segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Eles levam a carroça à frente dos bois

Eles levam tão a sério a sua sensibilidade em relação à fauna, que preferem puxar a carroça, a submeter os bois a esse fardo doloroso. Por isso querem intervir nas próprias tradições linguísticas, como meio de abrandar os costumes relativamente à fauna. Só por peta, talvez, mas nunca se sabe aonde se pode chegar, com tanta gentileza deles perante a vastidão da fauna que o Nosso Pai criou, juntamente com o pão de cada dia para nós outros, racionais dependentes. Nitidamente, eles, os da PETA, sentem para com a fauna irracional, uma fraternidade não pueril, mas muito respeitável, na irmandade democrática que se originou ultimamente com todo o bicho careta, apesar das muitas excepções. Vê-se que eles nunca “engolem sapos vivos”, tanta é a sua delicadeza de mastigação, de opção vegetariana, mas quanto a “entregar-se aos bichos” não digo que não. Estas coisas da entrega aos bichos, sendo perversas, são também antigas, li-as, adolescente, salvo erro, no livro “A Selva” de Ferreira de Castro, entrega aos bichos que me impressionou sobremaneira então, por motivos púdicos, mas hoje não diria o mesmo, se a relesse, tão extensa tem sido a minha “entrega à bicharada” dos novos conhecimentos sócio-gramaticais, sexuais e outros mais, pese embora o meu lapso de memória que tento refazer com Vita D, comprada na farmácia a uma senhora brasileira representante do produto naturista americano, que lá se encontrava na altura, fazendo a promoção do produto, com o desconto próprio, que logo me fez adquiri-lo.
A excelente crónica de SOFIA FLORENTINO, uma Estudante de mestrado em Ciência Política e Relações Internacionais, de22 anos, revela uma maturidade de pensamento e Ética que logo me fizeram sua fã, sem desdouro para os da PETA, pois, para mim, “tudo o que vem à rede é peixe”, mau grado o plástico que não foi reciclado e que também vem na rede, julgo que para desgosto da PETA sensível, que, para mais, nem concorda provavelmente com a rede da pesca - nem com os artefactos da caça, a menos que sejam utilizados no combate aos “fascismos” e outros “moralismos” reaccionários, a cair da tripeça.
A PETA, os outros censores e a caça às expressões
SOFIA FLORENTINO
OBSERVADOR, 9/12/18
O combate da PETA à liberdade de expressão não se baseia apenas numa estratégia de marketing, mas configura um ataque real a costumes construídos socialmente durante décadas.
A associação dedicada à defesa dos animais PETA People for the Ethical Treatment of Animalsveio alegar que se deverão trocar expressões como “mais vale um pássaro na mão que dois a voar” por “mais vale um pássaro a voar do que dois na mão” para se eliminar a cultura de violência para com os animais. Recentemente colocou-se em causa a passagem na rádio de músicas icónicas como “Baby It’s Cold Outside” porque alegam estar implícito um comportamento predatório, e há pouco tempo questionou-se uma pessoa poder despedir-se dizendo “até amanhã se Deus quiser”.
Músicas proibidas, palavras substituídas, expressões alteradas, temas tabu, estaremos a assistir ao renascimento do Lápis Azul? Trata-se de uma edição um pouco mais vermelha, mas tanto ou mais perigosa. Uma caça às bruxas da actualidade: o pensamento livre e os costumes neste caso exemplificados por dizeres populares.
De facto, com este tipo de propostas a PETA “mata dois coelhos de uma cajadada só”: cria polémica, ganhando visualizações na internet, e dissemina ideias que pretendem pôr fim à livre expressão. Mais preocupante é que esta sua luta não se baseia apenas numa estratégia de marketing, mas num ataque real a costumes construídos socialmente durante décadas.
Não se devem levar estas notícias de ânimo leve, não são inocentes e desprovidas de perigo. São sim uma das maiores ameaças que a Democracia enfrenta hoje em dia, pois actualmente os seus maiores inimigos não se encontram longe, nem se identificam como tal, estão pelo contrário completamente integrados no sistema e declaram-se publicamente como os “verdadeiros democratas”.
