Sem sensacionalismos, expressão de uma realidade destes nossos tempos “de
progresso” ideológico. ZITA SEABRA o escreveu, sóbria e realista. Mas os homens
asiáticos, de autoridade forte, não se deixam levar por igualitarismos machucadores
da sua virilidade exigente de bom trato caseiro, naturalmente.
Ainda vale a pena comemorar o 8 de Março?
O Dia da Mulher é importante pois os
seus direitos estão longe de serem garantidos em muitos países, em particular
no mundo islâmico, e há que lembrar a coragem de quem combate discriminações
brutais.
ZITA SEABRA Editora
OBSERVADOR, 09 mar. 2025, 00:1627
A esta pergunta respondo sim! Se o Dia Internacional da Mulher permitir
denunciar a situação de todas as que, em grande parte do mundo, não têm
direitos iguais aos homens e vivem na mais brutal e dramática discriminação na
família, na vida pública, na escola, no trabalho ou no desporto.
Refiro-me muito especialmente a todas as mulheres que vivem em países ou
zonas da chamadas repúblicas islâmicas, onde impera a lei da
Sharia e que são constantemente esquecidas pelas novas
feministas da esquerda radical.
Ao longo do século XX, as mulheres no
mundo ocidental conseguiram o reconhecimento da igualdade de direitos perante a
lei e essa conquista civilizacional é presentemente identitária de um regime
democrático e de um Estado de direito. O último país em que as mulheres
conquistaram o direito de voto em igualdade com os homens foi a Suíça, em 1990.A partir daí, em todos os países
ocidentais ficou consagrada a igualdade de direitos e o fim da discriminação em
razão de sexo.
Foi a vitória das mulheres que
lutaram corajosamente pelo direito à igualdade perante a lei desde os fins do
seculo XIX e, particularmente no início do século XX, com a luta
das têxteis americanas em Nova Yorque. São inesquecíveis mulheres,
como Clara Zetkin, que propôs
exactamente o dia 8 de Março para Dia da Mulher; ou a dirigente bolchevique Alexandra Kollontai, que tão abnegadamente lutou pelos direitos das
mulheres, levando a que Lenine e, depois, Estaline fizessem dela a primeira
mulher embaixadora do mundo, só para não sofrerem a sua pressão diária a favor
da causa feminina. Foi ela quem propôs pela primeira vez uma licença de
maternidade paga para as mulheres trabalhadoras após o parto.
O caminho foi longo e, a
seguir à igualdade perante a lei, veio sempre a luta pela mudança de
mentalidades na sociedade, na família e no trabalho – que é, e foi sempre, em
todos países mais lenta que a alteração constitucional e legislativa.
No final do século XX, podemos dizer,
e muitas o escreveram, que as mulheres ganharam, e bem, o reconhecimento dos
seus direitos em múltiplos aspectos da sua vida familiar, profissional, social
– enfim, o direito a não serem discriminadas.
Não faz, pois, nenhum sentido
a tentativa de vitimização feita por certa esquerda radical, mais recentemente toda a esquerda ocidental que,
depois da queda do muro de Berlim e do fim anunciado do comunismo soviético,
começou à procura de novas bandeiras para substituir as que caíram, gastas
também pela revolução tecnológica e pela globalização que acabou com o
proletariado do ocidente e a respetiva luta de classes ao deslocalizar as
empresas para a China ou para a Índia, entre outros países.
Foi assim que substituíram a luta de
classes por novas causas absurdas e condenadas ao fracasso por serem criações
artificiais de “elites” académicas, contra o bom senso – e o bom senso tem muita força no mundo livre.
Assim nasceu o wokismo, ou melhor, a
ideologia woke, nas
universidades americanas, que alastrou a todo o ocidente, procurando ter como
bandeira a vitimização das mulheres perante o homem branco, poderoso e
responsável pela chamada “ditadura patriarcal hegemónica”, contra a qual
levantaram “barricadas”, quotas obrigatórias, regras e mesmo legislações,
regulamentos e muitos artigos “científicos” enchendo páginas de teses ou
estudos académicos.
