segunda-feira, 21 de agosto de 2023

Na certeza, porém,

 

De que do PR nunca se dirá o mesmo que Mário de Sá Carneiro disse de si próprio, em mágoa de brilhante e insuspeita insatisfação. Mas não temos garantias disso, que os jogos de bem-estar permanente, do retrato daquele traçado por HELENA MATOS, podem dissimular insatisfação igualmente ilimitada, de um qualquer arrebatamento de plenitude que se ficou, todavia, igualmente por um “Quase”, conquanto fossem outras bem diversas as suas vias de busca. Mais penosas, todavia, estas, no seu espectáculo diário de comédia seca, bem visível, hélas! Um retrato exemplar de dois governantes e eventuais assessores, feito por uma brilhante analista de um governo de comediantes pelotiqueiros. Exemplar também o retrato contido no comentário de Maria Paula Silva.

QUASE

Um pouco mais de sol – eu era brasa,

 Um pouco mais de azul – eu era além.

Para atingir, faltou-me um golpe d’asa...

Se ao menos eu permanecesse aquém...

 

Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído

Num baixo mar enganador d’espuma;

E o grande sonho despertado em bruma,

O grande sonho – ó dor! – quase vivido...

 

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,

Quase o princípio e o fim – quase a expansão...

Mas na minh’alma tudo se derrama...

Entanto nada foi só ilusão!

 

De tudo houve um começo... e tudo errou...

– Ai a dor de ser-quase, dor sem fim... –

Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,

Asa que se elançou mas não voou...

 

Momentos d’alma que desbaratei...

Templos aonde nunca pus um altar...

Rios que perdi sem os levar ao mar...

Ânsias que foram, mas que não fixei...

 

Se me vagueio, encontro só indícios...

Ogivas para o sol  – vejo-as cerradas;

E mãos d’herói, sem fé, acobardadas,

Puseram grades sobre os precipícios...

 

Num ímpeto difuso de quebranto,

Tudo encetei e nada possuí...

Hoje, de mim, só resta o desencanto

Das coisas que beijei mas não vivi...

...................................................................

...................................................................

Um pouco mais de sol – e fora brasa,

Um pouco mais de azul – e fora além.

Para atingir, faltou-me um golpe d’asa...

Se ao menos eu permanecesse aquém...

Mário de Sá-Carneiro, Paris, 13 de maio de 1913

Verão azul. Acinzentado.

Aos vendedores de bolas de berlim e gelados – figuras obrigatórias dos nossos areais – juntou-se agora um homem vestido de azul que na praia fala sobre o país. Diz-se presidente da República.

HELENA MATOS Colunista do Observador

OBSERVADOR20 ago. 2023, 01:4961

1Nove dias de férias. Seis declarações. Da carreira dos professores ao pacote Habitação, questões constitucionais e baixa de impostos, tudo comentou o homem vestido preferencialmente em tons de azul a caminho da praia ou a sair dela.

O mar é azul. O céu é azul. Azuis são os olhos do homem. Um pouco mais de azul e talvez fosse possível esquecer que o homem se chama Marcelo Rebelo de Sousa e é presidente da República. Mas não só tal não é possível como, pelo contrário, a informalidade da paisagem, do vestuário e do discurso tornam ainda mais óbvia e espessa a solidão familiar e política que emana do presidente da República.

Dos outros presidentes no Verão avistávamos os amigos, a família, os íntimos. De Marcelo avistamos a sua solidão. Marcelo no areal procura os microfones e as câmaras pela mesma razão que as crianças batem os pés ao entrar num espaço desconhecido: para que não se perceba que estão sozinhos.

É óbvio que, sobrestimando-se como é seu hábito, Marcelo imagina que com este declaratório diário dita a agenda e pressiona o Governo, que é como quem diz António Costa. Para 5 de Setembro marcou a parte II daquele Conselho de Estado de que a 21 de Julho António Costa saiu antecipadamente para ir ao futebol. Aos mais distraídos recordo que a 5 de Setembro vai ter lugar uma etapa da Volta à Espanha e decorre o Open de Ténis dos EUA, tudo motivos mais que plausíveis para o primeiro-ministro chegar mais tarde, sair mais cedo ou nem aparecer no dito Conselho de Estado. Também pode simplesmente inovar e em vez de privilegiar a agenda desportiva, como aconteceu na parte I deste Conselho de Estado, alegar que precisa de ver o pôr-do-sol que para esse dia 5 de Setembro está previsto para as 19h 01m. Sim, tudo e o seu contrário podem acontecer porque António Costa pode fazer o que lhe apetecer.

