Uma análise de dúvidas e esperanças...
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As tácticas e movimentos antes da chuva.
Os progressos são lentos e Kiev já teve de mudar a estratégia para furar as
linhas defensivas russas
Em Zaporíjia, os avanços são lentos.
Na recta de Bakhmut há trabalha a fazer, mas o "cerco está a
apertar". Faltam apenas poucas semanas para as chuvas de outono começarem.
OBSERVADOR, 23 set. 2023, 22:042
Índice
Zaporíjia e a esperança de cortar o
corredor terrestre da Crimeia
Os avanços no eixo de Bakhmut que
possibilitaram alguns dias de calma
Crimeia e o sonho de restituir as fronteiras
“A guerra não é sempre os triunfos
espectaculares.” A frase, de George Barros, analista do Instituto
para o Estudo da Guerra (ISW, na sigla em inglês), think tank que há mais de um ano acompanha os desenvolvimentos
do conflito na Ucrânia, pode ser usada para resumir os últimos meses da
ofensiva e contraofensiva ucraniana. Iniciada
em meados de junho, não tem tido o progresso esperado por Kiev e pelos seus
aliados ocidentais, com avanços lentos e muito desgastantes, ainda assim
pontuado pela recuperação de algumas pequenas localidades estratégicas.
Em alguns sectores, os avanços das
tropas ucranianas não passam dos 100 metros por dia, como chegou a apontar o secretário-geral da NATO, Jens
Stoltenberg. O
progresso é muito diferente do ritmo alucinante com que no ano passado os
militares foram recuperando território às forças inimigas — em três dias de
setembro, conseguiram recuperar o controlo de mais de um terço da região
ocupada de Kharkiv — e deixou a fasquia elevada para este ano. Mas os
especialistas alertaram cedo que o mesmo cenário podia não se repetir em 2023. As intrincadas linhas de defesa russas,
com sistemas de trincheiras, fossos e campos minados, construídas para
dificultar ao máximo um avanço, reduziram drasticamente o ritmo de progressão
das forças de Kiev no terreno.
Ainda assim, as forças ucranianas ultrapassaram algumas posições
russas ao longo da linha de avanço a sul, a frente mais promissora. Também
reivindicaram a libertação de algumas pequenas localidades no Donbass, perto da
disputada cidade de Bakhmut (região de Donetsk) e há muito que essas
reconquistas vão acontecendo por trás das cortinas, longe dos holofotes. “É em grande parte devido às coisas chatas
que não vemos e a todo o trabalho base que estabelece as condições para os
triunfos”, como acrescenta George Barros.
▲No campo de batalha os
soldados ucranianos vão celebrando mesmo os pequenos sucessos NURPHOTO
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Apesar da lentidão nos avanços, o balanço que muitos analistas fazem
dos últimos meses é positivo: “A Ucrânia
tem a iniciativa e isso é algo muito importante na guerra”, sublinha em
declarações ao Observador Johan Norberg, especialista em assuntos militares
russos e analista militar na Agência de Investigação em Defesa da Suécia. “A contraofensiva está a decorrer
lentamente, mas a avançar. E o progresso é lento porque os territórios a
recuperar são enormes — correspondem aos territórios dos Países Baixos, Bélgica
e Suíça combinados. Toda esta conversa de que a
contraofensiva não está a ir a lado nenhum só mostra a completa ignorância
sobre os princípios básicos desta guerra”, defende.
A Ucrânia já recuperou até à data mais de 54% das zonas sob ocupação
russa, avançou esta semana o Chefe do Estado-Maior das Forças
Armadas dos Estados Unidos, Mark Milley, na reunião do grupo de contacto para a
defesa da Ucrânia, sem contudo especificar se estava a referir-se a territórios
ocupados desde 2014 ou da invasão em larga escala lançada em fevereiro de 2022. “Enquanto a contraofensiva progride, é fácil
ficarmos concentrados nos números, gráficos, dados, as setas num mapa. Mas
devemos lembrar-nos, em primeiro lugar, de que a guerra é um esforço humano.
Cada avanço ucraniano, cada centímetro de território recuperado só acontece
devido à bravura, honra e sacrifícios incríveis feitos pelo povo ucraniano e os
seus militares”, afirmou, na mesma semana em que o Presidente da
Ucrânia esteve em Nova Iorque — para participar na Assembleia Geral das Nações
Unidas — e em Washington — para uma visita ao Congresso e uma reunião pessoal
com Joe Biden na Casa Branca.
