A luta (subentendida) de JAIME NOGUEIRA PINTO, que não
só conta bem a sua história acerca de dois países – Espanha e Portugal, relativamente às
pretensões de certos partidos infiéis à sua pátria... (Por cá também tivemos um
Jardim a divagar sobre a sua ínsula não divina mas também não pertencente “aos
do Continente”, que, escrupulosamente, repartiam e repartem ainda os dinheiros vindos
do exterior para que ela continue a florir bem, sob o mesmo hino nacional
continental…) JAIME NOGUEIRA PINTO, repito,
não só narra a situação, no contexto das eleições espanholas, como demonstra a
razoabilidade da sua crítica subentendida, à Catalunha e ao País Basco ou Vasco,
que se pretendem separatistas, mau grado o bom senso patriótico de muitos
outros espanhóis, de oposição àqueles, até mesmo entre os Catalães. Complicado
labirinto esse, sim, oxalá que a ambição do poder dos partidos em disputa não faça
subverter a história de uma Espanha que amamos como Estado poderoso que o nosso
pequeno “jardim”, plantado do lado de cá, se habituou a respeitar, como pátria
de um Quixote imortal praticante de acções quantas vezes inúteis, mas jamais
medíocres...
No labirinto espanhol
As cisões no PSOE, provocadas por uma
possível cedência aos “nacionalismos regionais”, só vêm confirmar que, em
Espanha, a questão nacional é transversal.
JAIME NOGUEIRA PINTO Colunista
do Observador
OBSERVADOR, 23
set. 2023, 00:1824
Portugal está, há muitos anos,
numa letargia estável, numa decadência progressiva, indolor e insípida, agora
animada pelo relato ao minuto de guerras de alecrim e manjerona entre altas
personalidades da República ou pelo debate, a três anos, das eleições
presidenciais. Entretanto, entre lamentos e protestos
desconsolados, mas pouco reactivos, vai vendo passar a falta de legislação e de
decisão política no muito que, de estrutural, falha e falta, e o excesso de
legislação avançada e de accção expedita na “implementação” dos artigos de fé
de todo um novo catecismo, alheio ao povo, supérfluo, absurdo mas letal.
Tem
sido esta a tónica da Terceira República e, nestes meses que faltam para o
cinquentenário da Gloriosa, não é estranho que se tenha intensificado. Afinal,
muitos dos principais artistas e figurantes ainda estão em cena e alguns até
refinaram os talentos.
A Espanha é diferente. Até porque a Espanha passou antes de nós
pela experiência, sempre colectivamente traumática, do fim do Império. Para
eles, foi em 1898, com a independência, sob protectorado norte-americano, de
Cuba e das Filipinas. Depois disso, tiveram uma longa guerra civil, ideológica
e sangrenta. E os vencedores impuseram um regime autoritário. Bastante mais
autoritário que o nosso.
O desfecho dos dois regimes
ibéricos foi também diferente: em Portugal
houve um golpe de Estado militar, seguido de uma ruptura institucional e da
tentativa de uma revolução social; em Espanha houve uma transição regulada por Franco, que deixou
intocadas as estruturas sociais, mas que mexeu na política do Estado. É um
paralelo interessante, ligado ao problema central da unidade e identidade do
Estado e à sua garantia e defesa em diferentes regimes políticos.
Em Portugal, a raiz do
apoio ao regime anterior pelas pessoas da minha geração que o apoiaram a partir
de 1961, no princípio da guerra de África, estava na defesa do Ultramar.
Nas gerações anteriores, à direita, havia a experiência da Primeira
República e a forma como os Democráticos de Afonso Costa, e depois de António
Maria da Silva, se tinham perpetuado no poder nesses 16 anos, usando e abusando
da Constituição e das leis, recorrendo à violência de milícias partidárias,
tratando os católicos e os monárquicos como não-cidadãos, perseguindo até os
republicanos conservadores.
Hoje, nos 50 anos que o regime
já leva, não são esses os métodos. A Esquerda voltou a apoderar-se do
Estado-aparelho, controla grande parte da comunicação social mas, apesar de
estar há meio século no poder, continua a apresentar-se como uma
comunidade-vítima de “antifascistas perseguidos”.
