sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

Baboseiras


Bem compinchas, os tais anglicanos de que trata o historiador João Pedro Marques, por desejarem aparentar, quer desportivismo, quer uma superioridade moral, sobre o resto dos mortais - que estará, talvez, em conformidade com as suas bolsas recheadas. Na minha pelintrice matarruana, mas, afinal, lucidamente revoltada, e digo-o sem peneiras, parece-me isso puro exibicionismo de uma espécie de rebaixamento que não tem em conta as vantagens culturais, entre outras, que os colonialismos levaram para as terras colonizadas. O certo é que a actual invasão do Ocidente pelos descendentes desses escravos, fugindo dos novos seus escravizadores – os governantes desses países hoje livres da tal escravatura, afinal há muito extinta – em hordas sucessivas dos que buscam o conforto e fogem ao terror dos chefes seus concidadãos que se guerreiam e trucidam - mostra bem que é com gente europeia ou americana que eles se sentem melhor, disso não temos dúvidas.

O nosso provincianismo imitativo, para mais amedrontado pelas estridências devotas da actual “cultura” woke, é bem capaz de ceder a iguais propostas de ressarcimentos serôdios de arrependidos imaginários ou patéticos – para não dizer patetas.

 

Pela porta das traseiras

Após décadas de constantes campanhas de culpabilização do homem branco, muitos ingleses, escoceses, galeses abrem os cordões às bolsas para comprar indulgências por pecados que não cometeram.

JOÃO PEDRO MARQUES Historiador e romancista

OBSERVADOR, 28 dez. 2023, 00:1735

O Reino Unido é, na Europa, o país onde o wokismo é mais visível, mais contundente e absurdo nos seus exageros. O que nesta área lá se passa é, por um lado, excepcional, pelo peso desmesurado que os woke lá têm, mas, por outro lado, é um farol ou um aviso do que, ainda que de forma mais atenuada e protelada no tempo, poderá vir a passar-se noutros países da Europa Ocidental.

Vem este preâmbulo a propósito do seguinte: há mais de 20 anos que activistas woke, tanto a título individual como associados em organizações — nomeadamente a Caricom, que agrupa 15 países das Caraíbas —, pressionam o governo de Londres para que peça oficialmente desculpa pelo envolvimento britânico na escravatura e para que pague reparações por esse facto. Londres continua a não dar ouvidos a esse tipo de pressões. Inquirido no Parlamento, o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak recusou frontalmente o pedido de desculpas e, evidentemente, as eventuais reparações.

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Mas enquanto o governo britânico resiste muito compreensível e adequadamente à pressão e à chantagem moral que os acólitos do wokismo exercem sobre o país, há várias entidades e cidadãos(ãs) britânicos(as) a pôr a corda ao pescoço, a vestir o hábito de penitente e a ceder jubilosamente a essa pressão e chantagem. Em Fevereiro de 2023, uma conhecida pivô e jornalista da BBC, tornou público que iria doar 100 mil libras para projectos comunitários na ilha de Granada como forma de reparação pela ligação de remotos familiares seus à escravatura e a plantações de cana-de-açúcar na ilha. E fez mais: abandonou a BBC para dedicar o seu tempo a campanhas públicas em favor de reparações pela escravatura. No seguimento da sua decisão, mais de 100 famílias britânicas com antepassados envolvidos no sistema escravista comprometeram-se publicamente a disponibilizar importantes quantias como forma de se purgarem desse pecado e de ajudarem as antigas colónias britânicas nas Caraíbas. Acresce que a Igreja Anglicana criou um fundo de 100 milhões de libras para ajudar esses países e que, no início de Novembro, a Lloyd’s de Londres, a maior seguradora do mundo, veio assumir publicamente que iria despender 52 milhões de libras em programas de apoio como forma de reparações pela ligação que, no passado, a companhia teve com o tráfico transatlântico de escravos e a escravidão.

É verdade que tudo isto frustra um pouco as intenções dos activistas woke, visto não ser exactamente aquilo que exigiam. Na verdade, preferiam ter sido eles a decidir os montantes das reparações e queriam, em vez de programas de apoio social ou educativo, dinheiro vivo pago directamente aos descendentes de escravos ou a quem os representasse, como algumas cidades norte-americanas fizeram ou irão fazer. Preferiam, além disso, ter chegado a um acordo global com o governo britânico em vez de serem polvilhados por estas medidas parcelares de particulares. Porém, se tudo isso é verdade, por outro lado esta disponibilidade de muita gente no Reino Unido para pagar compensações por situações ocorridas há dois, três ou quatro séculos, abre-lhes um manancial de inesperadas oportunidades.

