligações ao grupo extremista que foi objecto da
reportagem da TVI e que está a ser investigado pela PJ. O PCP e Os
Verdes percebem a ameaça. Num quase inédito comunicado sobre investigações
judiciais, o PCP, para além da preocupação sobre o alegado envolvimento da
chefe de gabinete no grupo extremista, põe em causa “uma prática subjacente ao
projecto político do PAN que, sob o
manto das preocupações sobre a natureza e os animais, e assente num discurso de
intolerância, promove uma orientação de incriminação, de estímulo à delação e
criminalização de hábitos socioculturais, em si mesmo um caldo de cultura para
justificação de práticas criminosas”. Infelizmente, o tempo que corre,
corre a favor da intolerância.
COMENTÁRIOS:
Paula
Custodio: 17.11.2018 20:53 Sra.
Lopes, Quando diz "em contraste paradoxal com a frieza com que hoje os
animalocêntricos europeus olham para os barcos dos refugiados do Mediterrâneo
ou para os sem-abrigo das suas cidades?" - PRECISA DE PROVAR que são os animalocêntricos que olham com frieza
para os barcos de refugiados ou sem abrigos... que eu saiba, é a direita
chauvinista e saudosista das "tradições" que tanto alarido faz contra
os refugiados e sem-abrigo que lhes "sujam" as suas preciosas cidades
e ao mesmo tempo tanto gostam que eles existam para lhes limpar as retretes e
os poderem tratar como sub-humanos, i. é, escravos modernos… Quem é defensor
dos direitos dos animais não defende a morte da humanidade, apenas que não
somos donos deste planeta, mas inquilinos como todas as outras espécies que
nele cohabitam.
Pedro Almeida,
Pico - Açores 17.11.2018 18:47: Não há outros
temas na agenda nem outras prioridades. A Dr.ª Graça, com tese em Coimbra, deu
um “banho de civilização” aos portugueses, e abriu o debate à volta do
cãozinho, gatinho, periquita, galinhas e os touros de arena - espero
ansiosamente pelo debate à volta da caça do coelho bravo ou da perdiz... O
vulgo anda agora atento às catacumbas da GNR de Alcochete onde a carrinha da PJ
é seguida pela CMTV em direito para o tribunal do Barreiro… Há, no meio
disto, uma grande solidão…há cada vez mais casais sem filhos - ou com filhos
únicos. Há cada vez mais idosos e menos crianças…mas os temas são outros… Assim
vai o País…
Pedro Almeida,
Pico - Açores 17.11.2018 18:46: Na
"parvoeira" do caruncho do "Parlamento", assistimos à Sr.ª
Dr.ª das unhas, a Sr.ª Dr.ª das passwords - consideradas um dado pessoal e
intransmissível, mas..."pode-se partilhar”...e outras parvalheiras…como a
iniciativa do PSD de propor o Dia Nacional do Cão - atenção projecto de
resolução, do lendário Marques Guedes, gosto especialmente do nome “projecto de
resolução”…bem como o antigo líder da bancada do PSD que tinha um currículo
invejável mas não tinha metido os pés na Califórnia… A cereja em cima do bolo é
mesmo o Parlamento ter um deputado eleito, para representar o periquito, a
aranha…e as melgas…e já agora as moscas…
Raquel Azulay,
17.11.2018 17:20: uma pessoa que acha que os animais não devem ser
maltratados é = a alguém que valoriza os animais mais do que os humanos??? Ana,
sinceramente!!!! e logo em Portugal, país onde milhares de animais são tratados
de forma brutal. é de pasmar. está a tentar ser polémica?
Porto 17.11.2018 16:00: muito de acordo
com ASL. é assustador a personificação dos animais, a sua valorização acima de
todas as coisas e pessoas, mas penso que é um discussão sem esperança. os
animalocêntricos não são demovíveis, eu tb não: muito respeito pelos animais e
pelos vegetais, mas, sem qualquer margem para dúvidas, primeiro as pessoas.
João Teixeira,
17.11.2018 09:23: Nós temos um imenso amor pelos outros
animais, é por isso que se estima que 60% dos animais selvagens foram dizimados
nos últimos 50 anos por actividades antropogénicas...
