sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Um trocadilho gracioso

 

A disfarçar o amor pátrio real de um português sabiamente espirituoso.

(Por amor a essa Igreja de Santa Cruz, “feita de pedra morena” fado que também escuto na Internet, acrescento, em NOTAS finais da Wikipédia, a Biografia de S. Teotónio, como apoio a recordações da encantada Coimbra, que o texto humorista do Dr. Salles fez evocar).

UMA SELA POR UMA CELA

HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO, 20/12/24

18.12.24

Esta é a história de Telo, João e Teotónio. Chegou, pois, o tempo de Deus decidir dar cumprimento ao voto formulado pelo presbítero Telo. Comprara ele, casualmente mas não sem a intervenção de Deus, em Montpellier uma sela que era muito bem trabalhada e era mais que excelente para montar a cavalo. Certo dia em que o arcediago seguia montado numa mula pela porta de Coimbra e caminhava como habitualmente pela Rua Régia, aperceberam-se dela os cortesãos que notaram o seu bom recorte. Alguém de entre os conselheiros deteve a atenção na sua elegância e propôs ao Infante que pedisse ao arcediago para lha dar. Sem demora, satisfez ele o pedido sugerindo em troca a oferta dos Banhos Régios ao fundo da judiaria. Todavia, porque o juízo real se move por outros motivos que não os nossos, o príncipe, cheio de respeito, embora dando largas à alegria com olhar rasgado e rosto sorridente, respondeu que primeiro teria de ver o assunto, bem lembrado das palavras do sapientíssimo rei Salomão “tudo faz com conselho para não te arrependeres”. Deus, porém, da atalaia da Providência, favorecia os santos desejos do seu presbítero, aos ouvidos do rei e de Hermígio, seu mordomo-mor (paz à sua alma), que ocupava o lugar cimeiro da hierarquia e era homem de grande valor e prudência e mais do que nenhum outro conselheiro do rei nosso senhor, fez chegar a inspiração de apoiar todos os planos do arcediago. Assim aconteceu. Com efeito, por sugestão divina, é-lhe passado um documento autenticado com as armas reais.[1]

Filho do arcediago da Sé de Coimbra, viajara Telo a Jerusalém em peregrinação ao Santo Sepulcro. No regresso permaneceu alguns meses em Bizâncio navegando de seguida até Marselha e rumando depois a Montpellier onde decidiu comprar uma sela que lhe permitisse cavalgar com algum conforto até Coimbra.
Fervoroso adepto da
reforma gregoriana, encontrou no presbítero João Peculiar, mestre-escola da Sé de Coimbra, o correligionário que lhe faltava para a implantação da nova doutrina naquela que então era uma região de fronteira com o Islão.
Foram razões ideológicas que os levaram a travar amizade com
Teotónio, presbítero que já estivera duas vezes em Jerusalém e que para lá tencionava regressar a título definitivo. Convenceram-no a ficar em Coimbra para fundarem uma nova congregação religiosa que, no meio da sociedade, pregasse a Palavra e desse o exemplo de vida apostólica.

Foi nos antigos Banhos Régiosque o Infante Afonso Henriques oferecera a Telo por troca duma sela – que no dia 28 de Junho de 1131 lançaram a primeira pedra da nova igreja, a de Santa Cruz de Coimbra.

Ali foi Teotónio o primeiro Prior; subiu aos altares e ficou na História conhecido como S. Teotónio[2].

João Peculiar foi de Coimbra para Braga como Arcebispo defensor da nacionalidade portuguesa contra a constante ofensiva do rival Arcebispo de Santiago de Compostela; não subiu aos altares mas desempenhou a elevada função de conselheiro principal do nosso primeiro Rei.

Telo, fundador da Ordem de Santa Cruz, criou à sua volta um escol de letrados que viria a dar origem a uma das Universidades mais antigas do velho continente, a de Coimbra.
Eis como uma sela trocada por uma cela foi estrutural na criação de uma Nação.

BIBLIOGRAFIA:

• Mattoso, José –
D. AFONSO HENRIQUES, Círculo de Leitores, Outubro de 2006

• Sobre S. Teotónio, http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A3o_Teot%C3%B3nio

• Sobre D. João Peculiar, http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Peculiar


________________________________________
[1] - Pedro Alfarde, Via Tellonis (tradução de A. Nascimento, 1998, pp 60-61)
[2] - D
. Telo e S. Teotónio foram pessoas diferentes e não uma só, como alguma informação dá a entender, nomeadamente na Internet (v. Mattoso, op. cit. pág.80 e seg.)

 COMENTÁRIOS

Antonio Fonseca 19.12.2024 22:34 Lembrei-me do dito - Deus escreve direito por linhas tortas. Admiro a prosa cintilante.

NOTAS DA INTERNET

Teotónio de Coimbra

Parte inferior do formulário

São Teotónio

São Teotónio (século XV), por Nuno Gonçalves

Fundador dos Cónegos Regulares da Santa Cruz

Nascimento

1082
Ganfei, Valença, Portugal

Morte

18 de fevereiro de 1162 (80 anos)
Coimbra, Portugal

Veneração por

Igreja Católica

Canonização

1163
Roma
por Papa Alexandre III

Festa litúrgica

18 de fevereiro

Padroeiro

Viseu e Diocese de Viseu

https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/4/4a/Disambig_grey.svg/20px-Disambig_grey.svg.pngNota: Para outros significados, veja Teotónio de Coimbra (desambiguação).

São Teotónio (Ganfei, Valença, 1082Coimbra, 18 de Fevereiro de 1162) foi um religioso português do século XII, tendo sido canonizado pela Igreja Católica.

Reconhecido por todo o Ocidente, contava-se entre os seus amigos pessoais São Bernardo de Claraval.

Biografia

Tendo sido confiado aos cuidados de seu tio-avô, Crescónio bispo de Coimbra, foi formado em filosofia em Coimbra e Viseu. Nessa última cidade, tornou-se prior da Sé de Viseu em 1112.

Foi em peregrinação a Jerusalém, e aí quiseram que ele fosse superior da comunidade dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho da Terra Santa mas ele recusou, regressando a Portugal. Assim como, ao regressar, quiseram oferecer-lhe o lugar de bispado de Viseu, o que recusou.

No contexto da independência portuguesa (1139) em relação ao Reino de Leão, São Teotónio tornou-se um dos aliados do jovem Infante Dom Afonso Henriques (o proclamador da independência e primeiro Rei de Portugal) na sua luta contra a mãe, Infanta Dona Teresa de Leão, dizendo a lenda que teria chegado a excomungá-la. Mais tarde, seria conselheiro do então já Rei de Portugal, Dom Afonso I.

Entretanto, foi de novo em peregrinação à Terra Santa, onde quis ficar; regressou porém a Portugal (1132), desta vez a Coimbra, onde foi um dos cofundadores, juntamente com outros onze religiosos, do Mosteiro de Santa Cruz (adoptando a regra dos referidos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho), do qual se tornou prior. Esta viria a ser uma das mais importantes casas monásticas durante a Primeira Dinastia.

Em 1152, renunciou ao priorado de Santa Cruz; em 1153, o Papa Adriano IV quis fazê-lo bispo de Coimbra tal como seu tio, o que uma vez mais recusou.

Morreu em 18 de Fevereiro de 1162, que é ainda hoje o dia em que é celebrado pela Igreja Católica. Foi sepultado numa capela da igreja monástica supracitada que ajudou a fundar, mesmo ao lado do local onde o primeiro Rei de Portugal, Dom Afonso Henriques (ou Dom Afonso I), se fez sepultar.

Em 1163, um ano depois da sua morte, o Papa Alexandre III canonizou-o; São Teotónio tornava-se assim o primeiro santo português a subir ao altar, sendo recordado sobretudo por ter sido um reformador da vida religiosa nessa Nação nascente que então era o Reino de Portugal (1139-1910); o seu culto foi espalhado pelos agostinianos um pouco por todo o mundo. É o santo padroeiro da cidade de Viseu e da respectiva diocese; é ainda padroeiro da cidade de Valença, sua terra natal. É também o santo que dá nome a um colégio situado em Coimbra, chamado Colégio de São Teotónio.

No concelho de Odemira, uma das mais extensas freguesias do país recebeu também o nome deste santo. Desta vila, São Teotónio é também o santo padroeiro, sendo as festividades religiosas realizadas anualmente no dia 18 de Fevereiro.

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