Ele, contudo – digo Montenegro - deve escutar
as críticas e não armar em figura novelesca misteriosa, levado num qualquer
fito desafiante, a ser decifrado pelos Poirots ladinos da nossa praça.
▲Saga
do IRS “não correu manifestamente bem”, assume fonte do Executivo DIOGO
VENTURA/OBSERVADOR
Receita de Cavaco ameaça estratégia de Montenegro
Gestão do silêncio, centralização do
discurso em Montenegro, erros não forçados, tom duro contra a oposição e
jornais não têm ajudado afirmação do Governo. E há quem reconheça que é preciso
melhorar.
MIGUEL SANTOS CARRAPATOSO: Texto
OBSERVADOR, 16
abr. 2024, 22:4714
Cerrar fileiras para fora, corrigir os erros dentro de casa. A saga da redução do IRS, “a maior
redução da carga fiscal em tempo de crescimento” que se
transformou rapidamente num “retoque fiscal” para oposição política e opinião
publicada, deixou um profundo amargo de boca no núcleo duro do Governo. E uma lição: se Luís Montenegro quer
sobreviver para contar mais um dia, é preciso comunicar mais e melhor.
Por muito sedutora que seja a ideia de mimetizar Aníbal Cavaco Silva na forma
como se relacionava com a oposição e comunicação social, começa a tornar-se
indesmentível que a gestão do silêncio
que o agora primeiro-ministro tem feito e imposto ao seu Governo começa a ser
contraproducente, lamenta-se no interior do próprio Executivo. Era preciso
tentar, ao menos, prolongar o estado de graça.
Esta quarta-feira, quando for ouvido no
Parlamento, a expectativa que existe é a que Pedro
Duarte, ministro dos
Assuntos Parlamentares e mais vocacionado para o debate político do que
Joaquim Miranda Sarmento, por exemplo, seja capaz de recuperar a iniciativa
política e explicar a estratégia global do Governo para a redução do IRS – e é possível que existam novidades para lá
dos 200 milhões que resultam do diferencial entre o Orçamento do Estado de
Fernando Medina. Será a tentativa de fazer a gestão de danos possível, ainda
que nunca ninguém o assuma frontalmente – basta ver que a reacção
de Montenegro não foi recuar; foi dizer que não governa para os “jornais” e
para os comentadores.
Seja como for, o dano foi causado,
lamenta-se no Executivo PSD/CDS. Logo na noite de sexta-feira, quando o tema já
queimava, Manuel Castro Almeida,
ministro Adjunto e da Coesão Social, reconhecia e lamentava na SIC Notícias que se
tivesse instalado um “equívoco de comunicação” em virtude de alguma
“ambiguidade” na forma como foi anunciada a medida. A partir daí, a
estratégia para fora (comunicado da Presidência de Conselho de Ministros, Hugo
Soares, o próprio Luís Montenegro) foi responsabilizar
a “política de terra queimada” da oposição, em particular Pedro Nuno Santos, e
lamentar a perceção que foi criada por jornais e comentadores — nunca pelo
próprio Governo.
Mas,
em boa verdade, há quem, a partir do próprio Governo, reconheça que o processo
“não foi brilhante” e que o Executivo deveria ter sido mais proactivo na gestão
da informação junto da comunicação social. Como tem
acontecido desde que Montenegro é líder do PSD, valeu a regra de ouro: impedir fugas, controlar a informação que
sai e centrar a mensagem no presidente do partido ou, agora, no chefe do
Governo. “Não correu manifestamente bem”, assume fonte do Executivo. “É preciso
melhorar. Muito. Os tempos são outros, não estamos em 1985.”
A receita tirada dos manuais da “Arte
de Governar” de Aníbal Cavaco Silva, que fazia gala de não ler jornais – um dos sete mitos que alimentou sobre si próprio
–, tem provocado alguns calafrios a quem acompanha de perto Montenegro.
E não apenas na forma como o Executivo (ou o partido) comunica e lida com a
oposição. O horror às fugas de informação, de resto, já se revelou pouco
prudente até na formação do próprio Governo: Montenegro centralizou
de tal forma o processo e reservou tantos convites para o fim (precisamente
para evitar que fossem conhecidos antes do tempo) que houve quem recusasse ser
ministro por ter sido convocado com tão pouco tempo para decidir. E o processo
de escolha de secretários de Estado não correu de forma muito diferente, com a
ida a Belém com a lista por fechar como se veio a saber — sem que houvesse
explicações oficiais para sucedido.
Os termos utilizados na reacção à
polémica sobre a redução do IRS (e a própria controvérsia em si) parecem ter,
para já, dinamitado as frágeis pontes que podiam existir -- até a Iniciativa
Liberal se demarcou de Montenegro. E o Governo parece ainda não ter encontrado
o tom certo para enfrentar o novo ciclo. No mesmo debate sobre o Programa do
Governo, no Parlamento, Paulo
Rangel, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, pediu
que se parasse com a “discussão quase bizantina e bastante moralista sobre
defeitos, vícios e virtudes” e que se deixassem de lado as “quezílias
retóricas”. O aviso não era só para o PS ou Chega – era também para dentro de casa.