III - TOURADAS As touradas: uma ética
bestial? /premium
É da essência do Cristianismo o amor pela criação. Desde sempre, os
cristãos amam a natureza, espelho onde admiram a omnipotência e o amor de Deus.
G. K. Chesterton dizia que não é verdade que neste tempo não haja
valores, mas parecem ter enlouquecido. Com efeito, mata-se violenta e
impunemente um nascituro, ou um doente terminal, mas depois fazem-se campanhas
para a ‘adopção’ de animais domésticos, para recolha de alimentos e até
cobertores para cães vadios e protesta-se contra a falta de condições dos canis
municipais, a que se proíbe o abate de animais porque – ironia do destino! –
parece que os matadouros devem ser apenas para os seres humanos!
Se
a questão da defesa da vida, no seu início e termo natural, é uma questão de
honra e um princípio irrenunciável, pelo menos para qualquer humanista que se
preze, bem como para qualquer cristão digno desse nome – não o seria se fosse
favorável à eufemística ‘interrupção voluntária da gravidez’, ou ao inverosímil
‘direito a uma morte digna’ – é, pelo contrário, discutível o modo como a
sociedade deve encarar a vida animal.
Não é aceitável, não só por questões da mais elementar ciência
jurídica, mas também por razões de bom senso, equiparar os animais irracionais,
ou as plantas, aos seres humanos, nem conceder-lhes personalidade jurídica: a
ausência de inteligência e vontade impede que esses seres vivos possam ser titulares
de direitos, do mesmo modo como obsta a que fiquem adstritos ao cumprimento de
quaisquer obrigações: só a loucura e a prepotência de um Calígula explica que
um cavalo possa ter sido senador em Roma!
Como seres dotados de sensibilidade, como o direito português
reconhece, mas não de personalidade, os
animais são susceptíveis de protecção jurídica, não apenas pelo seu valor
intrínseco, mas sobretudo pela sua relação com os seres humanos. Para algumas pessoas, os animais que
criam são o seu sustento e, portanto, essenciais à sua vida. Também há quem os
use na sua actividade profissional, ou como meio de transporte e, também para
estes, é necessário que o ordenamento jurídico garanta a protecção de tais
instrumentos necessários para o trabalho ou deslocações. Também o valor
estimativo de um animal é susceptível de protecção jurídica: se um invisual
precisa de um cão que o guie, ou uma pessoa tem por única companhia um animal
doméstico, é óbvio que esse valor acrescido desse ser vivo deve ser
juridicamente relevante.
É evidente, para qualquer pessoa
que tenha um mínimo de bom senso, que a questão da protecção dos animais não se
põe quando está em perigo uma vida humana. Quando, há já algum tempo, uma criança caiu na jaula dos símios e
foi arrastada por um orangotango, felizmente sem danos para o menor, a única
decisão acertada foi a então tomada pelas autoridades desse jardim zoológico,
que prontamente executaram o animal. O
risco, para a vida da criança, era razão mais do que suficiente para o seu
abate.
Outra questão, certamente mais discutível, é a utilização de animais
em actividades lúdicas, como são os circos, ou as touradas. Há quem entenda que
não é aceitável a sua utilização em espectáculos circenses, porque as condições
a que os mesmos são sujeitos não são as melhores. Mas, nesse caso, também seria
de impedir os jardins zoológicos – não estão, também esses animais, em
cativeiro?! – bem como os aquários, oceanários e até as reservas naturais que,
a bem dizer, pouco têm de natural, na medida em que os animais, embora tendo
mais liberdade de movimentação, também estão confinados a um espaço limitado?!
E, se a liberdade de movimentação dos
animais é essencial, porquê permitir então a trela e o açaime nos cães?! Não é
verdade que esses instrumentos são também inibidores para o animal?! De
reconhecer um ‘direito’ do animal irracional, seria preciso, em coerência,
abolir tudo o que, de algum modo, os seres humanos impõem, para sua segurança
ou comodidade, aos animais que têm consigo.