O wokismo minou os fundamentos da
democracia e, em nome de discriminações positivas de que as mulheres não
precisam, as inferioriza e ridiculariza. Em
Portugal, temos quotas de entrada nas listas dos candidatos a eleições
legislativas ou municipais, bem como quotas obrigatórias nos Conselhos de
Administração de empresas, como se alguns dos principais empresários
portugueses não fossem já mulheres (Sonae, Amorim, entre muitas outras), que
não estão lá por favor.
Na cultura, assistiu-se não só à
revisão da história do ocidente como à censura de clássicos da literatura. Chegou-se
ao ponto, por exemplo, de apresentar modificações
censórias das tradicionais encenações de óperas, como a Carmen
que, em vez de morrer, é ela quem mata o Don José. Pobre Bizet. Ou da Butterfly, em
que ela foge ao destino trágico que lhe deu Puccini para desaparecer de
cena para parte incerta. Para já não falar da alteração da língua portuguesa
para a chamada linguagem inclusiva dos todos, todas ou todes.
No entanto, creio ser bem necessário comemorar o 8 de Março para
lembrar as mulheres que hoje, em pleno século XXI, ainda são discriminadas e
vítimas de violência perante o silêncio cúmplice de muitas recém-radicais
feministas destas causas.
Para denunciar as mulheres silenciadas,
as verdadeiras vítimas – basta lembrar a situação das mulheres
do Irão, esse grande
país que perdeu a herança da civilização Persa, com muita culpa da esquerda
ocidental e, particularmente, dos democratas americanos de Carter e dos filhos
dos anos 60 franceses que preferiram osAyatolas, vindos de França, ao Xá da
Pérsia. Xá que, apesar de doente terminal com cancro, não foi recebido como
exilado no ocidente, apenas o Egipto o recebeu e lhe fez um funeral de Estado.
O Irão ficou, assim, uma República islâmica desde a Revolução de
1979.
Nesse ano, a 1 de Abril, o Irão
passou a seguir a lei da Sharia. Na ONU, votou mesmo contra a
proposta de reconhecimento da igualdade legal de direitos da mulher e do homem.
Os casamentos passaram a permitir que um homem pudesse ter quatro
esposas legais. É sabido
que, em poligamia, os direitos das mulheres e dos homens nunca são iguais.
É, assim, que o marido pode impedir as
esposas de trabalhar em determinados empregos, alegando que são “contrários aos
valores da família”. As
mulheres não podem mostrar o cabelo em nenhum lugar público, mesmo em
restaurantes ou lojas, em locais fechados e não podem ir à praia.
Lá, o casamento infantil é frequente. As mulheres podem casar aos 13 anos e
mesmo aos nove, com aprovação legal. Quando a menor tem menos de nove anos, pode ser legalmente forçada a
um “casamento temporário”. Este limite de idade, deriva do
exemplo do Profeta, que se casou com Aisha, quando ela tinha essa idade. E, na
Sharia, os conceitos de bem e mal, certo e errado, remetem sempre para a aplicação
literal do Corão, pois o islamismo é uma religião do livro.
É
assim que as meninas são forçadas a casar com homens mais velhos e submetidas a
violações e abusos físicos contínuos e graves. Se fugirem, podem ser
assassinadas por desonrar a família. Não há estatísticas oficiais, mas dados
oficiosos revelam que cerca de 28.000 meninas com menos de 15 anos casaram, só
no ano de 2022. O número é provavelmente muito maior, porque muitos casamentos
não são sequer registados.
Em tribunal, o testemunho de uma
mulher vale metade do de um homem, sendo necessário o testemunho de três
mulheres para vencer o de um homem. Isto
explica, por exemplo, a execução de Atefeh Sahaaleh, acusada de “relações
sexuais impróprias”, por ter sido vítima de violação. Vítima…
O Irão aplica ainda as chamadas leis
da modéstia às mulheres. Assim se chama ao facto de serem obrigadas por lei a
vestir com “modéstia”, o que
implica esconder o corpo e usar o véu. Desobedecer é crime e as autoridades da chamada “Polícia da Moralidade” fazem cumprir rigorosamente a lei, com penas de
detenção, prisão, multas, açoites, andando na rua com paus na mão e açoitando
mulheres que considerem que mostram o cabelo ou deixaram deslizar o véu. A
ideia geral é a de que a visão dos atributos femininos provoca os homens que,
em consequência, têm legitimidade para atacar as mulheres.
