quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

Ficções


É o que se pressente, neste vaivém trapaceiro, de um povinho sem conserto, pesem embora as tentativas de uma aliança à direita que nenhuma esquerda que se preze deixará de boicotar. E os comentários a este trecho de LUÍS ROSA são a prova disso, uns favoráveis, de que não descarto o meu, outros bem cientes da inutilidade de acções extremistas como a de Montenegro, desprezando Ventura, mas também cientes de que uma aliança com esse CHEGA irrequieto seria igualmente um cóio de disputas pedantes, rebaixando ainda mais um país sem defesas, porque sem amor, a não ser nos programas das alegrias cantantes.

Luís Montenegro virou o jogo

Estas eleições resumem-se a uma ideia: vamos ter continuidade ou mudança? Montenegro tem sido fiel à sua estratégia e ganhou pontos nos últimos 10 dias. A ideia da mudança começa a instalar-se.

LUÍS ROSA Redactor Principal e colunista do Observador                     

OBSERVADOR, 14 fev. 2024, 04:4751

1Em 10 dias tudo mudou. O PS deixou de ter uma dinâmica de vitória. Luís Montenegro deixou de ser o bombo da festa dos comentadores televisivos, sendo criticado por tudo e por nada — mesmo de comentadores que se apresentam como representando o espaço do centro-direita. E o Chega até pode consolidar-se como terceira força política mas André Ventura arrisca-se a ficar como a carochinha que fica solteira para sempre.

Começando pelos Açores. Luís Montenegro arriscou, ganhou em toda a linha e credibilizou a sua estratégia do “não é não” em relação ao Chega. Com a ajuda preciosa de José Manuel Bolieiro, o país ficou a perceber duas coisas essenciais:

A AD não negoceia com o Chega e governará em minoria.

O PS/Açores seguiu a estratégia nacional de Pedro Nuno Santos, recusou viabilizar o Governo Regional da AD e pode ser um promotor activo de instabilidade política.

Este último ponto é fundamental para percebermos como as eleições regionais dos Açores tiveram mais do que nunca uma leitura nacional.

É certo que o PS de Pedro Nuno Santos quer repetir a estratégia de António Costa em 2022 e assustar o eleitorado moderado com o papão de uma possível aliança do PSD (leia-se AD) com o Chega. Daí que já tenha deixado claro há várias semanas que não viabiliza um eventual Governo minoritário da AD no pós-10 de março.

2O primeiro problema desta estratégia é que o contexto de 2024 pouco ou nada tem a ver com o de 2022. Por várias razões que se resumem na seguinte chave: protagonistas + desgaste da maioria do PS + quase impossibilidade do bloco da esquerda parlamentar ter maioria absoluta.

Em primeiro lugar, o líder do PSD já não se chama Rui Rio — que tinha características autoritárias e populistas que o aproximam claramente do Chega de André Ventura. O líder social-democrata é Luís Montenegro e tem uma forma de fazer política marcada pela moderação, ao contrário de Rio e também de Pedro Nuno Santos.

Por outro lado, António Costa chegou às eleições legislativas em 2022 com a aura do vencedor da pandemia, com boa imagem no eleitoral e claramente em posição de força. Pedro Nuno Santos é obrigado a defender como líder do incumbente um legado de uma governação com oito anos marcada por sucessivos escândalos que levaram à saída, no âmbito do último governo, de 13 governantes em 16 meses e estiveram mesmo na origem da queda do Executivo.

O desgaste político da governação socialista é tremendo e isso é claramente percecionado pelos eleitores.

Além das escolas sem professores, o caos instalado nos hospitais, a perda de poder compra e os juros elevados, há outro facto que muda claramente a situação face a 2022: a esquerda (PS + BE + CDU + PAN + Livre) praticamente não tem hipótese de ter maioria absoluta no Parlamento.

Ou seja, o PS não consegue derrubar o Governo com uma moção de rejeição do programa do Governo, como fez em 2015. E, se esse cenário se concretizar, os socialistas não conseguem oferecer uma alternativa de estabilidade: a reedição da geringonça. Por uma razão simples: provavelmente, não terão votos suficientes para isso.

3Acresce a tudo isto o facto de a estratégia de Pedro Nuno Santos assentar num pressuposto que os Açores deitaram por terra: a de que a AD vai sempre aliar-se ao Chega, caso o PS recuse a viabilização do Governo.

O que aconteceu nos Açores credibilizou definitivamente a estratégia do “não é não” de Luís Montenegro. Ou seja, se o PS ficou agora sem narrativa e sem discurso.

Pior: o PS/Açores assumiu-se como um factor de instabilidade ao anunciar sem mais que o grupo parlamentar socialista iria chumbar o Programa de Governo de Bolieiro. Tudo porque mesmo uma abstenção do Chega pode derrubar o Governo Regional. Só se a Iniciativa Liberal e/ou o PAN votarem ao lado da AD é que o Executivo é viabilizado.

