Por essa altura de rodopio em torno de
Salazar e da inflexibilidade deste, que orgulhava alguns de nós, eu lamentei, contudo,
lá em África, a morte de Kenedy, por ter filhos tão pequeninos, frase que
mereceu as troças dos meus eruditos companheiros de café, o Raposo Pereira, o Rui Knopfli, o
Eugénio Lisboa, o Rui Lacerda, pelo meu desligamento
da realidade, confiante, sempre, nos
valores defendidos por Salazar, embora naturalmente humana e não vingativa. O
25 de Abril veio provar, contudo, que não éramos todos confiantes assim, já
Salazar morrera e Marcelo Caetano desistiria, a seguir. E nós por aqui vamos
indo, olhando para trás de nós e tendo pena. Inutilmente, é claro. Evolução,
mudança, volte face, tudo coisas que acontecem ao longo dos tempos, provando
que somos seres pensantes, inconstantes, uns dos outros divergentes… Gostei do
texto que segue, que me chegou pelo correio electrónico e que me fez recordar.
Salazar Recusou Milhões Pela Independência das Ex-Colónias
António Oliveira Salazar rejeitou uma proposta dos Estados Unidos para a
independência das ex-colónias portuguesas a troco de mil milhões de dólares
(782 milhões de euros), porque "Portugal
não estava à venda", revela um ex-responsável norte-americano no seu
livro "Engaging Africa: Washington
and the Fall of Portugal's Colonial Empire".
Segundo o secretário de Estado adjunto para os Assuntos Africanos durante a
administração Clinton, Witney Schneider, o
ex-presidente do Conselho rejeitou a proposta americana em 1963, durante um
encontro com um enviado da Casa Branca.
O livro detalha
minuciosamente, com base em documentos oficiais e entrevistas com
personalidades norte-americanas e portuguesas, as relações dos Estados Unidos
com Portugal e com os movimentos independentistas das ex-colónias portuguesas,
em particular Angola e Moçambique, desde o início dos anos 60 até à
independência de Angola, em 1975.
De acordo com o autor, em 1962, o assistente do director adjunto de planeamento da CIA, Paul Sakwa, elaborou um plano denominado
"Commonwealth Plan", que visava convencer as
autoridades portuguesas a aceitar o que a CIA considerava ser a inevitabilidade
da independência das colónias portuguesas.
O plano previa que Portugal concedesse a
auto-determinação a Angola e Moçambique após um período de transição de oito
anos. Enquanto isso, seria organizado um
referendo nas duas colónias para se determinar que tipo de relacionamento seria
mantido entre os dois territórios e Portugal após a independência.
Durante esse período, os dirigentes nacionalistas angolano Holden Roberto e moçambicano Eduardo Mondlane receberiam "o estatuto de
consultores assalariados" e seriam preparados para a liderança dos novos
países.
"Para ajudar
Salazar a engolir a pílula amarga da descolonização, Sakwa propôs [ainda em
1962] que a NATO oferecesse a Portugal 500 milhões de dólares [391 milhões de
euros] para modernizar a sua economia", escreve Schneider.
Um ano depois a proposta
daquele funcionário da CIA foi ampliada pelo diplomata Chester Bowles, que
duplicou a ajuda a oferecer a Portugal, propondo que os Estados Unidos
concedessem mais 500 milhões de dólares durante um período de cinco anos, ou
seja um total de mil milhões de dólares durante o período de transição.
Documentos oficiais
mostram que Bowles argumentou que seria "um bom negócio diplomático"
se os esforços norte-americanos conseguissem resolver "o feio dilema"
de Portugal a um custo de cem milhões de dólares (78 milhões de euros) por ano.
O plano dos Estados Unidos esbarrou, contudo, na
inflexibilidade de Salazar.
"Portugal não está a venda", foi a resposta do ditador português quando a proposta lhe foi
apresentada, em Agosto de 1963 - ainda durante a administração Kennedy - pelo
secretário de Estado adjunto norte-americano, George Ball.
Franco Nogueira considerou a proposta americana uma
"idiotice
O autor diz ainda que o
então ministro dos Negócios Estrangeiros português, Franco Nogueira, considerou
a proposta americana uma "idiotice", porque revelava que Washington
acreditava poder determinar ou garantir acontecimentos a longo prazo.
Segundo Nogueira, o plano dos Estados Unidos seria o
primeiro passo para a inevitabilidade do caos nas colónias portuguesas em
África.
Um dos aspectos mais
curiosos do livro é a exactidão com que a CIA e vários diplomatas
norte-americanos fazem, com muitos anos de antecedência e em documentos
oficiais, a previsão da derrota militar portuguesa em África e o derrube da
ditadura.
"A derrota militar portuguesa é uma conclusão inevitável se se
permitir que a revolta em Angola ganhe volume e continuidade", adverte o
documento da CIA que acompanhava a proposta inicial elaborada por Paul Sakwa,
pouco depois do começo da guerra em Angola.
Sakwa questiona-se mesmo
se os Estados Unidos poderiam permitir que Portugal "cometesse suicídio,
arrastando os seus amigos na mesma via".
O então embaixador dos Estados Unidos em Lisboa, Burke Elbrick, considerado
em Washington como um simpatizante das autoridades portuguesas, enviou um
telegrama às autoridades norte-americanas em 1963 em que dizia que Portugal
estava "debaixo da espada de Dâmocles", pois não era "nem
suficientemente grande nem suficientemente rico" para fazer frente a uma
guerra de guerrilha em três frentes.
As guerras em África poderiam significar "o fim
do império lusitano" e do regime de Salazar, escreveu ainda o diplomata,
advertindo que o fim do regime poderia resultar na subida ao poder de um
Governo "consideravelmente mais esquerdista ou neutral".
Em 1964 - dez anos antes da revolução do 25 de Abril -, a CIA advertiu que
as guerras em África levariam ao aumento do descontentamento interno e que esse
"aumento do descontentamento poderá convencer os militares da necessidade
de substituírem Salazar".
Nesse mesmo ano, o
Conselho de Segurança Nacional advertiu o Presidente Lyndon B. Johnson - que
sucedeu a John F. Kennedy - de que as perspectivas de Portugal em África eram
péssimas.
"Já não se trata de uma questão
de saber se Angola se tornará independente ou não, pois a única questão é
saber quando e como, tal como aconteceu na Argélia.
Do mesmo modo, é uma certeza que
quanto mais a luta durar, mais violenta, racista e infiltrada pelos comunistas
se tornará, mais grave será a crise final a que os Estados Unidos terão de
fazer face e mais caótica, radical e anti-ocidental será uma Angola
independente", diz o documento.
Durante os anos 60, e face a estes avisos, muitos
funcionários norte-americanos deram conta em documentos do seu desespero face à
inflexibilidade do Governo de Salazar em mudar a política colonial.
Paul Sakwa, o
funcionário da CIA que elaborou o "Commonwealth Plan", desesperado
com a inflexibilidade de Salazar, terá chegado, ironicamente, a manifestar
dúvidas de que o ditador português pudesse aceitar o plano americano "sem
o benefício de uma lobotomia".
Para o secretário de
Estado adjunto de então, George Ball, Salazar elaborava a política externa de
Portugal "como se o Infante D. Henrique, Vasco da Gama e Fernão de
Magalhães fossem os seus conselheiros mais próximos".
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