Somos pequenos, queremos ser grandes, não saímos deste círculo vicioso
das acusações mútuas, em vez da tal reconstrução que não há quem queira – ou deixe
- fazer… Para além de que os chefes se passeiam demais, por esse mundo além...
A PERVERSÃO DO REGIME
Newton foi eleito deputado quando já se sabia tudo e era arguido no
caso Tutti Frutti. Ninguém o incomodou. Bugalho foi cabeça de lista às
europeias. Ninguém lhe faz perguntas nem ele dá explicações.
MARGARIDA BENTES PENEDO Arquitecta
e deputada municipal
OBSERVADOR, 20 fev. 2025, 00:1532
Envolve o PS e o PSD, e mais de
meia centena de políticos de um e do outro partido. Tem centro em Lisboa, por
ser o centro português de todas as coisas e porque o orçamento e as decisões
vivem aqui; mas estendeu-se às autarquias praticamente do país inteiro. A operação Tutti Frutti deixou a descoberto uma amolgadela no regime democrático.
O caso aponta para um entendimento
entre o PS e o PSD com o objectivo de se favorecerem mutuamente nas ambições
prosaicas dos homens sem ambições: avenças, ajustes directos, atribuição de
vantagens e subsídios. A
primeira verdade a declarar é que podemos e devemos ter opinião: a
mais que abusada “presunção de
inocência” aplica-se ao processo jurídico e a
justiça decidirá sobre a legalidade dos comportamentos – se configuram ou não
corrupção e outros crimes. Mas há
juízos sociais e políticos que podem incidir sobre o que já sabemos, sobre os
factos apurados pelo Ministério Público através de escutas telefónicas,
inquéritos e, no geral, investigações conduzidas pelas instâncias judiciais. O
despacho de acusação (ou de encerramento de inquérito) é um documento público;
obviamente, a presunção de inocência não se aplica nem pode aplicar em matéria
de opinião pública. Não custa compreender esta verdade simples.
O que custa é compreender a falta de
amor próprio das criaturas que vão à televisão fingir que não a compreendem. A
responsabilidade política está sujeita a uma apreciação pública que pode
manifestar-se de muitas maneiras. Uma delas é pela liberdade de expressar a
nossa condenação.
O caso Tutti Frutti, além dos favorecimentos mútuos, ou como método de
chegar até eles, tem um aspecto político até agora pouco comentado: os acordos para dividir, entre o PS e o PSD, a
liderança das juntas de freguesia em Lisboa. Como era isto feito? De
acordo com a acusação do DIAP, os responsáveis do PS e do PSD entendiam-se e
decidiam: “esta freguesia é nossa,
vocês mandam para aqui um candidato fraco, nós ganhamos a eleição; aquela
freguesia é vossa, nós pomos lá um candidato para perder”. As aspas
são minhas, as palavras são minhas, a ideia da conversa é precisamente a que
eles trocaram nas escutas.
Isto é uma burla política. Não é uma burla jurídica, nem sequer é um
comportamento ilegal, mas é uma perversão do regime democrático. Para quem
defende as democracias liberais, este crime de natureza política é sem dúvida o
crime mais grave do processo Tutti Frutti.
Lamentavelmente, o problema não
acaba aqui. Ainda de acordo com o despacho de acusação, Sebastião
Bugalho, que na altura era jornalista, combinou uma
entrevista com Luís Newton, candidato do PSD à Junta de Freguesia da Estrela;
fez essa entrevista previamente
combinada, e no fim enviou a entrevista a quem mandava na campanha do PSD para
ser corrigida. Mais. Bugalho, o jornalista, fez essa
entrevista como parte de uma campanha de promoção de Luís Newton.
Além disso, a acusação diz que Bugalho
sabia das manobras decididas entre os responsáveis do PS e do PSD. Mas o facto
é que nunca falou. Disso nós sabemos. Sebastião
Bugalho esteve na televisão como comentador, escreveu e publicou dúzias de
artigos nos jornais, mas desta burla política ele nunca falou.
