quarta-feira, 27 de novembro de 2024

No fundo no fundo

 

A lisura de carácter apontada como modelo clássico de modéstia nesse despojamento dos bens materiais, pelos homens, que preferem simplificar a teorização conceptual através da exemplificação objectiva, a mim parece-me antes, tal modelo humano, retrato exibicionista de uma modéstia aparente, prova, antes, de uma atitude arrogante de provocação pouco educada e presunçosa, que não serve de modelo educativo, mau grado a originalidade das acções e objectos da referência exemplificativa desse Diógenes moralista a quem apelidam de cínico, com ofensa para o “cão”, de que provém a designação, e termo cuja analogia com o fiel amigo do Homem nunca percebi.

NA VERDADE VOS DIGO QUE...

HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO, 25.11.24

Cinismo é a filosofia que pugna pela verdade e só por ela. Os seus, rejeitam eufemismos, parabolismos, disfarces e subentendidos para evitarem mal-entendidos. E na questão dos disfarces, ainda hoje há nas zonas quentes da Índia aqueles «verídicos» que trajam a rigor em conformidade com o que traziam quando vieram ao mundo usando apenas um espanador para enxotar moscas e mosquitos potenciais transmissores de moléstias. Mas na Grécia, sazonalmente soprada por ventos boreais, os cínicos se viam obrigados – por certo a contragosto – a algumas protecções. E nesses reduzidos preparos andaria esse grande Mestre do pensamento a quem chamavam Diógenes, o desprendido dos bens materiais. Comendo o que lhe davam, Diógenes possuía apenas a dorna que lhe servia de casa, os farrapos com que se cobria, uma lanterna e uma caneca.

Distinguindo-se pelo rigor do seu carácter, dele se contam histórias curiosas:

Perguntado por que andava com a candeia acesa em plena luz do dia a vaguear pela cidade, respondeu que procurava alguém com carácter;

Vendo uma criança com as mãos em concha a beber água de uma fonte, logo aventou a sua caneca;

Quando Alexandre Magno lhe ofereceu tudo aquilo que quisesse, o filósofo apenas terá pedido que Alexandre se chegasse um pouco para o lado a fim de não lhe tirar «o que não me podes dar, a luz, do Sol».

 *  *  *  

Claramente, Diógenes foi e os «verídicos» indianos são originais benignos que vivem a seu modo sem perturbarem a harmonia social. Pelo contrário, pululam por aí originais malignos que nos querem impor a sua presença a que urge impedir de nos perturbarem.

Esta, a mensagem que em verdade vos digo no 25 de Novembro.

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