Não surpreende por isso que os activistas woke queiram agora assumidamente contornar o Estado britânico que, ano após ano, resiste às suas pressões, para irem literalmente bater a outra porta, isto é, pressionar directamente famílias e organizações privadasbancos, colégios, universidades, seguradoras, firmas comerciais ou industriais, etc. — que tiveram uma qualquer forma de envolvimento e de ganho material com a escravatura. E vão começar pelo topo, exigindo reparações à família real britânica. Como diz um dos advogados encarregados de defender os interesses dos woke da ilha de Granada, nas Caraíbas, “ele (Carlos III) deve disponibilizar algum dinheiro. Não dizemos que deva privar-se, e à sua família, de comida, mas também não estamos a pedir ninharias. Acreditamos que podemos sentar-nos à roda de uma mesa e conversar sobre formas de reparação justas.”

Em conformidade, o rei receberá, até ao fim deste mês de Dezembro, um pedido oficial para iniciar conversações. O mesmo acontecerá a outras pessoas e entidades. Os woke acreditam que, por essa via, ultrapassando o governo pela berma da estrada e podendo formalizar acordos indemnizatórios com várias individualidades e instituições britânicas, acabarão por condicionar o próprio governo a ceder e a fazer, também ele, um acordo. Ou seja, no que desde já se anuncia como um ano farto, preparam-se para colher o que semearam. Após décadas de constantes campanhas de culpabilização do homem branco e de doses massivas de acusações despejadas para dentro da sociedade britânica, viram tudo isso frutificar nas cabeças de muitos ingleses, escoceses, galeses, que agora se flagelam, agitam bandeiras brancas e abrem os cordões às bolsas para comprar indulgências por pecados que não cometeram. Com tão fraca gente, com tanto precedente aberto, é evidente que o governo britânico vai perder força política e será provavelmente apanhado por trás pela quebra da sua retaguarda.

Esta nova estratégia woke deve pôr-nos de sobreaviso. Portugal é muito diferente do Reino Unido, bem sei. O nosso governo não está, para já, sujeito a uma pressão similar nem temos por cá, felizmente, um número perigoso de fanáticos do wokismo. Mas não é absolutamente garantido que fique assim para sempre. O que se vê na casa dos outros deve fazer-nos redobrar esforços para contrariar este veneno ideológico. Como o exemplo britânico mostra, esse é um combate que se vence — ou se perde — no campo da opinião pública. E para o vencer é necessária uma narrativa que, ao contrário da narrativa woke, seja historicamente informada e equilibrada, estruturalmente verdadeira e pelo menos tão convincente como ela.

Será esse o tema do meu próximo artigo.

