segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

O riso amarelo de todos nós



Coloco em primeiro lugar a Carta “Foi uma Festa”, de Artur Gonçalves, de Sintra, por me identificar mais com o seu ponto de vista crítico em torno do festival orçamental e da comemoração final de um A. Costa sorridentemente inchado a deixar prever a sua continuidade em outro mandato tranquilizador, mau grado as sinuosidades e a falta de transparência apontadas, o que apenas serviu para atiçar as habituais ironias impacientes, mas a sujeitar os seus apoiantes da esquerda, com o “prato de lentilhas” confirmado.
O Editorial de Manuel Carvalho, parece-me ambíguo e mais subserviente, apesar de querer indiciar rigor, bem assim os comentadores do seu texto. Mas, na verdade, que outra coisa vale a pena fazer num mundo a desabar partout?

I - Cartas ao director: Foi uma festa!
PÚBLICO, 30 de Novembro de 2018
Li muitos textos na comunicação social e na televisão sobre os três anos de duração da geringonça. Todos disseram que nunca esperaram que a geringonça durasse tanto tempo. Foi por isso que o PS deu em comemorar esta data com solenidade festiva. E, em suma, por aqui se ficaram, sem adiantarem razões deste sucesso, a até porque as perguntas não iam nesse sentido.
Mas valia a pena escrever umas linhas ou falar sobre as razões que estão na base desta formação ou aceitação de partidos tão contrários entre si. Para responder a esta questão bastava que os entrevistados ou os jornalistas dissessem que isso foi à custa de os dois partidos da extrema-esquerda terem traído a sua matriz ideológica de contestação, de greves de arruadas e arruaças, colocando no esquecimento a
defesa dos direitos dos seus eleitores. E acrescentarem que não se compreende como, sendo eles partidários da abolição da UE, aprovaram todas as políticas comunitárias que iam em sentido contrário à defesa dos seus princípios estatutários.
Sabemos que Costa lhe acenou com um prato de lentilhas e eles morderam a isca porque com ela vinha a sede de mando e de protagonismo, sem falar do facto de terem aderido para não deixarem governar a direita. 
Por isso, é provável que esta aderência governativa venha a prejudicar os resultados das próximas eleições. Estaremos cá para ver!
ARTUR GONÇALVES, SINTRA

II – EDITORIAL - O Orçamento que inaugura o fim de um ciclo
Agora a campanha eleitoral vai começar. Esperemos que fique a salvo das tentações eleitoralistas que os partidos já começaram a esboçar na aprovação do Orçamento.
MANUEL CARVALHO
PÚBLICO, 30 de Novembro de 2018
A recta final que levou até à aprovação do Orçamento do Estado de 2019 dava um excelente trailer de um filme indiano. Numa repetição do movimento e drama que faz parte do código genético da base parlamentar de apoio ao Governo, houve zangas, insultos, ameaças, pequenas traições, insinuações e provocações, mas no final do enredo, António Costa, o herói da fita, acabou por sobreviver a todos os problemas e apareceu sorridente com quatro dedos em riste a sinalizar outros tantos orçamentos aprovados.
É obra, ainda que imperfeita – o Orçamento de 2019 continua a ser um exercício em que há um claro desequilíbrio entre as respostas aos problemas do Estado e da função pública e as que têm como destino a economia e o sector privado.
A encenação faz parte do jogo parlamentar, mas, desta vez, a necessidade dos partidos de fazerem barulho para serem notados pelo eleitorado chegou a níveis surreais. Impávidos e serenos, o Governo e o PS impuseram, no essencial, as suas regras, porque, como notou Carlos César, “os partidos, pródigos nas promessas, tornaram-se, afinal, mais acanhados, quando se tratou de as fazer valer”.
E foi fácil ao Governo sobreviver à torrente de quase mil propostas de alteração, porque, na verdade, a maioria dessas propostas tinha como único objectivo fazer prova da existência da oposição. Do voto sobre vacinas sem qualquer parecer científico à inacreditável imposição de uma agenda negocial ao Governo com os professores cuja única utilidade é ficar bem com essa determinante classe eleitoral, houve de tudo um pouco. Até touradas.
Não é, no entanto, a dissimulação que leva o Bloco a criticar a “soberba” do PS ou o PCP a invocar o horror da atenção concedida à dívida para depois votarem de cruz o Orçamento que merece ser destacada por estes dias. Com todos os seus riscos, com todas as suas evidências de que este Governo é prisioneiro do ciclo curto, com todas as incertezas sobre a conjuntura internacional que o Orçamento descura, com todos os golpes de teatro no IVA ou nas coligações negativas, facto é que António Costa e o seu Governo vão mesmo cumprir a legislatura, facto é que o PCP e o Bloco revelaram uma disposição para o compromisso surpreendente.
Agora, e ao contrário do aviso de Catarina Martins, a campanha eleitoral vai começar. Esperemos que fique a salvo das tentações eleitoralistas que os partidos já começaram a esboçar na aprovação do Orçamento.

III - COMENTÁRIOS:
José Cruz Magalhaes, Lisboa 30.11.2018: Nenhum dos partidos com representação parlamentar estava empenhado em outra coisa que não fosse a aprovação do OE para 2019. No último ano da legislatura, todos aproveitaram a discussão e a votação na especialidade para deixarem a sua marca, em medidas adicionais que satisfaçam as estratégias eleitorais a desenvolver. À esquerda, a continuação da pressão sobre o governo para diminuição da desigualdade e contenção da miséria e, à direita, o desempenho oscilante entre a cavalgada da onda populista e o irresistível papel de"fazer de morto".
CHINTZ, Porto 30.11.2018: O que serão as coligações positivas e as coligações negativas? Estou com uma curiosidade! A esquerda beneficia dos milhões dos contribuintes para comprar milhões de votos dos subsidiados. Como qualquer dia já haverá mais subsidiados que contribuintes, a esquerda já era, morreu de demagogia. A direita nem precisa de fazer campanha, só precisa de gente inteligente e com pulso, poucos.
rvasconcelos, 30.11.2018: Essa do filme indiano é pela ordem goesa? Só cá faltava!
AndradeQB, Porto 30.11.2018: Se as tentações eleitoralistas forem lembrando os calotes do Estado, é que vai dar que lembrar. Não vão, por exemplo, os alunos carenciados com direito a bolsas, e cuja primeira tranche lhes foi dividida a meio adiando o pagamento da outra parte para 2019, quererem receber as próximas tranches antes de 2020 ou 2021.
Domnall Mór Ua Briain, King of Munster30.11.2018: As bolsas, lá pelo início dos anos 90 eram pagas todos os meses, não eram "tranchadas", mas até 1994 entre seguro escolar e propinas pagavam-se mil escudos por ano para estudar na universidade. As universidades portuguesas sentavam-se entre as 100 melhores do mundo, hoje ficam abaixo das 300 melhores. Nada do que se passa hoje numa universidade portuguesa faz sentido.


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