Mas o mal já está feito: o PS de Vasco Cordeiro foi a primeira força política a dizer claramente que quer derrubar o Governo Regional quando as eleições acabaram de ocorrer. O eleitorado não costuma premiar quem é um agente activo da instabilidade.

É precisamente essa imagem isolada e radical que o PS de Pedro Nuno Santos também está a passar no Continente — e isso poderá ser percecionado pelos eleitores a 10 março como algo negativo para a estabilidade do país. O que é terrível para um partido como o PS que luta pelo eleitorado do centro.

Na prática, foi isso que tentaram dizer Francisco Assis e Tiago Antunes, nas críticas que expressaram à posição assumida pelo PS/Açores. Infelizmente, António Costa radicalizou o PS — como já o disse várias vezes — e essa herança vai levar tempo a desaparecer.

4Também André Ventura ficou de cabeça perdida com o que aconteceu nos Açores, mas acima de tudo como o que Luís Montenegro reafirmou olhos nos olhos no debate desta 2.ª feira: “não é mesmo não”.

E aqui é importante recordar que Ventura já prometeu em dezembro que iria apresentar uma moção de rejeição — igual à de António Costa em 2015 — do programa de um eventual Governo da AD que saia das eleições de 10 de março. Tudo porque o Chega não podia admitir ficar de fora de um Governo liderado pela AD.

Da ameaça travestida de chantagem, evoluiu para um recuo estratégicoregressou ao silêncio, insultou o PSD como “prostituta política” e acabou a mendigar por conversações com a AD no pós-10 de março após Luís Montenegro ter reafirmado de que não haveria qualquer espécie de negociação com o Chega.

Não é que seja propriamente uma novidade, mas André Ventura não passa de um cata-vento político. Pior: arrisca-se mesmo a não contar para o totobola a seguir às eleições.

5Luís Montenegro conseguiu reforçar a sua credibilidade como candidato a primeiro-ministro nos últimos 10 dias fazendo algo que muitos não consideravam possível: arriscou nos Açores (e ganhou) e tem-se mantido totalmente fiel à sua estratégia de recusar qualquer aliança com o Chega, esvaziando o bicho papão que o PS e a extrema-esquerda tentaram criar.

Acresce que, tendo em conta a autêntica barragem de escrutínio e censura que tem tido na comunicação social, as expectativas sobre Luís Montenegro eram claramente baixas antes do início dos debates televisivos.  O líder da AD começou muito bem contra Marina Mortágua, continuou com Paulo Raimundo e Inês Sousa Real e atingiu o seu máximo contra André Ventura.

Foi no debate contra Ventura que a lógica do voto útil atingiu o seu ponto máximo de eficácia, até ao momento. Não só por ter reafirmado ‘olhos nos olhos’ o “não é não”, mas também pela demonstração do irrealismo das propostas do Chega (que quantificou em mais de 25 mil milhões de euros) e o apelo direto ao voto dos eleitores do PSD que fugiram para o partido de Ventura.

Estas eleições resumem-se a uma ideia: vamos ter continuidade ou mudança? Luís Montenegro tem conseguido fazer com que a ideia da mudança comece a instalar-se no eleitorado.

A principal prova disso é que Pedro Nuno Santos já foi obrigado despir o fato de candidato moderado, assumindo a sua verdadeira persona política de radical e combatente. Mais: no debate com Rui Tavares fugiu-lhe a boca para a verdade e admitiu mesmo que a situação é completamente diferente da de 2022 porque “há o risco da AD vencer”.

Ainda falta muita estrada até à meta de 10 de março — e, tendo em conta os rumores que circulam nos bastidores, ainda muita roupa suja vai ser lavada em público. Logo, nada é certo. Mas, para já, Luís Montenegro conseguiu virar o jogo e está numa boa posição para o resto da corrida.

