Apanágio, de resto, de ALBERTO GONÇALVES, desta vez com o natural
repúdio sarcástico pela toleima pretensiosa dos honestos defensores duma
aparente justiça incriminatória, subentendendo apenas a pseudo bondade desses
da parcialidade amorosa, pela sua parcialidade crítica mentirosa e vã.
O Holocausto do Martim Moniz
A esquerda desistiu de oferecer o esboço de uma visão das coisas,
por absurda e caricatural. A esquerda actual está condicionada a berrar
sentimentos e palavras, sem ligações entre si excepto o rancor
ALBERTO GONÇALVES Colunista do Observador
OBSERVADOR, 28
dez. 2024, 00:203
A operação policial no Martim Moniz
originou um popular concurso para apurar a maior indignação. Centenas, talvez milhares, de
participantes esgrimiram-se nas televisões e nas redes sociais a fim de mostrar
qual deles era o mais chocado com o episódio. Felizmente, julgo que não
chegou a haver internamentos para tratamento de stress pós-traumático. Mas terá
faltado pouco. Não tenho vagar e sobretudo paciência para ser exaustivo, pelo
que me
limitarei a alguns exemplos de virtude e sensibilidade, classificados de acordo
com o grau de escândalo e horror manifestado por cada concorrente. Há um bónus para os concorrentes que, por
força de as ditas terem ocorrido sob tutela de governos socialistas, nunca se
pronunciaram sobre acções anteriores da polícia no Martim Moniz, noutras zonas
de Lisboa e do país, em bairros de imigrantes e em bairros sem imigrantes e,
claro, durante as saudosas e humanitárias rusgas alusivas à Covid. Vamos a isso.
O nível básico de
choque & pavor é aquele que acusa as autoridades de responderem a “falsas
percepções de insegurança”, assim definidas por quem não reside em lugares
animados por tráfico de droga, punhaladas e delinquência em geral. Uma
“jornalista” da RTP comentou: “A PSP, ou
quem ditou a operação ‘especial’, não pára de rondar esta zona de Lisboa… onde
não há sinais de aumento de criminalidade.” É uma perspectiva
interessante, principalmente se considerarmos que 52 crimes graves praticados na
pequenina zona em questão em menos de dois anos equivalem a uma superlativa paz. Prémio: menção honrosa da Associação dos Cegos e
Amblíopes.
O nível seguinte é o que acusa o PSD de entrar no espaço “ideológico”
do Chega, disputando as desconfianças face ao excesso de imigrantes.
Um caso típico é o do chefe do partido
Livre, que opinou: “O ‘não é
não’ de Luís Montenegro para a extrema-direita é mais: ‘vão à frente que eu vou
lá ter’”. Presume-se que o dr. Tavares, que pelos vistos acha o
controlo de fronteiras uma iniquidade, não fecha a porta de casa à noite (ou de dia): se
o território de um país não tem donos, seria absurdo subverter esses caridosos
princípios apenas para protecção, necessariamente extremista e radical, da
habitação própria. Prémio: um capacho de boas-vindas e uma lancheira do
Sandokan.
O terceiro nível de revolta
é o que, sem sequer fazer escala no
Chega, lança directamente ao governo as tradicionais acusações de “racismo” e “xenofobia”.
Um tal Carlos Paz, criatura que se afirma professor universitário embora
escreva com maiúsculas, palavrões e dificuldade, proclamou: “Recuso-me a viver num Estado Policial
[sic], dirigido por um Governo de racistas, xenófobos, retrógrados,
completamente boçalizados. ISTO NÃO É TOLERÁVEL!” Pois não.
Faz impressão que, em 2024, indivíduos legalmente adultos continuem a entoar a
cantilena do “fascismo”. Faz impressão que, em 2024, indivíduos
estatisticamente alfabetizados cometam redacções indignas da segunda classe. E
faz impressão que, em 2024, o ensino superior se arraste por catacumbas tão
inferiores. Prémio: um dístico para colar no carro que reze
BOÇAIS VÃO PARA O C‰R@#§¶!!!
O quarto nível de repúdio é o que
finge que os eventos
do Martim Moniz rebentaram com o Estado de direito, a liberdade e o regime em
cerca de vinte minutos. Catarina
Martins, figura que dispensa apresentações e racionalidade,
confessou: “Aterrei tarde. Acordei num
pesadelo. Como era aquela frase sobre dormir em democracia? Pois.” Enquanto
apreciadora de sistemas políticos em que, além de revistar cidadãos por
suspeita de infracções, a polícia prende-os e mata-os pelo que pensam, dizem e
são, o abalo da dra. Catarina não é muito
credível. Não obstante, vale a intenção. Prémio: medalhas de mérito da República Bolivariana
de Venezuela e da Autoridade Palestiniana.
E o vencedor é… O vencedor,
ou a vencedora, atingiu o nível máximo de indignação e ainda conseguiu
ultrapassá-lo um bocadinho. Trata-se de Mafalda
Anjos, ex-directora da ex-“Visão”. A senhora dona Mafalda ignorou as falsas
percepções, o Chega, o fascismo, o Estado de direito e pôs logo o dedo – e as
mãos, os pés e o que calhou – na ferida: no Twitter, colocou a omnipresente
fotografia dos transeuntes encostados à parede na rua contígua ao Martim Moniz
ao lado de uma imagem de judeus detidos após o levantamento do gueto de
Varsóvia. Ou seja, para a senhora dona Mafalda o que aconteceu em Lisboa
é similar ao Holocausto, a PSP é equivalente às Waffen-SS e pedir a
identificação a uns sujeitos avulsos é igual a enviá-los para Treblinka. Enfim, uma análise que faz inteiro sentido e
tresanda sensatez. Prémios múltiplos: renovação do contrato para
comentários televisivos, um suprimento de Xanax, uma “História Universal” para
colorir e três “woks” anti-aderentes.
Todos os esforços acima são merecedores de aplausos e da convicção de
que a esquerda desistiu de oferecer o
esboço de uma visão das coisas, por absurda e caricatural que fosse.
A
esquerda actual está condicionada a berrar sentimentos e palavras, sem ligações
entre si excepto o rancor. Se os
sentimentos de plástico e as palavras de papelão sempre estiveram lá, vinham
cobertos de um pastiche da verdade que, por estas e por aquelas, se esfarelou
com o tempo e deixou a fraude
exposta como um osso partido.
Não admira que, fora dependentes e oportunistas, a
esquerda não seduza ninguém: ninguém quer ver um osso partido, a
não ser com a curiosidade mórbida com que se vêem os desastres. A esquerda é um
desastre que interrompe, idealmente por instantes, a vida real.
COMENTÁRIOS (de 17):
F. Mendes: O parágrafo final, escrito sem ironia nem
hipérbole, resume superiormente a indigência mental de algumas esquerdas que
infectam o planeta. As nossas, contaminaram irremediavelmente o PS: as
Moreiras, as Gomes, os Augustos SS, os Ferros, os Carneiros, os Pedros Nunos,
para citar apenas alguns, ombreiam em estupidez, fanatismo, maniqueísmo e
ignorância com as perso-nulidades citadas no artigo; obteriam certamente
prémios de monta num concurso de disparates e tiradas absurdas. Pena é que
quase ninguém tenha escrito uma coisa óbvia: estas rusgas protegem, em primeiro
lugar, as pessoas que são obrigadas a viver lá. Imigrantes ou não; pretos,
brancos ou de outra cor.
Jose Marques: CONVITE Na próxima noite de fim de ano, todas as madamas
comentadeiras - mais as anjos e as lábios vermelhos - estão convidadas para a
festa de arromba e multicolor na rua do benformoso. Se saírem de lá
assediadas, perseguidas, assaltadas ou violadas, terão provado o veneno que
andam a propagar de que não há relação entre imigração, segurança e
criminalidade. Venham daí ó
corajosas, espera-vos uma noite de arromba e boas entradas em 2025
Alexandra Ferraz: Oh Alberto, calma ! Que esta gentalha da
esquerdopatia está em vias de extinção. Demos-lhe mais alguns meses... São ridículos, absurdos e andam
desesperados com essa perspectiva. Mas obrigada pelo sempre excelente artigo
com que nos brinda semanalmente. 🙌🙌
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