A perseguição é implacável. Em abril de 2024, foi implementado o Plano Noor,
que inclui patrulhas e presença policial permanente em áreas públicas, para
fazer cumprir as regras draconianas de vestuário. Em 22 de julho de 2024, a
polícia disparou contra Arezoo Badri, que conduzia sem véu, ferindo-a
gravemente.
Em
dezembro de 2024, Parastoo
Ahmadi, uma cantora
de 27 anos publicou um videoclip de uma performance em que actuava sem hijab e
com um vestido sem mangas. Foi prontamente detida. Ignora-se até hoje o que lhe
aconteceu.
Em janeiro de 2024, Zeinab
Khenyab Pour, dona de uma loja de roupas e activista detida por apoiar os
protestos relativos à morte de Mahsa Amini às mãos da polícia, foi condenada a
prisão por publicar fotos sem hijab nas redes sociais. No mesmo mês, Roya
Heshmati, foi punida com 74 chicotadas, por ofensa às leis da modéstia.
As mulheres não podem entrar livremente
em estádios para assistir a jogos de futebol e Khamenei é visceralmente contra
a possibilidade de tal acontecer, apesar da impopularidade da proibição. Ultimamente, por pressão internacional
deixam entrar pequenos grupos só para “inglês ver”. Em 2019, Sahar Khodayari
imolou-se pelo fogo, ao ter sido condenada por tentar entrar num
estádio vestida de homem. A FIFA ameaçou inibir a participação do Irão
em provas internacionais pelo que 4.500 mulheres foram autorizadas a
assistir a um jogo pela primeira vez, mas separadas dos homens. Como parte dos protestos, em Novembro de
2024, a estudante Ahoo Daryaei despiu-se na rua, frente à Universidade de
Teerão, sendo detida e considerada doente mental.
Os chamados crimes de honra, segundo
a lei islâmica, a “honra dos homens”, indicam, segundo fontes da ONU, que, só
em 2024, foram executadas 31 mulheres no Irão, por razões legais. Mas o número de mulheres mortas por maridos e
ex-maridos, irmãos, pais, filhos, sogros, primos, etc. por “desonrarem a
família” é avassalador. Em 2023, foram assassinadas 149
mulheres por chamados “crimes de honra”, que resultam de atitudes tão comuns
como pedir o divórcio ou recusar um casamento. Em 25 de Dezembro de 2024,
Ghazaleh Hodoudi foi queimada por recusar uma proposta de casamento.
Isto,
sem falar na omnipresente violência doméstica, cujas vítimas não só não têm
defesa legal, como o sistema incentiva o crime, ao exigir que as mulheres
obedeçam aos maridos que são seus proprietários. A lei afirma que os homens
podem matar por adultério as mulheres, mas não o contrário, e é muito
compreensiva nos casos em que os homens matam filhas e netas, por questões de
“honra”.
O divórcio é permitido ao homem
sempre que o desejar, bastando repudiar a mulher, mas o contrário não é
verdade. A mulher tem de provar (e o seu testemunho vale metade) que o seu
casamento é insuportável, ficando sem a guarda dos filhos, o que leva
muitas a resignarem-se a uma vida humilhante e inimaginável, muitas vezes
relatada em testemunhos de quem conseguiu fugir, ou em livros e filmes, como o
recente “A Semente do Fruto Sagrado” (prémio especial do Júri do Festival de
Cannes).
O Dia Internacional da Mulher é,
pois, muito importante para mostrar que os seus direitos estão longe de serem
garantidos em muitos países do mundo e, particularmente no mundo islâmico, e
que é importante denunciá-lo e lembrar a coragem de quem paga por vezes com a
vida a sua luta pelos direitos básicos e pelo fim de discriminações brutais.