O seu governo desfaz-se, nasceu sem rasgo e enfraqueceu-se ainda mais numa sucessão nunca vista de casos e escândalos mas o primeiro-ministro, esse está mais forte. António Costa beneficiou ao longo da sua carreira política de um estatuto-modo de estar que se caracteriza por mandar em tudo mas nunca ser responsável por nada. Sintomaticamente os seus ministros só se tornam protagonistas quando entram na categoria de remodeláveis. Foi assim com Constança Urbano de Sousa, Eduardo Cabrita, Azeredo Lopes, Marta Temido. Vamos ver se assim continuará a ser com João Gomes Cravinho. João Galamba não conta para esta história pois o seu papel não é ser ministro mas sim continuar ministro para que Marcelo perceba quem manda.

Não tinha de ter sido assim. Mas só por ingenuidade se suporia que com Marcelo seria diferente.

2Paulo Batista é o novo director do SEF. É o sétimo desde que António Costa chegou a São Bento. Entre Janeiro de 2016, quando Constança Urbano de Sousa, ministra da Administração Interna do recém-nomeado governo de António Costa escolheu Luísa Maia Gonçalves para dirigir o SEF, até à nomeação em Agosto de 2023 de Paulo Batista, o SEF conheceu um inédito corrupio de dirigentes: Luísa Maia Gonçalves não chegou a estar dois anos no cargo, pois logo em Outubro de 2017 foi substituída por Carlos Alberto Matos Moreira. Um ano e dois meses depois, a 16 de Janeiro de 2019, Carlos Alberto Matos Moreira alega cansaço e deixa a direcção do SEF. É então substituído por Cristina Gatões que também não fica no cargo por muito mais tempo: em Março de 2020, com o SEF mergulhado no caso da morte de um cidadão ucraniano, José Luís do Rosário Barão substitui interinamente Cristina Gatões. Antes do fim do ano, em Dezembro de 2020, o tenente-general Luís Francisco Botelho Miguel torna-se o novo director do SEF. Um ano e escassos três meses depois, em Março de 2022, o tenente-general Luís Francisco Botelho Miguel solicitava o fim da “comissão de serviço” como director nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Em Abril de 2022 Fernando Pinheiro da Silva torna-se o novo director do SEF para em Agosto de 2023 dar lugar a Paulo Batista. Pelo caminho o SEF esteve para ser extinto, com a extinção suspensa, adiada e anunciada. O seu fim está agora agendado para Outubro deste ano. Em sete anos o SEF teve sete directores. Viu serem condenados por homicídio três dos seus inspectores. Trabalhou de forma tão deficiente que floresceu no país um esquema de venda de senhas para atendimento no SEF. Os imigrantes desesperam pela regularização dos seus documentos… Azar deles o governo ser de esquerda e dizer-se todos os dias a favor das migrações e da inclusão.

PRESIDENTE MARCELO    POLÍTICA    SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS       SEGURANÇA       SOCIEDADE

COMENTÁRIOS (de 61)

