Não, há muito que alguém disse que “o povo é sereno”. Nem precisamos de tropa, para ajudar no equilíbrio…
Um emprego a 700 metros de casa
Vamos descontar o IMI, vamos esquecer
a especulação, vamos notar as ajudas de custo, vamos lembrar as embrulhadas,
vamos ver a 10 de março.
ALBERTO GONÇALVES, Colunista do
Observador
OBSERVADOR, 03 fev. 2024, 00:1924
Vamos
descontar a história do IMI, um roubo às claras que Pedro Nuno Santos
certamente defende. Para cálculo desse imposto, as propriedades do
cidadão comum são avaliadas em cerca de um terço do valor de mercado. Uma propriedade alentejana do dr. Pedro
Nuno é avaliada em menos de um décimo. É melhor concluir que se trata de um
acaso, ou que o homem tem sorte.
Também
é escusado recordar o episódio em que o dr. Pedro Nuno, adversário feroz da
especulação, vendeu um apartamento em Lisboa por perto do dobro do valor da
aquisição. É evidente que o negócio não é muito
compatível com quem, enquanto ministro do sector, declarou que os preços do imobiliário em Lisboa e
Porto são, cito, um “crime lesa-pátria”. Percebeu pelas brincadeiras
na TAP que lesar a pátria não tira o sono ao actual secretário-geral do PS,
embora, repito, não valha a pena ir por aí.
Prefiro notar o caso das ajudas de custo.
Entre 2005 e 2015, o período em que foi deputado com uma interrupção pelo meio,
o dr. Pedro Nuno beneficiou de 202 mil euros em subsídios de deslocação,
alimentação e alojamento. Ao que
percebi, uns 75 mil patrocinaram as viagens, que Porsches e Maseratis não são
automóveis poupadinhos. Se não erro, o resto, 127 mil mais trocos, cobriu o
resto. Garantido, segundo a
“Sábado”, é que, durante nove anos, o dr. Pedro Nuno recebeu perto de dois mil
euros mensais para financiar alegados passeios a São João da Madeira, onde
dizia morar. A chatice é que o dr. Pedro Nuno morava em Lisboa.
Além
de morar em Lisboa, o dr. Pedro Nuno morava a 700 metros, contados pelo Google
Maps, do local de trabalho. Dez minutos a pé, cinco de carro, seis de
bicicleta, talvez sete em patins. A título de “ajudas”, se calhar trinta euros
por mês chegariam e sobrariam. PNS discorda, e começou por esclarecer
que, até entrar para o governo, São João da Madeira era o “centro” da sua “vida
pessoal, familiar, social e política”. Não esclareceu grande coisa: nas datas referidas, o dr. Pedro Nuno
tinha de facto casa em Lisboa, a mulher morava e trabalhava em Lisboa e, no
mínimo, 80% da respectiva “vida política” decorria em Lisboa. A “vida social”
talvez diga respeito a visitas aos pais, à prova de uns mocassins na sapataria
que pertenceu ao avô ou a partidas de bisca com os pobrezinhos que tanto o
comoveram na juventude, tarefas que não parecem esgotar o conteúdo da “vida
pessoal”.
Se calhar por isso, o dr. Pedro Nuno, ou
o PS por ele, avançou com novos esclarecimentos: a notícia dos subsídios serve um “objectivo insidioso”, mesmo que
não se esclareça qual é. Voltamos a ficar pouco esclarecidos. O PS não nega os subsídios, o
apartamento, a notícia em suma. O PS apenas nega ter havido ilegalidades,
esquecendo-se, ou esperando que os cidadãos não se lembrem, que as leis que
favorecem as habilidades dos deputados são aprovadas pelos próprios deputados,
normalmente por unanimidade. A questão aqui é a decência, e peço desculpa
por utilizar uma palavra que os socialistas ignoram. Ao que tudo indica, o dr. Pedro Nuno
morava em Lisboa e simulava o contrário para arrecadar uns cobres adicionais.
Aliás, o posterior desempenho governativo do dr. Pedro Nuno confirmou em pleno
o desprendimento com que o Carismático encara o dinheiro alheio.
