Mergulhada em utopia, sempre. Daí a
desesperança e o desespero tantas vezes, com os porquês sobre as anomalias que
grassam por esse mundo, e, no fundo, todos pobres que não escapamos ao ciclo e
nos interrogamos em vão, gulosos do Bem, incapacitados de compreensão do Mal,
aceitando, na desportiva, o “Façam o favor de ser felizes”, de Solnado, como alegre
imposição não despicienda, talvez.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 07.03.24
Pedir ao poeta que cumpra rigorosamente
as regras gramaticais e os ditames da lógica é o mesmo que exigir aos arquitectos
e engenheiros que metam o Rossio na Betesga mas, na verdade, todos nós, os
prosaicos, compreendemos essas liberdades poéticas.
Vai daí, a minha amiga Eli O (em sotaque
britânico), querendo elogiar-me (o que senti e agradeci), disse, citando Manuel
Gusmão, poeta meu desconhecido, que eu tenho «a esperança que não
espera». Gostei mas fiquei a pensar…
… e pensei que a esperança é o sentimento de quem acredita na concretização de algo
subjectivamente positivo no futuro, ou seja, de algo que só o tempo trará.
E como o homem ainda não consegue manipular essa quarta dimensão, o tempo, não esperar pela esperança só pode resultar
no seu contrário, o desespero. Mas, para além deste ambiente
cartesiano, há outras dimensões em que a expressão pode tropeçar.
Assim, na perspectiva política,
não dar tempo de amadurecimento à esperança significa precipitar os
acontecimentos, ou seja, fazer a revolução. E o Estado revolucionário, o
oposto ao Estado de Direito, cede sempre à vontade do «caudillo» da revolução,
ao seu improviso ou capricho. Eis o
fascismo na sua plenitude.
Num registo menos doutrinário, o da
culinária, à «esperança que não espera» chama-se gula.
Março de 2024
Henrique Salles da Fonseca
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