sexta-feira, 21 de março de 2025

O certo é que blá blá não falta


Até ver. Está-se em expectativa. O medo permanece, a somar a outros dados sentimentais…

Também não há guerras grátis

Os governos europeus julgaram que tinham descoberto a guerra grátis: os ucranianos morriam, os americanos pagavam, e os europeus falavam. Mas também não há guerras grátis.

RUI RAMOS Colunista do Observador

OBSERVADOR, 21 mar. 2025, 00:2016

Perante a Ucrânia, há duas atitudes possíveis. Uma é fechar os olhos, tapar os ouvidos, encher o peito de indignação moral e geoestratégica, e gritar muito alto que Trump é um “agente russo”. A outra é tentar perceber o imbróglio que Trump, bem ou mal, está a procurar resolver. Experimentemos, por uns minutos, esta segunda atitude.

Em 2012, Barack Obama riu-se muito quando Mitt Romney lhe disse que a Rússia de Putin era um perigo. Em 2014, Putin pôde começar a invadir a Ucrânia, perante a esplêndida indiferença de Obama e de Merkel. Em 2022, o tirano russo deduziu que teria licença ocidental para consumar a ocupação. Talvez tivesse tido, não fosse a resistência de Zelensky, que surpreendeu toda a gente. Biden e os europeus sentiram-se obrigados a manter a Ucrânia à tona da água, mas apenas o suficiente para não se afogar. Forneceram-lhe armas, mas não todas as de que precisava e sem deixarem que as usasse com todo o impacto. Castigaram Putin com discursos, mas prosseguiram, directa ou indirectamente, os negócios com a Rússia.

Vou agora acusá-los de cobardia e falta de visão? Vou dizer, como a gente sábia diz de Trump, que eram “agentes da Rússia”? Não. Vou admitir que Biden, Macron, Scholz e os outros souberam sempre que derrotar Putin implicava, não apenas o risco de uma guerra entre potências nucleares, mas uma transformação dos Estados ocidentais para a qual as respectivas sociedades não estão preparadas. Desde meados do século XX, o Ocidente construiu Estados em que a despesa é sobretudo “social”. Uma guerra com a Rússia subverteria este tipo de Estado. Os governos europeus já resistem a elevar os gastos militares para 2% do PIB. Imaginem como seria se os tivessem de subir para 20% ou mais. Poderia recorrer-se à dívida, como agora se propõe fazer a Alemanha. Mas a maior parte dos Estados já tem dívidas tão grandes como as que, no passado, só as guerras causavam. Uma guerra seria uma revolução no Ocidente.

Mas era para essa guerra que a situação na Ucrânia se estava a encaminhar. A opção ocidental de uma guerra limitada criou um triturador de carne à maneira da I Guerra Mundial. Com isto, Biden, Macron e Scholz puseram a Rússia, que tem mais carne para triturar, em vantagem. A necessidade de enviar tropas para prevenir o colapso da Ucrânia já apareceu no horizonte. Macron atreveu-se a mencioná-la. Só que ninguém tem soldados em número suficiente, nem está disposto a suportar as baixas daquela guerra.

A Ucrânia de Zelensky provou muita coisa. Quem dizia que não era uma nação, como o ditador Putin, foi desmentido onde mais importa, no terreno. Infelizmente, a Ucrânia não tem recursos nem aliados para uma guerra dispendiosa e sem fim. No ano passado, os jornais de referência ocidentais começaram a admitir concessões territoriais à Rússia e a descontar até uma garantia da NATO à Ucrânia. Mas nenhum político se atrevia a reconhecer isso, porque o apoio incondicional à Ucrânia estava a ser usado pelo establishment para embaraçar os “populistas”. Todos ficaram assim à espera de Trump.

Não é difícil perceber Trump: não lhe convém uma segunda retirada do Afeganistão, como a que consumiu a credibilidade de Biden em 2021, mas também não lhe interessa uma guerra com a Rússia, para que ninguém está pronto. A alternativa é um acordo. Para desempenhar o papel de árbitro, Trump precisou de renunciar ao papel de protector de Zelensky. Na Europa, fez-se um grande escândalo. Havia por aqui quem julgasse que tinha descoberto a guerra grátis: os ucranianos morriam, os americanos pagavam, e os europeus falavam. Mas não são só os almoços que nunca são grátis: as guerras também não. Posto isto, Trump pode falhar. Mas julguemo-lo pelos resultados.

DONALD TRUMP      ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA      AMÉRICA      MUNDO      UCRÂNIA

EUROPA      VLADIMIR PUTIN       RÚSSIA

COMENTÁRIOS..:

Filipe Paes de Vasconcellos: O meu comentário foi para moderação e não sei porque motivo -

Não, “não há guerras grátis “.Não, não há influência estratégica e económica global grátis. Também não se perspectivava, apesar de todos os riscos e eram muitos, que a maior potência do mundo livre pusesse à frente dos seus destinos um ser criminoso, amoral, desumano, abjecto … completamente incapaz de liderar o Mundo Livre. É certo que os países do Ocidente nunca quiseram uma Paz “à borla” não investindo mais em defesa porque tinham um quadro estratégico de defesa que se suportava numa organização de defesa do Mundo Livre que se chama, chamava, NATO. E , repito, se os EUA, investiram bem mais em Defesa do que na Europa, era porque precisavam, era do seu interesse manter o seu domínio no mundo. O contrário é chamar-lhes mentecatos.Em Tempo: A conclusão e até sugestão com que acaba o seu artigo é profundamente lamentável.Em moderação             Bimperl: Soubemos ontem que Portugal, ao lado de Espanha e França, foi um dos estados que chumbou o aumento para 40.000 milhões de ajuda para a Ucrânia, tendo o pacote final ficado pelos 5.000 milhões. Talvez o Montenegro e a Spinunviva sejam “ agentes russos”.                 JOSÉ MANUEL: desde que o referiu a admiração por kim e pudin, que "como ele amam o seu povo", qualquer expetativa de algo de bom desapareceu. Pontos comuns destas personagens são um egocentrismo estratosférico, megalomania, ânsia de ficar na história e uma absoluta intolerância para com quem os critica, seja em que aspecto for, inclusivamente técnico, não aceitando factos científicos óbvios (na verdade como alguns fundamentalistas do clima, ainda assim com a diferença de que os críticos destes têm mais segurança nas escadas). Pode este ser alaranjado produzir algo de bom para a humanidade? Eventualmente, sim, ou por mero acaso, ou se coincidir com os seus próprios interesses, ou se for massajado no seu ego e endeusado, como Zelensky parece ter percebido...               Pedro Leitao: Mais uma excelente análise. A realidade terá que se impor e não há guerras eternas. A Rússia é mais forte e a sua opinião pública não conta. É duro, mas a negociação tenderá sempre a favorecer mais a Rússia. Contudo, Trump e o seu vice  ao destratarem malcriadamente Zelenski na casa branca e ao fazerem "guerra psicológica" à NATO e Europa, alteraram, e muito, a imagem dos EUA no mundo. Talvez de uma maneira irreversível!                Ruço Cascais: Rui Ramos é o Elon Musk português na vertente de ter ficado doido pelo Trump. Primeiro ficou em estado de êxtase com o discurso de Vance, agora vem salvar Trump, o estratego. Vamo- nos colocar no lugar de Trump para acabar com a guerra quando este estava a jogar à sueca com os amigos. Eu Trump: - Jorge pah, és o melhor agente de viagens que eu conheço. Vou-te enviar para Moscovo para dares a volta ao Putin para ver se ele acaba com a porcaria da guerra. Aproveita e tenta por lá vender umas viagens e convida o Putin para a sueca. Se vires por lá uma russas bonitas convida-as também discretamente. Há umas espetaculares do Trump que devem ter passado ao lado do Rui Ramos e que mereciam um artigo de opinião; carros elétricos Tesla, o novo amor de Trump e o Biden que comeu os ovos todos. A Karoline também é um espectáculo, merecia uma crónica. Pois é, caro Rui Ramos, como diz no artigo, o Zelensky é que agitou isto tudo. Muita razão tem o Trump em destratá-lo ao contrário dos europeus que andam com ele ao colo.                Eduardo Cunha: Excelente crónica. Parabéns.                 