É da essência do Cristianismo o amor pela criação, obra de Deus,
como recentemente recordou o Papa Francisco, com a encíclica Laudato Si. Desde
sempre, os cristãos amam a natureza, espelho em que admiram a omnipotência e o
amor de Deus. Apesar de muitos dos primeiros cristãos terem sido pasto das
feras, é próprio da doutrina católica entender que os animais são um bem, que
importa preservar. São úteis para a alimentação dos seres humanos, como são
prestáveis para o trabalho e como meio de transporte. Também podem ser uma boa
companhia, embora nunca com eles se possa estabelecer uma relação afectiva ou
amorosa, que há-de ser sempre interpessoal. É
da responsabilidade dos poderes públicos preservar a natureza na sua
integridade, defendendo as raças em vias de extinção, impondo defesos em
relação à caça ou pesca de certos animais e criando reservas, onde a sua
existência possa estar ameaçada e, por isso, deva ser assegurada.
A
questão que se põe é, contudo, em relação à licitude de certos espectáculos,
como o circo ou as touradas. Há quem entenda que a tourada deve ser
proibida porque é cruel para o animal, que é exposto a um sofrimento
desnecessário. Com certeza que, para o touro, não são agradáveis as bandarilhas
que lhe são espetadas, nem as pegas, nem muito menos a morte em plena praça,
embora, se for instantânea, não seja mais dolorosa do que a que lhe é provocada
no matadouro. Mas,
para os cavalos de corrida, são amenas as chibatadas recebidas até chegar à
meta?! Não será também cruel o uso das esporas?! E as trelas e açaimes dos cães,
não são também outras formas de tortura animal?!
A verdade é que, pela via do suposto interesse ou bem do animal,
seria praticamente impossível estabelecer um código de conduta razoável. Se
calhar, todas as práticas desportivas humanas têm um impacto negativo na
natureza: os atletas de corta-mato, ou praticantes
de BTT, podem destruir ou obstruir o trilho de algumas formigas, os praticantes
de para-quedismo, asa delta ou aviação, interferem com o voo das aves, os
surfistas e nadadores perturbam o habitat marinho, etc., etc., etc. Mas também
é verdade que os animais, entre si, estão em constante luta e que a sua
sobrevivência não pode ser alcançada senão pela morte dos seus agressores, ou
daqueles de que carecem para a sua alimentação. Não se negue, portanto, aos
homens, pelo menos as mesmas prerrogativas que se reconhecem, naturalmente, aos
‘outros’ animais.
No
contexto de uma ética personalista, a vida animal deve ser encarada como
instrumental para o homem, que é o cume de criação: as pessoas não existem para
os animais, mas estes existem, como aliás as plantas e o resto do mundo, para o
homem. Uma ética cristã é, por definição, antropocêntrica. E é, portanto, nesta
perspectiva, que devem ser encaradas as diversas actividades lúdicas, como o
circo ou as touradas.
Não parece razoável que uma pessoa ponha em causa a sua vida por uma
questão tão fútil como um espectáculo circense, ou taurino. Se um ser humano
morre em defesa da sua fé, ou da sua pátria, ou da sua família, ou de um
inocente, é certamente heroico, mas não seria honrosa a morte que acontece por
indesculpável temeridade. Ir a uma velocidade excessiva, porque assim o exige a
vida em perigo de um doente que se transporta, com urgência, para um hospital,
é louvável; mas não o seria se fosse apenas para ganhar uma corrida, pondo em
causa vidas humanas, a começar pela do próprio. Introduzir a cabeça no focinho
de um leão, ou de um crocodilo, só para ganhar um aplauso, não é razoável: não
seria um acto de bravura, mas de supina estupidez. Se lidar um touro significa
pôr, desnecessariamente, em risco a própria vida, não é eticamente aceitável,
por mais divertido ou emocionante que possa ser o espectáculo.
Nenhuma mãe ou pai perdoaria a um seu filho, ou filha, o imenso
desgosto da sua perda, pela mera futilidade de um qualquer desporto, ou
diversão. A vida humana inocente, desde a concepção até à morte natural, é um
imperativo moral absoluto e, ante esta exigência irrenunciável, não faz sentido
recorrer a argumentos sobre os supostos direitos, dignidade ou sofrimento
animal. A não ser que, como manifesta
expressão da loucura de que já se queixava Chesterton, se queira trocar a moral
humanista cristã por uma ética verdadeiramente bestial.
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