Sem retrocesso.
Árvore das Patacas
Por alguma razão a maioria dos países
da nossa dimensão da União Europeia nos estão a deixar para trás. O sonho
nacional é o da árvore das patacas, distribuir sem produzir.
HENRIQUE NETO Empresário
OBSERVADOR,29 fev. 2024, 00:1611
A revolta das forças policiais
pode ser politicamente justificada, mas o que não tem qualquer justificação é a
cobardia da ausência do ainda governo de António Costa em assumir quaisquer
medidas de defesa da ordem pública, bem como dos dirigentes das polícias em
deixar que os polícias passem de agentes da ordem democrática para agentes da
desordem. O ministro da Administração Interna, que já mostrara a sua valia no
caso do SEF e no desastre que deixa ao País no controlo dos imigrantes, foi,
entretanto, dado como desaparecido.
Mas
talvez o facto mais relevante da situação democrática em que vivemos tenha sido
a acção dos comentadores de serviço nas televisões na noite do debate no
Capitólio, que mostrou bem até que ponto o Partido Socialista teve a arte de ao
longo dos anos ter colocado nos principais meios de comunicação pessoas com óbvias
simpatias pela esquerda em geral e pelo Partido Socialista em particular. Porque críticos da acção das polícias que invadiram
ilegalmente as ruas junto ao Capitólio, numa indisfarçável e ilegal acção de
afronta à ordem pública, os
comentadores não encontraram nada melhor para criticar do que as palavras sobre
o tema de Luís Montenegro, para concluíram com base nessas palavras que ele
tinha perdido o debate.
Ou seja, António Costa, sem mesmo informar o ministro das polícias,
decidiu com a ministra da Justiça melhorar as remunerações da Polícia
Judiciária e das secretas, criando com isso uma óbvia e estúpida injustiça
relativamente às outras forças da ordem, causa do actual estado de
insubordinação, mas a vítima das críticas dos comentadores foi o líder do PSD. Pessoalmente,
sou há muitos anos critico da qualidade de muitos programas de comentário das televisões, muitos que sobrevivem há demasiados anos e sempre com os mesmos, sem
a qualidade e sem a independência que se desejaria, mas bens agarrados aos bons
rendimentos e a fama que a actividade permite. Esta
questão atinge um indisfarçável nível de carreirismo e de ausência de
independência e de qualidade de muitos comentadores durante a presente campanha
eleitoral.
Como não me tenho cansado de escrever, Portugal não é um País
democrático devido aos deputados serem escolhidos pelas hierarquias partidárias
e não pelos cidadãos eleitores, mas também pelo domínio que o Partido
Socialista teve a arte de introduzir na política e na sociedade portuguesas. O
que na prática tem impedido a alternância democrática, razão do estado geral de
crise e de desgoverno em que nos encontramos. Como hoje se sabe bem, o progresso e o desenvolvimento
de qualquer sociedade depende da qualidade e da independência das instituições
públicas e privadas, mas que entre nós são em grande medida controladas pelo
PS.
Esta
realidade tornou-se mais visível nos debates da presente campanha em que
ficaram ausentes alguns dos principais temas da economia portuguesa, em
estagnação há mais de vinte anos. Exemplos: (1) ausência
de investimento na indústria, nomeadamente investimento estrangeiro, que foi a
base do sucesso económico de dois períodos do nosso passado como o da EFTA e do
PEDIP/AutoEuropa; (2) número excessivo de muito pequenas empresas, mais de 90%
do total, sendo que são na sua esmagadora maioria empresas comerciais, a
tentarem sobreviver no mercado interno num clima de concorrência fortemente
irracional. Empresas que morrem e nascem anualmente às dezenas de milhares,
apesar dos apoios do Estado, mas sem condições de contribuírem para o
desenvolvimento económico; (3) protecionismo e conservadorismo económico,
tragicamente visível na política ferroviária de Pedro Nuno Santos e na recusa
do comércio livre e da concorrência, o que torna Portugal uma anormalidade
europeia; (4) o PRR que distribui o dinheiro pelos mais variados objectivos em
vez de contribuir para reforçar os factores estratégicos do nosso desenvolvimento,
como a educação e a industrialização; (5) Fiscalidade que condena o
investimento estrangeiro e nacional de grandes empresas exportadoras e
protecção das pequenas empresas que geralmente não pagam impostos, mas que não
têm condições de fazer crescer a economia.
Uma
nota final para recordar que a economia portuguesa está presentemente presa
pelos arames do
turismo, que
ninguém pretende que acabe, mas que é necessário qualificar para poder
contribuir para melhores salários e melhor produtividade, sendo que o que
acontece hoje é o inverso.
São
estas algumas das questões que foram deixadas de fora dos debates da presente
campanha eleitoral, que tem sido conduzida para ver qual o partido que dá mais alguma coisinha ao bom
povo, sem cuidar que existe uma dívida enorme, que de forma mentirosa dizem
estar a diminuir, além do crescimento anémico da economia. Por alguma razão a
maioria dos países da nossa dimensão da União Europeia nos estão a deixar para
trás. O sonho nacional é o da árvore das patacas, distribuir
sem produzir.
28-02-2024
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