POLITICAMENTE CORRETO   SOCIEDADE   ESCRAVATURA   REINO UNIDO    EUROPA    MUNDO

Rui Lima: Todos os povos do mundo devem ser reverentes a esse grande país a Inglaterra por 2 razões -combateu a escravatura de forma eficaz fez a revolução industrial, foram as máquinas que mataram a escravatura por ser anti-económica sem máquinas ainda hoje haveria escravos. Também o fez ideologicamente e na prática com os seus barcos, eu penso o contrário serão os povos libertados que estão em dívida para com os ingleses .                     José Carvalho: Um antepassado meu foi escravizado pelos romanos para trabalhar na extracção de ouro no local a que hoje chamamos Tresminas, aqui no meu concelho. Vou exigir ao governo de Itália que me pague uma indemnização!                   Maria Paula Silva: Excelente, como sempre. Os seus textos, JPM, são verdadeiras aulas. É assustador verificar como é tão fácil  manipular massas. Vivemos um tempo de loucura desenfreada em que reina a mediocridade (e muita ignorância). E muita manhosice também. Ansiosa à espera do próximo artigo. *Boas Entradas!*               Renato Pedro Milheiro Ribeiro > Américo Silva: O nazismo não é desculpável O estalinismo não é desculpável o Leopoldo II não é desculpável Creio que até aqui estamos de acordo Agora, para "fazer pagar as culpas" do nazismo vamos fazer o quê aos alemães de hoje? Agora, para "fazer pagar as culpas" do estalinismo vamos fazer o quê aos russos, georgianos, ucranianos et tutti quanti de hoje?  Agora, para "fazer pagar as culpas" do Leopoldo II vamos fazer o quê aos belgas de hoje?       Pontifex Maximus: Que os ingleses paguem pela colonização de algumas partes do mundo é um claro absurdo (os bretões foram eles também colonizados pelos romanos, pelos anglos, pelos saxões, pelos normandos), mas ao menos poderiam ter a lucidez de exigir a reparação integral do mal que supostamente fizeram de modo a que o preço das viagens de regresso dos pobres descendentes dos escravos nas Américas a África e do lucro dos povos africanos que lhes venderam os cativos para que a escravatura fosse diluído no preço. Sim, pois ou se repara o mal ou não e se a escravatura foi um mal, os descendentes dos escravos têm que regressar à terra mãe. E está claro que não vale a pena dizer aos pretinhos americanos que não têm responsabilidade e por isso não querem voltar a viver em cubatas preferindo o conforto americano, pois os descendentes ingleses têm o mesmo grau de responsabilidade face ao que os seus ascendentes fizeram              John Doe: O Wokismo e seus fanáticos devem ser combatidos ferozmente sempre que se manifestarem. Por cá também já houve casos isolados de wokistas a alegar que "um primeiro passo para a reconciliação, era Portugal pedir perdão..." O segundo passo seria obviamente pagar as centenas de milhares de pedidos de indemnização que viriam em seguida... Mas à parte um lapso do Presidente, é pouco provável que isso vingue por cá, mesmo na opinião pública, mais preocupada com o dia-a-dia do que com cenas que aconteceram há centenas de anos. E então quando começarem a falar em indemnizações, então menos ainda.              Meio Vazio: Parabéns aos "wokeiros" por, passo a passo, irem levando a água ao seu moinho: fazer reviver o fantástico sistema penal vigente na Antiguidade, que estendia a pena aos descendentes, e até aos ascendentes vivos, do condenado (...sendo que, no caso em apreço assistimos à bizarria de ver naturais dos "países mártires" - eles  sim, descendentes de colonos e eventuais "culpados" - a pedir reparações aos descendentes de quem nunca da Europa saiu).              José B. Dias: Curioso como a "compra de indulgências" voltou ao activo ... precisa-se de um novo Lutero para despoletar a necessária Reforma.               Elizabeth Coelho: Excelente, mais uma vez obrigada.  Boas festas.                 João Floriano: Não partilho o ponto de vista mais ou menos descontraído do nosso país estar «ainda» a salvo destas indulgências modernas. Apesar de os nossos wokes serem fundamentalmente ridículos não devem ser subestimados sobretudo porque têm grandes apoiantes em cargos de topo no governo: o Ministro da Cultura, o PR, muitos deputados do PS, o Bloco de esquerda e a extrema-esquerda em geral são wokes militantes e têm um peso significativo na CS. No entanto estas organizações piedosas e humanitárias que recolhem as compensações e que sem dúvida as vão aplicar em proveito dos descendentes de escravos (honi soit qui mal y pense) que estes milhões vão acabar em contas bancárias off shore e não onde inicialmente se destinavam) sabem que não vale a pena pedir a quem já de si é pedinte. No entanto é bom estar de olho bem aberto não vá alguém fazer promessas e assinar compromissos em nosso nome sem que para tal tenha sido mandatado. Entretanto se vier um pedido de compensação do Brasil não se esqueçam de descontar os 4 milhões em vacinas mais as cadeiras de rodas Rolls Royce.                  Tim do Á > Rui Lima: Precisamente. Deviam compensar os britânicos pelo seu desenvolvimento, assim como as nossas províncias ultramarinas também nos deviam compensar por tudo o que lá deixámos. E muito! Chega!                   Tim do Á > Américo Silva: Hello! Os culpados já morreram. Como reparar? Não sou culpado bem responsável pelo que fizeram os meus antepassados. Posso até discordar muito. Não devo nada a ninguém. Mais. É claro que há raças superiores às outras. Assim como há homens mais inteligentes do que outros. E raças de cães mais inteligentes. Os brancos ocidentais foram claramente superiores. Mas isso muda com o tempo. Agora já não são. Serão os chineses talvez no futuro. Os brancos estão em decadência. Dentro dos ocidentais também sempre houve povos superiores. Já foram os romanos, depois vieram os anglo-saxónicos. Os mouros já foram superiores em relação aos povos ibéricos. Agora não valem nada e se não fosse o petróleo viveriam todos em tendas.                   José Tomás > Rui Lima: What have the Romans ever done for us? Ok, éramos caçadores recolectores, com escassas hipóteses de chegar aos 30 anos, sem ser vítimas da fome, da doença, de tribos rivais ou de um leão com fome, e eis-nos aqui, no sol de Barbados, a separar os turistas dos seus dólares e euros, com a expectativa de chegar aos 80, mas, tirando isso, o que é que esses malandros fizeram por nós?

 

 

 

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