Em Espanha não foi assim: ao contrário de Salazar, Franco preocupou-se com a sucessão,
mesmo depois de saber que a Espanha ia ser uma monarquia parlamentar
democrática, com partidos de todas as cores. Os franquistas aceitaram o Rei – e
as estruturas económico-sociais da Espanha desenvolvida do pós-anos 60 – como
garantia de estabilidade política na transição; e as esquerdas, aceitaram-no
como garantia de que os militares não interviriam pela força, apesar do
terrorismo separatista da ETA, cujas vítimas rondaram o milhar.
Do terrorismo da ETA à longa marcha de Pujol
Mas com a democracia, os movimentos separatistas no País Vasco e na
Catalunha constituíram-se em partidos políticos, de natureza mais “burguesa”: o Partido
Nacionalista Vasco, no País
Vasco, e o Partido Convergência i Unió, na Catalunha. O partido catalão e o seu
líder Jordi Pujol apostaram numa estratégia
não violenta, baseada no poder
cultural. Esta estratégia rumo ao separatismo traduziu-se no
chamado Programa 2000, onde se configurava a fixação de uma identidade ou de
uma “personalidade catalã” por via do ensino escolar e universitário da língua
e da cultura da comunidade autónoma. Da criação desta “personalidade”, fez
também parte o estabelecimento de uma História da Catalunha, com vista à
consolidação de uma nação catalã (Països Catalans) no quadro da União Europeia,
e de um “memorial de queixas” contra Madrid.
Este
programa foi prosseguido durante o longo governo de Pujol à frente da Generalitat e, com o tempo, praticamente duplicou o número de
catalães que se sentiam mais catalães que espanhóis; número que chegou a rondar
a metade.
A questão nacional, da identidade nacional, ressuscitada no século
XX, está, pois, no centro da vida política espanhola. Enquanto a oposição de classe ou a
repartição de renda são quantitativas e negociáveis, como, apesar de tudo, o
são também as diferenças ideológicas (mais conservadorismo ou mais
progressismo), a identidade
nacional e a identificação com uma ou outra comunidade como primeira
destinatária da lealdade política dos cidadãos não deixa grande espaço para
negociações ou acomodações.
Ora das eleições de 23 de Julho passado resultou um Parlamento em
que, para ascender ao poder, a coligação da Esquerda – PSOE-SUMAR – tem
necessariamente que contar com os partidos separatistas (Junts, da Catalunha,
com 7 lugares, EM Bildou e EAJ-PNV do País Vasco, respectivamente com 6 e 5
lugares).
A asfixia do centro
Convém
não esquecer que o fim do bipartidarismo espanhol (PSOE versus Partido
Popular) ficou também a dever-se à questão
catalã. Primeiro foi
o fenómeno Ciudadanos, um partido do “centro”, que marcou o protesto dos
catalães que se sentiam mais espanhóis que catalães, mas que não gostavam do PP. Porém, em
tempos de radicalização – uma
radicalização provocada precisamente pela questão nacional da Catalunha e pelos
novos ventos da Europa –, o Ciudadanos, que em 2019 tinha sido o terceiro
partido nacional, perdeu-se pelo seu “centrismo”. E veio o Vox, como correcção ao que muitos eleitores da
direita espanhola viram como a fraqueza do Partido Popular de Pablo Casado na
questão catalã. O Vox surgia também enquadrado na vaga europeia das direitas nacionais conservadoras e
populares, alcançando um resultado surpreendente, ao eleger 52 deputados e passando a ocupar o terceiro
lugar no Parlamento, a seguir ao PSOE e ao PP. Nas últimas eleições, o voto
útil no PP penalizou o Vox, que, ainda assim, com 33 deputados, continua a ser
o terceiro partido.
O Vox subiu porque soube pegar
na agenda europeia de combate aos projectos das novas esquerdas contra os
valores nacionais, religiosos e identitários; mas subiu também, e essencialmente,
por ter sabido capitalizar a reacção do
nacionalismo espanhol à ameaça secessionista da Catalunha.
