Na graça (im)pertinente sobre os
desmandos nacionais, da habitual crónica de costumes de AG. Mas Tino de Rans
deve sentir-se ofendido por não ter sido referenciado, quando também fez parte
de candidaturas presidenciais, piedosamente poupado às chufas aristocráticas,
num país de facto envilecido ao admiti-lo com largo apoio, nesses tempos de democracia
cristalinamente enxovalhante da Pátria-Mãe.
A minha
candidatura a Belém
Os governantes e os portugueses que
elegem os governantes não querem reformas: querem a reforma. Eu também. Vote em
mim.
ALBERTO GONÇALVES Colunista
do Observador
OBSERVADOR; 30
nov. 2024, 00:209
Era de esperar. Após quase nove anos de
desvalorização do cargo, não espanta a quantidade de gente que legitimamente se
sente habilitada a desempenhá-lo. Se o prof. Marcelo fez da presidência da
República um palco de variedades, é natural que qualquer artista olhe para
aquilo e se ache capaz de fazer igual ou, Deus permita, melhor. E quando digo
qualquer artista não falo dos habituais cançonetistas excêntricos à política,
como o sr. Tino de Rans ou, nas fases preliminares, o vocalista dos Ena Pá
2000. Falo mesmo de qualquer um.
Para já, em matéria de “presidenciáveis”
(ou de indivíduos que “não excluem a hipótese de candidatura”), temos o dr. Portas, o ex-futuro da direita que entretanto se
especializou a difundir patranhas – a pretexto da Covid, de Trump e do que
calha – num canal televisivo. Temos o dr. Centeno, que sem receio nem vergonha saltitou das Finanças
para o Banco de Portugal e agora quer saltitar outra vez. Temos o dr. Marques
Mendes, o boneco que aspira ao posto
do ventríloquo. Temos a dra. Leonor Beleza, cuja prova de vida política nas últimas
décadas consistiu num remoque a Pedro Passos Coelho, o único “presidenciável” a sério e que,
infelizmente, não temos. Temos o dr. Seguro, que por comparação e através do silêncio adquiriu certa “gravitas”.
Temos o dr. Vitorino, sinal de que provavelmente alguém decidiu gozar com o pagode. Temos o
dr.
Santos Silva, sinal de que
inequivocamente alguém decidiu gozar com o pagode. Temos a dra. Ana
Gomes, porque parece que berrar
insanidades na Sic Notícias hoje constitui currículo. Temos o dr. Santana, que sob
várias perspectivas continua a ser o dr. Santana. Temos os que sonham com o porta-voz do Hamas, eng.
Guterres de sua imensa graça. Temos o dr. Aguiar-Branco, de facto uns degraus acima dos restantes no que
toca a decência. E temos os comunistas da praxe, talvez os
drs. António Filipe e, se ainda
estiver vivo, Francisco
Louçã. Fora dos partidos e à espera dos partidos, temos
o almirante Gouveia e Melo, célebre por coordenar a
montagem de tendas para uma campanha de vacinação.
Isto por enquanto, que até 30 dias antes
das eleições de 2026 nada impede novos e sonantes nomes de se juntarem ao rol
acima. Em temerária manobra de antecipação e patriotismo, aproveito para
juntar já o meu. Leram bem: não excluo a hipótese da minha candidatura a
presidente da República, anúncio que
conto ver recebido com uma vaga de fundo e duas ou três multidões em delírio
nas ruas (evitem estragos excessivos). Não posso? Posso sim, senhor. Desde
logo, constitucionalmente: possuo nacionalidade portuguesa, capacidade
eleitoral activa e, embora dispensasse a vantagem, sou maior de 35 anos. Daqui
em diante, é sempre a subir. Ao contrário dos meus rivais, que não assumem nem
saem de cima e que não apresentam um esboço de “programa” ou sequer uma ideia,
eu chego à corrida com um programa perfeitinho e uma data de ideias. A título
de aperitivo, deixo aqui meia dúzia, exemplares de um modo diferente de
desempenhar a função e, de caminho, resgatá-la dos abismos de enxovalho em que
caiu. E onde, caso eu não seja eleito, seguramente se manterá.
