quinta-feira, 18 de abril de 2024

Bom-senso e bom-gosto


Nesta escrita de MJA, de que andávamos arredados, conceituosa e brilhante.

E até quando?

Para aquele meu interlocutor eu estava a sair fora do perímetro demarcado que a esquerda consente à direita. Definitivamente eu não possuía o cartão da direita com quem se pode conversar”.

MARIA JOÃO AVILLEZ Jornalista, colunista do Observador

OBSERVADOR, 17 abr. 2024, 00:2250

1Aqui há uns semanas um cavalheiro bem-educado veio ter comigo na rua e logo após se ter confessado “ouvidor” da série de podcast que tenho vindo a fazer no Observador, passou a um reparo: “mas é pena ser tão à direita, quase não há ninguém de esquerda”. Sorri interiormente com o “tão”, lembrei-lhe nomes fora do “tão” e da própria direita: “ah mas esses não são bem de esquerda…” Ignoro segundo qual critério tais nomes não eram – suficientemente? – de esquerda; ignoro de que instância superior poderia surgir “o” árbitro nacional ou internacional capaz de situar a correcta morada política dos protagonistas que o desgostavam, a ponto de não lhes merecerem guarida no seu universo.

O que me pareceu foi que para aquele meu inesperado interlocutor eu estava a sair fora do perímetro demarcado que a esquerda consente à direita. Sabemos como se estimam – os da esquerda e os da direita a quem a ela, esquerda, atribuiu direito de cidade; sabemos como se entreajudam, decifram confidências e trocam estado de alma ao jantar, sentados à mesma mesa. Há exemplos, conhecemo-los: são os “autorizados úteis”. Permitem à esquerda o uso da etiqueta do “pluralismo” mesmo que o uso tenha caído em desuso. Em troca os autorizados auferem do cartão que só a esquerda tem o exclusivo de carimbar, da “direita com quem se pode conversar”.

Deus os abençoe, que eu não.

2Vem isto a propósito do tonitruante ruído público que envolveu a publicação de um livro que a esquerda tomou como uma invasão-ocupação do seu terreno. O ruído permite a dúvida: tê-lo-iam suspendido se pudessem? O ataque feroz, agitado, rápido como o som, disparou cedo, mas a ira trazia o rabo de fora: percebia-se que a grande maioria dos irados não lera o livro: os autores “papagueavam”, nunca se explicando porque “papagueavam” em vez de naturalmente escreverem; “não havia mulheres” neste lote de intrusos quando pelo contrário havia textos assinados no feminino e mais do que um; e também não havia algumas das matérias contra as quais a fúria articulista vituperava — não constavam daquelas páginas mas era preciso dizer que sim, que estavam lá: todas as armas eram bem-vindas – mesmo as falsas, mesmo as ignorantes – contra a defesa de uma visão de “Identidade e Família” dissonante do ar tempo nacional e internacional. Mas bem encaixado num modelo de sociedade já definitivamente banido como lixo, dentro e fora das nossas portas: a publicação do livro era uma afronta às “conquistas” culturais em matéria de costumes, a sua circulação esbarrava com um sinal de trânsito proibido.

As vendas têm sido ciclópicas.

3Como sempre ocorre com todas as obras que resultam de um naipe de distintos autores e consequentemente de opiniões, visões, interpretações diversas, o livro é desigual e desigualmente interessante. Não é dele que me ocupo (seria incapaz de subscrever alguns dos textos, partilhando porém ideias e preocupações expressas noutros), ocupo-me de algo que vem antes do conteúdo do livro e se situa para lá dele, que é o que me interessa aqui: o seu direito a existir. O resto tem de vir depois. O que aconteceu foi um acto de condenação pública concretizado com a segurança dos “proprietários” que com cada vez mais ácida desenvoltura pontuam e actuam. Desta feita bastou tocar três simples notas – a do acinte, a da acusação, a da ignorância – ampliá-las à exaustão e aí estava o coro do pensamento único, em canto afinado e polifónico. Mas….em nome de quê – e num Estado de direito – é que um grupo de portugueses não pode expressar a sua preocupada opinião quanto a temas que considera de índole civilizacional mais que cultural, chamando-os publicamente a uma mais séria reflexão? Sabendo aliás que o seu gesto interpela uma parte do país que em vez de se sentir “controversa”, se sente perplexa? Que acompanhando o galope da legislação em temas fracturantes, testemunhando o que se passa nas escolas de filhos ou netos, ou afligindo-se com a desqualificação quase sarcástica da família natural, não se acha “chalupa” mas antes atónita?

Ou talvez preocupada, entristecida, indignada, sozinha. (escolham o adjectivo).