GateKeeper: Top 5. Nem almoços, nem guerras, nem centrões  Tudo isso se paga. E quem paga? A História da Humanidade é toda uma constatação de que SOMOS NÓS. A "Europa" acordou do coma que perdurou durante mais de 80 anos. E, numa escala de tempo imaginado, é como aquele jovem Z que andou a noite & a madrugada a jogar e teclar no social virtual e só acordou ao meio-dia, quando tinha um exame fatal às 09:00 da manhã. O welfare fake de 75 anos de subsidiocaína e crédito transformou a Europa num decadente e velho "salvado" da História. E a mediocridade "literária" das e dos "poetas político-sociais-económicos" actuais não passa de um comprovante da ilusão que nos tentam vender diariamente. Mas, ainda pior do que isso, é a "negação militante ", na qual mergulharam milhões de europeus, acomodados à mentira, à omissão e à ilusão de que "está tudo bem" com aquilo que NÃO têm. As "bolhas" virtuais acumulam-se. E a "riqueza das Nações" não passa de uma opereta muito pimba e de mau gosto. Caro Rui, keep them coming e quem não gosta que não coma. Top 5!    .               Carlos Chaves: Os resultados até agora, foi após o famoso telefonema entre Trump e Putin para chegar a um acordo de paz (imagine-se sem a Ucrânia,) em que Putin se comprometeria apenas, apenas, a não atacar as centrais de energia, logo de seguida Putin ordenou e iniciou um dos maiores ataques a alvos civis na Ucrânia! Excelente resultado! É estranho o Rui Ramos não escrever uma palavra sobre as intenções de Trump, sobre os EUA passarem a controlar unilateralmente as centrais nucleares Ucranianas e explorar o Lítio, Urânio etc… e que os Ucranianos têm que sair dos território ocupados pela Rússia! Parece que voltámos aos tempos do antigo colonialismo!                     José B Dias > Carlos Chaves: E é estranho o Carlos Chaves não escrever uma palavra sobre as vagas de drones lançados pela Ucrânia sobre a Rússia ou sobre os "tempos do antigo colonialismo" do Iraque, do Afeganistão, do Kosovo, da Líbia, da Síria... ou se calhar é mesmo o expectável!               Carlos Chaves > José B Dias: Eu não sou colunista de um jornal, nem historiador como RR! Não compare as responsabilidades caro José B Dias! Quanto aos drones Ucranianos na Rússia são a possível resposta ao invasor de um país soberano e enganado, por nós Europeus e pelos Americanos.                José B Dias > Carlos Chaves: Eu imaginei que seria qualquer coisa assim ...                    José B Dias: ... os ucranianos morriam, os americanos pagavam, e os europeus falavam. Mas não são só os almoços que nunca são grátis: as guerras também não. Posto isto, Trump pode falhar. Mas julguemo-lo pelos resultados. E disse tudo!              madalena colaço: Recomendo vivamente ao Rui Ramos que ouça a conferência que o economista Jeffrey Sachs deu no dia 12 no Parlamento Europeu.         https://www.youtube.com/live/SHFOcIYEL8Q?si=beLpZMRYconV-Hyv                      José B Dias > madalena colaço: Também já por aqui a citei e reproduzi breve excerto ... os maiores cegos sempre foram os que se recusaram a ver!                  Gustavo Lopes: Lucidez e frieza na análise!!! Não é fácil, mas é bem-vinda!!! Bem ao jeito do RR… Obrigado.

Lourenço de Almeida: Aqui está um texto o de não há uma unica mentira provada, no qual as hipoteses colocadas são viáveis e prováveis e no qual os bois são chamados pelos nomes. A coversa de que o Trump é isto e aquilo é boa para revistas cor de rosa - incluindo o Economist, Time e afins - e para quem gosta de declarações pra inglês ver, desde que não gaste com isso nem esreja disposto a ir dar o corpo ao manifesto. Ou seja, para europeus.                        José Fernandes: RR tem dúvidas quanto aos resultados das acções de Donald!                  José B DiasJosé Fernandes: Em todos os processos complexos existe sempre dúvida sobre o resultado final ... não ter dúvidas apenas seria sinal de irracionalidade ou de pensamento mágico. Infelizmente parece que por aqui e por ali não falta gente que nunca tem dúvidas sobre o resultado final do caminho que preconizam como único ...          João Guilherme Sousa: Se calhar devia ir ao contra corrente , dado que o José e a Helena não estão a servir para esse fim.

 

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