Estranho que a propaganda do Rato ainda
não ordenasse que o dr. Pedro Nuno, ou o PS por ele, ou os avençados pelo PS,
saíssem de dedinho em riste, a berrar que a dignidade da “classe” não pactua
com cedências ao “populismo” (indigno seria a “classe” recusar verbas que não
merece, e o “populismo” derrota-se mediante assaltos ao contribuinte). Porém,
já anda por aí a invocação dos “outros”, os colegas ou ex-colegas do dr. Pedro
Nuno na AR, que para amealhar fundos extras juram residir na terra natal, a
deles, a dos trisavós ou a de um cunhado. Infelizmente, a sofisticação do
“argumento” não impressiona: se a abundância de carteiristas não inocenta cada
carteirista, a falta de decoro de inúmeros políticos não atenua o descaramento
de cada um. Os “outros” são criaturas igualmente imorais, com a discutível
ressalva de que não se candidatam a primeiro-ministro.
Com a legitimação de dois terços do
partido e de uma percentagem imprevisível do eleitorado, o dr. Pedro Nuno é
candidato a primeiro-ministro. Numa democracia que se levasse a sério,
deixaria de o ser. Não necessariamente por causa das ajudas de custo, que o
ajudaram a ele e nos custaram a nós, e sim por causa de qualquer das
incontáveis embrulhadas que atafulham o seu longo currículo.
Infelizmente, a nossa democracia não se leva a sério, pelo que, em vez de cair
o dr. Pedro Nuno, caem as recorrentes embrulhadas em que ele se mete. Porque o
PS determina as regras. Porque os “telejornais” existem para entreter as massas
e não para maçá-las com realidade. Porque o povo é sereno, para não dizer
pasmado.
Nada disso retira interesse à
personagem, pelo contrário. Num país habituado a reverenciar nulidades, o dr.
Pedro Nuno é uma nulidade especial, um zero radical e despreocupado. Um garoto,
enfim, que não sabe e não quer saber. Não aprende e não quer aprender. Não
disfarça e não quer disfarçar. Não manda mas quer mandar. A vida,
pessoal, familiar, social e política, foi-lhe evidentemente fácil, não só fácil
a ponto de não experimentar contrariedades: fácil a ponto de não fazer ideia de
que há contrariedades. Ou responsabilidades. Ou vergonha. O dr. Pedro
Nuno só conhece a vontade de poder, que arrastou para a capital a expensas
nossas. Somos o fuzilado que paga a bala.
Quanto ao dr. Pedro Nuno, e a rimar com
as suas aventuras na aviação, assemelha-se a um acidente aéreo particularmente
grave, cuja ocorrência exige uma extraordinária combinação de erros,
circunstâncias e coincidências. Contra todas as probabilidades, o desastre está
iminente. A 10 de Março contam-se as vítimas.
COMENTÁRIOS (de 24)
Nuno Silva: Quem vai para o mar, avia-se em
terra. Se já sabe que sendo deputado ou membro do Governo, tem que trabalhar na
assembleia da república, que se amanhem. Ninguém os obriga a isso. Mandam um
professor trabalhar a 600 km de casa e não lhes dão nada, por que razão para os
políticos é diferente? Com 200 mil euros, dava para um cidadão comum comprar
uma casa. Nem sabem o valor das coisas. Vivem num mundo á parte. E querem
depois governar o país. Ridículo!!! F. Mendes: Ora aqui está um excelente
exemplo de como o AG utiliza devidamente o seu talento! Este é um daqueles
artigos a enviar, obrigatoriamente, a amigos e conhecidos; dos tais que se
refugiam num estafado "eles são todos iguais": não são, e mesmo que
fossem não arriscaríamos vê-los tramar-nos no desgoverno deste pobre país. Retenha-se a metáfora do
executado que paga a bala que o liquidou. Não anda longe da verdade, neste
sentido: boa parte do povo não percebeu ainda que estamos a pagar a opressão a
que estamos sujeitos; ou seja, a fornecer aos opressores os meios de exercer e
prolongar este sufoco. Que se manifesta, entre outras formas, numa crise
institucional sem precedentes, iniciada numa "pr" versão Marcelo,
continua nos governos da "República" e regionais, contamina
tribunais, polícias e forças armadas(?!), prolonga-se nas autarquias, e é
abjectamente disfarçada por uma CS que envergonharia a defunta Alemanha Oriental.