4Não é senão este comportamento declaradamente censório que me traz, deixando aqui o meu protesto assinado. Dispenso-me por isso de algo bem mais desafiador como seria discutir o conteúdo do referido livro, ou evocar uma e outra vez a nossa matriz, impressa há dois mil anos na civilização ocidental, judaico-cristã que nos foi berço. E pode-se partir de outra geografia territorial, política, cultural, civilizacional se é dela que deriva o que fomos e somos? E daquilo que fruto dela escolhemos, fizemos, elegemos, defendemos? Julgo que não mas há quem pense que sim, fazendo tábua rasa da responsabilidade dessa herança e escrevendo outros mandamentos em novas tábuas de lei. Também me dispenso (mas tomei boa nota da coincidência) de analisar palavras de um dos homens citados com gosto pela esquerda radical, Francisco, o Papa. Disse ele num Congresso recente – 1 de Março deste ano – com a simplicidade da evidência que “ hoje, o perigo mais horrível é a ideologia de género que anula as diferenças”. E há dias, num documento do Dicastério da Doutrina da Fé, constava uma frase sua falando de “colonização ideológica” a propósito de algo que Francisco nunca escondeu considerar que atenta contra a dignidade humana,

5Nenhuma sociedade subsiste com saúde, seriedade, critério, energia, se os seus — da elite ao povo — não acompanharem as escolhas do seu país e o rumo que ele segue, agindo, intervindo, concordando, discordando. Entre nós, metade do país em vez de privilegiar a discordância como ponto de partida e (desejada) chegada, elegeu a apropriação, a censura, o cancelamento ao direito de cidade. Com uma naturalidade estarrecedora anulou um modo de pensar, substituindo-o por um pensamento único inscrito num novíssimo mapa de comportamentos. A outra metade ou acata as novas coordenadas ou é publicamente acusada de pecados que não tem e vexatoriamente arrumada num limbo.

6E aqui chegados, chego eu ao mais doloroso de lembrar, mas a seriedade é um imperativo. E manda a seriedade que termine com a constatação que se impõe e que na verdade é um forte libelo: se a tentação do cancelamento acontece todos os dias e só tende a piorar ;se a feroz imposição de cartilhas faz lei; se o êxito do politicamente correcto veio para ficar, pergunto: quanta culpa, quanta preguiça, quanto deixa andar, quanto faz-de-conta em quem hoje grita aqui d’el rei? Do centro-direita e da direita, às elites, à sociedade civil, a academia, quanto amolecimento e quanto silêncio? Quanta responsabilidade em suma, de uns e outros, neste estado de coisas? Excepções? Claro. Mas extraordinariamente contam-se pelos dedos.

É verdade, não se antecipam desfechos neste feio combate. Mas a culpa não está de modo algum, num só lado.

POLÍTICA    NOVO GOVERNO

COMENTÁRIOS  (de 50)