Seguir
Uma sucessão de tropeções
Depois disso, para lá do episódio em
torno da redução do IRS, já houve vários momentos em que Luís Montenegro perdeu
o controlo da narrativa política e mediática por manifesta imprudência. Logo à
cabeça, a nomeação de Patrícia
Dantas como adjunta de Miranda Sarmento, contratação que não durou um dia e
caiu em virtude de um processo judicial que é publicamente conhecido há um par
de anos e já mereceu uma série de notícias.
Para lá deste caso e da ameaça que paira
sobre o ministro Miguel Pinto Luz (nesse caso, por uma investigação
judicial que só agora foi tornada pública e por uma escolha de
secretária de Estado que está a merecer críticas), houve irritantes
que atrapalharam o processo de afirmação de Montenegro porque o primeiro-ministro preferiu ficar ou impôs
o silêncio — e que poderiam ter sido evitados ou contornados. Logo a
abrir, a novela sobre a inclusão
ou não da Iniciativa Liberal no Governo de Montenegro.
Durante duas semanas, os liberais, incluindo Rui Rocha, fizeram
vingar a tese de que foram eles que não quiseram fazer parte do Executivo
porque estavam mais preocupados com as ideias do que com lugares ministeriais.
Ou seja, Montenegro ficou de mão
estendida e Rui Rocha saiu como o único que pensou no país e não nos cargos
políticos — algo que não corresponde inteiramente à verdade,
como
explicava aqui o Observador. Mesmo tendo ficado essa ideia, a ordem
foi sempre para não reagir – os
sociais-democratas preferiram não abrir feridas porque sabem que precisarão da
Iniciativa Liberal para a legislatura. E momentos houve em que o “excesso de
protagonismo” de Rui Rocha irritou e muito o PSD.
Apesar de ter passado pouco mais do que
um mês desde a ida às urnas, este foi sequer o único exemplo. A eleição de José
Pedro Aguiar-Branco como presidente
da Assembleia da República foi um caso paradigmático de como o silêncio
atrapalhou mais do que ajudou: na véspera dessa eleição, André Ventura
garantiu publicamente que havia um “acordo” entre PSD e Chega para a eleição de
um vice-presidente da Assembleia; a partir desse momento, a direcção do PSD foi
imediatamente confrontada por vários jornalistas com a existência do tal
entendimento e se esse alegado pacto não violava o “não é não” de Montenegro a
Ventura.
Ainda assim, a opção foi sempre não responder oficialmente porque se
entendeu (e entende) que o líder do Chega aproveitará cada momento mediático
para se colar ao presidente do PSD e que responder a cada um desses momentos
será fazer o jogo de Ventura e alimentar o peditório do Chega. Resultado
prático: não só se instalou a ideia de que havia um acordo (que não havia),
como Ventura ainda conseguiu criar a ideia de que o PSD tinha violado esse
suposto acordo.
A forma como foram geridas e
comunicadas as negociações para desfazer o impasse não foi muito melhor. Os
sociais-democratas permitiram que Pedro Nuno Santos o anunciasse primeiro e, só
depois e à pressa, apareceu Joaquim Miranda Sarmento a explicar aos jornalistas
que José Pedro Aguiar-Branco ficaria durante dois anos e que depois o PS teria
direito a indicar o seu candidato – sem responder a perguntas dos jornalistas.
Para o filme daqueles dois dias, ficou a ideia (nunca desmentida) de que Pedro Nuno Santos foi o grande responsável pela solução encontrada e a
imagem de uma coligação que começou ainda mais coxa, sem capacidade para fazer
aprovar um presidente da Assembleia da República, quanto mais um Orçamento do
Estado.
O silêncio como arma política seria mais compreensível se a base de
apoio do Governo no Parlamento fosse mais sólida – coisa que não é,
reconhece-se no Executivo. Luís
Montenegro depende
do apoio parlamentar de Pedro Nuno Santos ou André Ventura se quiser sobreviver
para lá do próximo Orçamento do Estado – ou
governar por duodécimos, com todos os riscos políticos associados.
Agora, mesmo sabendo (porque vai sendo assumido por quem pensa a estratégia da
Aliança Democrática) que o desejo de Montenegro, também aqui, é repetir
Aníbal Cavaco Silva e partir de uma minoria, vitimizar-se com as forças de
bloqueio e crescer em futuras eleições, importa evitar erros não forçados e não
perder o foco.
Sob pena de se perder, precisamente, o
controlo na narrativa política e mediática: se quer ser bem sucedido,
Montenegro tem de aparecer e sair deste impasse como vítima e não como
responsável por uma crise política que quis a todo custo evitar. Não foi exactamente
isso que aconteceu antes, durante e depois da discussão do Programa do Governo.