Acontece que a questão nacional não
divide apenas os partidos “nacionalistas” dos “nacionalismos regionais”: abre
cisões noutros partidos, nomeadamente no PSOE. Cisões que levaram à recente
expulsão de Nicolás Redondo Terreros, dirigente socialista, filho do histórico
Nicolás Redondo, por ter criticado a negociação da amnistia.
Mas se a oposição da Esquerda a um
governo de coligação PP-Vox é suficiente para bloquear essa solução, a geringonça esquerdista PSOE-SUMAR
também não tem a vida facilitada, já que, para passar no Parlamento como
governo, precisa do voto dos partidos separatistas, especialmente do Junts, de
Puigdemont. Ora, para apoiar a geringonça, o Junts exige uma
amnistia para os condenados pelo referendo ilegal da Catalunha, entre os quais
o próprio Carles Puigdemont, exilado em Waterloo, onde foi visitado, na
sexta-feira 15 de Setembro, pelo Presidente do Partido Nacionalista Vasco,
Andoni Ortuzar.
A direcção do PSOE, com
Sanchez e outros aparatchiques, parece disposta a todas as cedências para
guardar o poder (a amnistia e a instituição do Catalão e do Vasco, a par do castelhano, como línguas
oficiais do Estado espanhol), mas a
eventualidade de tais concessões começou já por dividir o PSOE, com os líderes
históricos Filipe Gonzalez e Alfonso Guerra a criticarem-na aberta e duramente.
A questão nacional, que é a grande
questão que divide a Espanha, parece estar para durar.
PS: Ciclovias– Em
1640, quando da Restauração, Portugal beneficiou da súbita concentração das tropas
espanholas na revoltosa Catalunha;
em 2024, parece que é a Catalunha que vai beneficiar
da súbita concentração do pelotão de ciclistas da “Vuelta a España” em Portugal. É que desta vez – há quem diga que a bem do nosso
turismo e restauração – a Vuelta vai começar em Lisboa e acabar em Madrid… sem
passar pela Catalunha.
COMENTÁRIOS (de 24)
Riaz Carmali: Em Nome de Deus, O Absoluto. Em primeiro lugar quero agradecer ao Jaime Nogueira Pinto pelo artigo.
Posso no passado ter discordando de si em muita coisa, e quiçá também no
futuro, mas respeito-o como Intelectual e académico. Sobre a Espanha, é facto
que o país de nuestros hermanos tem 4 nações, nomeadamente os Castelhanos, os
Catalães, os bascos e os galegos. Na minha
modesta opinião, Espanha deveria tornar-se numa Federação. Ou seja as 17 (ou 18
já não me recordo bem) autonomias passariam a ser estados federados como ocorre
na Alemanha. Pessoalmente, preferia ver uma
Espanha mais centralizada, algo que por coincidência é também defendido pelo
Vox. Mas tenho a humildade de admitir que o meu Pensamento (e o do Vox) são
utopias que jamais se irão concretizar. Então devemos ser realistas tal como o
falecido Rubalcaba do PSOE, que propôs exactamente o modelo federal em Espanha. Só que o Centro tem imensas dificuldades em
conceder mais autonomia às regiões. Quanto
ao nosso país, da Esquerda à Direita, grassa uma falta de Patriotismo enorme. O nosso povo não é Patriota. Eu, quando vejo a
bandeira nacional hasteada em Belém ou onde quer que seja, fico comovido, pelo
amor que tenho a esta que é a minha terra, onde quero ser enterrado quando
chegar a minha hora, se Deus Todo-Poderoso quiser.