Maria Carreira > madalena colaço: Também gostei muito da entrevista. Sinceridade, clareza e verdadeira devoção ao país de PPC. Às vezes penso que teria sido melhor que o PS tivesse ganho as eleições de 2011. Provariam do próprio veneno e não andariam a proclamar que a culpa foi do Passos, como têm feito. O pior seria como ficaria o país (relembro que o Sr Varoufakis da Grécia, depois de muita conversa, acabou por fugir às responsabilidades...)               JOHN MARTINS: Ainda não li o livro Identidade e Familia apresentado por Passos Coelho que causou uma grande celeuma à esquerda que se julga proprietária de tudo que diga respeito a cultura usos e costumes. É bom sinal toda esta agitação da esquerda. Significa que alguém está a mexer com o seu status quo. E de facto Passos Coelho com as suas aparições faz agitar ainda mais a esquerda desesperada com os números da direita bem compostos com a nova maioria silenciosa...                    madalena colaço: Aproveito este artigo da MJA para dizer que gostei muito da entrevista a Pedro Passos Coelho. Só a fui ouvir porque deu celeuma. Os portugueses deveriam ouvir para não esquecerem o que o país sofreu porque um governante socialista desatou a emitir dívida, dívida essa que não reverteu em produtividade mas em processos judiciais de corrupção. Na entrevista, com detalhes desconhecidos como o do Trichet, percebemos como Portugal esteve à beira do colapso total. O grande problema, como explica PPC, era que Portugal de forma autónoma conseguisse emitir dívida, mas para isso tinha que dar sinais aos investidores que a conseguia pagar. Em 2012, como foi referido, Draghi salvou o euro, e como referiu PPC os juros baixaram, mas isso não evitou que a 7 avaliação fosse dificílima pois os mercados externos tinham que ter confiança no país. A grande diferença é que é só a partir de 2015 que o BCE passa a comprar as dívidas dos países do euro , ou seja, Costa e a esquerda governaram sem ter que se preocuparem se os investidores acreditavam em que Portugal pagava a dívida, pois as emissões de dívida estavam garantidas pela compra do BCE. O resultado dessa política, é preciso lembrar, levou à subida drástica da inflação prejudicando todos, mas é impressionante como nunca ninguém fala nessa benesse que a esquerda teve, em governar o país sem se preocupar com as emissões da dívida. Fiquei perplexa quando a dita entrevista saltou para a comunicação social por causa do que PPC disse sobre o Portas e Montenegro. Esta entrevista serve para recordarmos um período terrível da história recente de Portugal.            Filipe Paes de Vasconcellos: É extraordinário que passados 50 anos do 25 de Abril só agora uma maioria clara e extensa da direita se assuma como tal, deixando de se preocupar mais com o que a esquerda dizia dela do que com o que ela tinha a dizer ao país. A culpa foi nossa e foi nossa porque nos deixámos silenciar! Obrigado pela sua força e brilhante texto.                 João Floriano: Há bastante tempo que não lia um artigo de Maria João Avillez com o qual me identificasse tanto. Interrogo-me o motivo que para muitos de nós seria óbvio de a extrema esquerda que gritou e grita palavras de ordem contra o livro da indignação ( já devem ter pensado como seria bom fazer uma fogueira tipo Inquisição no Largo do Rossio), não tenha pensado em lançar o seu próprio livro. Seria bem mais saudável e bem mais democrático. Vivemos um clima de abuso, de opressão, de censura patrocinado pela Esquerda e pela CS largamente infiltrada por todo o bicho careta woke ignorante, intolerante, cheio de soberba, de arrogância, de autoridade moral. As coisas irão piorar antes de melhorarem porque pela primeira vez estes wokes se sentem desafiados e contestados . O politicamente correcto já não é o que era dantes. Contudo a falta de contestação tornou-os intelectualmente gordos e balofos e num debate sério não se aguentam. Haja vontade e força política para o fazer. Infelizmente não estou a ver o governo de Montenegro a fazer uma limpeza na CS e sobretudo na Educação que reponha o equilíbrio. E não estou de modo algum a sugerir que se apliquem aos wokes de esquerda as tácticas e o cancelamento que são aplicados à direita. Apenas que deixem de ter um tratamento de privilégio e tantas horas de propaganda e intoxicação nos meios de Comunicação. A CS está a tornar-se um problema na nossa democracia e a contribuir para a degradação da mesma. Sermos o 31º num grupo de 160 países não é de todo um bom resultado. A 15/fevereiro/2024, a notícia aqui está no Observador dando conta do pior resultado desde 2013 e uma queda de 3 lugares. Um resultado que não nos honra.              Tim do A: O PS amestrou bem a direita que pode governar. E o anjinho do PSD caiu.               Carlos Chaves: Caríssima Maria João Avillez, “Mas a culpa não está de modo algum, num só lado.” Sem dúvida, cabe a cada um de nós na nossa vida do dia-a-dia, rejeitarmos veementemente estes comportamentos totalitários da esquerda, que nos quer impor maneiras e costumes avessos à nossa civilização ocidental, judaico-cristã! Espero que a democrática sova eleitoral que a esquerda levou nas últimas eleições (apesar da maioria da CS continuar a fechar os olhos e a agir como se nada tivesse acontecido) continue, e trave estas estratégias intolerantes que chegam a ser patológicas! As vendas do livro “Identidade e Família” que “têm sido ciclópicas” como nos informou, são uma esperança de que podemos e devemos arrepiar caminho!                   Filósofo Aristóteles: Obrigado Maria João, obrigado Passos. É nosso dever defender os nossos valores conservadores e da família contra a esquerda degenerada que pretende destruir a nossa civilização. Chega!               