Mas, apesar dos sinais públicos de
apoio, vai crescendo a impaciência do ocidente, especialmente com a realização
de eleições em vários países e com setores da população algo descontentes com
os elevados gastos com o apoio a Kiev, em detrimento de investimentos nos
próprios países. A esse respeito, os especialistas ouvidos pelo
Observador sublinham a importância da manutenção do apoio. “Devemos dar aos ucranianos o benefício da
dúvida. O importante é continuar a apoiá-los”, sublinha Johan
Norberg, destacando que esta é uma guerra que vai muito para além da Ucrânia.
O fim do verão traz consigo um
novo inimigo nos esforços da Ucrânia para recuperar território: o mau tempo. Restam a
Kiev apenas cerca de três semanas até as chuvas começarem a tornar os terrenos
lamacentos e a dificultar novos avanços. O major-general Isidro Morais Pereira sublinha
que é importante que as tropas ucranianas consigam avançar mais alguns
quilómetros até lá, especialmente na frente sul. “A janela de oportunidade para efectuar avanços significativos, com a
chegada do outono, diminui a esperança de conseguir progredir a bom ritmo”,
refere. Não deixa de destacar que os avanços dos últimos meses foram
conseguidos mesmo à custa de apoios militares que chegaram de forma tardia, e
também apesar da falta de superioridade aérea.
Zaporíjia e a esperança de cortar o corredor terrestre
da Crimeia
A
frente de Zaporíjia, no sul
da Ucrânia, assumiu-se como o principal eixo dos meses da contraofensiva. As forças ucranianas celebraram no final
de agosto a recuperação da pequena localidade de Robotyne, expandindo a
abertura à sua volta, cruzando assim a primeira linha das defesas russas e
aumentando as esperanças de um avanço após semanas de progressos medidos ao
metro. O objectivo neste sector parece claro: abrir
caminho em direcção ao sul ocupado da Ucrânia e à Crimeia, península anexada
pela Rússia em 2014. “Ao
ficarmos entrincheirados nos flancos de Robotyne, abrimos caminho para Tokmak
e, finalmente, para Melitopol, bem como para a fronteira da Crimeia”, assegurou
recentemente o ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia.
Dmytro Kuleba reconheceu que esta
batalha foi particularmente longa e árdua, devido aos aviões, helicópteros e
drones russos “que dominam o céu”, bem como as dificuldades de cruzar os campos minados
— em alguns casos, chegam a estar
cinco a sete minas por metro quadrado. Mas a vitória em Robotyne não se fez sem perdas. Na tomada de posições em torno
da localidade, uma companhia ucraniana, por exemplo, perdeu quatro de oito
carros de combate, assim como os tripulantes que seguiam em dois deles, como
revelaram ao El País
militares perto da linha da frente de guerra. Há a registar, inclusivamente, a
perda de material recém fornecido pelo Ocidente, com a destruição, pela
primeira vez, de um Challenger-2 britânico.
▲As tropas ucranianas têm feito
progressos na região de Zaporíjia, em particular no sector junto de Verbove
Ao jornal espanhol, vários militares
descreveram que estas e outras perdas levaram a uma ligeira alteração de tácticas: dar prioridade nesta frente a ataques
de pequenos grupos de infantaria, esquadrões e pelotões entre seis a 30
soldados, e deixar para apoio indirecto os veículos blindados, que se tornaram
um alvo fácil. “A maneira mais fácil de morrer é seguir
dentro de um carro de combate”, justificou ao
El País Volodymyr (sem referências ao apelido), um oficial da Guarda
Nacional da Ucrânia a combater na região, descrevendo as tropas russas como mais
bem formadas, com mais experiência e mais bem equipadas. “Basta
que um carro de combate nosso que esteja a abrir caminho pise uma mina para que
toda a coluna se detenha e numa questão de minutos seja arrasada com mísseis a
partir das trincheiras, com drones, com bombas, com artilharia e fogo aéreo”, explicou.