Residência. Apesar de
ser historicamente enriquecedor morar no lugar em que, nas palavras de um
futebolista do Belenenses, nasceu Cristo, a verdade é que prefiro a minha casa.
Fica longe de Lisboa? Lisboa é que fica longe de minha casa, e na qualidade de
mais alto magistrado da nação não estou para me maçar. Além disso, economiza-se
em pessoal: para limpezas, a dona Amélia e eu próprio chegamos, e sei conduzir
sozinho, muito obrigado.
Conselheiros. Não
preciso, a menos que a dona Amélia adoeça e haja que passar a ferro os
edredões.
Viagens ao exterior. Nisto
tenciono poupar bastante ao erário público. O
prof. Marcelo fez 131 viagens oficiais a 55 países, ou cerca de 15 passeios
anuais. O estilo vida airada não me cai bem. Descontada Espanha, que é
pertinho e me serve o ocasional jantar, só me disponho a uma saída (prolongada:
digamos três semanas) a cada seis meses, invariavelmente aos Estados Unidos,
sem formalidades, sem “agenda” e sem comitiva de políticos, empresários e
pechisbeques da “cultura”. Era o que faltava.
Viagens ao interior. No interior
estou eu com frequência, e não me apetece cirandar pela portugalidade profunda
ou superficial a contemplar rotundas, a inaugurar “certames”, a tirar “selfies”
com transeuntes atordoados e a decretar que somos “os melhores dos melhores” em
tudo e inúmeros pares de botas. Para despachar a coisa, informo que somos os melhores dos melhores em tripas
à moda do Porto, pezinhos de coentrada, ovos moles de Aveiro e, claro, Amália
Rodrigues. Se me lembrar de mais, do que duvido, di-lo-ei na altura
devida.
Recepções e audiências. Visitas de
dignitários estrangeiros? Salvo excepções, que divulgarei em breve, que não
ultrapassarão o singular dígito e que incluem Javier Milei, não atendo ninguém.
Dado o panorama internacional, a probabilidade de aturar patetas ou pior é
elevadíssima. Quanto a delegações nacionais, de sindicalistas, deputados,
“personalidades” avulsas e treinadores da bola que conquistaram uma taça no
Dubai, podem enviar e-mail que um dia, se me der jeito, não respondo.
Comendas. Julgo que
não resta uma alminha em Portugal sem um penduricalho atribuído pelos
sucessivos presidentes, donde a questão não se põe.
Comemorações. O 25
de Abril, o 10 de Junho e o 5 de Outubro são efemérides lindas. Por azar, são
datas em que estarei ocupado a não receber homólogos uruguaios ou a não
participar no aniversário da Casa do Benfica em Carcassonne.
Estilo. Numa
curiosa interpretação das obrigações constitucionais, o prof. Marcelo passou
36% dos mandatos a despir-se e a vestir-se em praias repletas de repórteres
televisivos. Dado que não vou a praias, e principalmente a praias em que a
temperatura do mar se encontre abaixo dos 25 graus, o risco de ser filmado em
pelota é reduzido. Prometo igualmente não dançar à frente ou atrás das câmaras,
não roubar batatas fritas em restaurantes, não abraçar inocentes, não fingir
que sei assentar calçada e não aparecer em todos os “casos” a exigir, com a
menor convicção possível, que “se apurem responsabilidades”, “até às últimas
consequências” e “doa a quem doer”.
Interpretação dos poderes presidenciais.
Cabe ao presidente garantir o “regular funcionamento das instituições
democráticas”. Visto que as nossas instituições democráticas regularmente
funcionam mal, não me peçam para demitir governos e trabalheiras afins. É
notório que não iremos longe independentemente de quem manda, e assim
continuará comigo – apenas com menos gastos e, sobretudo, menos embaraços. Os
governantes e os portugueses que elegem os governantes não querem reformas:
querem a reforma. Eu também. Vote em mim. Make Portugal Mediocre As Usual (os
bonés MPMAU não tardam).
PRESIDENCIAIS 2016 ELEIÇÕES POLÍTICA
COMENTÁRIOS (de 16)
Pedro Correia: Pode já contar com o meu voto, Alberto Gonçalves!
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