OBSERVADOR, 10/2/2023
Guerra e Paz.
I- Os tópicos:
a)GUERRA NA
UCRÂNIA (352º dia)
«Em direto/ Lavrov: Ocidente
falhou objectivo de isolar Rússia
22:43 Zelensky
já chegou à Ucrânia, após paragem na Polónia
21:50 Autoridades
ucranianas alertam para ataque com drones em Kiev
21:13 Estados
Unidos pedem à Rússia para cumprir regras do tratado nuclear Novo START
20:39 Autoridades
ucranianas dizem ter abatido drones em duas regiões
18:45 Eslováquia
recebeu pedido da Ucrânia e pode começar negociações sobre envio de caçasGUERRA NA UCRÂNIA
O que aconteceu no 352. dia de guerra na Ucrânia?: Kiev denunciou ataque em larga escala no país,
acusando Moscovo de lançar mísseis que cruzaram o espaço aéreo da Moldávia e
Roménia (que desmente caso). Zelensky diz que ataque é "desafio para NATO.»
b) SISMO
Em directo/Sismos: mais de 23 mil mortos e 82 mil
feridos
«Síria
autoriza entrega de ajuda em zonas controladas por rebeldes e atingidas pelos
sismos. Há mais de 23 mil mortes. Continuam os resgates de pessoas com vida com
mais de 100 horas sob os escombros.»
II- A beleza criada e recriada
A recriada, disfarçando o penar, pelo
reflexo e pela recordação do Belo natural - o que jamais encontraremos em
Picasso. Mas sim, a pintura deste, também é bem figurativa dos contorcionismos
humanos reais e penosos, que uma Terra, por vezes facinorosa, também sabe
produzir.
O mar, reflectido no céu, chega-nos pelo ar
A brisa que vem do mar não pode ser
directamente pintada. Mas o génio do pintor pode criar a sua alucinação através
do modo como o mar se reflecte no céu por sobre as figuras humanas.
PAULO TUNHAS, Colunista do Observador
OBSERVADOR, 09 fev. 2023, 00:197
Devia ser preciso pedir desculpa
quando se fala de arte, escreveu Paul Valéry.
Já não me lembro do texto nem do contexto em que o disse, mas há, sem dúvida,
uma boa razão para o tal pedido de desculpas: o facto de a verdadeira obra
de arte dizer tudo sobre si mesma, tendo como consequência o discurso sobre ela
ser, no melhor dos casos, sempre um pouco redundante.
Há,
no entanto, casos em que o pedido de desculpas deve ser facilmente aceite. São
os casos em que a obra de arte nos traz a recordação de sensações passadas por
muitos partilhadas, particularmente quando essas sensações são de prazer. A
arte transforma a memória dessas sensações comuns numa forma particular de
conhecimento, o conhecimento estético.
Nestes casos, a bem dizer, nem se deve pedir desculpa, já que as sensações em
questão são sensações comuns, não as de uma subjectividade que quer, no fundo,
apenas falar de si.
Não
é difícil ver na pintura de Eugène Boudin uma tal forma de conhecimento estético. No seu
caso, a memória que os quadros despertam é a memória das sensações que o ar do
mar nas praias nos provocou. Não
interessa que as praias que ele pinta sejam as praias da Normandia,
particularmente a de Trouville, nem que elas estejam povoadas pelos elegantes
do Segundo Império. O ar do mar é o nosso, tanto quanto o deles. Boudin
dizia que gostava de pintar “enquanto respirava o ar do mar”. E a
frescura do ar do mar invade a mais ínfima parte das suas telas.
O mais espantoso é que nem sequer se
vê muito o mar nas suas praias. Às vezes, pura e simplesmente, não se vê. Vêem-se grupos numerosos de pessoas vestidas e
imensos céus (entre dois terços e três quartos dos quadros, normalmente). Mas
o mar aparece reflectido no céu, por assim dizer, e metamorfoseado numa brisa
que sopra para junto de nós. “Nadar em pleno céu”, dizia ele a propósito da ambição da sua pintura. Não
é o mar visual e sonoro, uma massa bruta, de Turner, nem o mar pleno, rítmico e
ondulante, da música de Debussy. É antes um mar quase puramente olfactivo – e
táctil, pela mediação da brisa que dele vem. As “prodigiosas magias do
ar e da água”, como dizia Baudelaire justamente a propósito de Boudin, invadem
aquelas figuras na praia e, por seu intermédio, invadem-nos a nós mesmos.
É
um mar do Norte, é claro, não o mar mediterrânico que tão bem é sugerido em La baignade de
Picasso. Em parte
por causa disso, em praticamente quadro algum se vê alguém a tomar banho. O
espectáculo, de resto, não se recomendaria. Pelo menos, horrorizava
Flaubert, que abominava ver, exactamente em Trouville, as pessoas mergulharem
na água com uma indumentária que cobria a maior parte do corpo. Mas o mar
sente-se à mesma. Sente-se sobretudo através do ar que chega até nós, como
disse.
A grande arte produz sempre em nós um
sentimento de evidência. E a evidência, como notou Fernando Gil, comporta uma dimensão alucinatória. As praias de
Boudin são um bom exemplo disso. A brisa que vem do mar não pode ser
directamente pintada. Mas o génio do pintor pode criar a sua alucinação – a
alucinação da sua presença – através do modo como o mar se reflecte no céu por
sobre as figuras humanas que povoam a praia.
O conhecimento estético reconduz-nos
ao espanto originário do qual nasce a filosofia e, se virmos bem as coisas,
todo o pensamento humano. Ao vermos aquelas praias, lembramo-nos como eram as
praias da nossa memória. Qualquer pessoa o pode fazer. Lembramo-nos da
maravilha do mar e do seu ar. Toda a experiência passada é convocada pela arte
do pintor. Subitamente, a felicidade parece ser algo fácil. E nada de que se
deva pedir desculpa.
COMENTÁRIOS (de 7)
Pobre Portugal: Tal como se não “vê o mar nas
suas praias”, o martírio do glorioso povo ucraniano “sente-se à mesma”, nas
crónicas de Paulo Tunhas.
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