Miguel Sanches: Uma resenha muito triste de um País que já foi respeitado, que teve classe! Esta gente não devia estar ao leme de um dos Países mais antigos do mundo. Em tese, a democracia deve ser o governo de todos nós pelos melhores de todos nós. Em Portugal é ao contrário.                 Momo, um Deus em Cascais: Interessante a solidão de Marcelo. Não é a primeira vez que a Helena refere esta orfandade de Marcelo. Como se faltasse a Marcelo um porto seguro para se ancorar. Mas, Marcelo tem família, filhos, irmãos, sobrinhos para garantir abrigo seguro, a não ser, que seja um egocêntrico elevado à potência que o torna um solitário. Lembro-me de um livrinho que li há uns bons anos de Salman Rushdie chamado Fúria que fala de um sujeito com grande sucesso mediático na Índia, e, ao querer desaparecer escolhe Manhattan para encontrar a solidão. Pode ser o caso. Marcelo estar sempre rodeado de tantos ser uma forma de solidão. Ontem Paulo Pinheiro falava num Costa Teflon e acertou em cheio. Realmente, um director do SEF por ano e nem um vestigiozinho de caspa aparece nos ombros de Costa. É como se o homem andasse com um colete à prova de culpas. Disparam uma culpa na direcção de Costa, esta faz ricochete e vai-se cravar na testa do ministro ao lado. Talvez a responsabilidade do Teflon esteja também no jornalismo político que vai cravar os dentes na canela que lhe puserem à frente. Um péssimo governo, mas, Costa continua o maior. Como se o governo fosse uma coisa e Costa outra coisa diferente. Até Marcelo, espertinho de neurónios e profissão, passa a vida a apanhar papéis com Costa.           Joao Barbosa > Maria Paula Silva: MRS como acrónimo médico significa Methicllin-resistant Staphylococus. Um sarilho em termos infecciosos . Aqui também o problema é o mesmo : uma infecção desde 1978. Muito tempo.      Alexandre Barreira > Maria Paula Silva: Pois. Cara Maria, É isso mesmo. E não me tenho cansado de "bradar". Que o Marcelo enquanto "mexer". O PSD andará a ver "navios"....!                  Alexandre Barreira > GateKeeper: Pois. Oh my dear. I hope so. Forever....and ever.....allways....indeed.....!             Alexandre Barreira > Alberico Lopes: Pois. É verdade.....nota-se....!                  Alexandre Barreira: Pois. Cara Helena. Ou é impressão minha. Ou o "bichinho". Anda a criar problemas "climáticos". A vida não está fácil....pode crer.....!                GateKeeper: Benvinda de volta, cara HM. Cheguei a recear por si, como cronista e comentadora independente. Keep those, like this one, coming.                   Madalena Sá: Óptima crónica! Problema é o povo português que vota nesta escumalha!              Alberico Lopes: Ainda bem que o Observador, por  vezes, nos brinda com artigos como este e que nos faz ver como vale a pena sermos subscritores do jornal. Desta vez, a Helena consegue desfazer estes dois marmanjos que nos querem transformar em crianças destituídas de inteligência! Tanto no que se refere ao pobre Marcelo, que mais parece um papagaio andante, como quanto ao Costa, um saltimbanco apadrinhado por uma c.social sem coluna vertebral, que nunca assume os erros e nunca é criticado como devia ser por jornais e televisões isentas e patrióticas! Entretanto, continua a colocação de boys e girls nos lugares mais apetecidos da administração pública, como agora na Parpública! Triste país este, sem oposição, sem comunicação social, sem qualquer motivação para sair do marasmo e podridão em que o PS e os sócrates/costas e o pardalito marcelo nos colocaram e de que têm retirado todo o proveito!    Maria Nunes: Só nos podemos queixar de quem votou neles.              João Ramos: Marcelo segundo dizem é muito inteligente… devo dizer que não entendo onde é que essa inteligência está, pois não consegue perceber sequer o ridículo do personagem em que se tornou, além de que se tem sempre colocado em posição subalterna do nefasto e mentiroso Costa, Marcelo não só não tem servido para nada em relação ao país como anda completamente “aos papéis “ na mão do tal pestilento Costa. Marcelo em minha opinião tem sido o pior presidente da república desde o 25/11, o mais ridículo e o que mais nos envergonha dada a falta de dignidade que tem dado ao cargo que ocupa!!!                