A escolha das 60 medidas (algumas delas inócuas) dos outros programas
eleitorais foi recebida como uma provocação
por parte da oposição. A forma como
Montenegro recuperou a ideia que tinha levado para a sua tomada de posse (a
pressão evidente sobre o PS) irritou de sobremaneira os socialistas. E o bate
boca que marcou os dias dias de debate não ajudou a fazer valer a tese de que
este Governo está empenhadíssimo no diálogo.
Os
termos utilizados na reacção à polémica sobre a redução do IRS (e a própria
controvérsia em si) parecem ter, para já, dinamitado as frágeis pontes que
podiam existir — até a Iniciativa Liberal se demarcou de Montenegro. E o
Governo parece ainda não ter encontrado o tom certo para enfrentar o novo
ciclo. No mesmo debate sobre o Programa do Governo, no Parlamento,
Paulo Rangel, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, pediu que se
parasse com a “discussão quase bizantina e bastante moralista sobre defeitos,
vícios e virtudes” e que se deixassem de lado as “quezílias retóricas”. O aviso
não era só para o PS ou Chega – era também para dentro de casa.
COMENTÁRIOS (de 14)
José B Dias: Cascais: Carlos Carreiras vai
ter de provar que refeições de 233 mil euros foram entregues aos refugiados
ucranianos in Página Um Manuel
Filipe Correia de Araújo: O problema de base em Portugal é o "Não é Não", o que obriga ao
"Sim é Sim" aos Socialistas que são os Verdadeiros Adversários do
PSD! Vejam como Pedro Sánchez, Presidente de Governo da Espanha, se aliou ao o
Junts per Catalunya, da Catalunha, e ao Partido Nacional Vasco (PNV), do País
Basco, para poder formar o Governo Espanhol, sendo que estes dois Partidos
protagonizaram uma aliança para articular uma frente comum de carácter
Conservador e de Direita no Congresso dos Deputados, a que se juntam o Sumar
(Unidas Podemos) à Esquerda com a Esquerda Republicana e EH Bildu no flanco
Esquerdo. Assim, em Espanha com Partidos de Direita e de Esquerda existe um
Governo Maioritário, enquanto em Portugal, por causa do "Não é Não",
só existe um Governo Minoritário da AD dependente das boas graças dos
Socialistas, como se viu de uma forma muitíssimo clara e transparente na
recente Eleição para o Presidente da Assembleia da República! Joaquim Rodrigues: Conversa da treta! Rui Pessoa: Todos a “ malhar” no governo
que existe há meia dúzia de dias. É um “ enjoo”! Mais vale ver um filme ou ler
um livro do que escutar permanentemente as politiquices inventadas ou
propagandeadas todos os dias. Um dia destes quem compra ou lê jornais serão os
próprios jornalistas porque o público não tem paciência para o “ massacre”
permanente de quem governa. Escrutinar é indispensável e salutar, inventar não vale a pena pois nem todos são estupidos
!!!
J L: Este governo existe apenas há cerca de 2 semanas e a comunicação social
('Observador' incluído) não pára de lhe apontar o dedo ou de tentar encontrar a
mínima falha. Pior: não lhe estão a dar nenhum tempo para governar e parecem
querer que resolva todos os problemas de um dia para o outro. Dêem-lhe tempo e
deixem-nos governar! P.S. Costa teve 8 anos de (des)governo e não foi
pressionado diariamente, como Montenegro está a ser! Cisca ImpllitJ L: É mesmo. São umas saudades de Costa e das
embirrações alimentadas pelo par ASS e AV... que até dói. Zé Pagador: Um governo sem
força armado em cavalo vai acabar a fazer figura de burro…. João Amorim: A única esperança é o
ex-jotinnha Pedro Duarte? Podem esperar sentados. Para além de ser uma
nulidade, é daqueles ultra politicamente correctos, que muito antes das “linhas
vermelhas” e do “não é não” já esconjurava os “xenófobos, racistas e
extremistas” do Chega. O Chega não tem memória curta, e está à espera dele no
Parlamento. A única carta que este Governo ainda poderá tentar é o Carlos Abreu
Amorim. A ver vamos.
Cisca Impllit > João Amorim: Folgo saber da renovada e
crescente amizade por Carlos Amorim. Mas ex jotinhas é qualidade pertencente a todos, uns
chegaram mais à frente, já uns outros à concelhia freguesia, ou mesmo a
conselhia de uns outros outros. É uma festa pueril. Cisca
Impllit: Batem tanto em Montenegro e neste recém empossado governo que parecem ter
saudades do Acosta João
Amorim > Cisca Impllit: Aí estamos de acordo, o Costa
ainda consegue ser pior. Cisca
Impllit > João Amorim: Estamos de acordo em que
desacordamos
João Amorim > Cisca Impllit: Sim
João Guilherme Sousa: O problema de Montenegro é que
não é Cavaco. Um homem pouco notável e sem brilho que tenta imitar homens
melhores
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