Não é de surpreender esta disposição. “É
difícil fazer os tradicionais ataques em larga escala com muitos blindados e
infantaria. Isso implica concentrar forças num só lugar para produzir um
avanço, o que deixa as forças muito vulneráveis à artilharia — e isto é
sem dúvida uma guerra de artilharia”, diz o analista
militar sueco Johan Norberg, também investigador do Foreign Policy Research
Institute. É arriscar perder
as tropas “numa questão de minutos”, sublinha, razão pela qual as companhias de
soldados como Volodymyr se vão dispersando em pequenos grupos pelos bosques na
região.
A pouco e pouco vão chegando notícias
positivas para a Ucrânia. “A
observação geoespacial já assinala a presença de viaturas blindadas e
mecanizadas, principalmente na região de Zaporíjia, na direcção de ataque de
Melitopol, e fundamentalmente a oeste de Verbove”, refere o
major-general Isidro Morais. É o que aponta o Instituto para o Estudo da
Guerra no seu mais recente relatório. O think
tank norte-americano refere que imagens geolocalizadas e publicadas a 21 de
setembro mostram os blindados ucranianos a avançar a sul das valas antitanque e
dentes de dragão que fazem parte de uma defesa de três camadas e se envolveram
em alguns combates imediatamente a oeste de Verbove.
"A capacidade ucraniana
de trazer blindados para e através das mais formidáveis defesas russas
destinadas a detê-los e de operar estes veículos perto de posições defensivas
russas são sinais importantes de progresso na contraofensiva ucraniana." Instituto
para o Estudo da Guerra no relatório de 21 de setembro
“Não é claro se as forças ucranianas
mantêm estas posições, mas é o primeiro caso observado das forças de Kiev a
operar blindados além da defesa russa de três camadas”, começa por
explicar o ISW. “A presença
destes veículos para lá da linha final da actual camada defensiva russa mostra
que os ucranianos conseguiram ultrapassar as duas primeiras linhas desta camada
o suficiente para operar veículos através da brecha”, refere. E
acrescenta que, para isso, os
ucranianos tiveram de suprimir a artilharia e sistemas anti-tanque russos na
área, atravessando um das “mais formidáveis defesas” num importante sinal de
progresso na contraofensiva.
A Ucrânia vai celebrando discretamente. Esta quinta-feira, o coronel Mykola
Urshalovych, Director Adjunto de Planeamento da Guarda Nacional, disse num
briefing em Kiev que, “no sector Melitopol, unidades das brigadas da Guarda
Ofensiva estão a expulsar os invasores das suas posições e a consolidar as suas
posições, apesar da forte resistência russa”. Do lado russo, foram divulgados
prontamente ataques infligidos às tropas ucranianas, mas há também vozes que
admitem dificuldades. “O
inimigo está a completar a redistribuição das suas unidades na área de
Robotyne, pelo que esperamos que a situação na área de Robotyne-Verbove se
deteriore”, explicou Yevgeniy Balitskiy, um dos governadores
das zonas sob ocupação no oblast de Zaporíjia.
O que esperar daqui para frente? Um
trabalho a pouco e pouco das forças ucranianas para continuar a avançar
paulatinamente. “Deveríamos ter uma perspectiva de longo prazo sobre
esta operação”, alerta Johan Norberg. “Pode existir um colapso de qualquer um dos lados por causa de algo que
não conseguimos prever, mas parece que agora vai ser uma longa tarefa.”
Os avanços no eixo de Bakhmut que possibilitaram alguns
dias de calma
Tranquilidade é uma palavra que durante
muitos meses não se associou a Bakhmut, a cidade que foi palco da mais longa
batalha da guerra e que as tropas de Kiev estão agora a tentar recuperar. Mas
desde que os soldados ucranianos reivindicaram há quatro dias as localidades de
Andriivka e Klishchiivka, a cerca de oito quilómetros a sul de Bakhmut, o
sentimento é agora de um pouco mais tranquilidade. “Dois dias depois da
libertação de Klishchiivka, está tudo mais calmo. É possível que eles [os
russos] estejam a reposicionar-se ou talvez a construir novas posições, mas,
meu Deus, durante dois meses não havia calma. Simplesmente não acontece”, disse à
Reuters o comandante ucraniano Vladyslav. Ainda assim, o sentimento não deverá
durar. As aeronaves russas “tornam a vida difícil” e os ataques de drones são
“mais percetíveis ultimamente”, refere. A certeza é de que são necessárias mais
armas.