António Lamas: Depois de a ler fiquei mais "Blue". É urgente correr com esta gente urgentemente.. Nunca Portugal teve nos órgãos de soberania gente tão reles, com tão poucas qualidades. Gente sem vida, sem família, sem educação, sem sentido de responsabilidade e de sobriedade. Uns falhados, que em qualquer actividade privada, nunca passariam do grau mais básico.      Manuel Gonçalves: Muito tem sido feito para analisar a forma indevida como Costa exerce o poder político Mas é necessário e essencial aprofundar a relação intrínseca entre o actual declínio global dos valores democráticos e o desprezo/jactância de Costa pelas regras do escrutínio parlamentar, judicial e dos média. Se tivesse condições, que felizmente não há, Costa começaria por ser um protoditador e terminaria facilmente sem qualquer prefixo.                  Antonio Marques Mendes: Cruel para com MRS, diplomata para com AC. Carlos Chaves: O PR que nos calhou em sorte pela segunda vez e por vontade dos nossos concidadãos que o elegeram, deve sofrer de uma grave perturbação psiquiátrica, deve pensar que deixa de ser “amado” se desaparecer dos ecrãs durante o seu curto período de férias! E claro a CS até destaca equipas de “jornalistas” para os areais Algarvios. Na monarquia podíamos levar com monarcas malucos, na República parece confirmar-se a tradição! Quanto ao SEF, não tarda muito que a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex), venha pôr ordem nesta casa socialista!               Hás De Cá Vir: Nem a vida pessoal de Marcelo nem as lágrimas de crocodilo sobre a sua vida privada, nada disso me interessa. O que conta é o dinheiro que ele custa ao país, um inútil que nem à tropa foi.               António Sennfelt: Quando eu era miúdo ( na longínqua década de cinquenta do século passado) havia um pobre de espírito, muito popular entre a criançada, que percorria as praias de norte a sul de Portugal, desde o Moledo até Monte Gordo. Era o Catitinha! Será que ressuscitou?                   Maria Paula Silva: Muito bom retrato de um triste país. Quanto a MRS não acho que sofra de solidão. É solitário (o que não implica necessariamente sofrer de solidão) por opção e conveniência. Para quem for atento, tiver seguido o seu percurso desde 1974 e não se tiver deixado encantar pelos seus truques enquanto comentador televisivo, é óbvio que MRS sempre fez aquilo que quer e lhe convém. Personalidade narcísica, egocêntrica em demasia e muito manipulador, prepara o terreno para aquilo que quer com antecedência e habilidade subtil. Traiu todos os que lhe "estavam no caminho". Mas sai sempre airosamente com aquele ar de criança brincalhona e traquinas a quem tudo é permitido, dizendo umas banalidades com ar profundo (upsssss). Ele não sofre de solidão, ele é solitário por opção e conveniência. Pode-se dizer que está como peixe na água. As pessoas indignam-se porque criaram falsas expectativas àcerca dele e esperavam atitudes diferentes. O imaginário colectivo é muito forte. Mas não, isso é a expectativa das pessoas que o conhecem mal. E ele sabe disso e tira muito bom proveito. Assim que foi eleito PR pela 1ª vez, instituiu a técnica de self-marketing das "selfies"  e funcionou muito bem, a maioria das pessoas adora, sente-se próxima do presidente e acha muito engraçado aquilo que não tem graça nenhuma. Uma pirosice que vendeu muito bem. MRS  é e está apenas a ser MRS.  Não há incoerência nenhuma e ele é, e sempre foi, fiel apenas a si próprio. Nem ele nunca teve ideia ou intenção de servir o país, mas sim servir-se. Sempre se serviu. A juntar às características que acima mencionei, e deixei para último propositadamente, ele é muito, mas mesmo muito vaidoso. E sim, também é muito inteligente. Se não o fosse, não tinha conseguido chegar impune onde chegou. É um ser camaleónico. Como dizia Paulo Portas há uns bons e largos anos, "Deus deu-lhe a inteligência e o diabo deu-lhe a maldade". Ele está sozinho porque quer. É solitário porque, egoisticamente, lhe convém.                 Filipe Paes de Vasconcellos: O que mais me preocupa é se ainda não acabamos a ver o dito a mandar bitaites aos passarinhos!                  Sérgio: Que artigo brilhante e delicioso. É o que a malta gosta: "habilidosos e poucochinhos".... E alegretes até a ruina total e o último lugar da cauda da Europa e OCDE e isto com a maior dívida e carga fiscal da história. Pior seria impossível. Bem feito! Esta portugalhada iletrada rasca e reles MERECE-SE.            Rosa Silvestre > Antonio Marques Mendes: A traição dos nossos é sempre mais dolorosa...

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