segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

O pensamento lógico


É, pelo menos, mais apreensível, se tivermos uns laivos de cultura, e assim percebermos melhor os problemas que o Dr. Salles se diverte a equacionar – no objectivo bem necessário de lembrar quanto a instrução e a cultura são imprescindíveis na qualificação dos povos e nas suas artes de realização. E isso é consolador. E reconfortante para os países que assentam o seu progresso e bem-estar na racionalidade do exemplo passado, para criarem no presente as suas próprias achegas evolutivas. Um país que assente na sua agricultura e nas suas pescas, nos vagares ou apressamentos das suas realizações, sem procurar meios facilitadores de maior produção, ficará a marcar passo, julgo eu. Os países mais industrializados, que aplicam esses meios resultantes dos seus esclarecimentos culturais, desenvolver-se-ão melhor, é claro, pela eficiência e facilitação que resultam do saber ligado ao trabalho intelectual e por consequência físico. As desvantagens de um viver mais dinâmico nas questões do trabalho de alienação mecânica, estão bem satirizadas, contudo, há muito tempo já, nos “Tempos Modernos” por um Charlot quase robotizado, embora em farsa crítica. O certo é que, se a cultura faz progredir, julgo que a gradual mecanização precipita o Mundo num sentido destrutivo... E o Homem, igualmente, num sentido quantas vezes destrutivo, psiquiatricamente e mesmo moralmente falando, pelo excesso de ruído que causa o desenvolvimento tecnológico, ou, contrariamente, pelo excesso de “silêncio” trazido à nossa juventude de hoje, pelo “mergulho” numa “caixinha” alienatória, facilitadora de preguiça mental e física também, a apetência do trabalho colidindo com a facilitação do ripanço… Isso, por cá, pelo menos, preferencialmente amantes do nosso fado chorado…

DAS RELAÇÕES E DO TEMPO

HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO, 03.02.23

Diz-se que uma relação é biunívoca quando cada um dos dois (e, por isso, bi) elementos se relaciona essencialmente com o outro. Ou seja, nenhum dos elementos existe sem o outro. No mesmo grau de intimidade, admitamos a existência de relações pluriunívocas.

Matematicamente, ambos os tipos de relações descritas são igualdades sendo que na biunivocidade podemos imaginar uma equação e na pluriunivocidade podemos imaginar uma matriz ou determinante.

Até aqui, tudo é instantâneo, o tempo não vem à colação. Mas se introduzirmos o factor tempo, já a relação passa a sucessiva e podemos deparar-nos com questões darwinescas. Ou seja, as relações abandonam a univocidade (relação essencial) e passam para o campo das sucessões (influência genética, lógica., legal…).

Passemos a um caso concreto: é a cultura (instrução, educação formação) que promove o desenvolvimento económico ou vice-versa?

Antes do mais, explicitemos os conceitos «cultura» e «desenvolvimento económico» neste primeiro quarto do séc. XXI.

CULTURA diz-se que uma sociedade (Nação ou País) é culta quando se encontra no quartil mais elevado desse parâmetro do PNUD, ou seja, quando não existe analfabetismo, toda a população em idade activa concluiu o ensino obrigatório (em Portugal, o 9º ano), a maioria absoluta da população em idade activa completou o secundário superior (12º) e mais de metade dessa população tem formação superior;

DESENVOLVIMENTO ECONÓMICOdiz-se que uma sociedade ou país são desenvolvidos quando, no «benchmarking» mundial, se encontram no quartil mais elevado da OCDE.

Parametrizada a questão, salta à vista a existência duma multiplicidade de variáveis de complexa qualificação no que possa respeitar a uma relação causa-efeito. Não sendo meu propósito construir um modelo (nem sequer estático, quanto mais dinâmico) de mero interesse académico, sou levado a sugerir aos Investigadores matematizados que avancem na escalpelização de um modelo que, e não ouso desbravar limitando-me, pelo contrário e, arrepiando caminho, pergunto-me se os políticos devem começar por acelerar o desenvolvimento económico para obterem mais cultura ou se devem instruir primeiro para receberem o desenvolvimento mais tarde.

Sempre fui adepto da prioridade das políticas de educação-instrução-formação, mas recentemente encontrei mentes ilustríssimas a pensar o contrário.

A minha opção inspira-se nos clássicos gregos e resulta de um silogismo composto por dois axiomas e uma conclusão:

. O progresso resulta da inovação

- O conhecimento é o motor da inovação

- Sem conhecimento não há progresso

Aguardo com interesse pela tese contrária.

Fevereiro de 2023

Henrique Salles da Fonseca

Tags: economia

COMENTÁRIOS:

