segunda-feira, 24 de março de 2025

Expectativas

 

Que põem fim a muita confiança, não na vida eterna mas na vida terrena actual, de muito deleite, por vezes - em provável reviravolta - talvez de justiça, dada a violência ultrajante dos movimentos libertários patetas e patéticos, como origem primeira das instabilidades actuais, e dos desregramentos na questão da sanidade moral da responsabilidade humana, segundo os parâmetros doutrinários humanistas dos primórdios. Um povo e um chefe jovem sobressairão, é certo, neste primeiro quarto de século: Os ucranianos e o seu chefe Zelensky, para conforto do espírito e ensinamento exemplar, e consequente desprezo por outras “chefias” mais “poderosas” nas tais questões como as que essas promovem arrogantemente, sem pejo nem travão.

A idade da inocência

Despertar de um sonho bom é uma chatice. Mas não podemos deixar de sorrir perante a ironia que é o quem armou toda esta confusão e se julga um super-homem, acabar por ser o mais crédulo de nós todos.

ANDRÉ ABRANTES AMARAL Colunista do Observador

OBSERVADOR, 23 mar. 2025, 00:1827

A União Europeia tem de investir em defesa. Só esta frase mostra o que mudou desde Janeiro. A ideia de uma paz permanente em que a União Europeia projectava soft power e não se sujava com guerras, acabou em três tempos. O conceito era presunçoso e não passava de uma adaptação subtil, no século XXI, de práticas antigas em que os europeus falavam com superioridade moral para cima dos outros que não passavam de selvagens que precisavam de orientação; até Janeiro deste ano, esses outros não percebiam que as alterações climáticas deviam ser um entrave ao desenvolvimento das suas economias e à melhoria de vida das respectivas populações. Eram necessárias regras e essas regras, naturalmente, seriam ditadas por europeus cheios de boas intenções que já tinham atingindo um patamar de desenvolvimento superior ao dos restantes povos. Eram progressistas, claro. E iluminados, acima de tudo. O século XIX não foi assim há tanto tempo.

Investir em defesa tem uma consequência imediata que é os europeus terem de sujar as mãos. Descerem ao mundo real onde vivem os demais. Vamos ter de comprar armas e montar fábricas. Teremos de investir em inovação militar, o que significa usarmos a ciência para obtermos mais e melhor armamento. Teremos de treinar soldados e isso passa por inculcar nos jovens um espírito de missão diferente do que tivemos como certo nas últimas décadas. A concepção do planeta como um espaço comum partilhado por toda a humanidade, em que qualquer pessoa pode fazer negócios com quem quer que seja e pode viajar livremente por onde quiser, está a ser questionado. Ainda esta semana, a Alemanha alertou os seus cidadãos para a possibilidade de serem arbitrariamente detidos na fronteira dos EUA. Com o fim da URSS, muitos visitaram a Rússia e a China. Fiz algumas viagens, mas arrependo-me de não ter aproveitado para conhecer São Petersburgo, Pequim e o exército de terracota, em Xi’an. Algumas dessas viagens ainda são possíveis, mas deixaram de poder ser inocentes e tranquilas. A imaginação de um mundo idílico que os europeus tomavam como certa, acabou.

O investimento em defesa reavivou a questão do endividamento comunitário e da necessidade da UE se endividar através da emissão de Eurobonds. Se tal acontecer, e é quase certo que vai acontecer, fica aberto o caminho para o federalismo europeu. Um federalismo que abarque os 27 em igualdade, ou um sistema com diferentes graus de integração, com um centro mais coeso e federado, seguido de outros, correspondentes a determinadas regiões, com menores níveis de integração. Qualquer que seja a decisão esta conduzirá a uma realidade muito diferente da que conhecemos, pois será o regresso na Europa à necessidade do império, do poder centralizado que gere diversas regiões.

É uma chatice despertar de um sonho bom, mas a realidade tem a vantagem de não ser permanentemente fictícia. Aliás, é curioso, como após o choque inicial, os dirigentes europeus se sintam galvanizados com estas alterações. Depois do receio do que possa acontecer à Europa há uma vontade de pegar no que se tem e fazer pela vida. Se com sucesso, a seu tempo veremos. Entretanto, há dias Trump e Putin falaram ao telefone. É provável que o presidente dos EUA tenha finalmente percebido que Putin não ou respeita, o seja, não tem medo dele. Não consigo deixar de sorrir perante a ironia de que aquele que armou toda esta confusão e se julga um super-homem, acabe por ser o mais crédulo de nós todos.

