sexta-feira, 22 de novembro de 2024

CONCORDO

 

O 25 de Abril é só dela, da esquerda, que reste algum orgulho à direita. Embora já não aquente nem arrefente, a própria direita tendo-se adaptado bem, numa indiferença pátria que sempre achei pútrida.

BIOGRAFIA DE RUI RAMOS, que transcrevo do OBSERVADOR, como homenagem ao cidadão português actual, para o meu blog passadista.

« rramos@observador.pt»

«Nasci a 22 de Maio de 1962, licenciei-me em história na Universidade Nova de Lisboa, e doutorei-me em ciência política na Universidade de Oxford. Sou professor e investigador no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e professor convidado do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica. Escrevi, entre outros livros, A Segunda Fundação (1890-1926), volume VI da História de Portugal dirigida por José Mattoso (Círculo de Leitores), e a História de Portugal (Esfera dos Livros, em co-autoria com Bernardo de Vasconcelos e Nuno Monteiro), que recebeu o Prémio D. Dinis em 2009. Na imprensa, tive uma coluna semanal no Diário Económico (2005), e depois no Público (2006-2009), Correio da Manhã (2009) e Expresso (2010-2013). Colaborei em programas de debate semanal na RTP-N, TVI-24, SIC-N e Canal Q, e fui autor da série de 12 episódios “Portugal de...”, da RTP-1 (2006-2007).»

O problema do 25 de Novembro

O problema do 25 de Novembro é que a sua história e celebração obrigariam a oligarquia a reconhecer que a democracia assentou numa coligação diferente da que governou o país nos últimos anos. 

RUI RAMOS Colunista do Observador

OBSERVADOR, 22 nov. 2024, 00:224

Qual é o problema, quase cinquenta anos depois, de celebrar o 25 de Novembro de 1975? Ofusca o 25 de Abril, dizem uns. Como? O movimento militar de 25 de Novembro confirmou o ponto em que o movimento de 25 de Abril de 1974 unira toda a gente: a fundação em Portugal de uma democracia pluralista, assente na vontade dos cidadãos expressa em eleições livres. Foi esse o mandato que o Movimento das Forças Armadas se atribuiu em 1974, e ao qual o país aderiu. Depois, uma parte do MFA esqueceu isso, e abusou do poder militar para estatizar a economia, constranger a Assembleia Constituinte, e perseguir os que não se entusiasmaram com o seu socialismo de caserna. Em 1975, o 25 de Novembro pôs termo a essa prepotência. Não por acaso, foi protagonizado por muitos dos mesmos operacionais do 25 de Abril, a começar pelo então major Jaime Neves. Celebrar o 25 de Novembro é celebrar o 25 de Abril.

Mas o 25 de Novembro divide, dizem outros. É a esquerda que o diz, e é curioso que o diga, quando é a esquerda que, todos os anos, insiste em reclamar, falsamente, que o 25 de Abril é só dela. O divisionismo que possa causar a sua apropriação sectária e adulterada do 25 de Abril nunca a inquietou. Só as divisões do 25 de Novembro. Quanto a estas, é compreensível que o PCP e restante extrema-esquerda recusem abrir o champagne. A partir de Dezembro de 1975, o general Eanes devolveu a tropa aos quartéis, e retirou ao PCP e à extrema-esquerda o instrumento militar com que, à falta de votos, tentaram impor-se em Portugal. Aqueles que, às cavalitas de parte do MFA, fantasiaram Cubas europeias, nada têm a celebrar. Mas os outros? Porque é que, nas regiões políticas correspondentes ao PS, há esquivas e hesitações?

Porque em 1975, para reagir ao revolucionarismo militar guiado pelo PCP e pela extrema-esquerda, o MFA moderado (o chamado “grupo dos Nove”) e o PS tiveram de procurar aliados para além das linhas vermelhas da esquerda. O MFA moderado falou com a chamada “direita militar” e até com o MDLP. O PS conjugou-se com o PPD e o CDS, então os partidos “fascistas”. Entenderam-se com os EUA e com a Igreja Católica, incluindo o clero mais conservador, a quem se deveu o levantamento popular anti-comunista do Norte no Verão de 1975. Houve que dar a mão à “direita”, nas suas várias formas, para resistir a um radicalismo esquerdista que foi o grande vento contrário à democracia desde 1974.