LEGISLATIVAS 2024     ELEIÇÕES LEGISLATIVAS    POLÍTICA

COMENTÁRIOS:
José cordeiro Cordeiro: Parece-me que a sua análise está correcta, mas Montenegro tem uma batalha dura, que é contra a Média, infiltrada e infectada em grande parte(e por isso em crise)pela esquerda!                Joaquim Rodrigues > Carlos Chaves: Do ponto de vista do "modelo de desenvolvimento económico" e da forma como é encarado o "papel do Estado" nesse modelo de desenvolvimento, o André Ventura está muito mais próximo do Pedro Nuno Santos do que do Luís Montenegro. Aliás, por essa razão, parece-me muito mais fácil um entendimento entre o Chega e o PS do que entre o Chega e o PSD.                Ana Luís da Silva: As eleições legislativas de 10 de março onde está em causa o futuro de Portugal e dos portugueses são para Luís Rosa “um jogo”. Uma “corrida”, uma disputa.   Vou agarrar a metáfora, apenas para tecer alguns comentários sobre o “jogador” Montenegro nos três primeiros minutos desta “etapa” da “sua corrida”; ou seja, como  começa o debate por humilhar o adversário, dizendo que não terá “qualquer entendimento (quanto mais um acordo!) político”, “por uma questão princípio” com “alguém” que tem “políticas / opiniões muitas vezes xenófobas, racistas, populistas”. Ou seja:  - tenta controlar o outro jogador pela humilhação pessoal em vez de “correr” com lealdade e pela positiva, usando as suas próprias forças; - não utiliza argumentos, que levem o concorrente a expor-se naquilo que considera errado, mas usa rótulos, como um bully; - revela egocentrismo: em vez de L’Etat c’est moi” de Luis XIV,  temos “o PSD sou eu” de Montenegro; - e sobretudo, a sua atitude demonstra arrogância e total desrespeito pelo milhão de portugueses que, a fazer fé nas sondagens, dá o seu voto ao CHEGA e para quem as opiniões pessoais de Montenegro sobre André Ventura são de todo irrelevantes. Em conclusão, como “jogador”: Montenegro prima pela total ausência de fair play…  a que acrescento uma incapacidade inata para realizar compromissos com pessoas que lhe desagradam pessoalmente, ainda que isso seja do interesse de Portugal e dos portugueses.                   Carlos Chaves: Sempre acreditei que a “direita” devia estar unida para combater esta esquerda que nem merece qualificação! Mas os acontecimentos dos últimos dias são realmente como o Luís Rosa acertadamente catalogou, um virar de jogo! Arriscado, pois muito dificilmente a AD conseguirá uma maioria absoluta. Depois já estou como o Camilo Lourenço na cor do dinheiro, será o CHEGA um partido de direita como se auto denomina? As propostas que tem feito nomeadamente a nível económico, incluindo a TAP, são de mais estado, mais estado, e mais estado, que levarão a mais carga fiscal, tal e qual o modus operandis da esquerda! Se juntarmos a isto a rudeza e a radicalização da linguagem que tem sido utlizada, assim fica difícil!  Joaquim Almeida: Com mais ou menos erros, foi  André Ventura quem, durante anos, teve a coragem  e  a persistência  de fazer crescer uma significativa  massa popular  contra uma esquerda comunizante-marxisante  sonsa mas extremista, que já sonha  com uma Gestapo a bater à porta das famílias . - massa popular  que poderá   traduzir vir a traduzir-se em 40/50 deputados, Enquanto o PSD  dormiu e se enredou em linhas vermelhas. Com tanta fé nas sondagens ainda podem dar com os burros na água.                    bento guerra: Mudança só com o Chega, de que vocês não gostam(reaccionários)                     Domingas Coutinho: Óptima análise. Concordo plenamente com o que diz sobre Rui Rio que não é só um autoritário junto dos que considera fracos como não se afirmou junto do PS quando este tudo fez para tão injustamente denegrir o PSD na figura de Passos Coelho. A firmeza e coerência de Luís Montenegro está muito bem demonstrada e quanto ao Chega de André Ventura é um Partido que está cada vez mais enlameado agora também na forma como apresenta as suas ideias. Parabéns Luís Rosa.                    Joaquim Zacarias: Montenegro foi para a guerra, para tentar vencer um inimigo muito poderoso, bem armado e municiado. Parecia natural dever concentrar-se exclusivamente nesse combate, aliando-se a outras forças para melhor garantir a vitória. Porém, mudou de estratégia, e arranjou outro inimigo, colocando em causa a vitória que parecia praticamente certa. Coisas de amador.                   maria santos: Talvez, sim, são claramente reais as hipóteses de o PSD(AD) ser o vencedor a 10/Março. Mas duvido da consistência parlamentar da sustentação governativa do centro-direita para enfrentar a destabilização social provocada pelo ódio das esquerdas apeadas capitaneado pelo PS. O PS vai recorrer a tudo, à maneira do futebol, montras partidas, carros a arder, cortes de estradas, etc etc e os acólitos do BE têm a experiência assassina das FP-25 de Abril.   Constituir um Governo com bons quadros profissionais, é um factor necessário mas não suficiente. Citando um comentário, é real a incapacidade do PSD(AD) "para realizar compromissos com pessoas que lhe desagradam pessoalmente, ainda que isso seja do interesse de Portugal e dos portugueses."  A meu ver, a catástrofe que se avizinha é o centro-direita não constituir a estabilidade governativa do bloco PSD(AD)/Chega no Parlamento. Será mais uma Primeira República, mais um Alcácer-Quibir a juntar aos outros todos. Temos pena e temos tempo.                   João Floriano > Ana Luís da Silva: Eles andam todos  a cuspir para o ar! Deixa-os andar. Estão convencidos que vão conseguir governar em minoria. Vamos ver como vai ser aprovar propostas no parlamento sem  a colaboração dos «descartáveis».                   GateKeeper: A ideia  da mudança  já  se instalou e já  "anda". Contudo não  foi nem é, seguramente, com os pezitos do míope LM e a sua ad mini-minion que esse caminho foi, é e será "estraçalhado". Para bons entendedores... 1/2 palavra basta, certo?! Claro que o meu caro LRosa, sempre que sai da sua "confort/expertise zone", se espalha, habitualmente, ao comprido.

Nenhum comentário: