Venha a mesa das negociações para o alargamento territorial dos grandes
povos. O actual presidente americano até já foi a Angola demonstrar a sua
simpatia de branco por um continente que já não cabe a ele adquirir. Mas Trump
começa pelo terreno em volta. Talvez mais tarde a volta seja alargada, os primeiros
passos outrora dados nas descolonizações, os próximos logo após a compra dos
terrenos neste texto referidos, por MADALENA MOREIRA. Talvez isso seja ainda
feito no meu tempo, que estas coisas são rápidas e é preciso contrapor as
nossas, isto é dos trumps, às ambições dos russos e dos chineses, cada uma
destas raças ambicionando o espaço terreno na sua inteireza máxima, se possível
abrangendo continentes disponíveis, que dispõem de riquezas compensadoras.
▲Donald Trump
referiu-se várias vezes aos três territórios durante os últimos dias
ALLISON ROBBERT / POOL/EPA
Gronelândia, Canadá e canal do Panamá. Os três
territórios que Trump quer "comprar"
O que têm em
comum Gronelândia, Canadá e canal do Panamá? Trump quer comprar os três. Seja
para implementar as suas tarifas ou combater a influência da China, começa a
desenhar-se a política externa.
OBSERVADOR, 26 dez. 2024, 21:0018
Índice
Gronelândia. Minerais, rotas comerciais e uma questão
legal
Canal do Panamá. As tarifas “ridículas” e a mão da China
na América Latina
Canadá. O 51º Estado e a luta das tarifas com o
“Governador” Justin Trudeau
No dia de Natal, Donald Trump faz compras na Amazon. No carrinho de
compras online do Presidente eleito dos Estados Unidos estão apenas três
coisas: o Canadá, a Gronelândia e o canal do Panamá. A montagem foi partilhada nas redes
sociais pelo seu filho, Eric Trump, com a legenda “Estamos mesmo de volta!!!” e
resume uma série de declarações que Trump tem feito ao longo das últimas
semanas e que deixou claras na sua própria mensagem de Natal — a vontade de
tornar estes três territórios parte dos Estados Unidos durante os próximos
quatro anos.
Canadá,
Gronelândia e canal do Panamá têm pouco mais em comum para além da relativa
proximidade geográfica aos Estados Unidos. Além disso, nenhum deste casos foi o
foco directo da campanha eleitoral de Donald Trump. Porém, na visão do
Presidente eleito em novembro, podem ser a chave para desbloquear muitas das
promessas de política externa que foi deixando ao longo dos últimos meses.
O “negócio” mais realista é o da
Gronelândia, que já tinha sido sugerido na primeira administração
Trump, mas foi interpretado
como uma piada e travado pela Dinamarca. “Agora, não há muitas pessoas que
estejam a rir-se“, argumenta
o especialista em Segurança no Árctico, Marc Jacobsen, ao New York Times. Já o canal do Panamá pode ser um palco
para fazer um braço de ferro com a China. E o Canadá uma forma de levar a cabo
a sua política alfandegária. Mas que viabilidade podem ter
estes desejos de Natal de Donald Trump?
Gronelândia.
Minerais, rotas comerciais e uma questão legal
Dos três territórios, este é aquele
com que Donald Trump tem mais história. Em
2019, o Presidente classificou-o como “um
grande negócio imobiliário”. Desta
vez, o foco está nos “propósitos de Segurança Nacional e de Segurança“. “Os
Estados Unidos da América entendem que a posse e o controlo da Gronelândia são
uma necessidade absoluta”, escreveu Trump na sua rede social Truth Social, no
passado domingo.
À data, o interesse de Trump pelo
território tinha duas facetas. Por um lado, uma dimensão geo-estratégica, de fortalecer a presença norte-americana
nos vários pontos do globo — os Estados Unidos já têm uma base no norte da
Gronelândia, mas a ascensão internacional da China já fazia surgir a
necessidade de maior afirmação norte-americana. Por outro
lado, de exploração
de recursos, já que o território é rico em recursos naturais, entre os quais se
destacam minerais raros utilizados na construção de novas tecnologias.
Porém, esta exploração é difícil e, em 2019,
os especialistas classificavam-na como pouco
compensatória para os Estados Unidos.
Cinco anos depois, a Gronelândia ganha mais um ponto de interesse, uma vez
que o degelo está a levar à abertura de novas
rotas comerciais no Árctico. O controlo norte-americano do território
passaria agora a ter valor económico acrescido para Washington. Isto leva
Donald Trump a classificar a compra da Gronelândia como um negócio proveitoso. Sherri Goodman, antiga oficial do
Pentágono e analista do think tank Wilson Center, sublinha que esta
política não é “louca”, mas semelhante a outras que os Estados Unidos já
assumiram no passado.