Temos de criar uma cultura patriótica na nossa Sociedade. Mostrar aos
nossos jovens que é melhor ficarem cá a ganhar pouco do que irem para o
estrangeiro ganhar muito!!! Perguntar-me-ão se eu estou louco!!! A minha
resposta é que não estou!! Imbuídos de
Patriotismo, e trabalhando, um dia os jovens colherão os frutos desse
Patriotismo, deixando um país melhor para os filhos, os quais se fizerem o
mesmo deixarão por sua vez um futuro melhor aos seus filhos!! E num espaço de 20 ou 30 anos, temos um Portugal
rico e próspero, se Deus quiser. Os nossos
políticos não são Patriotas!!! O que é isso para eles??!!! Mais facilmente irão
aprender Mandarim do que serem Patriotas!! A
nossa terra tem imenso potencial que não é aproveitado.
Temos terras férteis, mas não são cultivadas!!
Tínhamos Indústria mas acabaram com a mesma!!
Tínhamos pesca, mas também acabaram com a mesma!! Não há entre os políticos, uma visão estratégica de longo
prazo para o país!! "Deixemos a
carroça andar, e quando o barco estiver a afundar-se, temos o dinheiro da
Europa para nos salvar!!" Esta é a
mentalidade de quem nos representa!! Eu tenho 44 anos. Se as coisas continuarem
assim ou pior, quando tiver 70 anos, Portugal estará povoado nos distritos de
Lisboa, Setúbal, Faro e Porto!!! O resto do país estará abandonado!!!!! É assim que os nossos políticos tratam um país
com quase 900 anos...... Riaz
Carmali > Rui Lima E dos irrevogáveis também!!! Mas nós podemos sempre
tentar, à nossa dimensão, fazer a diferença. Quando
o Fernando Medina, o demónio que Costa pôs nas finanças, era ainda presidente
da Câmara de Lisboa, ele decide fazer obras faraónicas e totalmente desnecessárias
na Praça de Espanha. Eu, um simples indivíduo de classe média, escrevi, sabendo
que não iria ter resposta, a manifestar a minha discordância com as obras e a
perguntar-lhe com que autoridade ele gasta 4 milhões de euros nossos sem nos
perguntar. Agora, caro Rui, imagine se mais
mil lisboetas tivessem feito o mesmo!!! Nós
o povo, temos de fazer valer, de forma pacífica, os nossos Direitos
Fundamentais diante das autoridades centrais e locais. Em relação a Espanha,
realmente Sanches está a ter um comportamento vergonhoso!!! Como o caro Rui
disse, está a vender o país. Não sei como
Espanha chegou a isto. Até 2008, tanto o PP
como o PSOE estavam de acordo nas grandes questões do estado. Agora parece que anda tudo louco!!! Muito obrigado por me falar da Crítica XXI.
Irei, se Deus quiser, ver a revista e se gostar, irei assinar. Um bem haja para
si e para os seus. Rui Lima
> Riaz Carmali: O sábado é sempre um bom dia porque
podemos contar com uma crónica esclarecida do JNP eu tenho a sorte de também o ler
numa revista Crítica XXI que ele dirige com o Rui Ramos, tem uma crónica sempre
acompanhada de grandes artigos de outras figuras ilustres valem sempre a
assinatura. Quando o êxito de um político
se mede apenas por renovar o poder, tudo pode acontecer como vemos em Portugal
e em Espanha , já tivemos a história do queijo e da geringonça em Portugal , em
Espanha é mais grave o actual primeiro está disposto a vender o país . João
Floriano > Riaz Carmali «Eu tenho 44 anos. Se as coisas continuarem assim ou
pior, quando tiver 70 anos, Portugal estará povoado nos distritos de Lisboa,
Setúbal, Faro e Porto!!! O resto do país estará abandonado!!!!!» Bom dia
caro Riaz Precisamente a idade do meu herdeiro, nascido a 16 de dezembro. Para
além de apenas a orla costeira estar povoada, resta saber quem a estará a
povoar. E não há aqui qualquer racismo ou xenofobia primária. Apenas uma
constatação, um facto. Para onde nos está a levar esta imigração ilegal,
descontrolada, promovida por políticas oportunistas de portas escancaradas?
Para onde está a caminhar-se a Europa censurada pelo Papa, com as suas raízes culturais
a serem destruídas pela loucura wokista e presenteada com sugestões como a de
Marcelo? Desejo-lhe um excelente fim de semana.
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