A imoralidade desta história é que no meio político tudo isto é considerado normal. Os políticos foram incluídos nas listas para deputados à Assembleia da República, candidatos e eleitos quando já se sabia tudo. Luís Newton, por exemplo, já era arguido. Até há umas semanas, nunca foi politicamente incomodado. Daí para cá, suspendeu o mandato de deputado mas manteve-se presidente da Junta de Freguesia da Estrela e líder da bancada do PSD na Assembleia Municipal. Os jornais falavam do assunto há oito anos, desde 2017, logo após a campanha para as autárquicas em que tudo se passou. Sebastião Bugalho, que aqui representa o jornalismo, aparentemente sabia deste crime político organizado e não considerou que fosse grave ou sequer relevante. Foi escolhido pelo PSD para cabeça de lista às eleições europeias. Ninguém lhe faz perguntas nem ele dá explicações.
LISBOA PAÍS SOCIEDADE POLÍTICA
COMENTÁRIOS (de 33)
João Floriano > Joao Cadete: Mas tinha 29 anos quando foi para Bruxelas. Aos 20
anos poderemos evocar ingenuidade e falta de conhecimentos. Aos 29 já não é
possível sobretudo quando andou anos a preencher os debates na televisão e
passou pela CNN e SICN.
Maria Paula Silva > Joao Cadete: não é querer marrar, chama-se dizer as verdades. É
esse o serviço público que MBP faz. SE
o Bugalho já era "jornalista" tinha a obrigação de denunciar a
trapaça, mas não, fez o contrário. Mais tarde, durante anos como comentador
teve muitas oportunidades para falar do assunto. Mas o oportunismo fala mais
alto. Maria
Paula Silva: Tudo
gravíssimo. Uma vergonha, e repete-se à exaustão o slogan "todos
diferentes, todos iguais" e está sempre certo. O pior é isto: "Não
custa compreender esta verdade simples. O que custa é compreender a falta de
amor-próprio das criaturas que vão à televisão fingir que não a compreendem." Eles gozarem à brava com o povo português que, bem
feitas as contas, é quem lhes paga os ordenados. Sebastião Bugalho, tadinho, não era visível desde o
início da anterior campanha até à entrada em Bruxelas que tudo aquilo
transpirava a egocentrismo, vaidade e oportunismo? Não me consigo esquecer de
algumas imagens, nomeadamente aquela em que ele vai buscar Manuela Ferreira
Leite para ficar ao seu lado na fotografia e depois a ignora totalmente no fim
quando ela fala para ele e ele vira costas. Espero bem que este caso chegue a
bom fim, e que não seja mais um a caminho da prescrição como tantos outros. Este
país precisa de uma forte mangueirada! Bjs, Margarida, obrigada! Joao
Cadete: Olha agora a
culpa é do bugalho... durou 9 anos a investigação... o homem tinha 20 anos qdo
se começou a olhar para isto... é mesmo querer marrar... Rui
Carvalho: Ah mas graves
são as malas e as bocas no parlamento, a conivência não é só entre o PS e o
PSD, os comentadores aqui da casa também se calam ou amaciam, aquilo que ouvi
sobre a semana má do Chega, só faltou pendurarem o Ventura pelo pescoço, mas no
Montenegro, não se toca.. o PS e o PSD não são responsabilizados pela corrupção
entre eles, mas o Chega é culpado do roubo das malas e de alguém beber demais,
isso sim é grave e o Ventura devia demitir-se. Imaginem se a situação da
empresa fosse com o Ventura... ui, era a loucura. Deviam ter vergonha de se
apresentarem como comentadores isentos, não o são! Há excepções, claro, mas na
sua maioria são tão isentos como o Bugalho. Ah excelente texto.
NOTAS DA INTERNET:
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