"Foi louco quando os Estados Unidos adquiriram o
Alasca? Foi louco quando os Estados Unidos construíram o canal do Panamá?"
Sherri Goodman, antiga oficial do Pentágono e analista do think tank Wilson
Center
Ainda assim, a investigadora
reconhece um obstáculo, o mesmo que impediu o negócio de avançar em 2019: “Foi louco quando os Estados Unidos adquiriram
o Alasca? Foi louco quando os Estados Unidos construíram o canal do Panamá?”,
questiona ao Times. “[Segundo] o Direito
Internacional e a ordem internacional, a Gronelândia ainda é parte da
Dinamarca”. Desde 1953 que a Gronelândia é um distrito
autónomo da Dinamarca, com uma administração própria, mas subordinada em
assuntos de Defesa e Negócios Estrangeiros.
O líder do governo gronelandês
foi rápido a responder a Trump. “[A
Gronelândia] não está à venda nem nunca estará“, escreveu
Múte B. Egede numa nota ao canal dinamarquês V2. Egede detalhou ainda que desejam
continuar a cooperação e o comércio com todos os países, “especialmente os
vizinhos”, mas que isso terá de ser feito à luz dos “valores gronelandeses”.
Da parte de Copenhaga, a resposta foi semelhante, apoiando directamente
a nega de Egede a uma “venda”. Ainda
assim, “o governo está ansioso por trabalhar com a nova administração
[norte-americana]”, tal como se pode ler no comunicado do gabinete da
primeira-ministra dinamarquesa. Apesar de ter sido sublinhada a
necessidade de “cooperação transatlântica”, o ministro da Defesa anunciou, três dias
depois, que vai aumentar o investimento da Gronelândia nessa área. Sem
especificar valores, Troels Lund Poulsen afirmou que seriam “dígitos duplos” de
milhares de milhões de coroas dinamarquesas — o que pode ser qualquer valor
entre 1,37 e 13,27 mil milhões de euros.
▲ O degelo da Gronelândia está
a abrir novas rotas comerciais Getty Images
Apesar das recusas da
Gronelândia e da Dinamarca, três pessoas próximas de Donald Trump avançaram
à Reuters que há uma discussão informal para avançar mesmo
com o negócio. A opção mais popular passa pela independência
da Gronelândia da Dinamarca e a assinatura de um acordo de Livre Associação com
os Estados Unidos — as sondagens mostram que a maioria dos 56 mil
habitantes da Gronelândia apoiam esta solução, destaca a agência. A
assinatura deste acordo promove a integração económica de países com os EUA,
sem lhes retirar a sua independência.
David Goldwyn, funcionário do Departamento de Estado nas
administrações Clinton e Obama, argumenta ao New York Times que a solução mais
“frutífera” para os Estados Unidos alcançarem os seus objectivos económicos e
estratégicos na Gronelândia continua a ser “a colaboração com o governo
dinamarquês e a população gronelandesa”.
Canal
do Panamá. As tarifas “ridículas” e a mão da China na América Latina
O segundo território é o que tem
ocupado mais tempo a Donald Trump. Trata-se do estreito de 82 quilómetros,
construído pelos Estados Unidos no início do século XX, que liga os oceanos
Atlântico e Pacífico e facilita o tráfego marítimo. Os EUA tiveram controlo
exclusivo da passagem até 1977, mas desde 1999 que esse passou para o Panamá —
entre essas duas datas, o controlo era partilhado pelos dois Estados. Está
assim explicado o interesse histórico dos Estados Unidos no canal do
Panamá.
Apesar de ter reconhecido este valor, o argumento do Presidente
eleito para tomar controlo do canal é mais económico, uma vez que os Estados
Unidos são o principal cliente do canal. “As tarifas cobradas pelo
Panamá são ridículas, especialmente sabendo a generosidade extraordinária
mostrada ao Panamá pelos Estados Unidos. Este roubo ao nosso país tem de parar
imediatamente”, escreveu Trump na
Truth Social no passado sábado. As afirmações foram repetidas no domingo,
quando discursou no USA AmFest, uma conferência organizada pela associação
conservadora Turning Point.
▲O canal
do Panamá foi construído pelos EUA, mas é controlado exclusivamente pelo Panamá
desde 1999 dpa/picture alliance via Getty I
Canal do
Panamá. As tarifas “ridículas” e a mão da China na América Latina
Canadá. O 51º Estado e a luta das tarifas com o
“Governador” Justin Trudeau
Dois conselheiros de Trump apresentaram à CNN duas possíveis
justificações para o interesse de Donald Trump pelo canal do Panamá. Um
considerou que podia ser o resultado de um interesse pessoal expressado por
algum dos seus aliados, com quem tem estado reunido em Mar-a-Lago. Este conselheiro nota que Trump “eleva
causas” que lhe são apresentadas por estas pessoas se “o animarem”. O
outro conselheiro aponta que os
navios comerciais norte-americanos são um tema que lhe interessa, “os negócios
são uma prioridade para ele”.