UNIÃO EUROPEIA      EUROPA      MUNDO      DEFESA      SOCIEDADE

COMENTÁRIOS (de 27)

Tim do A: A Europa vivia na ridícula Disneylândia Woke e acordou para a realidade. Aquela gente nunca deve ter lido um livro de História.                Carlos Chaves:  “Agradeçamos” a Trump por nos ter aberto os olhos e aparentemente nos ter obrigado a acordarmos da letargia em que nos enfiámos! A falsa paz e amor que o socialismo e a esquerda nos anunciavam acabou, ou melhor nunca existiu! É mais que tempo que a Europa tenha um exército Europeu, se o preço a pagar for o federalismo que o seja, será sempre melhor do que sucumbirmos às mãos de ditadores antidemocráticos e tornarmo-nos como eles!                  Rui Lima: A UE acreditava na superioridade do Direito para resolver todos os conflitos, que as guerras eram coisa do passado, bateu de frente com a realidade, é doloroso , todos os recursos foram canalizados para o social, com isso criou o homem que não precisava de trabalhar para viver com algum conforto, o drama é que com a guerra todos serão obrigados a trabalhar novamente para comer.            João Floriano: A Europa chocou de frente com o muro da realidade: um lugar-comum mas que se aplica perfeitamente no presente caso. E a Realidade é tudo menos bonita. Perdeu a sua importância diplomática, como se pode ver no modo como Trump e Putin a afastaram da negociação de um «imaginário» tratado de paz. A Rússia e a China colonizam grande parte do mundo onde anteriormente a Europa exercia a sua influência, a NATO é posta em causa e valores que a Europa considerava inquestionáveis, sobretudo a prevalência do direito internacional foram deitados ás urtigas: o que conta é a força, a violência. A Rússia e os seus aliados ameaçam diariamente a Europa com a destruição. Em muitos momentos a Europa é simplesmente humilhada. E para além das ameaça externas, a Europa enfrenta ameaças internas. Para quem não viu aconselho o visionamento da reportagem que passou no canal NOW sobre os Tuk Tuks lisboetas. A baixa de Lisboa já deixou de ser portuguesa. Aquilo é tudo asiático.                   Df Correctíssimo. A Europa tem de abandonar os complexos de superioridade do séc. XIX em que pretendia pregar moral ao mundo. Esse tempo passou. Há que mirar-se no exemplo de trabalho e organização da China e fazer pela vida. Como dizia o outro, 'foi bonita a festa, pá', mas acabou. A festa era boa, mas quem pagava eram os detestados ianques. Sem dinheiro não há palhaços. Há que acabar com as duplas nacionalidades, direito de solo e colocar os jovens imigrantes árabes e os outros na Europa no SMO, a jurar bandeira, ganhar lealdade e a assimilarem-se nos países de acolhimento. Isso contribuirá muito para a paz externa e interna. Esperemos que com um exército europeu e dívida comum se caminhe para o federalismo e se mantenha a paz na Europa....              Carlos Chaves > Rui Lima: "Homens fortes criam tempos fáceis e tempos fáceis geram homens fracos, mas homens fracos criam tempos difíceis e tempos difíceis geram homens fortes." Provérbio oriental!                    Carlos Real: Os políticos e comentadores dos media dizem o que lhes apetece, sem pensarem nos factos. Reagem ao momento, com ideias fáceis, mas fantasiosas. A Europa é uma casa a arder, com movimentos nacionalistas cada vez mais fortes. A economia está estagnada e dependente da China. Num cenário de decadência, alguém com cabeça, acredita que se vai gastar em defesa, que apenas significa andar atrás do prejuízo? Os EUA, a China e mesmo a Rússia são verdadeiras potências militares. A Europa desunida é uma carruagem velha, sem dinheiro, e que corre a 20 à hora. Daqui a uma década estarão a discutir se a guerra se faz com baionetas ou com carros de bombeiros. Os outros estarão a usar a inteligência artificial. Os comunistas também pensam em se actualizarem usando as tácticas do século 19. Não preciso de ir à bruxa para saber que apenas existe propaganda e ideias no papel. Quando acordarem já nem existirá UE.                    Manuel Magalhaes: Nem sempre estou de acordo com o articulista, até porque muitas vezes o acho ingénuo ou sonhador, mas desta vez acertou, o mundo está a ficar cada vez mais perigoso desde que temos um elefante na sala oval, que como já se começa a provar as suas asneiras estão aí ao virar da esquina, a Europa Ocidental no seu todo se não for muito rápida a tomar decisões e efectuá-las, será uma das principais vítimas de toda esta loucura e falta de senso!!!

Nenhum comentário: