- De “PEDRAS DE SAL” em primeira edição. -
A leitura do texto anterior, de JOSÉ ANTÓNIO RODRIGUES DO CARMO, Coronel
"Comando", segundo
acréscimo identificativo, trouxe-me à memória um caso, narrado num texto do
livro citado no título, da minha autoria, que, porque me pareceu um descritivo de
idênticos espécimes humanos ao que naquele foi referido, resolvi aqui rever, e
com isso recordar, factos que por mim e tantos outros passaram, na surpresa de
acontecimentos que a ignorância distraída, ou os zunzuns depreciados, a tantos
colheram de surpresa, seguidos de sucedânea desordem vivencial, de fuga
precipitada, (que provavelmente não terá atingido a figura do general Carlos Branco), e que a
sábia, enérgica, destemida, e plena de ironia, diatribe do Coronel “Comando” RC, descreve
como aparentado daqueles adeptos da russofilia, (embora, naturalmente, com mais
acentuado poder evocativo do que o texto por mim escrito, apenas emotivamente
expresso, a cultura política abafada então – como agora, de resto - pelos
condicionalismos da moral pessoal e dos interesses mais do foro literário e
familiar, para além dos condicionalismos sociais de rigor, em vigor estes, de
resto, acatados então, na indiferença, talvez da ignorância, talvez dos
trabalhos caseiros e profissionais, talvez por ingénua crença numa estabilidade
aparentemente garantida.
Não se tratou, contudo, no meu texto, de
um apenas, como o descrito no texto de R. C., mas de variados “generais”, empunhando o seu sabre
glorioso, do arcaboiço comunista daquela época, (prestes a festejar os 50 anos
da sua explosão dinamitadora), para espadeirar o incauto corajoso que se
permitisse discordar, defendendo nobremente o seu conceito de pátria -
disseminada por tantos espaços de um mundo aridamente achado antes por heróicos
e hábeis “barões” assinalados. A musa fora definitivamente arrumada, ao que
parecia, provocando reacções que os “generais” escrevinhadores dessa época e
desse espaço se apressaram a demonstrar – desta vez assanhados sobre a figura
de um “Neves Anacleto” advogado, pelos
vistos de alguma disciplina saudosista, já que apelidado de reaccionário pelos
seus acusadores.
Assim é, também, hoje, o general CB, defensor
acérrimo de um povo e um partido que sempre amou, desvirtuando, assim,
perversamente, a verdade dos acontecimentos e a responsabilidade da guerra da Ucrânia, como tão exemplarmente
o demonstra o Coronel “Comando” RC.
“Chapéus há muitos”, disse-o um querido
cómico português, o cinismo e a falta de honra proliferam em todos os tempos,
em razia de cabeças. Sem grandes discrepâncias.
Creio que não me enganei na analogia.
“«SABUJICE E TRAIÇÃO” e DEMOCRATAS” (in PEDRAS
DE SAL, 2ª edição in CRAVOS ROXOS)
Democratas de Moçambique em Lourenço Marques, na sua folha informativa nº 41 de
21/7, pronunciou-se a respeito do panfleto “Sabujice e Traição” de Neves
Anacleto.
Encimam os seus dizeres com o título «A senilidade ao serviço da reacção». Parece
que Neves Anacleto não é jovem como Democratas de Moçambique em Lourenço
Marques,
por isso, com a elegância própria da sua juvenilidade, chamam-lhe senil, sem
entretanto lhe citarem o nome, não sei se por pudor se por juvenil falta de
coragem.
Afirmam D. D. M. E. L. M.: «Apareceu à venda, na cidade, um panfleto que
constitui o produto mais acabado da debilidade mental do seu autor, ao mesmo
tempo que é também a mais recente e refinada manifestação de engenho “de” que
as camadas reaccionárias foram capazes de elaborar, até este momento».
A acentuada juvenilidade de D. D.
M. E. L. M. fê-los cair numa contradiçãozita de certo peso: Parecem-me
perfeitamente antagónicas as expressões «debilidade
mental» e «refinada manifestação de
engenho» atribuídas à mesma pessoa: Se o Dr. Neves Anacleto é um débil
mental, como se saiu com tanto engenho? Se possui tanto engenho, como se lhe
chama débil mental? Ficamos aguardando que o engenho refinado do Dr.
Neves Anacleto lhe permita decifrar o enigma ou que a sua debilidade
mental o torne indiferente a ele.
Insurgem-se seguidamente, D. D. M. E. L.
M. contra o «autor do panfleto mais os
cérebros organizados das camadas reaccionárias» que se abalançaram a «imprimir cerca de 75000 exemplares de
prospectos, ou seja, quase um prospecto por cada habitante europeu residente no
distrito de Lourenço Marques, no qual fazem a apologia do obscurantismo, e
cometem a mais perigosa agressão ideológica depois do 25 de Abril».
No período acima transcrito salienta-se,
além da inadmissibilidade da compra de prospectos por habitantes não europeus e
até mesmo de outros distritos, o respeito com que se referem aos “cérebros
organizados das camadas reacionárias”. Entre esses inclui-se, evidentemente, o “autor
do panfleto”, que o fez com muito cérebro, reconhecem-no respeitosamente e com
juvenil incoerência D.M.E.L.M.
Quanto à acusação de panfleto
apologético do obscurantismo, eu não vi lá nada disso, confesso. Até – antes de
o mandar para a família na Metrópole, no que fui imitada por imensas pessoas
interessadas em alargar as possibilidades de difusão do prospecto por mais
distritos, o dei a ler ao meu Salvador, para ele ficar mais ciente dos factos,
pois o “Notícias” e a “Tribuna” só vêem os problemas de uma maneira e
eu acho que a gente deve admitir várias hipóteses para estudar bem as teses e
as respectivas consequências, e foi por isso que dei a ler um dos 75000
exemplares do Dr. Neves Anacleto ao meu Salvador, para ele se esclarecer melhor e não se
deixar só influenciar pela hipótese e tese sem consequência do “Notícias” e da “Tribuna”.
Creio ainda que D.D.M.E.L.M. se
referiram com inveja aos 75000 exemplares publicados. Nesse ponto,
acompanho-os. Quem me dera idêntica saída para as minhas “Pedras de Sal”, mas reconheço o escasso poder de
absorção do meu “sal”, resultante da generalização da juvenilidade actual.
Continua a folha nº 41: «Referimo-nos, como é evidente, àquele
papelinho ridículo, criminoso, que anda a ser afanosamente distribuído, onde se
incita a população a não ler nada de nada, a pedir a demissão mental de todas
as ideias e a ficar indiferente ao que quer que seja que aconteça debaixo do
seu nariz. É o fascismo, finalmente, sem máscara, depois do 25 de Abril».
Se anda a ser afanosamente distribuído,
não sei. Comprei o meu numa livraria, sem me afadigar. Mas cuido que nesse
aspecto D.D.M.E.L.M. deveriam desculpar, faz parte do processo de
politização, já com precedentes jornalísticos.
«Onde
se incita a população a não ler nada de nada» - devem
referir-se, creio, não vejo outra hipótese, à sugestão do Dr. Neves
Anacleto
de boicotar a compra do «Notícias», em virtude do seu actual carácter
partidarista pouco esclarecido, ridículo e criminoso. Ficaram ofendidos D.D.M.E.L.M., pois pela
primeira vez eles estavam a ser muito lidos (por não aparecerem os escritores
anteriores, confinados, segundo consta, em “museus de cera”, a fazer recortes).
Compreensível é este desejo dos democratas de assim se promoverem. Entretanto,
admitem que a tudo o que estiver por cima ou longe do nariz dos leitores do
panfleto, já estes não ficarão indiferentes. Só ao que estiver por baixo. Tão
vasta influência do prospecto (logo acima e longe do nariz) constitui, pois,
factor extremamente positivo daquele.
O último parágrafo não está ao alcance
da minha compreensão reaccionária embora bem organizada, confesso-o
modestamente: «Talvez que o panfleto não
tenha sido suficientemente rendoso (impossível com tantos exemplares
fabricados!) e os jornais e as revistas
estejam a concorrer (indirectamente) para a sua venda (“quomodo”?) ao mesmo tempo que estão a dar um exemplo,
notável, de civismo, e de desprezo (“senão” mesmo de compaixão) por um
panfletário que caiu no mais degradante dos exercícios antidemocráticos: a
calúnia, a estupidez, a cobardia moral, a distorção intencional dos textos».
Civismo e desprezo, não enxergo em que o
mostraram os jornais e as revistas. Em todo o caso não o mostram D.D.M.E.L.M.
com a
sua folha nº 41.
Compaixão com 75000 exemplares em venda,
também não acho. Cá por mim, afigura-se-me pura inveja e nesse sentimento eu
alinho, pesarosa. No entanto, compreendo que, visto “Notícias” nem “Tribuna”
publicarem os seus artigos, o Dr. Neves Anacleto andou muito bem em tentar a
via do panfleto.
Calúnia em “Sabujice e Traição”?
Conviria demonstrá-lo, são inadmissíveis afirmações levianas. Eu só lá
encontrei de facto factos e creio que o meu Salvador também.
Estupidez? Nova contradição dos
democratas, em relação ao “engenho refinado” atribuído respeitosamente ao Dr.
Neves Anacleto no primeiro parágrafo.
Cobardia moral, isso nem por sombras.
Pelo contrário! Pareceu-me – e a toda a gente com quem contactei a esse
respeito – que o panfleto foi muito corajoso, pois se atreveu a contrariar os
panfletos “Notícias” “Tribuna” e quejandos, que são em maior quantidade, além de
que diária ou semanal, não há que ter inveja por esse lado. Por outro, a
sedução exercida por eles sobre as pessoas de menos coragem ou de muita rapidez
de absorção doutrinária é-nos revelada diariamente pelo “Notícias”, ansioso por
mostrar resultados definitivos, e por esse motivo, maior foi ainda a coragem do
advogado Neves Anacleto, opondo-se à absorção geral.
Quanto à distorção intencional dos
textos, acho demasiado erudito para o fraco valor ideológico dos mesmos textos.
Não estranhei o ataque ao Dr.
Neves Anacleto. Só estranhei a demora desse ataque. D.D.M.E.L.M.
estiveram sem dúvida a ganhar balanço para se manifestarem.
Nisso o pintor Quadros antecipou-se
ontem na “Tribuna” onde publicou um poema revelador de profundo jeito para
pintar, tal como nos seus quadros revelará possivelmente extremo jeito para
poetar.
Sempre assim foi, a crítica literária em
Portugal, não iríamos mudar com o 25 de Abril: o insulto baixo e soez, a sátira
verrinosa e sem nível, jamais a discussão válida, com argumentos lógicos e
serenos.
Neves Anacleto, que se intitula de
democrata (real), aponta factos e argumentos lógicos no seu panfleto, verdades
incontestáveis. E porque o são, os democratas (irreais) não os contestaram.
Limitaram-se ao insulto baixo e soez, que outra coisa não é acessível à sua
refinada juvenilidade mental.»
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