A resposta do Panamá à ideia de Donald Trump não diferiu muito
daquela que foi dada pela Gronelândia. “Cada
metro quadrado do canal do Panamá e da sua zona adjacente é do Panamá e
continuará a ser. A soberania e a independência do nosso país não são
negociáveis“, afirmou
o Presidente José Raúl
Mulino. No mesmo comunicado, o chefe de Estado panamense declarou que “as
tarifas não são um capricho” e estão ajustadas aos mercados. A variação nas tarifas pode ser
justificada pelo aquecimento global, que seca reservatórios e diminui a
capacidade do canal. Aumentar as tarifas de passagem e alfândega é uma forma de
diminuir o trânsito no estreito, explica o The Guardian.
As palavras de José Raúl Mulino não foram bem recebidas. “Isso é o que vamos ver”, escreveu Trump,
novamente na Truth Social, onde partilhou ainda uma imagem da bandeira
norte-americana com o canal ao fundo e a legenda “Bem vindos ao Canal dos
Estados Unidos”.
Porém, para além das questões das tarifas, Trump tem outro
motivo para estar interessado em controlar o canal do Panamá: “Não deixar que caia nas mãos erradas”, ou seja a
China, explicou o próprio. A seguir aos Estados Unidos, a China é o segundo maior cliente do canal e os dois
portos do canal — um no Pacífico, outro nas Caraíbas — são administrados por
subsidiárias de uma empresa de Hong Kong, nota a Reuters. Apesar de
isto não representar um controlo directo chinês, é uma presença suficiente para
ameaçar Trump. “Isto é
uma questão de influência e de flectir [poder]. Trump está a tentar minar a influência [chinesa] na
América do Sul”, argumenta Tricia McLaughlin, conselheira de Vivek Ramaswamy —
o escolhido de Trump para liderar o departamento de eficiência governamental
com Elon Musk –, à agência noticiosa.
Outros dois conselheiros, especialistas em política externa,
explicam à Reuters que o interesse pelo canal do Panamá é uma forma de lidar
com uma das bandeiras de Trump na campanha: fazer
frente à economia e influência crescente da China no mundo. Will
Freeman, investigador no Council of Foreign Relations, especialista na América
Latina, argumenta que cabe às autoridades do Panamá decidir se cedem às
declarações “coercivas” do Presidente eleito. “Há um interesse real dos EUA em
controlar a sua neutralidade”, remata à BBC.
Canadá. O 51º Estado e a luta das
tarifas com o “Governador” Justin Trudeau
Em dois dias, Trump pressionou a Dinamarca a leste e o Panamá a sul. Mas, no início
do mês, a pressão já tinha sido disparada a norte, em relação ao Canadá.
No final do mês
passado, Trump prometeu aumentar
as tarifas das importações do vizinho do norte, outra das suas grandes
promessas eleitorais, tema que foi discutido com o primeiro-ministro canadiano
duas semanas depois, quando Justin Trudeau se deslocou a Mar-a-Lago para jantar
com Donald Trump.
“Estou ansioso por ver novamente o
Governador em breve para que possamos continuar os diálogos sobre comércio e
tarifas, cujos resultados serão espetaculares para todos”, escreveu
Trump sobre esse encontro do dia 10 de dezembro. Esta foi a primeira ocasião em
que o Presidente eleito se referiu publicamente ao chefe do governo canadiano
como “Governador”. Terá sido também a primeira vez que pôs em cima
da mesa a possibilidade de o Canadá passar a
fazer parte dos Estados Unidos, segundo relatou a Fox News.
▲ Trump terá
feito a proposta a Trudeau em Mar-a-Lago no início de dezembro OLIVIER
HOSLET/EPA
Na sua mensagem de Natal da passada quarta-feira, Trump voltou a
trazer o assunto à baila. “[Feliz
Natal] também para o Governador Justin Trudeau do Canadá, cujos impostos dos
cidadãos são demasiado altos, mas se o Canadá se tornar o nosso 51º Estado,
serão cortados em mais de 60%”, declarou Trump na mesma publicação em que
menciona o canal do Panamá e a Gronelândia.