Anónimo 04.02.2023 13:45: No teu anterior post – “Performances 2022” -, explicitaste, Henrique, que o desenvolvimento económico dependia também da taxa de analfabetismo e do nível de ensino. Ao comentar o teu texto, disse que o subscrevia (e acrescentei uma análise). Foi com alguma surpresa que constatei que o meu Amigo António Pinho Cardão fez uma ressalva neste ponto, evocando uma tese (que eu desconhecia), e citando o Prof. António Barreto, que era o desenvolvimento económico que condicionava a educação e não o contrário. Não quero entrar nos caminhos do ovo e da galinha, mas sabemos – e isso também ensinou o Prof. Francisco Pereira Moura – que em Economia tudo reage sobre tudo. Independentemente do que o António Pinho Cardão possa, eventualmente, dizer, acrescento algumas reflexões. Sei que há autores que negam que o desenvolvimento económico, melhor, a diferença dos estádios de desenvolvimento dos Países seja explicada por factores como a geografia, a cultura e a ignorância. Daron Acemoglu e James Robinson, autores de “Por que falham as Nações” estão entre estes. Chamam a estas hipóteses “teorias que não funcionam” (capítulo 2, 1ª edição, 2013). Para eles a verdadeira explicação está na existência ou não de instituições extrativas ou inclusivas. Quanto mais houver das primeiras menor será o desenvolvimento económico, já que as elites se apropriam da riqueza, prejudicam a emergência de novas tecnologias, impedem a Sociedade de realizar o seu potencial económico, destroem os incentivos ao investimento e à inovação. Logo, o desenvolvimento é tanto maior quanto mais instituições inclusivas e pluralistas existam, pois assim todos têm as mesmas oportunidades, há concorrência, competitividade e produtividade. Ora, os autores reconhecem (página 513) que “o crescimento económico sustentado exige inovação e a inovação não pode ser dissociada da destruição criativa que substitui o velho pelo novo”. E aqui caímos na doutrina defendida pelo economista Joseph Schumpeter (ver, por exemplo, “Os Grandes Economistas”, de Linda Yueh (páginas 171 e seguintes, 2019, 1ª edição). Para este economista, a inovação é o motor do crescimento económico, é o “perpétuo vendaval de destruição criativa”. Verifica-se, pois, que para os 3 economistas citados, a inovação está no fulcro do crescimento económico. Mas como pode haver inovação sem investigação? E esta sem haver cultura, na acepção ampla como defines neste teu último post? Seria impossível, penso. Sabemos bem como “Investigação e Desenvolvimento (I&D)” está presente em todos os cenários macroeconómicos dos Países. Não me esqueço que a minha saudosa colega e amiga Maria José Constâncio, quando ocupava o lugar de Directora-Geral da Indústria, instar connosco (na altura estava na Administração da Siderurgia Nacional) para que privilegiássemos a Investigação, pois a empresa tinha recursos financeiros para isso e tal era necessário para que ela fosse competitiva, particularmente no cenário, em que se vivia então, de abertura de mercados (a adesão à CEE tinha-se iniciado). Se continuo a pensar que a Cultura (em sentido amplo) é necessária para a Investigação, e esta para a Inovação e para o Desenvolvimento Económico, também não excluo que, quanto mais elevado for este, mais as outras variáveis assumem valores relevantes. Ao fim ao cabo, estamos perante não só a relação biunívoca, mas também o cenário em que tudo reage sobre tudo. Forte abraço. Carlos Traguelho

 Henrique Salles da Fonseca 05.02.2023 05:19: Parabéns, Amigo por tão interessante análise! Porém, dito de modo mais lhano, parece que a maior taxa de crescimento - democrático, porque toca a todos - resulta da estratégia da captura do Estado pela Tribo! Elias Quadros

antónio pinho cardão 05.02.2023 17:04: Caro Salles da Fonseca: Excelente post, para mais com direito a proposição de tese contrária. Vamos então a isso: a) Cultura :” diz-se que uma sociedade (Nação ou País) é culta quando se encontra no quartil mais elevado desse parâmetro do PNUD, ou seja, quando não existe analfabetismo, toda a população em idade activa concluiu o ensino obrigatório (em Portugal, o 9º ano), a maioria absoluta da população em idade activa completou o secundário superior (12º) e mais de metade dessa população tem formação superiorTrata-se, a meu ver, de uma formulação meramente quantitativa. A sociedade pode ser mais ilustrada, mas tal não significa que seja mais culta. Aliás, a filosofia, a literatura e a história são cada vez mais disciplinas marginais no ensino. E nos estádios superiores do ensino a especialiazação tornou-se dominante. Por exemplo, os temas dos doutoramentos tratam maioritariamente matérias muito específicas e particulares. Ainda não há muito houve um doutoramento em pronomes possessivos…O mesmo noutras ciências. É culto quem sabe tudo sobre pronomes possessivos ou leis do trabalho e, no resto, logo diz que não é matéria sobre que se tenha debruçado? Bom, digamos que o que diz o PNUD será uma condição necessária, mas daí a ser suficiente vai uma grande distância. b) Desenvolvimento e cultura: Pois, também de alguma forma contrariando o que o meu amigo diz, a cultura ( e a educação) vêm com o desenvolvimento. E o silogismo em que se estriba parece-me imperfeito. Desde logo, porque nem toda a inovação provém do conhecimento; há muitos casos (penicilina, insulina, etc, etc, até o viagra) que advieram do acaso. Também o comentário do Carlos Traguelho é de excelência. Fala nas “teorias que não funcionam” às quais eu, mais prosaicamente, chamo mitos. E mito é o lema simplista de que a investigação tout court traz desenvolvimento. É que, independentemente de alguma investigação básica, a inovação que gera progresso é a que dá origem a produtos fabricáveis, comercializáveis e vendáveis, que criam emprego e riqueza. Em Portugal, por exemplo, quase todo o dinheiro que vai para investigação nos centros e laboratórios do Estado é gasto puro e simples. Onde estão os produtos vendáveis? É este o meu comentário, sucinto e em termos práticos. Grande abraço

Henrique Salles da Fonseca 05.02.2023 18:32: Muito obrigado, Caro Pinho Cardão. Continuemos.... Abraço Henrique Salles da Fonseca

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