COMENTÁRIOS (de 27):
Luís CR Cabral: Que tal um artigo que explique a razão pela qual a
esquerda apoia regimes teocráticos que oprimem as mulheres e não só? Rui Lima: Ontem em Paris grande confusão, perseguições, polícia,
gás lacrimogéneo … pelo que percebi um “collectif de mulheres“ pretendia gritar
pelos diretos das mulheres muçulmanas, e foi impedido, pelo contrário o grupo
maior gritava não pelas causas da Mulher mas sim pela causa Palestiniana . Maria
Nunes: Zita Seabra
devia ser uma presença mais assídua no Observador. Gosto muito de ler os seus
artigos. Antonio
Marques Mendes: Importante
lembrar que a libertação das mulheres passa por repudiar o islamismo num país
como o nosso onde no dia da mulher os manifestantes do PCP e do Bloco tinham
nas suas manifestações bandeiras do Hamas e outros terroristas islâmicos. Maria
Melo: Pois! Tantas
marchas pela liberdade da Palestina, mas nem uma, nem uma voz a condenar a
situação das mulheres, em particular, nos países muçulmanos. Nos países do
Ocidente, as mulheres têm os mesmos direitos e deveres que os homens. A
existência de quotas, seja para o que for, não as valoriza. E as expressões
encontradas para substituir a palavra Mulher também são absurdas. Cisca Impllit: Sim, vale sempre a pena. Pena que haja a possibilidade
de autofagia. No caso, as feministas que acabam com o feminino, e com tanto
ainda por fazer. É sempre um gosto ler Zita Seabra Manuel
Ferreira21: Brilhante
artigo. Longa vida à grande lutadora Zita Seabra. GateKeeper: Claro que não. Só as résteas esquerdalhas, wokes
"comemoram" esta data. E é fácil perceber porquê e para quê. No NOSSO
Mundo, aquele que devemos relevar, o mundo Ocidental, a mulher já
"conquistou:" tudo aquilo que queria "conquistar". Maria
Nunes: Excelente
artigo. Daniel
Ribeiro: Artigo
bastante pertinente e importante. Recomendo a leitura do livro "Mil Sóis
Resplandecentes" do escritor Khaled Hosseini que aborda também o tema da
falta de direitos e igualdade das mulheres relativamente aos homens, neste caso
no Afeganistão e sob o regime Taliban. Cisca
Impllit > Rui Lima: Engajadas
numa luta contra si. Duplamente triste. Mario
Guimaraes: Nunca
compreendi porque as feministas radicais não denunciam a forma como a mulher
nos países muçulmanas são tratadas. Miguel
Oliveira: Excelente
artigo. João Floriano:
Vale a pena assinalar o 8 de Março. A
condição feminina nos países como o Irão é insuportável, escandalosa, desumana
e embora não conhecendo o Corão, não acredito que Alá mande tratar assim as
mulheres. Trata-se de mais uma interpretação do livro sagrado, de modo a manter
a opressão . Ser «feminista» no ocidente significa fazer o folclore do costume
no dia 8 de março, descer a avenida com faixas e repetir sempre as mesmas
palavras de ordem, publicar uns artigos e umas declarações nas redes sociais e
continuar tudo na mesma. Mas se as nossas feministas de pacotilha quiserem
fazer alguma coisa de útil, denunciem e façam muita pressão para mudar as leis
e os comportamentos à volta da violência doméstica, um flagelo crescente na
nossa sociedade. É inadmissível que perante um brutamontes agressor muitas
vezes alcoólico, sejam a mulher e os filhos a terem de abandonar a casa da
família e andarem a esconder-se. Muitas acabam mortas e os assassinos com penas
leves face ao crime cometido e ainda por cima com a benesse de serem
considerados inimputáveis. Uns anitos num hospital psiquiátrico e aí vão eles
de novo prontos para a perseguição e para mais crimes contra as/os mesmos ou
outros/outras. Comecemos por nos preocupar com o que de mau existe à nossa
porta, não querendo isto dizer que esqueçamos os milhões de mulheres que
tiveram o azar de nascer em países como o Irão. Margarida
Moita: Muito bom! Anabela Arana:
Obrigada D. Zita Seabra.
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