Das três ideias, esta é a única que os analistas não vêem como uma
possibilidade real em nenhum cenário. Em vez disso, interpretam as pontadas
jocosas de Donald Trump como uma forma de pressionar o governo canadiano a
colaborar nas questões económicas, uma vez que o executivo de Trudeau já se
encontra sob pressão interna. “É parte da negociação
sobre as tarifas“, analisa Elliott Abrams, investigador no Council of Foreign
Relations, citado pela Reuters. Já Tricia McLaughlin vê uma ameaça de “não
mordas a mão que te dá de comer”.
Independentemente da viabilidade de
cada uma destas ideias, os analistas são, de um modo geral, unânimes de que
estas ajudam a desenhar a política externa norte-americana para os próximos
quatro anos. O seu lema “América Primeiro” não se limita a um slogan
isolacionista, mas a uma visão além-fronteiras, uma exibição de força. A CNN identifica ainda uma semelhança com a doutrina
“Manifesto do Destino”, que marcou a política externa dos EUA no século XIX —
“a crença nos direito divino dos Estados Unidos se expandirem pelo continente”. “A ideia é que o que é bom para a
América também é bom para o resto do mundo”, acrescenta por sua vez uma antiga
oficial de política externa da administração Trump, ouvida pela Reuters.
O
Manifesto do Destino do século XIX ("A crença nos direito divino dos
Estados Unidos se expandirem pelo continente") e a a política América
Primeiro de Trump ("A ideia é que o que é bom para a América também é bom
para o resto do mundo") interligam-se.
Contudo, apesar de o conteúdo destas
políticas não ser novo, a forma como Donald Trump as apresenta — como “provocações”
e como “floreados retóricos“, como define a CNN — pode pôr em causa a seriedade
destas propostas e a capacidade de a futura administração as implementar. Esta
crítica é feita por outro antigo conselheiro, John Bolton, que confirma que
estas negociações informais sempre existiram, mas que Trump pode deitar tudo a
perder porque “não soube manter a boca fechada“.
No
seu primeiro mandato e ao longo de toda a campanha eleitoral, Donald Trump
nunca se inibiu de deixar críticas e provocações aos seus adversários, como é o
caso da China. Mas o caso muda de figura se, no segundo mandato, o Presidente
quiser utilizar as mesmas táticas “coercivas” para lidar com aliados
históricos, como a União Europeia — aqui na figura da Dinamarca –, o Panamá ou
o Canadá.
Donald Trump
Estados Unidos da AméricA América Mundo Diplomacia
Dinamarca
Europa
Panamá
Canadá
COMENTÁRIOS (DE 18):
Mario Figueiredo: Gostaria que o artigo fosse mais abrangente. Porque
especialistas também os há que dizem que nenhuma destas hipóteses é remotamente
possível, nem nenhuma está mais próxima da outra. São todas absurdas. A única
forma que os Estados Unidos teriam de atingir estes objectivos territoriais
seria através de uma guerra. Mas ainda pior: No caso do Canal do Panamá, os
Estados Unidos iriam herdar um autêntico pesadelo administrativo, ambiental e
social. O canal sofre de graves problemas de escassez de água, e já teve que
sofrer várias intervenções que envolveram desviar cursos de água locais e mais
ligações ao mar, profundamente contestadas pelas populações locais e que ainda
por cima não conseguem resolver o problema. Apenas remendar. E muito disto
explica os preços que são cobrados. Todas estas intervenções em território
Panamiano, seriam impossíveis de fazer se os Estados Unidos adquirissem o
canal, e em pouco tempo secaria. A Gronelândia é um caso ainda mais complicado.
O território na verdade explora a ideia de independência há décadas. Mas as
motivações por detrás desta independência e as forças políticas que a apoiam
seriam ainda maiores adversários de uma integração com os Estados Unidos do que
a própria Dinamarca. Nunca assinariam um contracto de Livre Associação, temendo
para além das percas económicas, o enorme impacto ambiental que poderia ter no
território. Na verdade, uma Gronelândia independente iria cobrar valores mais
elevados por contractos de exploração do que a própria Dinamarca. Não há espaço
para explicar tudo aqui. Mas aconselho a investigarem um pouco sobre a política
e sociedade gronelandesa. Vale a pena. Muito interessante. O Canadá, é uma
parvoíce pegada. Nem merece comentário. Fernando
ce: Tudo ao pé da
letra! Compras na Amazon! Isto será um
jornal do BE? Parece. J.
P.: O Trump é uma anedota, porque se não
fosse... tudo isto seria muito perigoso, sobretudo para os EUA. Os EUA são o líder
do "mundo livre", mas se quer ostracizar esse mundo livre (Europa
ocidental, Canadá...) os seus arqui-inimigos agradeceriam. É a tal máxima,
inimigo do meu inimigo, meu amigo é.
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