11 de Março haverá muito boa gente a coçar a cabeça e a perguntar-se:
então, e agora? observador
censurado: Excelente artigo. Num país com cerca de 50 por cento de
pobres, como é aceitável dar 0,2 milhões de Euros do
dinheiro dos contribuintes a uma pessoa para a viagem casa - trabalho
cuja distância é 700 metros? Como é que uma pessoa que aceita esta gestão do
dinheiro dos contribuintes pode ser candidato a primeiro ministro de Portugal?
José Paulo C Castro: Ideias para diminuir as ajudas de custo dos deputados:
1) fazer uma lista dos transportes existentes e pagar
bilhetes regulares, antecipadamente, para cada deputado distante. Construir uma
residência para deputados num edifício do Estado.
2) mudar o Parlamento para um ponto central da rede
viária e ferroviária do país, onde haja imóveis baratos e possibilidade de
expansão da área urbana. Entroncamento ou Abrantes parecem-me bem.
3) investir, com o dinheiro das ajudas, na
possibilidade de reuniões via Internet e no voto electrónico dos deputados. As
ausências não seriam menos notadas. A ARTV agradece o feed directo.
4) reduzir o número de deputados ou dividi-los num
sistema bicamarário, com senado territorial não permanente, em que as reuniões
deste orgão são menos frequentes. O resto do trabalho dos senadores será feito
na sua região.
5) definir o centro da vida de cada deputado como o
local onde o cônjuge e a maioria dos filhos menores residem. Deputados sem
filhos menores podem escolher a residência fiscal, apenas, como opção.
Por fim, uma nota: Pedro Nuno Santos, na sua defesa,
disse claramente que o centro da sua vida NÃO ERA onde estavam a esposa e o
filho. É só para registar para memória futura.
Fernando
Cascais: O Pedro e o Nuno. O Pedro já era mobília da casa
com três mandatos seguidos como deputado socialista. O Nuno, esse, tinha sido
agora eleito pela primeira vez deputado socialista e foi apresentar-se ao Pedro
no seu primeiro dia na AR.
Nuno: - Pedro, podes dar-me uma ajuda nos formulários
a preencher para o registo da morada na AR?
Pedro: - Claro, vamos a isso, Nuno. Então onde é que
moras?
Nuno: - Ainda não tenho casa própria, moro em Algés na
casa dos meus pais.
Pedro: - Eh pá, temos que alterar isso. Algés fica
mesmo aqui ao lado e as ajudas de custo vão ser pífias e assim nunca mais
arranjas casa própria. Não tens uma tia ou um primo que more longe daqui? Senão
temos que alugar uma garagem para os lados do Porto ou do Algarve.
Nuno: - por acaso tenho uma tia que mora em Bragança
mas que está de relações cortadas com os meus pais há mais de dez anos.
Pedro: - Perfeito, vamos preencher isto com a morada
da tua tia.
Nuno: - mas, mas eu nunca lá fui, sem sequer para a
visitar…
Pedro: - c.aga nessa mera.a, há aqui um g.ajo que
disse que morava em Angola. Queres ganhar dinheiro ou viver em casa dos teus
pais toda a vida e seres um totó na política?
Nuno: - mas eu pensava que a AR era, era…
Pedro: - pensavas o quê? A pensar morreu um b.urro.
Isto não é a Santa Casa da Misericórdia nem nenhuma assembleia de franciscanos.
Vá rapaz, faz-te à vida e telefona à tua tia não vá algum p.anasca de um
jornalista se lembrar de investigar as moradas.
J. D.L.: Será que um dia o dr. Pedro
Nuno será julgado e irá para o Inferno?
Rosa Lourenço: Sobre o IMI ... O MESMO ou algo semelhante já tinha acontecido como uma
casa de Cristiano Ronaldo...foi muito noticiado mas desconheço se algo foi
alterado. Defendo melhores remunerações
para os políticos MAS sem quaisquer extras.... para evitar tentações de abuso
de poder, corrupção ou ... Ahhhh sugiro ainda que é desnecessária uma AR com
tantos deputados, sendo inexistente a representação da abstenção ou então
manter-se-iam o mesmo número de deputados mas os votos brancos, nulos e a
abstenção seriam representados na AR com cadeiras vagas na mesma proporção
segundo o método de hondt.
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