A recuperação das duas localidades, que
a Rússia não reconheceu para já, até pode parecer coisa pouca, mas essa
avaliação pode ser precipitada. “Estas vilas, embora à primeira vista pequenas,
são importantes elementos das linhas defensivas do inimigo que se estendem até
Bakhmut”, destacou o general ucraniano Oleksandr Syrskyi numa publicação no
Telegram. “Como resultado das ações bem sucedidas das nossas tropas, a linha de
defesa, que o inimigo tentou fechar ao enviar todas as reservas disponíveis
para batalha, foi invadida”, acrescentou.
▲Os soldados
ganharam alguns dias de tranquilidade após recuperar as localidades de
Andriivka e Klishchiivka ANADOLU AGENCY VIA GETTY IMAGES
A importância da cidade de Bakhmut tem sido questionada desde o início dos combates, que já remontam ao ano
passado. O que surpreendeu alguns analistas é que, mesmo apostando no setor
de Zaporíjia, se manteve uma intensidade significativa de combates em Bakhmut e
na região do Donbass. “É interessante que a Ucrânia esteja a avançar para leste
no Donbass e, por isso, está a apoiar duas operações ofensivas ao mesmo tempo.
Quando olhei para isso antes, pensei que iriam concentrar as forças numa
operação, mas transformaram-se em duas”, refere Johan Norberg. O analista sueco assume que pode
tratar-se de um sinal de que “há mais em jogo no Donbass do que apenas
Bakhmut”, ainda que para já seja difícil de ver o cenário
todo.
Perto de Bakhmut, à semelhança da evolução na região de Zaporíjia,
os avanços têm sido lentos. É uma guerra de pequenos avanços, mas o“cerco está
a apertar”, resume o major-general Isidro
Morais. “As forças
ucranianas estão a evitar combater dentro das ruínas de Bakhmut, onde estão
concentrados os russos, e tentam cercá-los”, aponta. Andriivka, que fica a
cerca de três quilómetros do aeroporto de Donetsk, e Klishchiivka, que se
situa num terreno elevado a partir do qual o ataque pode continuar, são
parte desse esforço, acrescenta.
“Os avanços ucranianos, embora lentos,
continuam a verificar-se diariamente. Os militares russos que combatem estão
entrincheirados dentro do perímetro urbano de Bakhmut e com o tempo podem vir a
ter de se retirar”, refere. Nessa eventualidade, o apoio logístico
começará a escassear, deixando as tropas russas sem capacidade de combate e com
apenas duas opções: retirar ou ser massacradas.
Numa das últimas declarações enquanto
vice-ministra da Defesa — antes de ser afastada, numa reformulação do sector
ordenada pelo Presidente ucraniano e que levou também ao afastamento do
ministro Oleksii Reznikov –, Hanna Maliar revelou que as forças ucranianas recuperaram cerca de 52 quilómetros quadrados de
território perto de Bakhmut. As forças russas, por oposição,
parecem estar a fazer poucos avanços. Num relatório publicado esta
sexta-feira, o Instituto para o Estudo da Guerra refere que as forças russas, “que têm por objetivo
manter as posições na linha da frente e proteger a rectaguarda de ataques
ucranianos”, conduziram operações ofensivas perto de Bakhmut sem avançar. O
mesmo cenário repetiu-se ao longo da linha Avdiivka-Donetsk.
Crimeia e o sonho de restituir as fronteiras
Enquanto as atenções estão mais
concentradas nos avanços, ainda que lentos, na região de Zaporíjia e no Donbass, a Ucrânia vai preparando o
caminho para a Crimeia. A península tem estado sob ataques recorrentes ao
longo das últimas semanas e esta sexta-feira trouxe novos desafios para as
forças russas ali estacionadas. Um
ataque com mísseis reivindicado por Kiev voltou a atingir a base da Marinha
Russa no porto de Sebastopol, junto ao Mar Negro. E ficou uma
promessa: “Haverá mais”, nas palavras do comandante das Forças Armadas
ucranianas, Mykola Oleschuk.
O analista militar Johan Norberg não tem dúvidas de que a Ucrânia “está
a preparar a Crimeia para poder mover as suas forças mais tarde”. Até lá, o principal objectivo é atingir
as infraestruturas e capacidades russas na península. Sobre
prazos, nem vale a pena falar. “É
preciso eliminar uma grande percentagem da defesa aérea russa antes de ser
possível avançar. Isso pode levar uma semana, um mês, pode levar um ano até”,
acrescenta
o analista da Agência de Investigação em Defesa da Suécia.