Lápis Afiado: Muito obrigado pela descrição clara da situação de ditadura que a esquerda impõe ao pensamento e que certa direita tolera. Em democracia todas as ideias são discutíveis.                   António Rocha Pinto: Não há elites. Se os "intelectuais" a "elite" da esquerda critica um livro sem, assumidamente, o ter lido, percebe-se que não leu nada. Talvez a Enid Bliton ou nem isso.                      Miguel Seabra: Excelente. Tanto silêncio, tanta covardia ….               Sara Alexandre: Seria muito interessante ver o PPC como comentador num dos canais. Este sim, valeria a pena ver e ouvir com atenção! Os índices de audiência certamente seriam elevados, ao invés, do que se prepara fazer o anterior PM (parece que já está acordada a sua presença num dos canais). Não se percebe o que tem de importante para dizer (??).                   João Floriano: Facebook recua e levanta restrição de 10 anos ao Chega A notícia vem num jornal da concorrência. O Observador já a publicou?              António Lamas: FABULOSO. Como eu gostaria de ter a capacidade de escrever isto. Obrigado MJA              Fernando CE: Muito bom. Sou um admirador seu desde muito “cedo” (1976-1977 ?). Continue a defender as suas ideias e o seu “ hemisfério”, nas palavras de MRS , pela liberdade de expressão, e porque me vejo “representado” por si quando fala ou escreve. É sempre um gosto ouvi-la e lê-la.                  joao lemos > Tim do A: não foi o PS, é toda uma corrente de pensamento iniciada nos anos 60 para quem a esquerda é arauto da liberdade, solidariedade e amiga de trabalhadores e pobres, e que lá vai permitindo a uma direita colaborante que continue a existir tão só e desde que não saia dos carris delineadas pela esquerda. Este pensamento de exclusão de quem pensa diferente, não é novo e as consequências não serão diferentes do que foram no passado...                  Carlos Real: Como sabemos, o insulto e catalogar as pessoas são desde há muito práticas corriqueiras. Chamar fascista a alguém que tem ideias muito diferentes é o habitual. Muitos estão preocupadíssimos com o autoritarismo (para eles fascismo) na Hungria, Polónia, Itália e Turquia. Os factos mostram que mesmo tendo Erdogan sido sujeito a uma tentativa de golpe, a democracia continua. Merloni, admiradora de Mussolini, não impôs o fascismo. Mas o Chega e Ventura (nasceu e cresceu no PSD), esses sim são o rosto do fascismo. Basta assistir à violência verbal de Raquel Tavares, Isabel Pedrosa e Ana Gomes para percebermos como a ideologia e o ódio contaminam a mente destas alminhas tão tolerantes e admiradoras do marxismo, do maoísmo, do lulismo e do Che/Castrismo. Estas campeãs da democracia e do seu pluralismo não aceitam a existência de 1 milhão e 200 mil portugueses. Querem que sejam expulsos da sua democracia. Estas 3 heroínas da liberdade pretendem impor a sua vontade a centenas de milhares. É destas figurinhas que eu tenho medo, desta visão totalitária que temos que desmascarar, porque até nos debates procuram calar as vozes discordantes. O fascismo está de facto na esquerda transvertida de democrata. Não é por acaso que a Coreia do Norte é uma República Popular do monarca Kim.                 Quase Famoso: "Definitivamente,eu não possuía o cartão da direita com quem se pode conversar”. Não é só a Maria João Avilez que não possui esse cartão, André Ventura aparentemente também não o possui, e pelo que tenho lido e ouvido de si, não é algo que a incomode muito.                Maria Emília Ranhada Santos: Desde o 25 de Abril de 1974 que a esquerda ficou convicta de que o domínio de Portugal estava nas suas mãos, definitivamente! A falsa liberdade por eles tão apregoada, fazia com que se sentissem no direito de classificar e rotular tudo o que lembrasse o antigo regime, asfixiando-o sem dó nem piedade, para que não houvesse hipótese alguma de renascer! Quem viveu no regime do Dr Oliveira Salazar sabe bem que não havia liberdade política, pois era controlada pela PIDE, polícia de quem todos tinham medo! Claro, para haver democracia é preciso que haja um parlamento com todas as cores políticas! Então no 25 de Abril, fizeram cair a ditadura de Salazar que se opunha veementemente ao comunismo soviético, para instaurarem no país uma democracia?!...será? Acho que não, pois nunca mais houve entendimento , entre os partidos políticos que constantemente se opõem à tal e tão ambicionada democracia, com as suas totais oposições aos partidos democratas que o povo português elege! Partidos ditadores são os que se opõem aos outros! Existe uma absurda guerra contra o Chega, que embora repudiado pela mediática comunicação social, tem sempre demonstrado abertura e liberdade de expressão e capacidade de diálogo com todos, o que não acontece com os restantes partidos, porquê? É simples: porque os partidos do poder e os outros a quem os do poder dão as mãos, NÃO SÃO DEMOCRÁTAS, mas sim ditadores! Falta-lhes formação política para saberem construir democracia! Mundialmente estabeleceu-se um clima de mentira e desconfiança, que conduz ao medo e neutraliza as capacidades de discernimento de cada pessoa, mas essa é a estratégia! Os portugueses nas eleições de 10 de Março disseram o que queriam, por isso fizeram com que o partido que a esquerda odeia ganhasse as eleições! Sim, e não ganhou mais, estou certa disso, porque muitos pensando que era um voto perdido, votar nele, votaram noutros! Hoje, esses mesmos eleitores percebem que é o CHEGA o partido que mais convém a Portugal, porque defende os valores tradicionais que tornam o país numa comunidade pacifica e harmoniosa!

 

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