Estes campeões da “Democracia” claramente olvidaram o verdadeiro significado de Democracia e Livre Expressão. É que estas não se prendem com uma verdade absoluta única e numa só resposta que agrade a elites morais, mas deve permitir a existência de todas as verdades e de todas as respostas, ainda que, e mais ainda, quando não são do agrado de todos.
A censura não é amiga da Liberdade, e promovê-la, apenas incapacita o desenvolvimento social e intelectual do homem, pois o debate entre ideias diferentes e até falsas continua a ser importante. E não se pode esperar que a censura proíba apenas coisas erradas, pois, quem é legitimamente reconhecido como autoridade moral para poder tomar decisões sobre que palavras se podem proferir ou músicas cantar e ouvir?
Adicionalmente, este tipo de argumentos demonstra que se perderam algumas ferramentas, que considero cruciais à interação civil humana, a compreensão, o senso comum e o sentido de humor. Há uma verdadeira falta de noção do sensato. Não querendo remontar aos tempos do antigamente, nos anos 90 ainda era possível proferir expressões como “agarrar o touro pelos cornos” sem ferir susceptibilidades, porque qualquer pessoa entendia que se tratava de enfrentar com coragem situações difíceis.
Hoje, porém, é impossível fazê-lo porque a recém eleita sem legitimidade reconhecida – elite moral dita que as pobres crianças ficarão traumatizadas e que crescerão adultos perturbados; o que perpetuará a cultura de violência, seja contra animais ou contra Humanos.
O seu máximo objectivo é deitar abaixo aquilo que a sociedade foi criando gradualmente através da interacção e construir uma nova sociedade utópica como se de um edifício de legos se tratasse. A pedra basilar da sua edificação? Uma perseguição moral incessante a qualquer demonstração de pensamento contrário ou distante daquilo que consideram a epítome da moral.
No futuro a maior hipocrisia será revelada, pois este tipo de preciosismos irá levar àquilo que afirma tentar evitar: humanos incapazes de se defenderem, incapazes de enfrentar o errado e de o refutar, no fundo crianças grandes que nunca se depararam com a realidade da vida e que vivem numa fantasia.
Esses homens medrosos serão com facilidade completamente subjugados a um ideal de conduta moral inatingível e uma sociedade de purgas e limpeza moral. Nesse mundo cor-de-rosa não há lugar para espaços cinzentos, apenas para a certidão moral e o Estado já não defende leis, mas primados de acção moral e correcta.
Um mundo ao qual me recuso conformar e, para contornar o mesmo, exorto a que se faça frente a estas ideias e que se mostre, com coragem, que não nos deixaremos vergar perante estes atacantes e defenderemos a Democracia e a Livre Expressão, sempre.
Como não temo estes guerreiros, e atrevo-me a afirmar que ainda tenho a capacidade de discernir entre a razoabilidade e o ridículo, despeço-me com esta: por favor reduzam as “lágrimas de crocodilo” e guardem-nas para problemas reais, não sejam “baratas tontas” a disparar em todos os sentidos, que estas expressões já andam há “muitos anos a virar frangos” e por alguma razão o será.
Estudante de mestrado em Ciência Política e Relações Internacionais, 22 anos
COMENTÁRIOS:
Readbeat Algorithms: Esqueceu-se do "andar em transportes públicos que nem uma sardinha enlatada". Coitadinha da sardinha!
Délio Melo: É apenas mais um exemplo de falta de razoabilidade e humildade. Mais do que uma mente fechada que já não consegue perceber o óbvio, diria que é um coração duro que só consegue ver o mal - em coisas insignificantes como esta. Para não falar na crescente antropomorfização dos animais… Há uns tempos lembro-me de ouvir sobre uma forma subtil de ditadura: não se tratava de controlar a pessoa, mas o que a pessoa poderia pensar. Para isso, certas palavras iam ou seriam "eliminadas".

(N.B.): Uma das palavras eliminadas foi, por exemplo, a palavra “liceu”, soterrada no vasto sorvedouro dos agrupamentos escolares, da unificação escolar, onde caberão, qualquer dia, não só os animaizinhos do nosso contentamento fraterno, mais as mudanças gramaticais do nosso desconhecimento linguístico.

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