Sem a direita militar, política e social, não teria sido fácil salvar a democracia em Portugal. Impulsionado por isso, Francisco Sá Carneiro exigiu a reversão total da revolução esquerdista. Mas anulado o poder militar alinhado com o PCP e a extrema-esquerda, o MFA moderado e o PS trataram de estabelecer um modus vivendi com o PCP, deixando-lhe a “reforma agrária” e as “nacionalizações”. Em Dezembro de 1975, cerca de metade do grupo parlamentar do PPD discordou do maximalismo de Sá Carneiro. O Conselho da Revolução sobreviveu. No entanto, a dinâmica do 25 de Novembro, de rejeição do esquerdismo revolucionário, não se esgotou. Alimentou o movimento de opinião que em 1979 deu uma maioria absoluta a Sá Carneiro, e criou o ambiente para a normalização do país como uma democracia de tipo ocidental na década de 1980.

Entretanto, o MFA moderado reconciliou-se com o MFA extremista. O PS reintroduziu o PCP e a extrema-esquerda nas salas do poder. Ultimamente, o país oficial apontou as direitas liberal e nacionalista como as únicas ameaças. Não lhe convém lembrar que a democracia em Portugal dependeu, num momento decisivo, de linhas vermelhas muito diferentes. Está aí o problema do 25 de Novembro.

25 DE NOVEMBRO    PAÍS    HISTÓRIA    CULTURA    ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA    POLÍTICA

COMENTÁRIOS

Filipe Bacelar: É extraordinário como um historiador trata tão mal a história. Que bagunça.   unknown unknown > Filipe Bacelar: Por favor, elucide-nos! O que está errado no que RR escreveu? Qual é o problema do 25 de Novembro?             Maria Paula Silva: Quem nasceu perto de 1974 ou era criança pequena nessa altura não sabe muito bem o que foi o 25 avril  e o que foram esses dois primeiros anos de "liberdade".  De facto foram 2 anos  de horror, de medo. Matou-se mais gente que em 40 anos de Salazarismo.  Podias ser insultado na rua, nem sabias porquê, só porque tinhas "boa cara". Ficavas sem casa, sem empresa, sem terras/propriedades  por dá cá aquela palha, só porque sim e porque à esquerda fanática apetecia roubar e não trabalhar.  Foi assim que o pai da Mortágua ficou com um "monte alentejano" onde depois viveu a vida toda como um verdadeiro latifundiário. As atrocidades que se fizeram têm apenas um nome: roubo. De facto, foi o 25 novembro que devolveu, ou trouxe melhor dizendo, a Democracia e Liberdade que aguardavam  desde 25 avril  para se manifestarem. Os primeiros 2 anos foram anos de horror. Só quem já era crescidinho é que sabe. Este artigo do RR, mto bom e sintético como sempre, põe os pontos nalguns   iii. Mas quem não era crescidinho naquela altura, não percebe o que foi o 25 avril. Apesar de tudo chamar fascistas ao PPD e ao CDS é um bocadinho exagero e forçar a nota. Usa-se e abusa-se da palavra fascismo hoje em dia adulterando  o seu verdadeiro significado. Francisco Sá Carneiro era um senhor, um verdadeiro estadista, homem sério e trabalhador e verdadeiramente democrático. Com uma inteligência muito acima da média. Só queria o bem do país. Por isso, limparam-lhe o sebo. E alguns dos responsáveis estão vivos. Chamar, por exemplo, AD a esta nova coisa que o Monte Rosa inventou é um verdadeiro insulto à memória democrática da AD de Sá Carneiro. É preciso chamar as coisas pelos nomes. Vivemos há 50 anos uma grande hipocrisia, que teve uns breves intervalos (Ramalho Eanes e PPC).                     Eduardo Cunha: mais que excelente , esclarecedor. Parabéns pela crónica.

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