“A Ucrânia está a preparar a Crimeia para
poder mover as suas forças mais tarde. É preciso eliminar uma grande
percentagem da defesa aérea russa antes de ser possível avançar." Johan Norberg, analista militar na Agência de
Investigação em Defesa da Suécia.
A Ucrânia não esconde que este é o seu objectivo. “O
caminho para a vitória no campo de batalha é destruir as logísticas russas”, já tinha assumido esta semana
Andriy Yermak, chefe da equipa de gabinete do Presidente da Ucrânia, na
sequência dos ataques à Crimeia. Derrotar a Rússia, sublinhou,
depende de não dar a Moscovo a “oportunidade de preservar o potencial militar
para travar uma guerra agressiva”.
Os ucranianos já o estão a fazer. Conduziram pelo menos dois ataques em que alegam ter destruído sistemas de mísseis
antiaéreos S-400 Triumf com os mísseis de fabrico nacional Neptune — se o
nome parece familiar, é porque foram usados no ano passado para afundar o
Moskva, um dos maiores navios de guerra russos. O ataque
mais devastador até agora, que, segundo alguns analistas, terá sido facilitado
pela destruição dos sistemas de defesa, ocorreu no entanto a 13 de setembro e atingiu o estaleiro de reparação russo Sergo
Ordzhonkidze com dez mísseis britânicos Storm Shadow. Permitiu
danificar um submarino e um navio da marinha russa na Crimeia.
“Apesar
de não ser tão surpreendente como o ataque ao Moskva, este tem talvez um
significado mais profundo para a guerra no geral”, considera Tom Sharp, antigo capitão da marinha real
britânica. Num artigo publicado no jornal The Telegraph, intitulado “A Ucrânia teve uma vitória naval massiva sem ter uma marinha”, Sharp
explica o porquê. Por um lado, obriga à remoção de uma embarcação logística e
um submarino equipada com os mísseis Kalibr, aumentando a “lista de perdas” da
frota do Mar Negro. A reparação do submarino, em particular, poderá ser difícil
ou mesmo impossível, refere. Por outro lado, explica, todos estes ataques
colocam em causa a viabilidade da base naval de Sebastopol. Ainda que possa
continuar a ser usada, será às custas da substituição e reforço das defesas
russas.
Estes
são apenas alguns dos ataques conhecidos, que alguns analistas apontam ser
apenas a “ponta do iceberg”. Poderão estar a ocorrer mais acções
ofensivas, que Kiev prefere fazer pela calada, e sobre os quais Moscovo prefere
não falar. O major-general Isidro Morais não tem dúvidas de que nos próximos
tempos a pressão vai aumentar com mais
ataques, especialmente com a chegada do outono. “A partir do momento em
que as operações na frente de combate diminuem de intensidade, vão sendo
substituídas por acções na profundidade do adversário, por ataques com drones,
mísseis, tanto de um lado como do outro”, explica.
Quanto aos próximos alvos, Isidro Morais
aponta aquele que considera ser o mais provável nos próximos tempos: “Não sei quanto mais tempo a ponte da
Crimeia, que ainda não está completamente reparada, vai continuar de pé. Não me
admiraria nada que, mais dia, menos dia, fosse novamente atacada e atacada de
forma soberana.” Isso depende, no entanto, dos meios à disposição da
Ucrânia. “Não têm um arsenal infinito de mísseis para continuar a atacar. Têm de definir as suas prioridades
cuidadosamente”, defende ainda Johan Norberg.
A esse propósito, Volodymyr
Zelensky poderá ter ouvido a notícia por que tanto esperava,
na sua passagem por Washington, esta semana. A informação, divulgada pelo canal norte-americano NBC News, só foi
conhecida já depois de o Presidente ucraniano ter deixado o país, mas tem um
peso significativo nos planos de guerra de Kiev: os Estados Unidos terão informado
Zelensky de que vão mesmo entregar um conjunto — ainda que em número reduzido —
de mísseis de longo-alcance ATACMS. Com capacidade de atingir alvos a pouco
mais de 300 quilómetros de distância, a entrega dos mísseis poderá ser a chave
para ataques mais eficazes para lá das linhas defensivas das forças russas,
permitindo inclinar um pouco mais o tabuleiro dos combates a favor de Kiev.
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